Você é a Melhor Escolha Que Eu Fiz

Escrito por Mari Gomez | Revisado por Isabelle Castro

Tamanho da fonte: |


1 - Utopia

“Vem a ser o que se imagina como sendo perfeito, ideal, porém imaginário não se sabe ao certo se é possível alcançar ou realizar, é almejado mas apenas utópico.”

  Durante 15 anos, imaginei como todos me notariam enquanto andava no corredor da escola. O que eu vestiria? Os caras iam gostar? Seria mais alta? Já teria seios grandes? Isso? Não era minha realidade. Eu estava enganada. Nada disso aconteceu, e provavelmente não vai acontecer. A única coisa que todos lembram é do vexame que meu pai, bêbado, deu na minha formatura do fundamental. Pois é, ninguém repararia em mim. E não tem só esses motivos. Provavelmente as meninas iriam me odiar mais ainda, e eu já não sou mais tão sociável. Sei que não sou a única que odeia ter que seguir a diretora até a sala, e sentar naquela última carteira e sentir todos os olhares em você, enquanto você tem que ignorar e estava acontecendo comigo. Primeira aula? Matemática.
  - Desculpe atrapalhar sua aula, Sr. Versalhes - porque ela pede desculpa? Ela é a diretora, ela que manda nessa escola... - Eu estou aqui para dizer que teremos uma aluna de volta esse ano. - ela me deu um empurrãozinho nas costas, para eu entrar na sala. - Esta é Agnes Miller, para quem não conhece, espero que tratem ela muito bem! - a sala inteira só assentiu com a cabeça, e alguns me olhavam estranho, curiosos, os que não me conheciam, claro. - Bom, é só isso, muito obrigada professor.
  - Não há de que Srta. Marcia. - ele sorriu como se estivesse dando encima dela, e ela gostou. Deu um sorriso tentando seduzir e saiu rebolando. Eu não mereço. - Pode sentar naquela carteira ali, Agnes, não é? - eu ainda não conhecia nenhum professor do colegial.
  - É, é sim. - Ele apontou para a mesa e eu fui em direção a ela. Suspirei, já não estava aguentando todos aqueles olhares.
  - Bom, Agnes, você é boa em matemática? - Não, definitivamente não.
  - Estou no meio termo... - Sorri sem graça.
  - Então sem problemas, vou dar o meu máximo para você ir bem nas provas. - Ele era gentil, e bonito. Sim, ele era bonito. Tinha um cabelo comprido, uma barba bem rala. Olhos verdes-musgos, estava de calça jeans skinny, o que deixava ele com um corpo bonito, considerando a camisa social que estava. Tinha um sorriso lindo, e uma voz que conseguia chamar e tirar a atenção de todos.
  - Obrigada, senhor.
  - Não me chame de senhor - ele deu uma risada - só tenho 28 anos!
  - Bom, se você diz... Obrigada, Versalhes. - Sorri, ele era legal, provavelmente iria começar a gostar de matemática. Ele explicou algo sobre equação do 2 grau avançadas, não prestei muita atenção. O sinal tocou e eu guardei meu estojo na mochila. Vi que alguém estava parado na porta, era o professor. Quando eu iria sair, ele me chamou.
  - Ei, Agnes, gostei de você! Cá entre nós - disse sussurrando - essa sala não tem muita gente educada como você. Se é que me entende. - deu risada.
  - Bom, conheço a maioria do pessoal, mas não gostei dos olhares pra cima de mim. Enfim, o que passou, passou né... Até Versalhes. - Dei um riso fraco. Ele mandou um tchau no ar, confuso, por não saber a história.
  Procurei meu armário, e do meu lado havia um ser extremamente abençoado pelos deuses. Tinha um cabelo cacheado preto, usava um óculos bem proporcional ao seu rosto. Estava reparando tanto nele, que não estava nem guardando minhas coisas.
  - Posso ajudar? - Sai do transe, e ele estava falando comigo.
  - Ah, não, desculpa, eu estava te encarando?
  - É... - Ele sorriu e olhou pro chão.
  - Ai... Desculpa mesmo, as vezes eu fico viajand. Desculpa...
  - Sem problemas, você é a aluna nova do primeiro ano não é?
  - Sim, como você sabe? - Logo me lembrei do dia do vexame, e imaginei que era por isso. - Ignore a pergunta. - ele mexeu nos cabelos. E aliás, o sorriso dele era bem bonito, ele me lembrava alguém...
  - Não foi muito difícil de descobrir. As pessoas só falam de você. -fechei a cara e voltei a olhar pro meu material.
  - Imaginei. - coloquei a mão na boca, arrumei minha franja e comecei a colocar meus livros no armário e pegando os que usaria nas próximas aulas. - não costumo chamar muita atenção, mas depois do que aconteceu é inevitável. - disse sincera, agora virada para ele, mas olhando pro chão.
  - Porque não? Você não é tão invisível, nem chega perto de ser. Você chama sim muita atenção. - óbvio que eu não era invisível, mas as pessoas não reparam em mim por causa de aparência ou algo do tipo.
  - Se não fosse aquele vexame, ninguém saberia quem sou eu. Não sou atraente, e muito menos, gostosa. Parando de falar de mim, qual seu nome?
  - Diego... Diego Versalhes. - Perai, Versalhes é o sobrenome do professor de matemática. - e o seu?
  - Agnes... Agnes Miller. Você é o que do professor Versalhes?
  - Imaginei que ia perguntar... Ele é meu pai. Dizem que não pareço muito com ele.
  - Na verdade, eu achei que você me lembrava alguém, e esse alguém era ele. Você tem a mesma cor dos olhos e dos cabelos. - Ele se surpreendeu, como perceberam sou bem observadora, e isso é bom e ruim ao mesmo tempo.
  - Ninguém nunca reparou nisso, pensei que só eu reparava. Eu não conheço minha mãe, só por fotos... Eu não tenho nada muito parecido com ela, só o sorriso e a cor da pele. - Ele sorriu simpático. Ele também deveria ter puxado a gentileza do pai.
  - Então você deve ser bom em matemática! - Pensei alto, e dei risada. - Ignore, pensei alto demais.
  - Tudo bem, e sim, eu sou bom. - Ele encostou um dos braços em um armário. - Você é?
  - Estou no meio termo, exatamente como disse pro seu pai. - meu celular começou a tocar. - Alô? Ah, oi mãe. É, tá tudo bem, na medida do possível sabe? As pessoas só falam daquele dia. Mas consegui entender matemática hoje - Olhei para Diego, ele sorriu. - Ok, você vai estar em casa quando eu chegar? Ah, tudo bem. Te vejo a noite então, se cuida, te amo também. - desliguei o telefone e me surpreendi por ele ainda estar lá. - Desculpa... era minha mãe, como você viu.
  - Tudo bem, relaxa. Não precisa pedir desculpa pra tudo. - ele deu uma risada sincera.
  - Desculpa por pedir desculpas! - Dei risada. Todos que passavam, olhavam pra gente. Eu via que ele se sentia desconfortável, então pensei em sair, não queria deixar ele sendo comentado só porque estava falando comigo. - É... eu vou procurar algum lugar com o mínimo de gente, e tentar pensar em outras coisas - olhei pro chão.
  Ele voltou a me olhar, ele era realmente bonito, como o pai. Sorriu e pegou na minha mão.
  - Vou com você. - vi a reação das pessoas e logo tirei minhas mãos das suas.
  - Não precisa, sério. Não quero que as pessoas fiquem falando de você só porque está falando comigo e etc.
  - Já perdi algumas pessoas por conta de ser um pouco popular. - me senti um pouco mal. Ele era popular, era óbvio que as pessoas iriam comentar sobre uma garota que tinha um pai alcóolatra, que estava andando com ele. - Não é só porque seu... aquele dia você foi "humilhada" - fez aspas com os dedos - que eu não vou andar com você.
  - Eu sou estranha, não sou muito amigável... Eu vou me acomodar em ficar sozinha. Por favor, pelo menos não hoje. - Ele pegou minha mão de novo, triste.
  - Você não é estranha se gostar de ler. - sorriu e dessa vez não ligou para os olhares. Percebi que ele não iria me largar. - E então, gosta?
  - Desculpa de novo, estava viajando. Acostume. - Olhei pro chão. - Gosto de ler sim, gosto de escrever também. - Ele se surpreendeu.
  - Qualquer dia desses pode me mostrar algo que escreveu? - Eu assenti. Ele pegou um livro de uma da sua mochila e me deu. - Se você ler esse livro e gostar, eu te recompenso com algo. Feito?
  - Porque me recompensar? É só um livro. - Olhei confusa.
  - Pra mim não, é um dos meus livros preferidos, do meu autor preferido. Nenhuma menina que eu conheço gostou dele. Se você gostar de algumas partes eu já te recompenso. - não levei muito a sério, mas guardei na minha mochila. - Quer me recomendar um que ninguém que conheça gostou? - peguei em sua mão e o levei para sentar em um banquinho enquanto eu procurava em minha mochila. Quando achei, entreguei pra ele. - Não ouço falarem muito bem desse livro.
  - É por isso mesmo, não encontro ninguém que teve os mesmos pensamentos que eu. Ninguém! Nem mesmo minhas amigas da outra escola. Eu levo ele pra todos os lugares, então... cuidado com ele. - sentei em seu lado - se isso for mesmo sério de você me recompensar, então digo o mesmo. - ele sorriu de canto, aquilo fez minha bochecha queimar - Eu te recompenso se conseguir tirar uma conclusão boa dele.
  - Feito. - Ele sorriu de canto de novo. - Não irei te decepcionar. - ficamos conversando por um tempo sobre livros, e ele tinha muita coisa em comum comigo.
  - Ah meu deus, estou atrasada pra próxima aula, sabe onde é a sala da Sr. Marshall? - Ele assentiu e pegou na minha mão, de mãos dadas fomos correndo até chegar na sala. Ele entrou junto comigo (provavelmente também era sua próxima aula). Mais uma dezena de olhares curiosos sobre nós...

