Uma Noite em Vegas

Escrito por Annelise Stengel | Revisado por Lyra M.

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Primeiro Capítulo

  

revirou-se na cama. Que cama deliciosa. Era a melhor cama da vida dela. Os travesseiros estavam na maciez e altura perfeitas, os lençóis eram suaves e a aqueciam bem, apesar de ainda sentir um pouco de frio por seu corpo. A sensação de relaxamento de uma noite muito bem dormida espalhava-se lentamente pelo seu corpo. Sem nenhuma preocupação no mundo, ela poderia ficar daquele jeito para sempre. Experimentou virar-se para o lado, mas ao menor movimento sua cabeça doeu de um jeito incômodo e ela interrompeu-se.
  Ressaca? Ela teria bebido tanto na noite anterior para sua cabeça doer a esse ponto? Pensando melhor, sua cama em casa não era tão confortável quanto esta que se encontrava agora, além de que o cheiro do quarto era muito mais gostoso. Estaria ela em algum hotel? O que fizera na noite anterior para estar em algum hotel?
  Forçou a memória o máximo que pode. Lembrou-se de Madeline e Loren, suas duas amigas. Sim, elas estavam juntas na noite anterior. Em Vegas! É isso mesmo, ela estava no meio de deserto de Nevada, na famosa Las Vegas. sorriu. Era a primeira vez nos seus vinte e três anos que ia para Vegas. Na verdade, nunca tivera a chance de viajar muito, sendo do interior do Colorado e estudando muito e trabalhando bastante desde que se formara na faculdade para ajudar os pais a manterem uma pequena loja de mantimentos. O motivo para tal viagem, ela conseguiu recordar-se, era sua promoção no emprego. Finalmente, depois de muito trabalho duro, conseguira um posto melhor, com um salário melhor. A primeira coisa que fez, obviamente, foi sair com as amigas em uma viagem de carro pelo Oeste americano. Como Colorado é vizinho de Utah, que é vizinho de Nevada, emendaram a festa até Las Vegas, onde ela se encontrava hoje, numa cama em um hotel maravilhoso.
  O que não conseguia se lembrar é como parara em tal hotel maravilhoso. Não tinha tanto dinheiro assim e não conseguia se lembrar de onde fizera a reserva. Ainda mais, bebera aos montes na noite anterior e estava com uma ressaca incrível, o que provavelmente indicava que ela não teria voltado para casa. Na verdade, devia estar agradecendo que ainda estava viva, considerando tudo que acontecia na cidade (tendo como referência, é claro, um dos seus seriados favoritos: CSI Las Vegas).
  Abriu os olhos e encarou a parede em frente a ela. Era cor de creme e tinha uma porta branca nela, com enfeites dourados. Em cima de uma mesinha cabeceira ao seu lado havia uma chave, um celular, um pacote de balas aberto e um relógio eletrônico que brilhava em neon dourado o horário. Dez horas e quarenta e três minutos da manhã. Mas a coisa que mais chamou sua atenção na mesinha cabeceira foi a alça de um sutiã, muito provavelmente o seu, encaixada no puxador da gaveta. Fazendo um esforço para inclinar-se, enxergou o resto do sutiã pendurado ali – confirmando que era mesmo o seu – e de bônus encontrou no chão sapatos brancos de salto alto – que definitivamente não eram seus – próximos de um vestido volumoso e brilhante branco. de fato estava nua, algo que havia notado há algum tempo, mas caso se recordava bem, na noite anterior tinha chegado a Las Vegas com um vestido preto curto com alças regata, além de uma sapatilha. Não tinha ideia de que vestido era aquele no chão do quarto, nem por que diabos estaria dormindo nua.
  Ao mesmo tempo em que teve um súbito mau-pressentimento, ouviu algo atrás de si que causou-lhe arrepios pelo corpo todo. Um ressonar baixo. , pela primeira vez desde que acordara, percebeu que o tempo todo não estivera sozinha naquela cama.
   sabia o que podia ter acontecido. Ela ouvira muitas histórias sobre bebidas e noites que falavam sobre isso. Só que ela recusava-se a acreditar que tinha acontecido com ela, não podia ser verdade. Enquanto virava-se, mesmo com a cabeça dolorida e o coração acelerado, seus pensamentos estavam a mil enquanto buscava uma sensação razoável para o que quer que tivesse acontecido na noite anterior. Porque o que era óbvio, na opinião dela, tinha que ser mentira.
  Ao completar a volta em seu próprio corpo nu, deparou-se com um homem adormecido ao seu lado.
  Um homem completamente desconhecido.
  Sua primeira reação, é claro, foi utilizar suas cordas vocais para soltar um grito rouco. Logo depois, ao notar que o homem abriu os olhos de súbito, puxou todas as cobertas possíveis para cobrir seu corpo enquanto recuava para longe do desconhecido. Suas ações não deram muito certo, pois, ao notar a garota em frente a ele, o homem também reagiu do jeito dela, puxando a coberta para si e, estando à beirada da cama, rolando para fora da mesma levando todos os pedaços de pano possíveis consigo. , frustrada e nua da cabeça aos pés, avistou um roupão dobrado em uma cadeira e correu até ele para cobrir-se, enquanto o homem remexia-se em um embolorado de lençóis.
  - Quem é você?! – ouviu uma voz rouca e grave vindo daquele amontoado. Era impressão dela ou ela acabara de ouvir um sotaque britânico? A cabeça do homem finalmente surgiu e ele a espiou, com um olhar desconfiado.
  - Eu que devia perguntar isso! – ela apontou para ele, usando a mão esquerda, já que a direita estava ocupada segurando um cinzeiro que havia achado por ali. Apenas por precaução. Sua mira era melhor com a mão direita. Ela esperava.
  O homem voltou a arregalar os olhos ao ver a mão de apontada para ele.
  - Você é casada?! – ele pareceu preocupado, e imitando o movimento dela, apontou seu dedo acusadoramente, como se isso fosse o maior problema ali. , surpresa com tal ousadia, notou a mão do homem e com surpresa percebeu que, apesar do que ele a acusava, em seu dedo anelar também brilhava uma aliança dourada.
  - Como é que você pode falar uma coisa tão acusadoramente, quando você também é?! – ela rebateu. Estava óbvio pela situação dos dois que eles haviam passado a noite juntos, mas se tivessem que encarar os cônjuges do outro, aquela situação se tornaria uma grande bola de neve. – Sua mulher deve vir atrás de mim com uma faca se descobrir que dormi com você! – afinal, esposas de caras tão bonitos como ele normalmente acabavam sendo possessivas e ciumentas. não conseguia acreditar em como se metera em tal confusão em apenas uma noite.
  - Como assim? Olhando pra você, seu marido deve ser um cara muito protetor! Eu nunca mais vou poder sair na rua! – ele reclamou, o rosto avermelhado. Ele levantou-se, ainda usando os lençóis como roupa provisória, passando a mão no cabelo escuro.
   ia retrucar de forma ácida mas finalmente a voz da razão falou mais alto do que a dor de cabeça e ela percebeu toda a besteira que estava falando. Estava tão nervosa com a situação que demorou todo aquele tempo pra lembrar um fato muito importante sobre sua vida pessoal.
  - Mas eu não tenho marido. – ela franziu a testa, olhando para o anel em sua mão esquerda. Era obviamente uma aliança de casamento.
  - O que? Como assi...? – o desconhecido ia começar a rebater o que ela dissera de forma irritada quando interrompeu sua fala, o olhar perdido em algum ponto em cima da cabeça de . Acompanhando os olhos do homem, ela encontrou uma grande faixa branca com os dizeres em dourado: “Parabéns pelo Casamento!”. Nos pontos em que a faixa se prendia à parede havia bexigas douradas em formato de coração e o resto do quarto estava decorado com pétalas de rosas.
  - Nós... nós... nós... – ele parecia não conseguir montar uma frase completa agora que a verdade estava exposta.
   mantinha-se quieta. O que era aquilo? Ela havia se casado? Ela ia passar uma noite em Vegas para aproveitar sua promoção e casara-se com um bonitão desconhecido? Recusando-se a aceitar a realidade, passou a observou o quarto e começou a preocupar-se com o preço do hotel. Ela havia sido promovida, sim, mas isso não significava que poderia arcar com as despesas daquilo tudo. Havia objetos no quarto que pareciam tão caros que ela achou que teria que pagar só de olhar para eles.
