Um Lindo Engano

Escrito por Marcella R. | Revisado por Lelen

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  - Mãe, mãe, mãe... - chamou, correndo pela casa à procura da mãe. Quando ia virar no corredor, escorregou com suas meias maiores que seu pé e parou em frente ao sofá, onde sua mãe estava sentada, tentando não rir da filha.
  - O que foi, ? - disse, sem conseguir se controlar e soltando um risinho
   era uma menininha de cinco anos bastante estressada. Odiava que rissem dela, mas, àquela noite, parecia estar de bom humor, pois se levantou, ainda com o livrinho que trazia do quarto em mãos, e deu um sorrisinho pra mãe.
  - Conta uma história pra mim? - pediu, fazendo uma carinha fofa.
  Tinha apenas cinco anos, mas sabia muito bem como conseguir o que queria com os pais.
  - Ah, sério? - resmungou, largando o controle da TV ao lado e suspirando.
   tinha parado com a mania de pedir que ela ou o marido lessem histórias pra ela antes de dormir e, embora gostasse de fazer isso, era bom não ter mais esse trabalho.
  Quando viu assentir e empurrar o pequeno livro de histórias em suas mãos, suspirou novamente e se levantou. Pegou a filha no colo e, antes de ir até o quarto da menina, ainda soltou um "Nossa, como você tá pesada", que fez rir.
  Chegando ao quarto, colocou a filha na cama e jogou uma almofada no chão, sentando-se em cima dela, do modo que costumava fazer quando lia para .
  - Que história você quer hoje? - perguntou, folheando o livro. - Cinderela? - sugeriu, mas logo negou com a cabeça: já tinha lido aquela pelo menos vinte vezes. - A Bela e a Fera? - sugeriu novamente e pensou um pouco antes de negar, afinal, aquela era uma de suas favoritas. - Tudo bem, me fala qual você quer. - pediu, antes de bocejar longamente.
  - Eu queria alguma diferente, mamãe... - a menina disse e sorriu ao ver o rostinho da filha fazendo biquinho.
  - Mas não tem uma diferente, ... - disse, e, como se tivesse tido uma ideia genial, sentou-se na cama rapidamente e, com os olhinhos brilhando, puxou o livro das mãos da mãe e o jogou pra um lado.
  - Inventa uma! - pediu, com um sorriso enorme no rosto, e negou com a cabeça.
  - Eu não ia conseguir inventar uma assim, de repente! - protestou, mas fez carinha de choro e suspirou. - Tudo bem, deixe-me pensar.
  Ao ver que a mãe havia cedido, deitou-se novamente e se cobriu até o pescoço, com os olhinhos brilhando em expectativa.
  , de primeiro momento, pensou que estava ferrada. Afinal, estava morrendo de sono, não conseguiria inventar uma história àquela hora e com aquele cansaço!
  Mas então, uma ideia passou por sua mente, e ela sorriu.
  - Tudo bem, vou te contar a história de uma garota muito legal e bonita, que conheceu o amor da vida dela por causa de um engano... - começou, sabendo que isso ia causar impacto.
  - Um engano? - perguntou, já interessada.
  - Sim... - confirmou - Um lindo engano.

  Tudo começou com uma promoção que estavam fazendo...
  - E quem quiser conhecer este grande ícone do futebol e passar um dia INTEIRO com ele, precisa apenas fazer um vídeo, mostrando o que ele faz para ganhar a vida: futebol!
  - Olha só , você adora ele, por que você não participa? - uma amiga minh...

  - ? - interrompeu, sem conseguir se conter.
  - Achei que fosse mais fácil se eu usasse o nome de alguém que você conhece - deu de ombros, como quem não quer nada. - Quer que eu mude o nome?
  - Não, mamãe! - interrompeu rapidamente, espantada com a ideia.
  - Ok, então eu vou continuar, está bem? - disse, sorrindo.
  - Tá bem... - disse, mas parecia pensativa quando acrescentou - Mas se você é a garota da história... O papai tem que ser o garoto, tá?
   sorriu mais, assentindo.