  E foi aí que minha mãe começou a me balançar pra me acordar. É, odeio acordar cedo. Eu adoraria poder continuar esse sonho, mas preciso ir pra merda da escola. Ver as mesmas pessoas do ano passado, as garotas que eu não gosto. Não estou preparada psicologicamente. E pensando bem... até que meu sonho fez um pouco de sentido. Era primeiro dia de aula, e eu recebia muitos olhares estranhos. Como sempre. Não conseguia levantar da cama, estava triste demais por ter perdido aquele deus grego do meu sonho. É, eu teria que superar. Levantei não enxergando nada, e procurei meu uniforme. A blusa, quer dizer, odeio o uniforme inteiro, então uso só a blusa. Coloquei a blusa e a minha calça jeans. Fui escovar os dentes, lavar o rosto pra enxergar menos borrado. Depois já coloquei o tênis e tomei meu leite com Toddy. Eu e minha mãe fomos pro carro e chegamos em menos de 5 minutos, era pertinho da minha casa. Me deu até um calafrio de ver todas aquelas pessoas, algumas pessoas sozinhas, outras trocando salivas com os namorados, outras procurando namorados. Odeio escola, já falei isso? É. Desci do carro e mandei um tchau pra minha mãe. Vi o meu ex, que já estava com outra. A ex (depois de mim e antes da atual) estava me encarando e disse:
  - É, foi bom enquanto durou, e durou mais que o seu! - revirei os olhos. Eu não era obrigada a aguentar gente como ela.
  - Você mente quando diz que foi bom enquanto durou. Se tivesse mesmo sido, teria continuado. Ou não? - ela fechou a cara e eu sai andando. Algumas pessoas já me olharam como se eu fosse "A mais que demais". Nem liguei, porque sei que não sou. Só odeio ela mesmo. Foi uma pequena caminhada até chegar na porta de entrada da escola, e quando cheguei... Pá! Um balde de tinta, em todo meu corpo. E nem foi só em mim, tinha um garoto que estava passando junto comigo. A coordenadora estava olhando quem chegava e viu a cena, quase matou os garotos que planejaram tudo.
  - O que vocês pensam que estão fazendo? Isso é jeito de começar o ano? Pra minha sala, já! - queria rir, mas estava mais preocupada com a minha roupa, e a situação a qual estava. O garoto que também estava cheio de tinta, murmurou pra ele mesmo:
  - Merda, não tô enxergando nada! - dei risada. Tirei o óculos do mesmo e tirei o máximo de tinta que deu. Coloquei em seu rosto e ele voltou a enxergar. - Valeu... - ele me olhou agradecido, e vendo a minha situação. - Como eu sou azarado.
  - Estamos no mesmo barco. - fiquei olhando pra coordenadora que estava pedindo para uma tia da limpeza limpar tudo aquilo de tinta, e reparei que ele estava me encarando. - Você é novo? - ele fingiu que não estivesse me olhando e respondeu.
  - Já tinha estudado aqui, mas fui morar em outro país, e agora voltei. Não vi quase ninguém que eu conheça, mas e você, é nova? - neguei.
  - Estudo aqui desde pequena. Se eu conseguisse te ver, até falaria se lembro de você, mas a tinta toma conta de nós. - dei risada, ele sorriu. E a coordenadora começou a falar:
  - Me desculpe... Aqueles meninos sempre foram assim. Vou ver alguma roupa do achados e perdidos, e dou para vocês dois. Me acompanhem. - assenti e seguimos ela.
  - Erica, as apostilas já chegaram? - ela olhou pra mim, e estranhou de eu ter falado o nome dela. Mas depois percebeu quem era.
  - Ah sim, não vi que era você Ag. Ainda não chegaram, hoje provavelmente, vocês terão só a apresentação dos professores. Entrem. - ela abriu a porta de sua sala, e Maira, a outra coordenadora estava lá, com algumas roupas para vestirmos. Erica avisou que os banheiros separados não estavam funcionando, porque estavam reformando algumas coisas, e eu e o garoto tivemos que nos trocar no banheiro misto. Já estava toda ferrada, então não vi problema. Ele havia saído da sala primeiro que eu, então quando eu entrei, lá estava ele, sem camisa. E que corpo era aquele? Meu Deus. Ele olhou e sorriu.
  - Não se importa, né? - claro que não, isso é um colírio para meus olhos. Neguei com a cabeça, e ele lavou seu rosto. Não entrei em nenhuma cabine e me troquei lá mesmo. Ele ficou meio surpreso quando me viu tirando a blusa. Mas eu disse:
  - Não se importa, né? - ele sorriu de canto, e colocou a calça jeans que haviam dado pra ele. Eu já tinha colocado a blusa, e me deram um shorts. Bom, ok. Ele não era tão curto. Quando tirei minhas calças jeans, ele deu uma boa encarada nas minhas coxas. Fingi não perceber, e nem olhei pra ele. Coloquei o shorts e calcei meus tênis de novo. Fui lavar meu rosto e quando olhei pra ele, fiquei assustada. Não podia ser. Ele? Não... Não pode ser. Engoli em seco. Olhei pro espelho e lavei o rosto mais uma vez.
  - Mas então, qual seu nome? - ele disse. Gelei.
  - Agnes... Miller. - ele sorriu. Não tive nenhuma reação, estava olhando pra pia.
  - Diego. - olhei pra ele, assustada. Não pode ser. - Versalhes. - ok, estou na merda. Estou conhecendo o garoto que sonhei essa noite. Legal vida, legal mesmo você fazer isso comigo. - Porque você tá assustada?
  Tentei pensar em várias desculpas mas a única coisa que saiu da minha boca foi: "Não tô assustada..." e um sorriso fraco. Ele continuou a conversa e eu também, como se nada tivesse acontecido.
  - Você tá em que ano?
  - Primeiro. - ele balançou a cabeça. Me olhei no espelho e estava um pouco menos pálida do que havia ficado. Arrumei meu cabelo e pensei se deveria ou não passar batom.
  - Eu também. - Decidi que não passaria nada, porque até que estava me sentindo bonita "ao natural". Até parece que eu passo maquiagem todo dia. Depois de parar de viajar em meus pensamentos, olhei disfarçadamente para Diego, que estava fazendo algo no celular. Como seria ter ele na minha sala?
  Escutamos alguém bater na porta e falando se já podíamos sair, porque já havia batido o sinal. Peguei minhas coisas e me sujei de tinta, saímos e deixei minha roupa com ela. Não sabia o que fazer, então dei pra ela e provavelmente ela deu pra tia da limpeza. Fomos pra sala e quando entramos, todos olhavam estranho. Parecia que todos conheciam ele. E eu era a menina mais invisível do mundo, mais uma vez. A aula foi longa, e quando tocou o sinal, todos foram pra cima de Diego. Sai da sala, me sentindo estranha.

