Capítulo 1 • Tu Recuedo (I Remember You)
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POV. %Paulo%
Revirei os olhos enquanto tirava a foto dela das mãos de Paredes, que encarava fixamente o pedaço de papel até que eu o arranquei de suas mãos.
— Não é da sua conta — resmunguei, perdendo um pouco da paciência, como acontecia todas as vezes que alguém me perguntava sobre %Mia%.
Guardei a foto novamente dentro da agenda e enfiei dentro da gaveta na sala, me perguntei porque eu ainda guardava aquilo.
— Foi mal — Paredes riu, enquanto dava um gole na sua cerveja. — Só tava procurando um endereço na sua agenda.
Eu ia mesmo ter que tirar aquela fotografia dali, já faziam seis anos, eu nem deveria guardar aquilo. Mas era tão difícil me desfazer daquela foto, principalmente porque não era apenas a foto, me desfazer daquilo também significava soltar uma parte do meu passado, e eu não queria fazer aquilo.
O motivo era bem simples, eu ainda amava %Mia%.
Tu recuerdo sigue aquí ,como un aguacero
Rompe fuerte sobre mí, pero a fuego lento
Eu nunca quis que as coisas entre nós terminassem daquele jeito, correção, eu não queria que as coisas entre nós tivessem terminado nunca. Ela ainda deveria ser a minha garota e eu o amor da vida dela, ela ainda era o meu.
Quema y moja por igual, y ya no sé lo que pensar
Si tu recuerdo me hace bien o me hace mal
Sentei na poltrona frustrado com os meus próprios pensamentos, eu não falava com ninguém sobre aquilo, já faziam anos e eu sempre ficava com um nó na garganta quando pensava demais nela. Talvez fosse a hora de desabafar, Leo era meu melhor amigo e eu não conversaria sobre ela com mais ninguém.
Quando parei de esfregar meu rosto, notei que ele havia largado a cerveja e me encarava de forma preocupada.
— O nome dela é %Mia% — comecei falando devagar. Ele assentiu — Essa foto tem quase oito anos, ela foi minha primeira namorada, durou dois anos.
Paredes ia dizer algo, mas neguei com a cabeça, não queria consolo.
— Ela é americana, veio fazer uma viagem com umas amigas quando fez 18 anos e foi quando a gente se conheceu.
Fechei os olhos, lembrando do nosso primeiro encontro na praia.
Siento tus labios en las noches de verano, ahí están, cuidándome en mi soledad
Pero a veces me quieren matar, tu recuerdo sigue aquí
Flashback - 8 anos atrás
Me arrastei até a rede de vôlei que meus irmãos e alguns dos meus amigos haviam colocado na praia, não estava muito afim de jogar, mas também não queria passar o dia todo sentado na areia.
Minha ideia era jogar por alguns minutos e depois ir para a água para dar um mergulho, no entanto, algo aconteceu logo depois do meu primeiro saque no início do jogo, a bola acabou indo pra bem mais longe do que eu planejei, caindo nas mãos de uma morena de olhos claros.
Seus olhos faziam um contraste incrivel com os cabelos negros e a pele bronzeada pel o sol, ela era linda.
Quando ela começou a caminhar, achei que fosse devolver a bola a algum dos meus amigos e lamentei não estar do outro lado da rede. Mas para minha surpresa, ela deu apenas alguns passos e sacou a bola na minha direção, eu nem sei como eu conseguir pegar, uma vez que eu não tirava meus olhos dela.
— Quer jogar? — Gritei com um sorriso nos lábios. Ela olhou as pessoas perto da rede, só havia homens. Claro que ela ia recusar.
— Porque não? — Sua resposta veio acompanhada de um sorriso. Eu tinha certeza que retribui com cara de idiota enquanto observava ela. Não sabia se por sua beleza, por ela ter aceitado o convite ou pelo sotaque maravilhoso que ela tinha na voz. Era diferente, não sabia dizer de onde era, mas não parecia um sotaque da Argentina, muito menos cordobés como o meu.
— Tem uma pessoa a menos deste lado — incentivei, enquanto brincava com a bola nas mãos. Escutei a risada de alguns dos meus amigos. Ela deu a volta e parou ao meu lado, não conseguia mesmo parar de olhar pra ela.
— %Paulo% — escutei a voz do meu irmão me gritando do outro lado. — A bola, idiota.
Dei uma risadinha sem graça e voltei a sacar a bola de volêi, escutando ela rir baixinho também.
— Meu nome é %Mia% — falou, fazendo com que eu me voltasse novamente para ela. Seu sorriso era magnético, na verdade, ela era magnética. Observei quando ela se jogou para rebater a bola que vinha na nossa direção, acho que eu não ia conseguir me concentrar naquele dia.