  Apesar de tudo, não conseguia afastar nenhum pensamento. O que os pais dela diriam dela? Eles eram pessoas simplórias que acreditavam no amor e esperavam que ela encontrasse um homem bom e se casasse com ele quando quisesse. Como explicaria que ficara bêbada e se casara com um desconhecido? Como seria sua vida como divorciada aos 23 anos de idade? E suas amigas? Onde estariam suas amigas? Ela precisava saber se elas estavam bem também. E se todas houvessem se casado?! Talvez assim se sentisse menos pior. Não! Não podia pensar dessa forma.
  - Oi! Estou falando com você!! – seu “marido” encarava-a e ela percebeu que ele havia se aproximado enquanto ela pensava sobre tudo aquilo. Olhando de perto, mesmo com a barba por fazer e um olhar cansado de ressaca, ele era realmente bonito. Bom, um ponto positivo na coisa toda. só torcia para ele ser rico também, senão aquele hotel seria um grande problema.
  - D-desculpe. – ela murmurou, ainda chocada com tudo. O homem suspirou.
  - Nós nos casamos. – ele disse, sério. arqueou as sobrancelhas. O que ele era, burro?
  - Ah jura? – retrucou, ironicamente.
  - Olha aqui, você acha que pode ser engraçadinha? Isso é um grande problema! – ele reclamou.
  - E você acha que é um grande problema só pra você, espertão? Se é tão burro pra eu ter que dizer isso, um casamento envolve duas pessoas e afeta a vida das duas. Eu nem ao menos sei seu nome!
  - Quem você está chamando de burro?! – ele fez uma careta e segurou os braços dela, encostando-a na parede. sentiu o coração disparar de medo ao vê-lo próximo daquele jeito, o aperto dele machucando seu braço.
  - Me solta. – sua voz tremeu quando ela sussurrou e ele arregalou os olhos de leve, afrouxando o aperto até que suas mãos caíram na lateral de seu corpo seminu. Os lençóis ainda enrolavam-se em sua cintura e notou uma ponta de tatuagem que aparecia próxima do pescoço dele, mas não conseguia ver nada mais do desenho. O que ele era, um delinquente? Ela havia se casado com um líder de gangue? Com um traficante? Como tal coisa podia acontecer para ela?
  Antes que qualquer um pudesse falar outra coisa, ouviram um toque de celular que reconheceu como seu. Esquivando-se do corpo do mais alto, correu até onde o som estava e encontrou o nome de Madeline na tela. Aliviada que a amiga estava bem e por estar longe daquele desconhecido, grudou o celular na orelha.
  - Maddy! – grunhiu, sentando-se no chão ao lado da cama que dormira. Espiou o homem, para ver se conseguia enxergar sua tatuagem, mas ele estava de frente para ela, abaixando-se para pegar uma camiseta no chão.
  - Ai meu Deus , então você está bem! – a voz da amiga transbordava alívio.
  - É, mais ou menos. – respondeu, murmurando. – Você está com Loren?
  - Estou, encontrei-a perdida um pouco mais cedo. Não sei como pudemos nos separar desse jeito ontem à noite! Nenhuma de nós tem ideia de onde você esteja!
  - Pois é, você pode me incluir nisso. – ela soltou uma risada desanimada ao constatar que, além de estar com um homem que não tinha ideia de quem era, também não tinha a menor pista de que hotel estaria e onde ele se localizava em Vegas.
  - O que você quer dizer? O que aconteceu? Você está bem mesmo? – Maddy começou o bombardeio de perguntas e a cabeça dolorida de não estava pronta para responder tudo aquilo. Até porque ela mal digerira tudo aquilo que acontecera ainda.
  - Maddy, escuta. Eu tenho que ver umas coisas aqui. Eu ligo mais tarde. – já sabia que as amigas estavam bem então agora era hora de se preocupar com ela mesma. Ignorando o que mais que Madeline estava falando, desligou o telefone e levantou-se, sentindo-se tonta. Como ela resolveria aquilo? Preferiu sentar na cama, de costas para onde ele estava de pé, e fechou os olhos.
  - . – ela ouviu e, abrindo os olhos, virou-se para encarar o homem. Deparou-se com ele todo vestido, uma jaqueta preta por cima de uma blusa azul marinho com gola em V, jeans escuros rasgados.
  - Desculpe?
  - Meu nome. Você disse que nem ao menos sabia quem eu era. Bem, meu nome é . – ele deu ombros e passou a mão novamente no cabelo. – Todo mundo me chama de , então você pode me chamar assim também.
  - Certo. – ela disse e percebeu que deveria se apresentar também. – Sou . Você pode me chamar como preferir.
  - Tudo bem, . – ele deu um sorriso mínimo e ela teve que admitir que gostava, mesmo que um pouquinho, do jeito que ele pronunciava seu nome.
  - Você é britânico? – decidiu perguntar e ele colocou as mãos no bolso.
  - É bem fácil de notar, não é? – o sorriso dele alargou-se um pouco e ela reparou que ele ficava mais bonito assim. , isso não é coisa para se reparar quando se está envolvida nesse problemão, pensou. – Desculpe por ter te segurado. É só que... – ele soltou o ar e esfregou as mãos no rosto. – Isso é péssimo. Esse é um problema dos grandes.
  - Tudo bem. – apesar de que ela ainda se sentia um pouco assustada em relação a ele. – Eu sei que é. – cansada de olhar para trás, voltou seu rosto para frente. – Mas tenho certeza que se conseguirmos um bom advogado e explicarmos a situação, podemos resolver o divórcio o mais rápido possível. – ela falava aquilo, mas na verdade na inocência de seus vinte e três anos, não tinha ideia de como documentação de casamentos funcionava, ainda menos como a documentação de divórcio seria. E como os casamentos em Vegas funcionavam? Ela não tinha nem ideia disso.
  - Sim. Vamos dar um jeito. – ele contornou a cama e sentou-se ao lado, entregando-lhe um pedaço de pano preto. reconheceu seu vestido, e perguntou-se como ele estaria ali. Será que vestira o vestido de noiva por cima dele? Talvez fosse melhor assim.
  - Obrigada.
  - Quem era no telefone? Sua amiga? – perguntou, encarando-a.
  - Sim. Vim com duas delas, mas não sei onde elas estão nem como nos separamos na noite anterior. Mas estão bem. Você está sozinho? – sentia-se envergonhada com tal conversa superficial. O que eles estavam fazendo?
  - Não, vim com dois amigos também. Talvez eles estivessem conosco quando... a gente... sabe... – ele resmungou a parte final. suspirou. Antes que pudessem continuar a conversa, foi a vez do celular de tocar e ele saiu do lado dela para atender. Levantando-se, caçou sua roupa íntima jogada pelo quarto e dirigia-se ao banheiro para se trocar quando , em um meio grito, falou um palavrão e se jogou na direção da TV.
  Assustada com a reação do rapaz, parou e observou até que ele parou num canal americano de fofoca, em que cenas confusas e gravadas de telefone apareciam na tela. soltava um palavrão atrás de outro, mas a garota ainda não tinha entendido a situação. Focou-se menos nas imagens – que pareciam de um casamento – para prestar atenção à voz nasalada e irritante da narradora, que explicava aquilo tudo.
  - OH-MY-GOD! Como vocês podem ver nas imagens submetidas por telespectadores do I!Gossip, mais um dos nossos queridinhos foi vítima de um inesperado casamento! O alvo da vez visto ontem por fãs, casando-se com uma completa desconhecida, em Las Vegas, é , sim, o nosso -deus-! Coitadas das fãs de , que nunca esperavam algo assim do bom moço da banda! Que dor no coração!
  , que aparentava estar solteiro todos esses meses, e sendo o mais comportado da banda, casou-se ontem com uma garota de identidade ainda desconhecida, completamente bêbado (mas feliz) na Capela Tru Luv em Las Vegas! Você pode ver algumas fotos e vídeos do nosso ídolo pop com a garota, que até que não é de se jogar fora hein! Que menino safadinho!
  Mas é mesmo uma pena! Será que a imagem do será afetada por esse deslize de ? Será que foi um casamento intencional, ou uma catástrofe resultada de muito álcool? Depois dos escândalos dados por e que têm mantido o grupo em alta, mas trazendo várias dores aos corações das fãs, será que acabaram as esperanças, agora que rendeu-se? E essa garota desconhecida, será que é uma fã que planejou algum golpe para conquistar o ídolo, ou há toda uma melancólica história de amor por trás de tudo? Continuem ligados na I!Gossip que traremos todas as informações assim que possível!