2 - Pândego

"Que ou o que gosta de frequentar festas e outros tipos de divertimento semelhantes; Que ou o que é cômico e/ou brincalhão."

  Fiquei pensando em como eu consegui sonhar com ele, antes de conhecê-lo. Era como se eu estivesse em algum tipo de filme ou livro, e as pessoas me passassem essas memórias. Como se eu não precisasse de roteiro para viver essa história, porque eu sempre receberia um prólogo dela em minha cabeça. A única coisa que mais me intrigou é que, na minha opinião, se você tem um sonho com tal pessoa, e depois o sonho se realiza, ele se realiza do mesmo jeito. Sem nada diferente. Mas comigo não aconteceu isso. Eu conheci ele de uma maneira totalmente contrária do sonho.
  Fui para meu armário e peguei meu Ipod, coloquei meus fones e dei play no aleatório. A música que começou a tocar foi Yellow do Coldplay. Boa escolha, Apple. Fui procurar meus amigos e achei-os no pátio. Sentados no chão, conversando.
  - Olha só quem apareceu! - Disse Kaio, meu melhor amigo. Nos conhecemos literalmente desde que estávamos na barriga das nossas mães. Elas se conhecem desde quando eram da faculdade, e casaram e engravidaram e tiveram filhos... e cá estamos. Nunca nos desgrudamos e ele é a pessoa mais incrível que eu já conheci. Sorri, e me sentei no chão junto a eles - Não nos viu na entrada? - abaixei a música, não tinha entendido nada do que ele falou.
  - Hã? - ele riu e repetiu a pergunta. - Ah tá! Não, aconteceu um pequeno imprevisto na hora da entrada.
  - Que tipo de imprevisto?
  - O tipo de imprevisto em que eu fico toda suja de tinta. - todos eles começaram a rir, mas não normalmente. Eles estavam rindo muito, gargalhando, tendo ataque de riso.
  - Era você? - Lilian disse. Ela era praticamente minha irmã, eu vivia na casa dela e ela na minha. Nos conhecemos quando eu ainda morava na minha outra cidade. Éramos vizinhas, e quando eu me mudei, eu realmente fiquei muito triste. Mas aí aconteceu tantas coisas que no fim ela se mudou para minha atual cidade. E aí, continuamos inseparáveis. Eu assenti. - Eu não acredito! Só com você mesmo pra acontecer essas coisas.
  Uma menina nova havia entrado e bom... Eu não era a que mais estava se sentindo deslocada ali. Pensei em falar com ela, mas minha timidez não deixou. Passei o dia inteiro conhecendo os novos professores, e me acostumando com o fato de que o garoto que eu sonhei estar na minha sala, na vida real. Fui pra casa e fiquei na cama ouvindo música.
  - Assim você nunca vai me deixar fazer yoga em casa né? Desde quando escuta música alta assim? - Podemos dizer que... minha irmã era a ovelha negra da família. Sempre em confusões, mas apesar de tudo sempre a admirei por isso. Ela é tão segura de si, tão audaciosa, coisa que nunca fui. E é linda, loira, um sorriso de dar inveja, usa piercings, dreads e alargador. Faz sucesso com os caras, totalmente diferente de mim também.
  - Desde que hoje estou animada e... - Ela me interrompeu e me fez mais uma pergunta.
  - Você não foi com essa roupa... o que aconteceu? Expliquei tudo, sobre a tinta, sobre as aulas... Mas não disse nada sobre o Diego. Não sei porque, apenas não queria que ela achasse que eu fosse uma louca.
  - Quer sair? Não consigo mesmo fazer aquelas posições loucas, vamos pro Shopping, para a praça, pra sorveteria, sei lá.
  - Tá, pode ser. Vou me trocar. - assenti, e como estava calor, coloquei meu vestido cinza, sem nenhum detalhe, junto com meu Converse vinho. Peguei minha bolsa, que no caso também era cinza mas tinha uma estampa, e coloquei um acessório vinho também, no cabelo. Enfiei meu celular na bolsa, e só passei um gloss nos lábios.
  - Pronta? - Tina disse e já foi descendo. Desci as escadas, peguei a chave do carro. Tina tirou o carro da garagem e fomos pro Shopping. Quando chegamos, estacionamos o carro e quando íamos entrar passaram um grupo de meninas. Uma era loira, com os cabelos lisos, com um corpo de se invejar (mas eu prefiro o meu), a outra era loira também, mas tinha a ponta dos cabelos enrolados. E a outra era morena, com os cabelos bem encaracolados, e não parecia gostar das outras garotas, nem abria a boca e era bem mais "normal" que as outras duas. Quando elas estavam saindo, um grupo de garotos estavam entrando, junto com a gente. Um assobiou, e a loira com os cabelos lisos sorriu.
  - Ela é tudo que eles querem. - Tina sussurrou.
  - Piriguete, fingida e fácil. - concordei. E quando íamos passar pela porta automática, um dos garotos, sem ser o mesmo que assobiou, disse:
  - Primeiro as damas... - para a minha irmã. Acho engraçado quando os caras falam isso, é só um jeito legal de dizer "ah, deixa eu olhar pra sua bunda enquanto você anda na minha frente".
  Eu estava morrendo de fome, mas o primeiro lugar em que entrei foi na livraria. Minha paixão por livros é maior que muito amor por aí. Gosto de alimentar a minha paixão sempre que posso, mesmo que esses livros só me deixam mais iludida. Os livros fazem complô com os filmes, para me iludirem. De onde eu tiraria o desejo de querer conhecer alguém na biblioteca, tentando pegar o mesmo livro, ao mesmo tempo, segurando pela capa em lados opostos? Pra que eu iria querer trombar com alguém no meio da rua e derrubar as coisas dela, me abaixar para ajudar a recolher, e depois levantar a cabeça devagar, até me deparar com o rosto mais bonito que eu já vi na minha vida? É assim que o meu subconsciente fica pedindo pra eu me apaixonar; trombando em pessoas, derrubando coisas. Tina me ajudou a escolher um novo livro, e dessa vez, escolhi "Anna e o Beijo Francês". A história parecia legal, e eu amava a França. Ela pagou, e disse que seria um presente para que eu não ficasse escutando música alta todo dia.