  - Olha só , você adora ele, por que você não participa? - uma amiga minha disse, meio que empolgada.
  Revirei os olhos, afinal, não é como se eu pudesse ganhar.
  - O próprio Cristiano Ronaldo vai escolher o vídeo vencedor então, vamos lá, meu povo, participem! - o locutor do rádio voltou a dizer e, por um monento, eu fiquei tentada a participar. E se ele me escolhesse?

  - E ele escolheu, mamãe? - interrompeu novamente, curiosa.
  - Calma, filha! - disse, achando graça - Você já, já vai descobrir!

  - Você não tem nada à perder, tem? - minha amiga insistiu e eu dei de ombros.
  Realmente, não tinha nada à perder, mas a ideia ficou esquecida na minha cabeça, já que eu tinha que me concentrar em outras coisas.
  Ficou esquecida até aquele fatídico dia...
  Estava andando pelas ruas de minha cidade, tentando não ser levada pelo vento forte daquela noite, quando, como naqueles desenhos animados, um papel voou na minha cara e não me deixou enxergar nada.
  Estressada, puxei o papel com força, mas ele continuava querendo voar e o amassei. Mas algo me chamou a atenção nele.
  Era um pedaço de jornal, com uma foto do Cristiano Ronaldo em campo e o mesmo anúncio da promoção que eu ouvi no rádio.
  Continuei andando, tentando vencer aquele vento e chegar até em casa. Quando cheguei, tentei ler tudo o que estava escrito naquele pedaço de jornal e descobri que só poderia enviar o vídeo até o outro dia, à meia noite.
  Pensei por um momento, mas logo me decidi: como minha amiga havia dito, eu não tinha nada á perder mesmo...

  - Então você fez o vídeo, não fez, mamãe? - a voz de interrompeu a narração de .
  - Mas que garotinha impaciente! - disse, apertando as bochechas da filha. - Eu fiz o vídeo! - contou, vendo o olhar da filha e sabendo que, como ela mesma, a garota era curiosa demais.

  No outro dia, fui até a casa da mesma amiga e, no gramado do quintal dela, fiz o vídeo.
  Ficou uma porcaria, pra falar a verdade. Imagine um vídeo onde uma garota descabelada tenta fazer embaixadinhas mas, o máximo que consegue, é acertar a bola na própria cara...
  Foi algo parecido com isso, mas o resultado final me surpreendeu. No vídeo, eu parecia divertida e engraçada e, com minha amiga me dizendo que eu deveria enviá-lo, passei o vídeo para o computador e enviei.
  Os dias se passaram rápido e eram raros os momentos em que eu me pegava pensando no vídeo e onde aquilo poderia me levar. E, todas as vezes que eu pensava, começava a me sentir idiota, sonhando com um jogador de futebol que, provavelmente, escolheria qualquer um dos outros vídeos que recebesse, menos o meu.
  Mas então veio a suspresa.
  Em uma quinta-feira, ligaram pra minha casa e me contaram: ele havia escolhido meu vídeo!
  Dei pulinhos de alegria e logo anotei o dia e a hora em que iria encontrá-lo. Eu me sentia muito feliz!
  Mas esses dias demoraram a passar, como se só porque eu quisesse que eles passassem logo, eles zombassem da minha cara e se arrastassem.
  E, quando o dia finalmente chegou, um carro parou à minha porta e lá fui eu, conhecer Cristiano Ronaldo.

  - E ele te beijou, mamãe? - perguntou, interessada, fazendo rir.
  - Nem nos conhecíamos, ! Você acha que as coisas são assim, é?
  , ainda coberta até o pescoço, pareceu dar de ombros, e essa foi a deixa para que continuasse a contar.