   ainda falava muitos palavrões e algumas outras palavras para quem quer que estivesse do outro lado da linha telefônica, mas mal conseguia se mover. Ainda segurando as roupas, ela encarava a TV que mostrava mais e mais fotos e repetia várias vezes o mesmo vídeo curto de – agora ela enxergava bem – ela e se casando na noite anterior.
  - MAS QUE BOSTA! – gritou, levantando-se e jogando o celular com força na cama. assustou-se com a reação dele e encarou-o. também olhou para ela e soltou um suspiro.
  - Você... – a voz de mais uma vez falhou e ela apertava com força as roupas em seus braços. – Você é... famoso?
  Houve silêncio por alguns longos segundos e então respondeu.
  - Eu te disse que era um grande problema.

Segundo Capítulo

  

- Como você pode não me falar tal coisa?! Devia ser a primeira coisa que você tinha que ter me contado! Não o seu nome! E agora?! – entrou em pânico. A situação toda era pior do que ela imaginava. Ela estava na TV. Seus pais, seus vizinhos, seus conhecidos, todos poderiam ver o vexame que ela tinha passado! Seria a vergonha eterna da sua família, uma desonra. era famoso! Não famoso a ponto de ela tê-lo reconhecido de cara, mas ainda assim famoso o suficiente para sair num programa de TV de fofocas.
  - Espera, como é que você espera que eu fosse falar isso logo de cara? – ele reclamou. – “Oi, bom dia nova esposa desconhecida, antes de sabermos qualquer coisa um do outro, gostaria de dizer que sou famoso e estamos ferrados.” – fez uma voz de falsete, fingindo um tom alegre, que irritou a ponto de ela largar as roupas e pegar uma almofada fofa da cama e jogar na cara dele. – Ei!
  - Não brinque com isso! Mesmo que achemos um advogado logo, o mundo todo já sabe disso! Eu vou ser a garota de 23 anos que divorciou de um cara famoso e minha vida vai ser arruinada!
  - Você pode ficar bem famosa a partir disso, sabe? – ele deu ombros, segurando a almofada. arrependeu-se de não tê-la guardado para jogar agora, porque ele a irritou ainda mais. Como ele podia ainda tentar ver um ponto positivo naquilo tudo?!
  - E eu ligo para fama?! Eu só queria passar uma noite divertida com minhas amigas pra comemorar minha promoção no emprego! Eu não queria ter me casado, muito menos com um babaca famoso, que vai arruinar minha vida!
  - Por que é que você continua me insultando?! – ele reclamou, jogando a almofada no chão. – Você mesma disse que é um casamento e num casamento tem duas pessoas envolvidas, o problema é das duas! Por que você está agindo como se só a sua vida fosse ser arruinada?
   não tinha como contestar aquilo, por isso manteve-se quieta. Mas ela sentia um grande peso dentro de seu coração que parecia ficar mais e mais pesado a cada segundo. a encarava com sobrancelhas franzidas, porém seus olhos também demonstravam preocupação e insegurança. Não aguentando mais, deixou seu peso ceder sobre as pernas e encolheu-se, escondendo o rosto nos braços. As lágrimas saíram antes que ela pudesse pensar sobre isso.
  Sua cabeça doía e desde o instante em que ela acordara, continuara descobrindo coisas desagradáveis. Definitivamente, Las Vegas mudava completamente a vida de uma pessoa. No caso de , sua vida estava de ponta cabeça, e ela não tinha ideia de como fazer para voltar para o normal. Na verdade, o que mais a assustava é que ela nunca poderia voltar para o normal. Já que a notícia se espalhara rapidamente, ela não poderia mais ser uma simples garota do Colorado que se divorciara aos 23 anos. Ela seria sempre a garota que se divorciou de . Do famoso e queridinho . E todo mundo saberia disso.
  - Ei. – ela ouviu antes de sentir a mão de tocar-lhe gentilmente as costas. Inevitavelmente, arrepiou-se ao toque dele, mas não levantou o rosto. – Eu sei que está tudo horrível agora, mas está horrível pra nós dois. – pela primeira vez, a voz dele estava sendo extremamente suave e não sentiu vontade de jogar alguma coisa na cara dele. – Então vamos resolver isso juntos, está bem? Tenho certeza que vamos achar uma solução boa para nós dois.
  - Certo. – ela resmungou e levantou o rosto, imediatamente cobrindo-o para enxugar as lágrimas que molharam suas bochechas. – Desculpe. – ela sussurrou.
  - Não tem problema. Estou feliz que você cedeu e chorou, porque senão seria eu que teria que fazer isso. – ele falou em tom gentil e ela soltou uma risada fraca ao mesmo tempo em que encontrava o braço dele e com força moderada aplicava um soco ali. Ouviu-o reclamar e finalmente descobriu o rosto, mantendo um sorriso simpático nele. A última coisa que queria fazer no momento era sorrir, mas ele estava se esforçando para ser gentil e estava certo, eles teriam que resolver aquilo juntos, então ela teria que colaborar.
  - O que vamos fazer? – perguntou.
  - Primeiro, temos que nos arrumar e sair desse hotel. Eu vou resolver as contas aqui, então não se preocupe com isso. – bem, menos uma coisa para ela suportar. – Quem me ligou foi , o baterista da minha banda. Ele que me avisou do programa de TV, enquanto me xingava de todos os nomes possíveis e me avisava que nosso empresário quer fazer uma reunião de emergência para discutirmos isso. Acho que seria bom que você fosse para essa reunião, porque podemos achar uma solução juntos lá, além de que você pode provar pra eles que não é uma fã louca que planejou tudo. Essa era a principal preocupação que eu tinha, mas fico feliz que não seja o caso.
  - Mas eu tenho que encontrar minhas amigas. – disse, enquanto se levantava com suas roupas. Pela primeira vez no dia, preocupou-se em como estaria sua aparência. – Elas devem estar preocupadas e não posso nem imaginar o que vão fazer se assistiram à TV. Posso encontrá-las antes?
  - Tudo bem, acho que é justo. – também estava de pé. – E vamos parar para tomar um café forte e comer alguma coisa, antes que eu morra de dor de cabeça e fome.
   concordou com um sorriso e entrou no banheiro.

  

  