  Logo depois fomos para a Forever 21, para retribuir, escolhi para Tina um vestido e ela realmente amou. Pagamos com o cartão dela, mas prometi que daria o dinheiro de volta. Fomos para a praça de alimentação e comemos no Mc Donald's. Estávamos indo comprar os ingressos para assistir "Invocação do Mal", vi Versalhes entrando fila, e quase me enfiei dentro da bolsa. Não sei porque, apenas fiquei nervosa.
  - Ok, o que foi isso? - ela disse e eu expliquei o que havia ocorrido na escola, com o mesmo.
  - E ai eu passei o dia pensando em como eu consegui fazer isso.
  - Primeiro: te desculpo por não me contar isso. Segundo: ele parece estar te reconhecendo. - sorri de canto, então quer dizer que ele estava curioso pra saber se era eu ou qualquer outra garota desconhecida?
  - Eu sonhei com ele. - disse sem pensar e ela nem se espantou.
  - Enquanto estava cochilando, escutando aquela música?
  - Não... Nessa noite. - ela estava com o cenho franzido.
  - Como assim?
  - Sonhei com ele, ué! Era ele no sonho, o mesmo nome, o mesmo óculos, a mesma voz. O mesmo. Não terminei o sonho, porque mamãe me acordou para ir pra escola. E ai foi que eu conheci ele.
  - Que. Loucura. - ela disse pausadamente, e eu dei risada. - Então acho que... é pra ser, sabe? Destino.
  Depois de comprarmos, conversamos enquanto andávamos por algumas lojas enquanto não dava a hora do filme. Passei no banheiro. Quando saí, vi Versalhes conversando com a minha irmã, mas antes que eu chegasse mais perto e ele conseguisse me ver, ele saiu.
  - Agora eu que pergunto, o que foi isso? - cheguei por trás de minha irmã, e ela se assustou.
  - Nada de mais, ele veio perguntar onde você tava, mas disse que você estava no banheiro e ele foi embora. - ela estava mentindo e mesmo se não estivesse, não iria falar nada do que ele disse, então relevei.
  Depois de alguns minutos, entramos na sala de cinema e esperamos começar o filme. Durante toda a sessão, peguei amizade com um garoto que estava sentado do meu lado.
  - Você sabe que a história é real né? - eu falei, e ele disse.
  - Sim, isso que deixa o filme mais louco! - ele soltou uma risadinha baixa. Ficamos conversando durante toda a parte que conseguimos assistir do filme. Isso mesmo, parte. Algumas pessoas reclamaram da conversa e o lanterninha nos mandou pra fora. Eis a surpresa.
  - Ei, vocês dois? - olhamos para a frente, e a lanterna estava na minha cara. - Pra fora, agora! - olhei pra minha irmã, e não saímos do lugar. - Mandei ir pra fora! - e agora ele apontava pro garoto. Ele olhou pra mim.
  - Diego? - eu sussurrei, e logo virei pra frente e saímos da sala. Nesse meio tempo tentei pensar em algo pra dizer, mas não saia nada.
  - É... Oi. - ele disse, e eu queria fugir dali.
  - Então era você o tempo todo? - ele assentiu.
  - Eu definitivamente não imaginava que era você. - o mesmo disse, e olhou pro chão.
  - Nem estava tão escuro assim, nós que não percebemos mesmo. - pensei no que faríamos enquanto o filme não acabava, e demoraria pra acabar. - O que vamos fazer agora? - ele voltou a olhar pra mim. O efeito daquele olhar, era demais pra mim. O azul dos seus olhos era como o mar. Antes de olharmos para os mesmos, poderia estar uma plaquinha escrito: "Cuidado! Porta para outra realidade."
  - Podemos... passar nas lojas, se você quiser. - estranhei o que ele disse, mas aceitei. Passamos por várias lojas, e hora eu fazia ele vestir alguma roupa e hora ele dizia que eu ficaria linda com outra. Acabando o filme, minha irmã ligou, e já estava vindo até a loja nos encontrar, e também estava com os amigos dele.
  - Minha irmã já tá vindo. - eu disse. Ele assentiu e olhou pro chão, eu estava encostada em uma das paredes que tinham espelho, e ele estava na minha frente.
  - Você disse que ia experimentar aquele vestido, e até agora nada. - ele disse e eu olhei para o tal vestido.
  - Ele é muito vulgar!
  - Claro que não. Ele pode parecer vulgar, mas tenho certeza que você ficaria gostosa nele. - ele disse e eu olhei bem pra cara dele. Quem ele é pra me chamar de gostosa?
  - Gostosa? - eu disse, rindo - Desde quando você me acha gostosa ou pode me chamar assim?
  - Eu te acho gostosa, não vou negar. E desculpa, não foi o que eu quis dizer. O que eu queria dizer é que... - seus amigos chegaram por trás e deram o maior empurrão nele, que fez o mesmo me dar um selinho. Mas quando percebeu que aquilo estava realmente acontecendo, colocou a mão no meu rosto, tentando continuar o beijo, e eu apenas empurrei ele de leve, e fiz ele olhar pra mim. - Desculpa. - ele me olhava, e eu não conseguia pensar, de novo. Ele saiu de perto de mim, e seus amigos ficaram nos zoando. Dei tchau para todos e fomos para a casa, e quando cheguei em meu quarto, pensei no que minha irmã havia dito. Mas, sabe, eu acredito mesmo nisso. Acho que quando tem que ser, simplesmente é. É simples, é diferente, é intenso.