  Quando cheguei, ele estava atrasado, e eu tive que esperar por volta de uma hora até ele chegar.
  Quando ele finalmente chegou, entrou pelas portas da mansão enorme dele no parecendo tranquilo e com um sorriso lindo no rosto.
  Eu, com meus olhos arregalados, o vi passar por mim e ir direto até sua equipe.
  E, quando ele abriu a boca, nem pude entender o que ele disse, perdida em sua voz e em seu sotaque lindo.
  Só reparei que apontavam pra mim quando ele fez uma cara de surpresa e então eu comecei a prestar atenção na cena. Algo estava errado.
  - Mas ela é a moça do vídeo 571! - um homem careca e barrigudo falava, parecendo nervoso.
  - Mas eu escolhi o vídeo de um menino - Cristiano explicava e, ouvir a voz dele, de repente, não era mais legal como antes. Como assim, ele havia escolhido um menino?!
  - Mas você disse vídeo 571! - o homem barrigudo tornou a falar e uma mulher que estava por perto e que estava no carro que foi me buscar estendeu um lenço pra ele, que secou o suor da testa.
  - Acho que houve um engano... - ela disse e consultou algo no celular, logo depois levando-o à orelha e fez sinal com a mão para que esperássemos.
  Enquanto ela se afastava e falava ao telefone, Cristiano voltou o olhar pra mim pela segunda vez e acho que eu devia parecer meio decepcionada, porque ele me olhou com uma cara de dó, e começou a se aproximar.
  Quando o vi se aproximando, tentei não pirar. Era o que eu vinha tentando fazer desde que descobri que ganhei a promoção. Afinal, se ia passar um dia com ele, não ia querer parecer uma louca histérica.
  Tentei me recompor e, assim que chegou perto o bastante, ele deu aquele sorrisinho meio de lado que me fez suspirar audivelmente.
  - Oi. - disse, sentando-se no sofá ao lado da poltrona na qual eu estava.
  - O-oi. - respondi, a voz meio falha. Meu Deus, eu estava falando com Cristiano Ronaldo!
  - Então, hmm... - ele coçou a nuca, parecendo desconfortável. Mas é claro que ele estava, já que, pelo o que eu entendi, haviam se confundido e não era eu a escolhida.
  No fundo, aquilo fazia sentido. Por que ele escolheria o meu vídeo? Mas, pra ser sincera, só o fato de ter visto ele de perto já valia à pena.

  - Foi nessa parte que ele te beijou, mamãe? - disse e, antes que pudesse responder, bocejou longamente.
  - Ainda não, ... - disse, passando as mãos pelos cabelos da filha.

  - Foi um engano, né? - recuperei minha voz e disse, também desconfortável. - Não fui eu quem você escolheu...
  - Olha, me desculpa! - ele pediu, e, nessa hora, pousou uma de suas mãos fortes sobre a minha e eu olhei meio abobada praquela cena.
  - Tudo bem... - eu disse, com um fio de voz.
  Nessa hora, a mulher ao telefone voltou e explicou tudo.
  O vídeo escolhido havia sido o de um menininho e era o número 517, mas por um erro de digitação, alguém mandou um e-mail para o homem barrigudo dizendo que Cristiano havia escolhido o número 571, e lá estava eu!
  - E o que fazemos agora? - o barrigudo perguntou, depois de se desculpar um milhão de vezes.
  OK, agora o sonho acaba!, pensei comigo mesma.
  - Bom, nós já estamos aqui, não é? - Cristiano disse, dando de ombros, e eu o olhei de esguelha.
  Isso queria dizer que eu ainda passaria o dia com ele?
  Tudo bem, agora eu podia dar uma de louca e gritar?
  - Então está resolvido! - a mulher disse, e, sinceramente, ela parecia ser muito mais profissional do que o barrigudinho se descabelando. Pelo menos alguém ali estava tentando resolver a situação!
  - Primeira parada, cozinha, estou com fome! - Cristiano disse e, sem conseguir me conter, ri. Ele olhou pra mim, sorrindo daquele jeito encantador e, caramba, ele tinha que ser tão lindo?!

   parou de contar, assim que viu bocejar longamente de novo.
  Sorriu e continuou fazendo cafuné em sua cabeça, sabendo que todas as forças da menina estavam concentradas em se manter acordada e, por isso, ela não interromperia mais.