Depois de se arrumarem, resolverem os gastos do hotel – chique até demais e cuja conta não permitiu ver – e passarem num drive-through para comprar um café e algumas outras coisas pra comer, o casal recém-casado agora se dirigia para uma praça afastada do centro da cidade onde encontraria suas amigas. Já havia telefonado para elas e avisou que explicaria tudo pessoalmente. Seria mais fácil, já que elas veriam que ela estava bem e segura. Depois de conversar com elas, iriam para a reunião da banda de .
  Enquanto ele dirigia um carro alugado, tentavam manter uma conversa mínima sobre a vida um do outro. estava realmente espantado que nunca sequer ouvira falar de , sua banda. Ela explicou que normalmente só ouvia música de rádio, durante o trabalho ou na loja dos pais, por isso era capaz de ter ouvido alguma música famosa deles, mas não saberia reconhecê-los. pareceu bastante interessado na vida pacata e tediosa de , mas ela não tinha certeza se ele apenas não estava sendo simpático. De qualquer forma, contou a ele como começou a trabalhar na loja de joias mais famosa da cidade, e como recentemente havia sido promovida para gerente da loja graças ao seu trabalho duro e dedicação. sabia muito bem como tratar os clientes, tendo aprendido isso a vida toda com a loja de seus pais.
  - Por que não ficou trabalhando na loja de mantimentos com seus pais? – ele perguntou, enquanto se aproximavam do parque onde Madeline e Loren deviam estar aguardando. deu ombros.
  - Os dois conseguem manter muito bem a loja sem mim lá. Se eu trabalhasse lá, não ganharia salário. Seria muito mais produtivo se eu trabalhasse fora e conseguisse um pouco mais para ajudar com as coisas. – explicou. concordou com a cabeça e estacionaram. A praça, já nos limites da borbulhante Las Vegas, não estava muito cheia, não sendo uma das principais atrações da cidade. pôde avistar suas duas amigas de pé em frente a um banco, olhando para todos os lados. Pareciam bastante ansiosas e a garota se sentiu culpada de fazê-las preocuparem-se tanto.
  - Eu vou sozinha. Espere aqui, está bem? – avisou a , que deu ombros.
   saiu do carro e dirigiu-se às amigas, que a avistaram imediatamente.
  - ! – as duas gritaram em uníssono e correram até ela, gerando um abraço triplo desajeitado.
  - Oi, oi, estou bem, estou bem. – ela disse com a voz fraca, apesar de estar cheia de problemas, com dor de cabeça e... ah, é mesmo. Casada.
  - Menina, o que houve com você? E quem é aquele no carro? Conte tudo agora mesmo, nós não conseguimos acreditar que te perdemos! – Loren disse, os olhos lacrimejando.
  Loren Mills era a mais velha das três e por isso entendia sua preocupação. Desde crianças as três moravam próximas na pequena cidade do Colorado e desde aqueles tempos Loren era a responsável pelas três. Não importa o que as duas mais novas aprontassem, a garota de pele cor de cappuccino sempre as cobria e cuidava delas.
  - É realmente uma longa história, e eu acho que não tenho muito tempo. – disse, lançando um olhar de soslaio para o carro onde ainda aguardava.
  - Como assim, “muito tempo”? Para onde você tem que ir? E quem está no carro? – Maddy, a mais baixa das três, ficou nas pontas dos pés tentando enxergar através dos vidros claros do carro alugado. Madeline Claire era o completo oposto de Loren. Suas sardas por cima do nariz e da bochecha, somadas ao cabelo laranja-fogo natural, concediam-lhe uma aparência travessa à qual ela sempre fez jus. Mente diabólica por trás das travessuras do trio quando menores, incentivadora de artimanhas e aventuras, não é engano pensar que foi ela que tramou toda essa viagem para a comemoração da promoção de . Talvez por isso seus olhos estivessem repletos de preocupação em relação à amiga caçula, a qual vivera altas aventuras em Las Vegas sem o conhecimento das mais velhas.
  - Tudo bem, deixe-me ver por onde começar. – disse, nervosamente, levando as mãos entrelaçadas à altura do peito e mexendo-as como costumava fazer quando não conseguia controlar os nervos. As amigas notaram o gesto, mas antes que começasse a buscar uma explicação, Madeline soltou um grito e apontou para a mão dela.
  - Que diabos de aliança é essa?! – escandalizou, segurando a mão esquerda de e quase colando a testa para enxergar com clareza. Loren arregalou os olhos e cobriu a boca em espanto.
  - Não me diga que...! – sussurrou de um modo abafado, por trás das mãos em concha. soltou um gemido.
  - Sim. – falou, lançando um olhar para trás. – Eu disse que era uma longa história.
  As duas amigas trocaram um olhar e, após alguns segundos, caíram na gargalhada.
  - O... o que...? – observava as duas, assustada, enquanto elas riam cada vez mais. – Por que vocês estão rindo? Isso não é brincadeira! Eu me casei de verdade! – ela choramingou, sentida com a falta de importância que as amigas demonstravam em relação à catástrofe que acontecera na vida dela.
  - Desculpe . Mas não consigo parar de pensar que esse era provavelmente o único jeito de você conseguir alguém mesmo. – Madeline disse, enquanto enxugava as lágrimas dos cantos dos olhos.
  - O que você está insinuando? – agora irritara-se. Como assim, o único jeito que conseguiria arranjar alguém? Não é porque nunca tivera um namorado em seus vinte e três anos que não tinha capacidade para tal coisa.
  - Nada, nada... Mas então, qual o nome dele? Ele é bonito? – Madeline manteve um sorriso irritante em seu rosto e bufou. Sentia que não queria falar mais nada para elas. Loren ainda mantinha a boca coberta, soltando risinhos ocasionais e Madeline encarava-a com aquele olhar irritante.
  - E isso importa?! – reclamou. – Eu estou aqui em uma crise e vocês estão rindo da minha cara! Eu não queria me casar com ele! Até acordar hoje cedo eu nem conhecia ele! Eu preciso resolver tudo o mais rápido possível e a bola de neve é simplesmente gigantesca, mas por que se importar, não é mesmo? – ela alfinetou em tom irônico, fazendo os sorrisos desaparecerem dos rostos das amigas. – Afinal, ele é mesmo bonito.
  - Ah, . Não nos entenda errado! – Loren apressou-se em tentar ajeitar a situação, percebendo o olhar emburrado na cara da caçula. – Não é que não nos preocupamos com você. Na verdade, de ontem pra hoje, quando nos demos conta que tínhamos perdido você, tudo o que fizemos foi nos preocuparmos com você. – ela disse em tom calmo e acolhedor, passando a mão no braço de . – Acho que estamos tão aliviadas de te ver bem, que só podemos rir da situação. Um casamento é um contrato e é só resolver papelada. Vai ser cansativo, mas é muito melhor do que as coisas que passaram pela nossa cabeça a noite toda. – Loren finalizou, sorrindo e puxando para outro abraço, Madeline seguindo-a logo depois.
   sentiu-se um pouco envergonhada, porque realmente tinha preocupado as amigas e estava olhando apenas para o próprio umbigo. Também não sabia o que tinha acontecido com elas, porém por achar que seu problema era a causa do fim do mundo, não se preocupara com elas. Que tipo de amiga era? É como fizera antes, com , pensando que só sua vida seria arruinada.
  Ah, !
  Ela afastou-se do abraço e olhou mais uma vez para o carro. Não sabia quando teria que ir para a reunião com ele, mas decidiu-se que não queria causar mais incômodos para ele.
  - Por que é que você continua olhando para lá? É o seu marido? – Loren perguntou, também espiando o carro, curiosa.
  - Sim. Nós temos que ir numa reunião para resolver o que faremos. Não sei se posso ficar tanto tempo aqui com vocês.
  - Uma reunião? – Madeline arqueou as sobrancelhas. – Para que tudo isso? E a gente não pode ir com você?
   suspirou, passando a mão no cabelo.
  - Porque a pessoa com quem me casei é um famoso. Já ouviram falar de ? – perguntou, e mal terminou de pronunciar a última palavra quando tanto Madeline quanto Loren abriram suas bocas em surpresa.
  - Você casou com alguém do ? – as duas perguntaram em um sussurro completamente enfático e Madeline agarrou os ombros de , como fizera mais cedo com a mesma.
  - Qual deles? Qual deles?
  - O-o . – respondeu, assustada com a reação das amigas. Não tinha ideia que elas conheceriam o grupo. Lembrou-se que normalmente as duas possuíam uma vida social um pouco mais agitada que a dela nesses últimos anos, contudo isso não poderia garantir que elas conheceriam o grupo britânico.
  - Não acredito! – o grito esganiçado de Madeline chamou a atenção de alguns passantes perdidos da praça, o que fez sentir-se muito embaraçada.
  - Dá pra falar mais baixo? – até ouviria desse jeito, mesmo trancado dentro do carro.
  - Eu não to entendendo! Por que você ta reclamando? Por que você vai se divorciar? Ele é o maior gostoso! – Madeline exclamou, os olhos brilhando. encarou-a indignada, perguntando-se se teria que se resignar a responder tal coisa.
  - Maddy, menos. – Loren interveio, para gratidão de . – não pode se casar com um desconhecido em Vegas e ficar de boa com isso. Ela é uma boa moça. Além do mais, a gente não sabe nada do cara.
  - Mas é o ! Claro que sabemos algo dele! Ele é o bom moço da , o com maior popularidade, a voz dele é o máximo, ele nasceu em Leeds mas desde a adolescência mora em Londres, tem vinte e cinco anos e normalmente compõe todas as músicas do grupo! – Madeline ia enumerando as coisas nos dedos e a cada momento se sentia menos confortável. Até sua amiga sabia mais coisas de seu “marido” do que ela. Era completamente desconfortável.
  - De qualquer forma Maddy, um casamento envolve duas pessoas. – decidiu interromper a contagem de Madeline, que continuara até o número de animais de estimação que o cantor tinha (aparentemente dois gatos), e falar a mesma coisa que falara para ele. – Mesmo se eu quisesse continuar casada com ele, o que eu não quero, a opinião dele também conta para a história toda. E eu tenho certeza que ele não quer continuar casado comigo. – ela disse.
  - É mesmo. Deve ser péssimo para a imagem dele algo do tipo. Você sabe se saiu na mídia? – Loren perguntou, preocupada.
  - Saiu. Assistimos na TV hoje cedo. – a caçula grunhiu, relembrando a voz nasalada da narradora do I!Gossip. – Por isso a reunião e o número de problemas. Se ninguém tivesse descoberto ainda conseguiríamos resolver o divórcio quietos e seguiríamos cada um na sua. Só que agora não dá mais para fazer isso. Temos que achar um jeito de resolver tudo. – suspirou, sentindo-se cansada. O que ela fizera para merecer tantos problemas? Como que algo que começara como uma pequena bola de neve podia se tornar uma avalanche em cima dela desse jeito?
  - Cara... é o . – Madeline murmurou, ainda chocada. a olhou. – Pelo menos você deu sorte. Ele tem fama de ser o mais carinhoso e gentil da banda. Os outros têm se metido em uns problemas feios, seria péssimo se você tivesse acabado casada com algum deles.
  - Eu preferia não ter acabado casada com ninguém. – choramingou. Ouviu uma leve buzina atrás e viu acenando de dentro do carro. Suspirou. – Acho que é minha hora de ir. Vou mantê-las atualizadas sobre o que for acontecendo. Acho melhor vocês voltarem sem mim, porque não sei quanto tempo tudo isso pode demorar. Eu me viro com meus pais e com o trabalho.
  - Você tem certeza? Podemos ficar e esperar por você. Não queremos te deixar sozinha assim. – Loren disse, seus olhos castanho-escuros transbordando preocupação. sorriu.
  - Não precisa tanto. Afinal, não estou sozinha. – ela grunhiu, olhando para o carro. – Estou casada.
  Madeline soltou um risinho e se jogou em cima da amiga, apertando-a num abraço.
  - Diga ao que depois eu quero um autógrafo. – ouviu e com um beliscão apertou a barriga da amiga, que reclamou em um meio grito. Loren envolveu-a apertado também e as duas deixaram-na ir. respirou fundo, e então voltou para o carro onde seu marido a aguardava.

Terceiro Capítulo

  