3 - Inelutável

"contra o que é impossível lutar; a que não se pode subtrair; fatal, implacável, invencível."
"destino i."

  Comecei a ler meu livro novo, e ele me surpreendeu. A personagem era muito legal, e o garoto francês, era simplesmente um amor. Quando estava quase dormindo, sinto meu celular vibrar debaixo do travesseiro. Número desconhecido. Atendo.
  - Alô? São... 2 horas da manhã. Quem é? - disse, soando irritada. Odeio quando me acordam bem quando eu consigo dormir.
  - Você é sempre assim? - Reconheci a voz e era ele, Versalhes, quem ele pensa que é para me ligar ás 2 da manhã?
  - E você, liga sempre para as pessoas de madrugada? - retruquei e escutei um suspiro.
  - Vai me dizer que já estava dormindo? - ele disse irônico. Não, claro que não. Dormir? Pra quê? São só 2h03 da manhã e é óbvio que eu estaria acordada. Que coisa mais óbvia...
  - Aconteceram coisas demais hoje, e ai eu demorei muito pra cair no sono e aí você me ligou.
  - Desculpa, foi sem querer, sério. - rolei os olhos.
  - Afinal, quem que te passou meu número? - já basta ele me ligar às 2 da manhã e eu ainda nem sabia quem havia passado o meu número pra ele.
  - Não é óbvio? - fiquei quieta. Não era óbvio, pra mim... Pelo menos - Sua irmã. - e em questão de segundos tudo ficou claro em minha mente. Aquela hora que eles estavam conversando, enquanto eu estava no banheiro. Fiquei um tempo em silêncio.
  - Você tá ai? - ele perguntou com a voz rouca.
  - Uhum. - respondi.
  - O que foi? O que eu fiz agora? - suspirei. O que ele queria que eu falasse? Meu Deus.
  - Por que quer tanto falar comigo? - não fazia sentido. Eu conheci ele a o que? Tecnicamente 2 dias?
  - Não sei.
  - Ah, por favor né. Não sei não é motivo.
  - Eu apenas... Gostei de você. Nenhuma garota me trata assim.
  - Assim como? - fiz a pergunta já sabendo a resposta. Nenhuma garota trata ele como uma pessoa qualquer. Um garoto qualquer. E sim como um Deus grego ou algo assim. Mas sim, ele pode ser muito bonito, ter olhos lindos, dentes perfeitos e cabelos enrolados sedosos mas ainda assim é uma pessoa. Uma linda pessoa, preciso admitir.
  - Eu não sei. Você não deixa de ser quem você é, e geralmente, pode parecer que estou me gabando, mas as meninas sempre tentam... É... - eu o interrompo. A resposta era exatamente essa, como esperado.
  - Óbvio, elas fazem de tudo pra trocar saliva com você.
  - Não significa que eu quero. - fiquei quieta. Nada mais clichê que eu conhecer o garoto há um dia e ele já estar dando encima de mim. Mas querido, você precisa de muito mais que um dia. - Sabe... Beleza nem sempre é conveniente. E pode ser ridículo, mas eu não ligo mais pra beleza. - bufei - Quer dizer, não tanto.
  - As pessoas não se apaixonam pela personalidade, Diego. A primeira coisa que você se apaixona é pela aparência.
  - Gostei que me chamou de Diego.
  - Por?
  - É sexy. - não pude evitar de dar risada. - Viu, te fiz rir. Não sou lá tão mal.
  - Não mesmo... - ficamos em um completo silêncio. - Você vai falar algo útil ou eu já posso dormir?
  - Porque tá sendo grossa comigo? Hoje no shopping foi tão legal...
  - Porque, me desculpa, mas eu não consigo ser simpática às... 2h07 da manhã. E... Só hoje você já me beijou e me chamou de gostosa. Não sei. É estranho. Não que você seja irritante ou algo do tipo. É só porque eu não entendo porque tá querendo tanto me conhecer e falar comigo. Tipo, nos conhecemos apenas há um pouco mais que 24 horas. - ele ficou quieto.
  - Eu só te dei um selinho! Isso nem é beijo. E desculpa se eu fui sincero e falei que você era gostosa. Não era a minha intenção.
  - Desculpado. - fiquei em silêncio de novo. De silêncio em silêncio meu olho fechava cada vez mais rápido.
  - Você não quer mesmo falar comigo, né?
  - Eu até falaria, mas eu estou morrendo de sono. Quebra essa, outro dia a gente conversa. - ele deu uma risada fraca.
  - Que desculpa mais esfarrapada.
  - Não é desculpa. - ele ficou quieto e eu só conseguia ouvir a sua respiração - Depois eu que sou chata.
  - Só estou retribuindo como você me trata. - como se eu fosse um poço de frieza com ele. Até parece.
  - Bom, se está retribuindo o meu jeito, não está sendo legal como eu sou de atender praticamente um desconhecido de madrugada e ainda conversar o mais simpaticamente possível. - ele deu risada. - Tchau, Versalhes.
  - Tchau, gostosa. - suspirei. Filha da mãe!
  Se eu dormi direito, acho que você já sabe a resposta. Dormi até umas 5 horas e depois acordei e não consegui mais cair no sono. Fiquei acordada até a hora de ir pra escola, e tentei acordar Valentina para ir comigo, já que ela tinha decidido que ia faltar a primeira semana toda.
  Me troquei e fiquei me olhando no espelho. Eu estava arrumada demais? Ou estava desleixada demais? Definitivamente não iria descobrir, porque minha mãe já estava buzinando. Entrei no carro e suspirei. Tina ainda demorou um pouco para sair de casa, mas logo já estava no carro. Fiquei pensando durante o trajeto se tinha sido grossa com ele mesmo. Infelizmente essa é a minha natureza. Às vezes parece que estou sendo grossa, mas na minha concepção eu estou falando normalmente. Eu... Eu não sei o que ele vai fazer. Tipo, eu não sei se ele iria puxar assunto comigo de novo ou se iria fingir que não me conhece. E estou ansiosa. Porquê? Não sei. Em poucos minutos cheguei na escola e avistei Kaio e Lily conversando com algumas pessoas que eu não gostava muito, então fui até meu armário, e olhei quais aulas eu teria. A vontade de voltar pra casa era de praticamente 5067%. Mas como aprendi com a minha irmã: "Faça cada roupa valer!". Escutei um grupo de meninas passando e falando sobre Versalhes, e deduzi que ele havia chegado. Seria possível eu entrar dentro do meu armário? Aposto que ele é muito aconchegante! As mesmas meninas estavam num armário um pouco depois do meu. Quando estava tentando me distrair, o babaca do meu ex para do meu lado.
  - Bateu uma saudade de você ontem. - olhei pra ele e não respondi, voltei a olhar pro armário. - Saudade de dormir com você, sabe?
  - Sério? - eu estava com raiva. Muita raiva. - Você tem várias outras namoradas e vem logo atrás de mim? Por favor, vai embora!
  - Sabia que você ia ficar nervosa. - ele sorriu, comprovando que conseguiu o que queria.
  - Não tô nervosa. Só não suporto a sua presença perto de mim. Você não significa mais nada, porque eu estaria nervosa? - ele me olhou confuso e eu vi Versalhes passando. Respirei fundo, sem parecer insegura e continuei falando. - Não precisa ficar assim, triste. Se você achava que eu ainda gostava de você ou algo do tipo, está bem enganado. Aposto que uma das suas milhões de ex's estão com saudade. Mas não eu. - ele me olhou, rolou os olhos e saiu. Vi que Diego olhava pra mim do seu armário e eu apenas fingi que não o vi.
  Eu estava indo para a sala, e Kaio para do meu lado.
  - Aquele garoto te encheu de novo? Eu vi ele falando com você. - gostava de como ele se preocupava comigo. Dava uma sensação de proteção. Ele realmente agia como um irmão.
  - Não, eu dei uma patada nele, e ele ficou sem saber o que falar e saiu. - ele levantou a mão e demos um hi-five.
  - Essa é a minha garota! - ele deu risada. Kaio tinha um dos sorrisos mais bonitos que eu já havia visto. Versalhes chega do meu lado e eu me assusto. Ele se apresenta para Kaio. "Oi, prazer, Diego" "Kaio, e aí".
  - O que foi? - ele diz, me olhando nos olhos. Sabe aquela coisa de borboletas no estômago? Me sinto assim, mas não é assim tão simples. É algo mais parecido com a sensação apavorante de estar em uma montanha russa, sua velocidade parece com a rapidez na qual eu me apaixono pelos seus olhos. Não parecia que eu havia sido grossa com ele na madrugada, ele estava normal e eu não sabia se aquilo era um jogo dele, ou era só pra me provocar.
  - Nada. - falei. Ele colocou uma das suas mãos envolta da minha cintura e eu apenas olhei pra ela e tirei. Ele sorriu de canto quando tirei suas mãos de mim. Mas continuou do meu lado, o que me fazia pirar, porque o perfume dele era realmente bom. Kaio disse que iria pra aula e me deu um beijo na bochecha. Encostei na porta da sala onde eu e Diego entraríamos e olhei para o mesmo. - Agora é a minha vez, o que foi?
  - Nada. - Ele disse e foi até sua mesa sorrindo. Porque ele consegue me provocar tão fácil? Arg! A aula começou, peguei o marca-texto e grifei algumas partes que o professor dizia ser importante. Parece que estou prestando atenção, mas não. Só estou grifando o que escuto mas não estou entendendo é nada.
  Na hora da saída, estava conversando com Lilian e vi Diego passando. Eu tirei meus olhos que estavam encarando Lily e olhei para Versalhes. Nossos olhares se cruzaram, ele me viu e deu um sorriso de canto. Levou a sua mão até a orelha e fez como um telefone e sussurrou: "me liga". E eu dei risada e balancei a cabeça, ele passou pela porta e eu voltei a olhar para minha melhor amiga. Ela estava me olhando com aquela cara de "querida, precisamos conversar sobre esse garoto". E eu ri de novo.

4 – Vicissitude

"s.f. Sequência de mudanças ou transformações; variação. Revés ou circunstâncias contrárias e \desfavoráveis; má sorte. Acontecimento casual e imprevisível: as vicissitudes da vida."

1 mês depois...