— De onde você é? — Perguntei, hipnotizado com seu sorriso.
— Miami.
Flashback off
¿Tú dónde estás? Atrapado entre los besos y el adiós
Tu recuerdo sigue aquí
Paredes estalava os dedos na minha direção, me arrancando das minhas lembranças.
— Acho que não to pronto pra falar dela ainda — confessei. Joguei a cabeça pra trás, querendo me perder nas minhas próprias lembranças novamente.
— Você disse que já fazem 8 anos, porque você nunca foi atrás dela? — Questionou, como se fosse algo simples.
E na verdade, até era. Mas não era justo, eu fiz o possível para que ela ficasse e ela escolheu ir embora. No entanto, explicar aquilo a Leandro, envolvia mais coisas do que eu me sentia confortável para falar no momento.
— Eu tenho meus motivos - pressionei meus lábios, lembrando da mágoa que senti naquele dia.
A verdade é que eu amava %Mia%, mas ainda guardava muita mágoa pela forma como ela me deixou. Não esperava que ela fosse partir meu coração daquele jeito, nem que abriria mão de nós dois tão facilmente, mas ela fez. Às vezes me preocupava com a ideia de reencontrá-la e a única coisa que eu tivesse para dizer, serem insultos.
— Posso perguntar porque vocês terminaram? — Paredes perguntou, dando mais um gole na sua cerveja.
Neguei com a cabeça.
— Qual de vocês dois colocou um chifre no outro?
Tive que rir.
— Ninguém. Acho que se eu tivesse traído ela, não me sentiria no direito de ficar tão triste assim — Comecei a brincar com a almofada da poltrona enquanto falava. — Talvez se ela tivesse me traído seria mais fácil, só ia ter espaço para raiva.
— Quando você se sentir pronto para falar - falou, enquanto me esticava a mão pra dar soquinho. Fechei minha mão e devolvi o toque, assentindo com a cabeça. — Se quiser procurar ela algum dia, pode contar comigo também.
Assenti em sinal de agradecimento. Eu não achava que algum dia teria coragem pra passar por cima do meu orgulho e ir atrás dela. Mas não iria afirmar nada.
Leandro deixou a garrafa em cima da mesinha e foi atrás de sua jaqueta na cozinha. Quase não escutei quando ele se despediu.
O problema de começar a pensar em %Mia%, é que dificilmente eu conseguia parar depois, eu me perdia nas lembranças, nos "e se" e minha cabeça virava uma confusão com as recordações do passado.
Me levantei em busca de uma cerveja e me afundei no sofá. Para o meu infortúnio, a tv transmitia a cena de algum filme onde o casal se beijava debaixo da chuva, da mesma forma como eu havia feito com %Mia% depois de termos dançando na chuva no primeiro dia que nos conhecemos.
Parecia uma piada de mal gosto, primeiro Paredes com a foto e agora aquele filme idiota.
Não sei quando a garrafa que eu estava na mão terminou se multiplicando por seis, também não sabia quando eu comecei a chorar e odiar minha existência. Esse dia não deveria nem ter começado.
Sé que te tengo que olvidar
Si tu recuerdo me hace bien o me hace mal
…
O som não parava, era irritante, barulhento e atrapalhava minha concentração. Eu tentava localizar a bola no gramado mas o som do apito não fazia outra coisa a não ser me atrapalhar.
Aquilo durou mais alguns minutos até eu perceber que estava sonhando e que o apito, na verdade era a campainha do meu apartamento.
Me levantei tão devagar que achei que a pessoa ia desistir antes que eu pudesse chegar na porta. Tinha uma dor de cabeça tão insuportável que latejava a cada passo, e eu não sabia se tinha sido causado pela quantidade de cervejas - que havia se multiplicado novamente desde a última vez que contei - ou pelo choro que vinha cada vez que eu me lembrava do passado.
Não sabia quem estava do outro lado da porta, mas pensei em não abrir só pela forma como continuava apertando a campainha, eu iria brigar com o síndico.
— JÁ VAI — gritei, já bastante irritado com o barulho.
Meus batimentos começaram a ficar acelerados, eu me sentia inquieto de um jeito muito incômodo, que inferno, eu nunca mais ia beber daquele jeito. Abri a porta com raiva, querendo gritar com a pessoa que estava do outro lado por ter piorado minha agitação. Com certeza era Leo que havia esquecido alguma coisa.
Não era Leo, não foi o meu melhor amigo quem eu encontrei quando ergui os olhos pro hall de entrada do meu apartamento. Infelizmente o choque não me deixou fazer nada, um zumbido tomou conta do meu ouvido e tudo era silêncio. Esqueci como se respirava.
— %Mia%.