- Desculpe ter demorado tanto. – ela murmurou, entrando no carro. Lançou um último olhar para onde suas amigas estavam, acenando, e lançou um aceno fraco de volta. Agora que se afastara das duas, o peso dentro de si parecera voltar.
  - Não se preocupe, eu sei que é uma explicação meio difícil. – ele deu o sorriso de canto de mais cedo e saiu com o carro, deixando as duas amigas de para trás.
  Explicou que fariam a reunião no hotel onde o estava inicialmente hospedado e concordou. Não que ela tivesse muita escolha. Já tivera sua chance de conversar com sua parte, agora era a parte de . Os companheiros de banda e o empresário do grupo. E sabe-se lá quem mais quem. ficava mais nervosa a cada esquina que o carro virava, suas mãos novamente contorcendo-se na altura do peito. Percebeu o olhar de canto de mas ignorou-o. Essa parte da viagem foi completamente em silêncio, apesar de ter mil coisas que gostaria de perguntar a ele.
  Após de alguns minutos de trânsito, finalmente conseguiram estacionar em frente ao hotel. Surpreendentemente – para – não havia fãs à vista, o que a relaxou um pouco. Parte de sua grande preocupação em estar casada com um ídolo britânico era o fato de ter que lidar com fãs ciumentas e loucas. Saíram do carro alugado e com um gesto gentil pediu para que ela o seguisse, o que ela o fez calmamente.
  - . . Eu. Vou. Te. Matar. – foram as primeiras palavras que ouviram ao pisar no hall do lugar. Um homem alto com um cabelo preto em topete e undercut, piercing na sobrancelha e olhos muito azuis aproximou-se do casal. Ele vestia jeans justas e podia ver sua cueca azul-elétrico, e a blusa de manga curta branca permitia que ela visse seus bíceps, mesmo embaixo das tatuagens que cobriam toda a extensão dos braços até os cotovelos. Por cima da blusa, um colete preto com algumas tachinhas brilhantes e um bottom de caveira preso perto da gola. Antes que o tal homem dissesse qualquer outra coisa, porém, notou ligeiramente escondida atrás de e pareceu surpreso. – Caralho. Ela é gostosa!
  - Olha o vocabulário, seu idiota. – socou-lhe o braço com força, fazendo o outro gemer. – Esta é . , esse é o , o baterista. – apresentou-os e timidamente acenou para o rapaz que ainda a encarava um pouco boquiaberto. Ele devia ter mais de 1,90m, e com seus meros 1,60m sentia-se intimidada perto do rapaz. também era alto, mas menos que , e não a assustava tanto.
  - Desculpe. Desculpe, . – ele sorriu, fingindo estar sem graça, mas ela não teve certeza se ele realmente se sentia assim. Ela murmuraria um “sem problemas”, mas não sabia bem como reagir ao ser chamada tão espontaneamente de “gostosa”, então permaneceu calada e acenou com a cabeça.
  - Onde estão Bill e ? – perguntou, enquanto fazia outro gesto para segui-lo, sem nem mesmo tocar nela. começou a andar ao lado de e a garota, que ainda estava um pouco atrás do passo do vocalista, sentiu-se atrás de uma barreira. O baterista lançou um olhar de canto para ela antes de responder.
  - Já estão no salão esperando por você. Me mandaram esperar você aqui para garantir que não fugiria. – explicou. – Mas não sabíamos que ela viria também. – apontou com o polegar para trás, fazendo manter seus olhos no chão.
  - Isso tem a ver com ela também, então é óbvio que ela tem que estar aqui, não acha? – replicou no momento que chegavam na frente de uma porta e fazia um sinal para que entrassem. seguiu , ainda atrás dele, e lhe deu uma piscadinha, talvez simpática, talvez provocativa, quando ela passou por ele. A garota corou, ignorando a atitude do mais alto.
  - !! – ouviram uma voz grave exclamar com um tom raivoso assim que pisaram na sala e , assustada, escondeu-se ainda mais atrás dos ombros largos de , quase encostando nele. – E... a esposa? – a voz continuou, meio hesitante. respirou fundo e, percebendo que lhe lançava um olhar de canto por cima do ombro, deu um passo para o lado para enxergar quem falava.
  - Olá. – murmurou, baixo. A pessoa a quem se dirigia era um homem de seus cinquenta anos, parecido com – cabelo preto beirando o grisalho, undercut, alto – mas com marcas de idade óbvias como algumas rugas ao redor dos olhos e uma barriga um pouco saliente. Seus olhos, ao contrário dos do baterista, tendiam mais para o cinzento, e ele a analisava com hesitação e calma, além de um toque de frieza.
  - Esta é a . Como qualquer decisão que a gente tome aqui hoje tem a ver com ela, achei justo ela vir também. – a apresentou para o homem, que concordou com a cabeça. – Esse é Bill, nosso empresário.
  , que já tinha percebido aquilo, murmurou um “muito prazer” e teve sua atenção chamada para o último homem da sala.
  Ele parecia mais novo que e que . Seus cabelos eram claro, provavelmente descoloridos, e a franja caía um pouco nos olhos verdes. Estava sentado, mas parecia tão alto quanto os outros. Vestia uma blusa social branca com uma gravata vermelha, e os jeans surrados eram escuros. supôs que aquele era o membro restante do .
  - E este é . Baixista. – complementou, confirmando as suspeitas dela. a observava com interesse, um sorriso no canto da boca que a incomodava. também acenou silenciosamente para ele, sentindo-se inesperadamente tímida. Normalmente, estava acostumada a lidar com pessoas, tanto na loja de seus pais quanto na que trabalhava, então não tinha problema em se desinibir, mas devido à situação e à aura daquelas pessoas, mal conseguia seguir até uma cadeira sem tremer um pouquinho.
  Sentaram-se todos à mesa e , ao lado de , encarou os três sentados à frente deles. Os olhos corriam dela para , que batucava na mesa num ritmo que dava a impressão de que ele estava ficando impaciente com a quietude súbita de seus amigos e empresário. teve a impressão de que, pelo grito que Bill deu ao entrarem na sala, estaria levando uma bela bronca se não fosse por ela ali.
  - Então? – finalmente quebrou o silêncio, encarando todos. – Ontem eu bebi pra caralho e fiz uma bela merda.
  - Que bom que admite. – Bill disse, lançando-lhe um olhar frio. - A mídia está louca por causa disso. Quer nos contar o que aconteceu com detalhes? – ele perguntou, olhando também para . Recostou-se na cadeira e puxou um cigarro do bolso, acendendo-o ali mesmo. Ela não gostou muito daquilo, mas não encontrou nenhum sinal nos cantos do cômodo que indicasse que aquela fosse uma sala não-fumante.
  - Detalhes? – soltou um riso nasalado. – O que é que você espere que eu lembre? Eu estava muito, muito bêbado. Não me lembro de absolutamente nada. – subitamente virou-se para . – O que você lembra?
  - Não muito, também. – ela murmurou. Todos os olhares voltaram-se para ela e ela sentiu-se nervosa com a atenção. – A última coisa que lembro é quando entrei numa festa com as minhas amigas. Eu não sou de beber muito, mas elas insistiram bastante e eu peguei algumas bebidas. Depois disso... – ela calou-se, dando ombros. A única coisa que lembrava depois daquilo era que tinha acordado num hotel muito luxuoso, ao lado de um adormecido.
  - Será que tinha alguma droga nas bebidas? É muito normal aqui em Vegas. – finalmente falou, um sotaque bem mais forte que o de ou de .
  - É, será que teria alguma droga, ? – Bill perguntou, encarando-a. sentiu sua espinha gelar com aquele olhar e seu coração acelerou-se. O que ele estava insinuando? Que ela havia drogado para casar com ele?
  - Bill, corta essa. A garota nem reconheceu nossa música quando cantei pra ela. – disse, e então riu.
  - , . Você é tão inocente. Sabe, existe uma habilidade que algumas pessoas possuem que se chama: a-tu-a-ção. – disse com um largo sorriso cínico, como se estivesse explicando o abecedário para uma criança. Depois lançou o mesmo sorriso para .
  - Eu... eu não... – ela não sabia o que podia dizer. Se eles estivessem convencidos de que ela era a culpada, não havia nada que pudesse dizer, porque eles distorceriam qualquer coisa para o ponto de vista deles estar certo. Era assim que ela encarava as pessoas famosas com dinheiro. Então era isso. Além de estar cheia de problemas, a culpa recairia toda sobre ela.
  - está desde o momento que acordamos insistindo por um divórcio. Ela estava tão perdida quanto eu, e caso você me ache um jumento, Mitchell, eu sei no mínimo reconhecer uma atuação. – a voz de era fria e surpreendeu-se de ele defendê-la assim. Sentiu-se muito grata por não deixá-la sozinha e lembrou-se de Maddy dizendo que ela dera sorte, porque ele era o mais gentil dos três. Isso ficava cada vez mais claro, apesar de que não se pronunciara o suficiente para decidir se gostava ou não dele. - Apesar de você ser o expert nisso, não é mesmo. – alfinetou, o maxilar trincado. continuou com o sorriso, mas parecia mais tenso.
  - Tudo bem, tudo bem. – Bill levantou as mãos em sinal de rendição, também intervindo naquela troca de olhares assassina entre os membros. – Desculpe, . Tomaremos sua palavra de que não drogou como verdade a partir de agora então, já que ele quer levar as coisas para esse lado. – com essas palavras, percebeu que nunca ia desaparecer a dúvida se ela havia feito aquilo ou não. E que, provavelmente, Bill e os outros membros, e até mesmo , sempre desconfiariam dela. Suspirou.
  - Obrigada. – forçou-se a dizer. Gostava cada vez menos do empresário. Ele soltou algumas baforadas de fumaça, parecendo pensativo.
  - O que podemos fazer, Bill? – foi quem perguntou. – Esse problema afeta a banda inteira.
  - É claro que afeta. Já que você e ficam sempre aprontando com garotas, drogas e bebidas, as pessoas ficam de olho em vocês para acharem qualquer coisa dessas. E para o ter feito alguma coisa, é o maior escândalo do século. – Bill pareceu irritado, e o baterista e baixaram a cabeça, como se estivessem um pouco envergonhados, mas mantinham um sorriso discreto no rosto. – Se não acharmos uma solução boa, isso tudo que vocês construíram por anos vai por água abaixo.