  São quase 5 horas da tarde, e eu não tenho ideia do que eu posso fazer pra sair do tédio. Estou no jardim, deitada na grama, olhando pro céu já faz umas 2 horas. Eu amo ver as nuvens, mas as vezes cansa. Estou pensando seriamente em ligar pra ele. Afinal, eu tenho o número, posso usar pra algo.
  - Alô? – Ouvi algumas risadas no fundo, e esperei alguma resposta.
  - Então quer dizer que a gostosa ligou pra mim? - ele disse e eu revirei os olhos. Faça essa ligação valer, Diego.
  - Uma hora eu iria ter que ligar mesmo. – Murmurei, não dando a mínima pro comentário.
  - O que posso fazer por você? – ouvi mais risadas e tentei não pensar que era por minha causa.
  - Poderia arranjar algo pra eu sair do tédio.
  - O que gostaria de fazer? - confesso que logo imaginei várias coisas um tanto quanto indecentes e resolvi deixar ele escolher.
  - Não sei! Me surpreenda. – desliguei o telefone e me troquei. Coloquei um vestido mesclado que, por ter uma fenda, cobria apenas uma perna e uma jaqueta azul-marinho, e meu coturno. Enquanto estava me trocando, pensei que ele poderia nem vir, mas estava com esperanças de que ele fosse uma boa pessoa e viesse me buscar. Sentei novamente na grama que tinha em frente à minha casa, e passado uma meia hora, Versalhes chegou e sentou do meu lado.
  - Estou aqui. – Ele estava com o seu cabelo um pouco mais arrumado, uma pólo azul clara e sua jeans não tão apertada nas pernas.
  - Eu estou vendo. - ele sorriu.
  – Tenho uma festa daqui algumas horas na casa de um amigo. Vai rolar até de madrugada. Topa? - ignorei todos os prós e contras que já estavam vindo em minha mente.
  - Topo. – Ele levantou primeiro que eu, e estendeu a mão para me ajudar a levantar. Fomos até seu carro, e até chegarmos na casa do garoto, conversamos muito pouco e eu só prestava atenção no percurso. Ok, não SÓ no percurso. Algumas vezes ele aumentava o rádio bem numa música que eu gostava, sem saber disso. Também olhava as mãos dele, era bonita. Enfim, quando chegamos na tal casa, ajudamos a arrumar os últimos preparativos pra festa, e esperamos o primeiro convidado chegar. Era estranho andar junto com os amigos dele. Era estranho ficar perto dele. Eu sinto algo que não consigo explicar, e essa é a minha maior frustração. Não saber explicar um sentimento. Esse também era o seu maior poder sobre mim.
  A festa havia começado, e Diego veio com dois copos quase cheios por batida de morango, começamos a conversar mais, e ele sorria mais do que eu esperava durante um diálogo.
  - Eu gosto de você. – Versalhes disse depois de vários copos daquele.
  - Eu também gosto. – Eu disse, e era verdade. Ele pode ser o cara mais irritante e provocante da cidade, e ainda consegue ser um cara simpático e que te faz rir. E a risada dele... Não preciso comentar.
  - Vamos sair daqui? – São 22h40 da noite, e estamos nessa festa há 6 horas e não aconteceu nada suficientemente interessante para meus olhos e eu não aguento mais ver esse casal se beijando desde que chegaram aqui.
  - Tá esperando o quê? – Nos levantamos e fomos andar pela rua. O garoto morava bem perto da praia, então conseguíamos enxergar ela mais perto quanto mais andávamos. Afinal, Califórnia é um lugar para se amar. Eu estava atrás de Versalhes, olhando para o céu e nem estava vendo por onde andava, quando senti ele me olhando. Ele estava parado, na minha frente, me encarando. – O que foi?
  - Quem perder, tem que entrar no mar. – E nesse exato momento ele começou a correr. Estávamos postando corrida para ver quem chegaria primeiro na praia. Ela não estava longe. Fiquei por um bom tempo atrás dele, mas depois consegui passa-lo, e quando colocamos o pé na areia, Diego puxou minha jaqueta, o que me fez parar e nós dois cairmos no chão. Ele estava bêbado, rindo, e ainda assim, continuava uma das pessoas mais lindas que eu já vi. Eu não estava bêbada, apenas estava energética, rindo junto com ele. Levantei e estendi a mão pra ele.
  - Você perdeu, babaca. – ele deu um sorriso, e pegou na minha mão para se levantar. Falei que ele deveria entrar no mar, mas ele insistiu que eu fosse junto com ele.
  - Ok, ok. Vou entrar no mar. – E foi aí que eu quase tive um infarto. Ele nisso, já tirou sua camisa polo e sua calça jeans. Foi um momento meio que difícil de respirar. Me levantei e tirei a blusa e a saia que estava, ou seja, eu estava apenas de calcinha e sutiã na frente do garoto mais bonito que já vi em toda minha vida. Fomos em direção ao mar, e eu não estava preparada para sentir a água gelada. Nós demos as mãos, olhamos um para o outro, parecia até que não nos veríamos mais. Como se aquele fosse o nosso último momento juntos. Mas isso era só nos olhares. A sensação de verdade é que aquele ia ser o primeiro de muitas coisas que faríamos juntos. Coisas divertidas e loucas que eu nunca faria com ninguém, mas coisas normais pra ele. Espero assim...
  Entramos no mar, não nos soltamos e depois de um minuto ou menos eu já estava congelando. Acho que o choque térmico foi grande demais. Corri de volta para a beira do mar e eu estava tremendo loucamente. Tipo, muito mesmo. Ele ficava dizendo: "Ei, Agnes, Agnes! Você tá bem? Agnes!!". Se eu fosse responder, de tanto que eu estava tremendo, ele não iria entender praticamente nada. Então ele só me abraçou.
  - Ei, calma, calma... Eu to aqui. - ele falava com uma voz suave irresistível. Ele parou de me abraçar e passou as suas mãos em todo o meu corpo para tirar a maioria de gotículas que estavam me congelando com o vento que passava. Tudo aquilo me deixava arrepiada. As gotas, o toque dele. Dos pés à cabeça, da cabeça aos pés. E ele percebia isso. Eu sentia a tensão dele enquanto ele passava as mãos. Parecia que ele estava desesperado para me ver bem. Para ver que eu não estava mais tremendo. Depois de tecnicamente me secar com suas próprias mãos, me abraçou forte. Vi que enquanto me abraçava, o mesmo também tremia, tendo calafrios. E eu só falei:
  - Diego! Você também tá com frio! - saiu um pouco melhor do que eu pensava, porque a maioria da tremedeira havia passado. Fiz o mesmo processo que ele havia feito comigo. Passei minhas mãos pelos seus braços, pernas e por ultimo sua barriga. Ele ficou apreensivo, porque minha unha às vezes o arrepiava, mas fiz mesmo assim. Eu juro que não estava o arranhando. Logo depois olhei para seus olhos e coloquei minhas mãos no seu pescoço.
  - Posso te beijar ou você vai dizer que mal me conhece e eu não posso fa... - Pra quê esperar ele terminar de falar se eu ia beijar mesmo? - Não pensei que poderia ser tão divertida assim.
  - As vezes a gente tem que aproveitar o momento. - ele riu e se deitou. Me deitei ao seu lado e ficamos olhando pro céu. Uma das coisas que eu mais adorava fazer. Logo depois, quando estávamos quase dormindo, estava me indagando como seria o outro dia.
  - A vida é tão estranha. - bufei, sorrindo. - É surreal como coisas que a gente menos espera acontece de uma hora pra outra. - levantei seus braços e me aconcheguei em seu peito.
  - É estranha há um ponto que ninguém nunca vai entender.
  - Ei, sobre aquilo que falou no primeiro dia de aula... Você sonhou mesmo comigo? - eu pensei que ele nem lembrava mais disso, ou de qualquer coisa que falei.
  - Sim, sonhei. - suspirei. - E se você acha estranho coisas inesperadas acontecerem, imagina estar deitada no peito do garoto que você sonhou. - ele deu risada.
  Eu não lembro exatamente o que aconteceu depois, porque cai no sono. Só sei que acordei meio assustada com uns gritos de: "Achamos eles! Caramba, eles estão dormindo... e abraçados!".

Capítulo 5 - Frívolo

"que é ou tem pouca importância; inconsistente, inútil, superficial."