  Almoçamos juntos, depois fizemos um tour por sua casa, pra que eu pudesse dar uma olhada no que ele chamava de "sua bagunça" e, depois, descemos até um campinho de futebol.
  Tiramos fotos, jogamos, rimos e, por incrível que pareça, no fim do dia estávamos nos divertindo como velhos amigos.
  Na hora da despedida...

  - É agora que ele te beija? - conseguiu dizer, com os olhos pesando.
   apenas riu, negando com a cabeça.

  Na hora da despedida, pedi autógrafos e mais algumas fotos, e ele foi legal comigo ao ponto de ir no carro até minha casa, conversando e rindo.
  Aquele dia havia sido surreal, mas o sonho precisava acabar.
  Desci do carro, depois de agradecer e acenei muito, com um sorriso enorme ainda no rosto.
  Ele era incrível e eu estvaa morrendo de medo disso. Provavelmente nunca mais o veria na vida, a não ser pela TV quando ele estivesse jogando, mas nada conseguia tirá-lo da minha cabeça pelos próximos dias, até que o outro fatídico dia chegou.

   olhou pra , esperando a reação, mas a menina apenas continuava com os olhinhos abertos, esperando.

  O segundo fatídico dia era um domingo, mais de um mês depois de ter conhecido Cristiano. Ele continuava na minha cabeça, mas isso não podia continuar, afinal, eu tinha que trabalhar, que viver minha vida... Tinha que acordar!
  Mas isso ficou meio difícil, já que nesse dia ele bateu na minha porta.
  Disse que eles não cumpriram a promoção do jeito certo, que dizia que o vencedor da promoção passaria um dia com ele e, depois, ele passaria um dia com o vencedor.
  Estranhei, pois não ouvi falar daquilo, mas logo me distraí, afinal, era Cristiano Ronaldo na minha cozinha, me ajudando a fazer um bolo de chocolate.
  Ao fim do dia, quando foi se despedir, ele disse que viajaria com seu time para um campeonato pela manhã, e por isso tinha passado ali.
  - Como assim? - perguntei, meio confusa.
  - Eu... Acho que precisava te ver de novo... - ele disse, fazendo meu coração acelerar.
  - Mas e a história da promoção...? - perguntei, conseguindo que minha voz saísse normal.
  Ele coçou a nuca, parecendo meio envergonhado, o que era estranho.
  - Bom... - disse, olhando em meus olhos. - Era mentira. Só queria ter uma desculpa pra passar o dia com você.

  - E então, finalmente, ele me beijou! - disse, sorrindo para a história, mas logo que olhou pra filha, viu que ela havia dormido.
  Fez um último carinho em sua cabeça e deu-lhe um beijo na testa. Ela teria muito tempo pra ouvir o fim da história.
  Levantou-se e se espreguiçou, ouvindo as costas estalarem por ter ficado tanto tempo na mesma posição.
  Estava caminhando pra porta quando ele chegou.
  - Desculpa a demora! - ele disse, com um sorriso tão cansado quanto o de sua mulher. - O treino durou mais hoje.
  - Tudo bem! - respondeu, abraçando Cristiano pelo pescoço e dando um selinho demorado nele.
  Assim que se afastou, Cristiano Ronaldo caminhou até a filha e pousou um beijo em sua testa, no mesmo lugar que havia depositado o seu.
  - Estava contando uma história pra ela? - Cristiano perguntou, estranhando, assim que viu o livro de histórias jogado no quarto.
  - Aham... - respondeu, sorrindo.
  - Qual foi a da vez? - ele perguntou, abraçando a mulher. - A Bela e a Fera de novo?
  - Não - respondeu - Ela queria ouvir algo novo, então pediu que eu inventasse uma história.
  - E qual você inventou? - ele perguntou, dando um beijo em seu pescoço.
  - Eu não inventei - disse, enigmática, dando de ombros e puxando o marido para o quarto deles.
  No escuro, abriu os olhos e sorriu.
  Tinha acabado de ouvir a história de sua mãe e de seu pai.

Fim