  - A gente não pode simplesmente se divorciar? – perguntou, esfregando os olhos. também defendia aquele ponto.
  - Se vocês simplesmente se divorciarem, ainda mais depois de menos de 24h, vai mostrar para o mundo que você fez uma grande de uma cagada e a imagem da banda já era. Isso vai grudar na figura de pra sempre, não importa o que você faça. Ídolos têm que ser cuidadosos, . Você não pode sair fazendo coisa assim.
  - A imagem da banda já era de qualquer jeito por causa desses dois merdas! – reclamou, apontando para os membros da banda. – Por que é que quando eu faço uma coisa sem querer a gente tem que fazer reunião e tudo pra resolver? Quando foi o dormindo com três garotas de programa, vocês só abafaram a divulgação do caso na mídia! – a face de começava a ficar vermelha e apenas assistia à discussão dos dois.
  - Pare de agir como um menininho mimado, . Você acabou de se casar com uma desconhecida em Las Vegas, completamente bêbado, e a mídia descobriu tudo antes que pudéssemos saber sobre isso. A proporção é completamente diferente.
   e o mais velho ficaram calados, trocando um olhar pesado, e e também se entreolharam. Depois de alguns segundos, suspirou e virou-se para .
  - O que acontece com você se nos divorciarmos? Qual a sua opinião nisso tudo?
  Um pouco tímida por ter recebido a permissão de dar sua opinião, começou a apertar as mãos, mas por baixo da mesa, já que não queria parecer uma pessoa nervosa (o que ela, às vezes, era, certo).
  – Eu sou de uma cidade bem pequena e se as pessoas de lá viram a TV, provavelmente vão me reconhecer. Eu acabei de ser promovida, então tanto o casamento bêbada quanto um divórcio vão afetar minha vida. Mesmo que me divorciar dificulte tudo... eu não quero continuar casada com você. – ela disse, levantando o olhar para . Percebeu, pelo canto do olho, dando uma risadinha. – Não quero ofender, mas... casar-se com um famoso nunca esteve nos meus planos.
  - Planos mudam. – cantarolou baixinho, irritando . também desviou os olhos para o companheiro por um breve momento.
  - Eu acho que nem eu nem você planejávamos casar agora. E acho que muito menos dessa forma. Eu gostaria de dedicar meu tempo ao novo cargo, a ajudar meus pais com a loja. Queria me apaixonar aos poucos e decidir me casar junto com o homem que amo. – ela continuou. Havia muitas outras coisas mais que queria falar, só não sabia como. Preferiu manter-se em silêncio por ora, esperando a reação dos outros, até porque sua última confissão a envergonhou. Agora pareceria uma inocente garotinha do interior que ficava fantasiando com seu conto de fadas.
  Todos pareceram pensar por um tempo, até que deu uma nova sugestão.
  - E se nós divulgássemos que foi um erro de câmera? A imagem nem estava tão boa assim nas gravações. Eu posso mudar meu estilo de cabelo de repente, e divulgamos algumas fotos como se fossem de ontem, assim o “” que viram na capela casando não era eu de verdade. Podemos fazer algo com também! – ele disse, animando-se. Bill, que já estava no segundo cigarro, soltou um grunhido que poderia ter sido uma risada.
  - Você acha que isso não vai ser muito óbvio, moleque? “Oh, olhe só, um escândalo do . Puxa vida, justo um pouco antes desse boato do casamento ele decidiu mudar o visual drasticamente pela primeira vez! Com certeza não era ele casando então!” – Bill fez uma voz de falsete e lançou um olhar seco por baixo das sobrancelhas arqueadas. bufou, irritado com aquilo.
  - Então não tenho nenhuma outra ideia, porra! – ele chutou a cadeira da frente, a que estava entre Bill e , por baixo da mesa, causando um pequeno sobressalto em .
  - Sabe, por que vocês simplesmente não ficam casados? – comentou casualmente, girando uma palheta na mão. Todos voltaram seus olhares para ele, que olhou em volta com um sorriso astuto. – Vocês juntos parecem bem para mim.
  - Pena que sua opinião não serve pra nada aqui, seu merda. – reclamou. fez uma careta para ele e depois sorriu travesso para , que não soube como reagir.
  - Espera, isso pode dar certo. – Bill disse, subitamente, atraindo os olhares como holofotes.
  - O que?! – e perguntaram ao mesmo tempo, encarando o empresário boquiabertos.
  - Eu achei que eles tinham dito que queriam se divorciar, Bill. – comentou, apontando uma baqueta tirada sabe-se lá de onde para o casal, que concordou com a cabeça. , num canto paralelo de sua mente que continuava a divagar apesar de toda a confusão e seriedade do momento, perguntou-se se os músicos começavam a tirar palhetas e baquetas dos bolsos para se distrair quando o assunto ficava muito chato ou tenso.
  - já foi bem clara que não quer ficar casada comigo, e, com todo respeito , - disse, virando-se rapidamente para ela, que deu ombros – eu também não quero ficar casado com ela.
  - Por quê? Ela é bonita. – soltou outro comentário casual, fazendo corar. O que é que aqueles britânicos tinham que ficavam soltando elogios para ela a torto e direito? Ela nem era tudo isso, pensou amargamente.
  - A questão aqui não é se ela é bonita ou não, idiota. – apontou irritado para o colega de banda. A garota, que no começo estranhara os modos de tratamento entre eles, já começara a se acostumar com tantas palavras rudes cuspidas a todo momento.
  - Vocês querem calar a boca por um momento, moleques? – Bill tentou retomar a ordem, mas virou-se para ele e fez um sinal de “pare” com a mão.
  - Bill, a gente já disse que nã...
  - Dá pra você parar um pouco e me escutar, ? – Bill disse mais alto, batendo na mesa e fazendo calar-se. – Eu sei que vocês não querem continuar casados, eu ouvi das primeiras trinta e nove vezes que você estava choramingando isso. Mas não quer dizer que vocês precisem se divorciar imediatamente, quer? Algum de vocês morreria por ficar junto com o outro por, sei lá, uns três meses?
  - O que você quer dizer? – perguntou, um pouco desnorteada. Ficar casada com o ? Aquilo era mesmo uma opção? Bill ajeitou-se na cadeira e acendeu outro cigarro antes de continuar. Agora, todos estavam quietos, prestando atenção na sugestão dele.
  - Escutem... se vocês continuarem casados por uns três meses, algo assim... e a gente criar uma história por trás disso tudo e lançar na mídia... transformar vocês em um novo Romeu e Julieta, sabe? A opinião geral pode mudar e a imagem de nenhum dos dois acaba ficando tão ruim. – ele explicou.
  - Ainda não entendi. – , sendo honesto, transformou em palavras a confusão que sentia. Bill esfregou o rosto com a palma da mão que não segurava o cigarro, buscando novos jeitos de explicar o que estava em sua mente.
  - Vamos criar uma história para vocês dois. Como vocês se conheceram há, sei lá, uns três anos atrás. E como mantiveram uma relação à distância por todo esse tempo, mantendo o sentimento pelo outro, encontrando-se em segredo por pouco tempo. – ele gesticulava enquanto falava e todos prestavam atenção. – A gente pode lançar que num desses encontros, aqui em Vegas, vocês acabaram se empolgando e decidiram se casar, o que acabou virando uma grande festa. Vocês não se casaram porque estavam bêbados e não sabiam o que estavam fazendo. – ele levantou um dedo indicador e fez um sinal negativo. – Vocês sabiam o que estavam fazendo, casaram-se e estavam bêbados porque estavam felizes. Entendem a mudança de ponto de vista?
  - Sim. – disse, entendendo o raciocínio dele. a olhou. – Dessa forma, nós seríamos um casal que sofreu com a distância por muito tempo. As pessoas, muito provavelmente, vão torcer pelo nosso relacionamento se tivermos uma história assim. Pelo menos, mais do que torceriam se nos casamos por acidente.
  - Exatamente.
  - Mas então, por que a gente não ficaria casado pra sempre? – perguntou, arqueando as sobrancelhas.
  - E por que depois de todo esse tempo decidiriam se mostrar? Se estavam mantendo segredo tão bem, por que não continuaram assim e casaram desse jeito? – acrescentou, fazendo concordar com a cabeça.
  Todos pareceram pensar por um tempo, e surpreendeu-se ao encontrar uma solução rapidamente para aquilo.
  - Que tal porque eu tinha medo da mídia? – sugeriu, um pouco receosa. Todos a encararam. – Sabe, antes eu não queria divulgar nosso relacionamento porque queria continuar minha vida normalmente por aqui, apesar de gostar muito dele. – ela apontou para o rapaz ao seu lado. – Então ele me convenceu a sairmos e decidimos nos casar e deixar nosso relacionamento público. Só que depois de três meses eu não vou aguentar a pressão da mídia, como eu temia antes, e então teremos que nos divorciar. – ela completou e Bill deu um sorriso mínimo, aprovando com a cabeça.
  - Muito bom. Ótimo, . – ele falou, não que isso a fizesse gostar um pouco mais dele. A sugestão na verdade era bem perto da realidade, então não seria difícil sustentar isso. Ela agradeceu com a cabeça e olhou para , que ainda pensava sobre aquilo.
  - O que você acha? – ela perguntou para ele, que a olhou com seus olhos .
  - Não sei. Ainda não sinto firmeza nisso. É um plano bem melhor do que os que apareceram até agora, é óbvio. Mas tenho a sensação de quando nós nos divorciarmos... – ele hesitou. – A situação não vai melhorar para você. Eu vou ser o pobre rapaz que teve que deixar a garota que ele amava ir por ela não conseguir se adaptar ao mundo dele. Mas você sempre vai ser a garota que amava e o deixou ir. Você vai ser a ex-esposa de e esse fantasma não vai deixar de te assombrar tão fácil quanto você acha. – ele disse. sentiu uma emoção estranha dentro de si. tinha a solução perfeita para si, mas ainda assim não parecia aceitá-la completamente porque não sairia exatamente bem com aquilo?
  - Acho... que podemos arriscar. – ela respondeu, exibindo um sorriso confiante. Ou, pelo menos, tentando.