  - Agnes! O que você tá fazendo aqui? Te procuramos a noite toda porra! Sabia que nossos pais estão surtando? - Tina me pegou pelo braço e já foi me levantando. Diego estava do meu lado, super sem graça, olhando para os amigos dele e pra mim, intercalando. Nós dois levantamos, eu olhei para Kaio e Lilian que estavam atrás da minha irmã. Kaio mal olhava pra mim, e se olhava, tinha um olhar de raiva. Achei estranho. Eles começaram a praticamente me empurrar para começar a andar, e eu só olhei pra trás tentando ver onde Versalhes estava. Ele estava no meio dos amigos dele, me olhou de um modo triste, e eu respondi com o mesmo olhar.
  Cheguei em casa e meus pais surtaram. Perguntaram onde eu estava com a cabeça quando pensei que poderia sair sem avisar, que eu deveria ter ligado pelo menos, mas não, eu era uma idiota imatura que havia dormido na praia com um garoto que mal conhecia. Ignorei, afinal, eles nunca iriam entender que nem sempre são assassinos em série que vão em festas de adolescentes e ficam bêbados (não tô dizendo que não pode existir, mas no meu caso não). Lillian, Kaio e Valentina ficaram por um tempo me encarando enquanto eu estava sentada na cama, encarando eles de volta, mas acho que o que eles queriam mesmo era uma resposta.
  - Tá, Agnes, começa a falar. Eu já to ficando nervoso. - Kaio disse. Fiz uma cara de deboche e revirei um pouco os olhos.
  - Ontem a tarde eu estava no tédio, eu tinha o número dele, liguei pra ele, fomos pra uma festa, ele bebeu um pouco, conversamos até chegar na praia, etc... Etc... - Eu disse e todos me olhavam como se fosse uma super história. Esperando mais, continuaram me encarando. - Vocês querem os detalhes? - as garotas assentiram com a cabeça. Kaio levantou, colocou a mão na boca e começou a andar pelo quarto. - Não vou contar nada com o K desse jeito. - as meninas olharam e ele também.
  - Você quer que eu fique como Marina? - ele disse e abriu os braços como se não tivesse outro modo.
  - Porque você tá tão incomodado com essa situação, hein? - eu levantei e fiquei na frente dele. - Sério, qual seu problema? - cruzei os braços e fiquei olhando em seus olhos. Nunca havia visto ele tão bravo desse jeito.
  - Você passou a noite fora com um garoto que mal conhece, caralho. Não avisou ninguém, nem seus pais, nem Lily, nem eu! Eu, Marina! Seu melhor amigo, lembra? - continuei olhando nos olhos dele, e ele suspirava, bufava.
  - Ok, tudo bem, me desculpa, mas não fica fazendo essa cara pra mim. Você também já sumiu inúmeras vezes por horas, e eu nunca fiquei desse jeito. - ele olhou pra cima, pra mim, suspirou e me puxou para um abraço.
  - Desculpa também. Eu só... Ah, deixa pra lá. Eu acho que vou pra casa. - ele disse segurando meu queixo para olhar pra ele. Logo depois, soltou num movimento rápido e já foi dando tchau. Em 1 minuto ele já tinha ido embora. Estranhei mas ignorei.
  - Conta, conta! - Lily deu risada. Eu sentei na cama de novo, e comecei a rir.
  - Como eu tinha dito, ele ficou meio bêbado e a gente saiu lá da festa, ele começou a dizer que gostava de mim. Ficamos rindo por um tempo andando na rua, e ele disse "quem perder, entra na água" e começou a correr até a praia. Ele perdeu, e de novo, eu vi ele sem camisa e... Vamos pular essa parte. Ai eu entrei também, só que a água tava MUITO, muito mesmo, gelada. Sai e comecei a tremer que nem uma louca, ele passou a mão pelo meu corpo todo, tirando as gotinhas que estavam me congelando com o vento, e ai, depois desse momento, eu beijei ele. - as garotas ouviam tudo com atenção, e quando eu disse que beijei ele, Lily colocou a mão na boca e deu risada. Tina me abraçou e disse: "Nunca pensei que ficaria orgulhosa de você por um motivo tão besta". Ela dizia isso mas nem imaginava que uma das frases que ela me falava quando eu perdia algo e chorava me incentivou muito nesse beijo e em muita coisa da minha vida. "Se você quer, então faça acontecer.".
  O dia foi meio longo, era um sábado e minha mãe praticamente me deixou de castigo. Ela me pedia as coisas, eu fazia. Eu pensei muito em Versalhes. Acho que ele queria mesmo aquele beijo. E eu queria saber o que ele estava sentindo na hora que estávamos indo embora, porque a expressão do rosto dele... Eu queria ter ficado com ele lá. Eu não queria ter sido praticamente obrigada a sair do calor do braço dele, e isso é uma merda. Tudo isso parece ser fofo demais, mas na real é uma coisa tão confusa que eu não sei muito descrever. Às vezes é muito bom olhar pro teto e refletir, era o que eu sempre fazia. Pensei em ligar pra ele, mas depois desisti da ideia. A campainha tocou e Tina fez uma cara de espanto.
  - Atende, atende! É ele! - ela foi pra frente do espelho e começou a ajeitar os cabelos e os dreads. Desci a escada e fui direto pra porta, abri e fiquei tentando reconhecer quem era aquele garoto.
  - Ei, prazer... Meu nome é Eduardo. - ele estava com a mão estendida na minha frente. Apertei, sorri fraco e dei espaço para ele conseguir entrar. - Você é a garota que estava com Versalhes na minha festa? - Ahhhhhh, agora tudo faz sentido. Ele era o dono da festa.
  - Eu mesma. - sorri fraco de novo, fingindo ser simpática. Ele estava subindo as escadas e eu estava atrás do mesmo.
  - É verdade que você dormiu com Diego na praia? - ele virou o rosto pra ver minha cara. Bufei. Então quer dizer que já estavam falando sobre isso? Assenti com a cabeça, chegamos no MEU quarto, em que Valentina e esse garoto provavelmente se pegariam, e eu simplesmente desci as escadas e fui parar no sofá. Um sentimento veio de dentro do meu coração e eu pensei: Netflix. Scream ou Supernatural? 4 episódios para acabar a temporada 10 de SPN, mas uns 6 pra acabar a primeira temporada de Scream... Supernatural, decidido.
  Depois que terminei a temporada, bateu um sono e eu dormi um pouco no sofá. Eis que tive outro sonho com Versalhes. Eu estava numa casa cheia de árvores, plantas. Estávamos juntos, rindo e conversando. Sai do mundo dos sonhos quando Kaio estava me balançando e chamando loucamente meu nome.
  - Nossa, nunca vi dormir tão pesado assim. - ele disse, me deu um beijo demorado na bochecha e se sentou ao meu lado. Me sentei também e me espantei quando vi a hora. Tinha dormido meia hora e parecia apenas 5 minutos...

6 - Inefável

"Adj. Indescritível; que não pode ser nomeado, designado ou descrito por ser naturalmente complexo, intenso ou belo. Inenarrável; que não se pode descrever por palavras. Encantador; que provoca grande prazer ou contentamento."

  Quando acordei do sonho, fiquei um tempo sentada sem entender muito bem tudo que estava acontecendo. Totalmente aérea. Kaio falava e eu não prestava muita atenção, mas depois me levantei, peguei a mão dele e fui pra cozinha. Fiz leite pra mim e café pra ele. Sentamos na mesa, um olhando o outro. Uma característica do meu melhor amigo que, ao mesmo tempo que me assustava às vezes, outrora eu amava, era que ele me encarava nos olhos como ninguém. Tinha vezes que ficávamos quietos olhando um pro outro, ele parecia saber tudo que eu sentia, por isso assustava.
  - Amo seu café. - ele sorriu.
  - Tem que amar mesmo, aprendi a fazer só por causa de você. - sorri, levantei da cadeira, peguei sua mão de novo e voltamos pra sala.
  Resolvemos assistir um filme de terror, sempre fazíamos isso. Ele tinha mais medo do que eu, era engraçado. Deitei no seu ombro, seus braços estavam me puxando para seu corpo. Durante o filme, eu estava pensando no que podíamos fazer quando ficasse de noite e ai pensei "shopping". Dei um pulo que o assustou e logo falei:
  - Shopping. Quando acabar o filme, vamos pro shopping.
  - Ué, fazer o que lá? - Sentei em seu colo, o mesmo parecia não saber o que fazer. Peguei em seu rosto e sorri já sabendo que ele ia querer me matar depois do que eu ia falar.
  - Comprar roupas pra você.
  - Ah, não, nem fodendo. - Ele tentou me tirar do seu colo, mas eu empurrei seu corpo contra o sofá. Ele suspirou, desviou o seu olhar do meu e olhou pra minha boca. Confesso que olhei pra dele também, era difícil ficarmos assim, tão perto um do outro. Sempre achei ele bonito, mas acho que algo dentro de mim sempre quis também provar o que nós não tínhamos dentro dessa "irmandade". Nós parecíamos namorados, porém, sem beijos ou algo do tipo. É estranho.
  - Vamos sim, você querendo ou não. - Ele resmungou um "tá, tá" e eu voltei a deitar nele. O filme acabou e ele foi pra casa dele se trocar. Entrei no quarto e Valentina estava se pegando com o tal do garoto na cama. Revirei os olhos, peguei uma roupa e vi se Kaio já estava longe, vi que não, gritei pro mesmo e fui pra casa dele também.
  - Porque resolveu vir comigo?
  - Não vou conseguir me concentrar na minha beleza se eu lembrar que a minha irmã tá se pegando com um garoto no meu quarto. - Ele riu. A casa dele era muito perto da minha, então em dentro de 10 minutos estávamos lá. Entramos e ele disse que ia pegar algo pra beliscar, concordei e fui pro quarto dele me trocar. Eu estava lá de boa, até que ele abre a porta exatamente na hora que eu estava colocando sutiã. Com o barulho da porta, me assustei e cobri meus seios com o meu braço.
  - Porra Kaio, que susto, tô me trocando... - ele deu risada. Deitou na cama e continuou me olhando. - Você ouviu o que eu disse? - ele assentiu com a cabeça e sorriu safado. Joguei uma blusa minha na cara dele.
  - Vai logo, morena. Até parece que não temos intimidade pra isso. - ele me chamava de morena quase sempre, eu adorava. Ele se levantou da cama e tirou a blusa. - Você tá gostosa e eu tô gostoso. Viu? - revirei os olhos, rindo.
  - É diferente pra você, tu não tem peitos. - liguei o foda-se e coloquei o sutiã o mais rápido possível. Meu corpo fervia e ele não parava de me olhar. Fui pegar a minha blusa que estava na mão dele. Puxei e ele segurava. Puxei de novo e ele não me deixava pegar. - Me dá, Kaio. - cruzei os braços na frente dele. Num piscar de olhos, ele me puxou totalmente para seu corpo, segurou minha cintura. Olhou dentro do meu olho. Olhou pra minha boca.
  - O que você vai fazer, hein? - arqueei as sobrancelhas.
  - Porque tá fazendo isso? - ele tirou sua mão que estava na minha cintura, mas tirou de leve, devagar. Eu sentia sua mão macia completamente por estar sem blusa. Foi um momento meio incontrolável. Eu sentia seu perfume maravilhoso e também sentia vontade de agarrar ele. Eu estava em êxtase. Nunca senti isso em todos esses anos de amizade. Minha mão que tinha parado no seu pescoço por causa do tranco de quando me puxou, desceu um pouco e foi parar no seu peito.
  - Levanta os braços. - acordei pra vida e levantei os braços. Ele colocou as blusa em mim, tirou meus cabelos de dentro, colocou uma mecha atrás de minhas orelhas, aproveitou pra segurar minha nuca e disse: "Você é linda".
  Fiquei parada por alguns segundos no mesmo lugar quando ele saiu da minha frente e foi colocar uma camisa. Fui até o banheiro que tinha do lado de seu quarto, me olhei no espelho, e fiquei me perguntando se só eu tinha sentido algo de diferente ou ele também. Mesmo que ele tenha feito coisas pra provar isso... É, acho que era a intenção dele. Porque isso do nada? O que tá acontecendo?
  Passaram-se alguns minutose e ele simplesmente estava me tratando como sempre me tratou. Sua melhor amiga. Ignorei a mudança repentina e fomos pro shopping. Fomos pra algumas lojas, compramos 2 calças e algumas camisas das quais ele, surpreendentemente gostou. Estávamos na praça de alimentação, indo embora dela pra falar a verdade. Comprei um milkshake de limão, e ele um de morango. Quando estávamos de começando a chegar perto do lugar onde as lojas começam a aparecer de novo. Kaio olhou pra mim espantado e disse:
  - Ah não, é aquela menina que não larga do meu pé. Fodeu, fodeu, fodeu... - ele se virou e encostou em uma parte de cimento vazia. Continuou falando e olhei em direção a menina.
  - Vamos, Kaio, para com isso, vamos logo antes que ela o veja. - comecei a puxar o braço dele de leve.
  - Tá louca? Preciso fazer algo. Já tentei de todas as maneiras fazer ela entender. - ele parou no meio do caminho, ficou olhando fixamente pro chão por alguns segundos e depois olhou pra mim como se tivesse uma ideia. - Finge que é minha namorada. Por favor, sei lá, eu... - arregalei os olhos.
  - Ah não, você que tá louco! Nós somos tipo irmãos e ela já tá vindo, eu não vou... - olhei para a garota, ela era bonita, não sei porque ele insistia tanto num "não". Ele me puxou pelo braço, olhou pra ela. Olhou pra mim. - Eu não... - ele já estava com o rosto colado no meu. Não conseguia ter nenhuma reação porque o olhar dele sempre me prendia. Me puxou pro beijo. Eu era magra o suficiente pra ele conseguir segurar com as duas mãos minha cintura quase que inteira. Minha mão fez o mesmo caminho de quando estávamos na sua casa. Seu pescoço, nuca. O seu beijo era forte. Ele apertava minha cintura, me consumia inteira. Era um emaranhado de sentimentos que eu sentia simplesmente com o toque da boca dele. E que boca macia... Sentia a respiração dele ofegante, fazendo com que eu ficasse sem ar. O coração dele batendo forte. O beijo foi terminando, e ele me deu alguns selinhos. Abrimos os olhos, eu estava meio perplexa, pisquei devagar apenas algumas vezes, meus braços ainda estavam entrelaçados no seu pescoço. Olhei disfarçadamente pro lado onde a garota estava, e a mesma estava nos encarando. Resolvi incorporar a personagem. Comecei a sorrir, Kaio sorriu também.
  - Ai, você é um lindo! - abracei ele, grudei no pescoço, e não parava de sorrir. A garota olhava e às vezes fingia que não estávamos ali. Eu sentia a respiração forte de Kaio no meu pescoço. Suas mãos apertando de leve minha cintura. Tirei a cabeça do pescoço e dei um último selinho nele. Ele já não tinha reação nenhuma.
  A garota passou pela gente e meio que a ficha caiu que eu tinha acabado de beijar meu melhor amigo. Olhamos um pro outro sem saber o que fazer. Como a menina estava por perto ainda, juntei minha mão com a dele. Ficamos assim até a entrada do shopping. Soltamos as mãos e eu olhei para o mesmo que estava de lado pra mim.
  - Obrigado por ter feito isso por mim. - ele disse e deu um sorriso fraco.
  Estávamos sem graça ainda pois era estranho pensar no que aconteceu. Fomos para o ponto e ficamos esperando nosso ônibus. O silêncio era constrangedor. Eu pensava no toque da boca dele, na sua mão na minha cintura. Às vezes eu conseguia ver ele pelo canto de olho me encarando. O olhar dele sempre fez meu rosto queimar. Aquele olhar quem pressiona. Penetra teu corpo e tudo que tu sente. O ônibus chegou depois de 15 minutos que mais pareciam 100 anos. Sentamos um do lado do outro quando o lugar esvaziou. Minha cabeça estava em outro lugar, até que ele pegou na minha mão. Olhei pra ele e o mesmo sorriu. Entrelaçou nossos dedos e disse:
  - Fazia tempo que não andávamos de mãos dadas. Lembra como todos achavam que a gente namorava? Era fácil enrolar os carinhas que você queria dizer não. - dei um sorriso sincero.
  - Era fácil mesmo. Eles sempre caiam. - ficamos em silêncio de novo. Paramos no nosso ponto e fomos andando a pequena parte que tinha até chegar em nossas casas. Ele me deixou na porta. Me deu um beijo na bochecha, mas seu olhar mostrava algo mais. O beijo foi demorado, ele olhava nos meus olhos como se tivesse escondendo algo e me perdendo ao mesmo tempo, meio que sem saber o que fazer. E só me abraçou e foi embora. Fiquei parada ali por alguns segundos e depois entrei. Estava tão confusa.



Comentários da autora


---