Quarto Capítulo

  

Depois do fim da reunião, havia muitas providências a serem tomadas. A mais importante era entrar em contato com seus pais e deixá-los a par da história – da história falsa, é claro – para que o resto pudesse se suceder sem problemas.
   não quis contar a seu novo marido e companhia que seus pais a conheciam muito bem e provavelmente desconfiariam daquilo. nunca tinha estado antes no Colorado, não que tivesse sido divulgado na mídia, e nunca havia saído do estado antes. O que dificultava o “encontro” dos dois que resultou no amor e todo o resto até o casamento. mal saía de casa e do trabalho, o que não poderia sugerir seus encontros escondidos com . Era bem difícil contar uma mentira dessas pros seus pais e vê-los acreditando.
  Mas seria muito pior contar a verdade. não conseguia se imaginar olhando na cara de seus pais e dizendo “fiquei muito louca em Vegas e casei com um vocalista de uma banda britânica” com um sorriso no rosto. Não sem causar um enfarte em seu pai e um ataque de pânico na sua mãe. O que pretendia evitar o quanto fosse possível.
  - E ai? – apareceu no quarto, interrogando-a com o olhar. Ela ainda segurava o celular que tinha acabado de usar para ligar para seus pais na altura do peito e divagava sobre como daria as notícias.
  - Eu só os avisei que Maddy e Loren iriam voltar antes por causa de uma surpresa que eu tinha para eles. E que era para eles se prepararem psicologicamente e tentarem manter a mente calma o máximo possível. – respondeu, mordendo o lábio inferior. – Eu não quero dar a notícia por telefone, mas só de pensar em encará-los eu... – ela balançou a cabeça e mostrou seu braço que se encontrava todo arrepiado para o marido. deu uma risadinha.
  - Eles são tão ruins assim? – ele perguntou, sentando-se ao lado dela na cama. Eles estavam no hotel em que havia inicialmente se hospedado e onde realizaram a reunião. Sairiam em algumas horas, então deixaram que subisse ao quarto dividido por e para fazer a ligação privada para seus pais.
  - Claro que não! Justamente porque eles são bons demais é que vai ser um choque tremendo. – ela suspirou. – Eles estão acostumados com a vida pacata de cidade pequena. Escândalos como esse não acontecem no mundo deles. – hesitou e depois fez uma careta com a boca. – No nosso mundo.
   permaneceu em silêncio encarando o chão e ouviram chamando-os do lado de fora. Levantaram-se. Havia outras coisas a serem resolvidas em Vegas, Bill já saíra da reunião atrás de algo importante. Depois de cuidar da mídia, das questões legais em relação à capela onde se casaram e outras coisas menores, partiriam para o aeroporto e pegariam o próximo vôo para Colorado. Tudo tinha que ser resolvido o mais rápido possível. Bill também já ligara para alguém e pegara a bagagem de que estava no hotel inicialmente reservado pelas meninas.
  - Posso fazer uma pergunta? – falou, antes de saírem do quarto. Ela queria muito perguntar sobre o que e tanto faziam para deixar a imagem da banda tão ruim. À primeira vista, parecera um pouco galanteador e assustador, e um garoto quieto e recluso, ela não conseguia imaginá-los fazendo coisas tão ruins a ponto de a imagem da banda estar tão corrompida. Mas quando a encarou, concordando para que ela fizesse a pergunta, ela não conseguiu formar as palavras certas e decidiu por uma pergunta idiota na última hora: – Por que você divide o quarto com o e não com o ? O parece ser o mais novo de vocês. – indagou. Depois, apressou-se a acrescentar: - É só uma curiosidade besta.
   soltou uma risada e deu às costas a ela, sem responder. Antes de passar pela porta, porém, disse por cima do ombro:
  - O ronca muito alto.
  , que estava esperando na porta os dois, fez um gesto obsceno, causando mais risos em . não perguntara o que queria, e fizera uma pergunta deveras estúpida e intrometida, mas ver rindo daquela forma pela primeira vez a deixou feliz por ter perguntado uma coisa boba e fora do contexto.
  De qualquer forma, tinha certeza que poderia fuçar a internet inteira atrás do passado de e e qualquer coisa desagradável que eles pudessem ter feito. Como ela sabia – e esse era um dos grandes amplificadores de seus temores – as notícias desagradáveis eram aquelas que mais duravam na memória das pessoas.

  

  

- Aquelas não são suas amigas? – perguntou, olhando por cima dos óculos escuros que usava. não entendia por que as pessoas usavam óculos escuros em lugares fechados, mas tinha que esconder parte do rosto e acabava ficando incrivelmente bonito dessa forma, então ela decidiu não discutir.
  - São. – confirmou, um pouco confusa. Por que Maddy e Loren estavam ali no aeroporto de Colorado Springs? Por sorte, só elas estavam lá, e não um bando de fãs loucas da . – Acho que vieram nos buscar, mas...
  Já era tarde da noite e e tinham acabado de chegar ao estado natal da garota. Desde que acordaram e se descobriram casados não pararam por um segundo, então as poucas horas de vôo que tiveram entre Las Vegas e Colorado Springs foram destinadas a uma boa soneca que ambos precisavam. Os dois foram sozinhos para o lugar, uma vez que Bill e os outros tinham que retornar à Inglaterra cumprir a agenda e começar a acalmar as coisas por lá. teria apenas um dia para contar e convencer seus pais de tudo.
  Sem contar, é claro, se demitir de seu novo emprego logo depois da tão esperada promoção.
  E então voar para a Inglaterra junto com seu novo marido, por onde passaria três meses, no mínimo. Bill disse que precisaria avaliar a situação conforme ela fosse avançando, então não poderia garantir os três meses com certeza. Mas prometeu a que fariam tudo o mais rápido possível.
  Essa segunda parte do plano era o que realmente assustava a garota. Era a parte que sua vida seria chutada como uma vaca chuta o balde. Tudo sairia voando e não daria para recolher o leite derramado. Precisaria trazer outro balde, precisaria enchê-lo com um leite totalmente diferente de novo.
  Mas o que ela estava fazendo, pensando em baldes e vacas em pleno aeroporto? Estava realmente na hora de dormir decentemente.
  - ! – Maddy correu até ela, embora seus olhos estivessem fixos em . A ruiva abraçou , apesar de terem se visto ainda naquele dia.
  - Como é que chegaram aqui tão rápido? – perguntou, um pouco confusa. Conversou com as amigas mais cedo e elas iriam voltar para o Colorado, mas vieram numa viagem de carro, então não tinha como elas terem chegado antes deles.
  - Ah, quanto a isso... – disse, e franziu as sobrancelhas, ainda mais confusa. O que tinha a ver com aquilo? – Bill entrou em contato com as duas para que assinassem um contrato de silêncio, e aproveitou para providenciar que elas voassem para casa. Assim podiam chegar antes de você e... hm... preparar o terreno. – ele deu ombros.
  - Contrato de silêncio?
  - É. – Maddy disse, olhando um pouco nervosa para . lembrou-se que Maddy gostava de , então aquilo tudo devia ser muito estranho. – Já que nós sabemos a verdade, que vocês não casaram porque queriam e tudo mais, eu e Loren tivemos que assinar um contrato que garante que não falaremos nada para ninguém. Se não tudo isso vai ir pro buraco. Não que nós pretendêssemos fazer isso de qualquer jeito, mas... burocracias. – ela deu ombros. – Vocês devem estar exaustos!
  - Estamos. – os dois disseram em uníssono e Madeline deu um de seus sorrisos sapecas.
  - Aliás, não me apresentei oficialmente. Sou Madeline, mas pode me chamar de Maddy. Loren vai se apresentar direitinho depois. – ela disse, estendendo a mão para , que apertou.
  - . – ele sorriu educado. soltou um longo bocejo que chamou a atenção de Madeline e a fez rir.
  - Ainda bem que viemos te buscar. Vamos, nós vamos dirigir e então vocês podem dormir tranquilos até chegarmos.
  - Obrigada, Maddy. – a caçula murmurou e seguiram Maddy até onde Loren estava. A morena cumprimentou-os e seguiram todos para o carro. já se sentia tonta de tanto cansaço, e parte dela desejava acordar e descobrir-se jogada num quarto de hotel junto com suas amigas, depois de uma noite de festa sem mais nada de especial em Vegas. Mas enquanto andava meio cambaleante de sono, esbarrou de leve em e sentiu-o ali: quente, real.
  Por mais que desejasse o contrário, aquilo não passaria da realidade, dura e fria como a aliança em sua mão.
  Ajeitaram as malas no porta-malas, apesar de serem bem poucas coisas. Apenas uma mala provisória de com uma troca de roupas e apetrechos eletrônicos, e a pequena mala de viagem que levara quando saíra de seu estado, há apenas alguns dias atrás. Loren acomodou-se ao volante: ainda teriam um tempo de estrada até a cidade das garotas e ela era a mais indicada para dirigir durante a noite. Maddy sentou-se ao lado dela, no banco passageiro, e imediatamente colocou fones de ouvido, o que estranhou. Maddy normalmente era a mais tagarela das três e costumava falar muito durante as viagens, não se isolar.
  De qualquer forma, lá estava ela sentada no banco traseiro ao lado de . Ele estava bastante próximo, porque o carro de Loren não era tão largo assim, mas sentia-se tão cansada que não se importou com a proximidade ali. Eles já haviam até mesmo dormido juntos depois de fazerem coisas, não era possível que desse para ficar ainda mais íntimo do que aquilo.
   subitamente lembrou-se de algo: se Maddy e Loren tinham voltado de avião, o que havia acontecido ao carro de Maddy, que foi utilizado por elas em sua viagem?
  Mesmo que essa dúvida tivesse lhe despertado uma sensação estranha, devido ao suave movimento da partida do carro e o ronco do motor, a recém-casada viu-se logo em um estado de torpor. Antes mesmo que o carro saísse do estacionamento, ela já havia adormecido.

  

  

sentiu-se sair lentamente da inconsciência do sono, sem saber direito o que a acordou. Seu corpo doía um pouco e ela não sabia bem onde estava. Quando abriu os olhos, sua visão demorou a acostumar-se e enxergou apenas borrões por um tempo, até que se localizou.
  Estava no banco de trás do carro de Loren e estavam entrando na garagem da casa dela. O que a acordara provavelmente fora o movimento interrompido do carro, para dar tempo de Loren abrir a porta automática da garagem.
   também descobriu-se meio torta, inclinada no banco, por isso seu corpo doía um pouco, desacostumado com a posição. Quando reparou exatamente em que posição estava, afastou a cabeça rapidamente do ombro de que, perdido em seus sonhos, deixou a própria pender inerte sobre o pescoço. Sentindo o rosto esquentar por ter acabado adormecendo naquela posição – e pior, tendo ficado confortável nela – torceu para que nenhuma das amigas a tivesse notado. Inútil, porque assim que seu olhar encontrou o olhar travesso de Maddy, sentada no banco da frente, sabia que não só a amiga sabia daquela cena como provavelmente já teria tirado mil fotos e adicionado corações e falas melosas em diversos aplicativos de edição de imagem. suspirou, cansada. Não tinha nada que pudesse fazer.
  - Acorde o Belo Adormecido aí, . Vamos descansar decentemente aqui em casa, e então amanhã podemos discutir tudo com calma e te levamos para a casa dos seus pais. – Loren disse, usando o tom materno que às vezes lhe dava na telha de usar, normalmente quando uma das mais novas fazia alguma burrada espetacular. O que era, certamente, o caso de . A burrada dela provavelmente levaria o prêmio do século se considerar o histórico das três. Ganhava até da vez que Maddy contou os dias no calendário de três anos antes e achou que a menstruação estava atrasada demais, o que significaria que ela estava grávida e sua vida estava arruinada.
  Até porque, bem, no caso de Maddy foi só um alarme falso, e no caso de sua vida estava mesmo arruinada.
   resmungou algumas coisas ao ser cutucado por , mas foi só quando Maddy bateu a porta da frente ao sai que ele sobressaltou-se e abriu os olhos. Pareceu um pouco perdido, olhando em volta.
  - Onde...? Quem... Ah! Ah... – ele pareceu lembrar-se de tudo – quando, onde, porque diabos - e desanimou-se um pouco também ao ver sua expressão triste. Os dois estavam numa baita encrenca.
  - Vamos. Loren vai nos emprestar um quarto então podemos descansar direito. – ela disse, saindo do carro. Sua vontade era perguntar se ele estava sonhando com algo bom, algo que quando ele acordou fez a realidade parecer uma incrível piada de mau gosto, mas não queria realmente saber a resposta para aquilo.
  - Certo. – ele respondeu com voz rouca de sono, o que parecia acentuar ainda mais o seu sotaque. Os dois saíram, pegaram as malas e entraram pela porta da cozinha que Loren havia deixado aberta depois que passara por ela.
  - Maddy vai ficar aqui também? – perguntou, entrando no cômodo e apertando os olhos por causa da iluminação forte. Na verdade a iluminação estava normal, ela que estava com os olhos corroídos de cansaço. Madeline, que sentava num banquinho de madeira alto e apoiava os cotovelos na bancada, segurava um suco em caixinha e bebia pelo canudo, parecendo extremamente confortável e infantil.
  - Com licença. – resmungou, também apertando os olhos e esfregando-os.
  - Fiquem à vontade. Bem, já fica à vontade aqui há anos. – Loren riu, passando pela cozinha com edredons na mão. – , me desculpe, mas você vai ficar no sofá. Ainda tenho um papel de amiga mais velha a cumprir aqui.
  - Loren, por que é que você está tentando preservar a pureza de ? – Maddy disse em um tom divertido. – Achei que ela já tivesse perdido esse tipo de coisa, pelo menos hoje cedo ela perdeu.
   pareceu embaraçado e fuzilou a amiga com o olhar.
  - Por que é que você tem que falar esse tipo de coisa quando eu estou cansada e com dor de cabeça e querendo dar um tiro em alguma coisa? – grunhiu, chegando perto da amiga e acertando-a com a mala pesada. Maddy soltou um “ouch” divertido e saiu de perto. – Você devia ir pra sua casa, Claire.
  - Podemos marcar um paintball em breve, pra você atirar em algumas coisas, que tal? – Maddy sugeriu, mas então um silêncio pairou na cozinha. “Em breve” seria sem data definida, já que depois de conversar com seus pais no dia seguinte, mudaria-se para a Inglaterra e ficaria longe da família e das duas melhores amigas pela primeira vez na vida, e sem previsão exata de volta. Madeline pareceu ter percebido o que falou, deixando uma situação incômoda, porque mordeu o lábio inferior e pareceu sem graça. permanecia em silêncio, observando tudo como se sua mente estivesse a milhares de quilômetros de distância, e soltou um suspiro cansado.
  Com um timing perfeito, Loren apareceu com seu sorriso maternal.
  - Hora de dormir, crianças. Vamos ter um dia longo amanhã. – e aproximou-se de para ajudar com a mala.
   seguiu-as pelo corredor e foi indicado o sofá que dormiria. Loren também falou que ele estava livre para usar o banheiro se precisasse tomar um banho ou qualquer coisa, o que ele agradeceu. Loren guiou para o quarto em que as três sempre dormiam juntas quando havia festa de pijama, mas a garota antes de sair dali lançou um último olhar para o marido, que discretamente observava as fotografias expostas próximas do sofá que ele dormiria.
  Depois de ajeitar as malas, tomar uma ducha bem rápida para tirar o cansaço do corpo e colocar pijamas confortáveis, as três amigas encontravam-se sentadas na cama. Havia muito o que conversar, mas não queria conversar. Queria dormir. As duas pareceram entender isso, porque logo se arrumaram e estavam prontas.
  - Ah. Vou pegar uma água. Alguém quer? – perguntou, tendo na verdade outros motivos para voltar para a sala. As duas negaram, mas Madeline deu um risinho provocativo que foi ignorado pela caçula enquanto saía do quarto, desembaraçando a barra da camisola branca que vestia.
  Os corredores estavam escuros, mas isso não era problema para a garota que muitas vezes passara por ali antes. Loren era a única das três que morava sozinha, porque perdera os dois pais muitos anos antes, então ficara com a casa para ela. Mesmo antes disso acontecer, as três frequentemente dividiam o quarto e dormiam juntas, porque a mãe de Loren, também cor de cappuccino e tão adorável quanto a filha, cozinhava bolos maravilhosos e mimava as duas meninas como próprias filhas. Aquela casa era casa de também.
  Chegou facilmente na sala e estava tudo silencioso. Não sabia se ia diretamente para a cozinha ou se alcançava para conversar com ele. Por algum motivo, queria garantir que ele estivesse bem. Ele estava totalmente fora de seu lugar-comum e estava para enfrentar a parte difícil da situação primeiro. Ela lidaria com a fama e o resto durante os três meses que passaria na Inglaterra, o que se fosse considerar talvez acabasse sendo pior. Mas ele teria que conhecer os pais de uma garota que nem mesmo amava, passaria por toda a situação e fingimento sem nem preparar-se direito. Embora quando acordara tivesse dito coisas egoístas, agora abria seu coração de forma altruísta e queria, da mesma forma que se preocupara com ela na hora de decidirem o que fazer, preocupar-se com ele.
  - ? – ouviu sua voz e saiu de seu transe, percebendo que já devia estar parada ali de pé havia uns bons minutos.
  - Oi.
  - Por Deus! Achei que era um fantasma. – ele resmungou em um tom engraçado e ela pôde ouvir ele se revirar nas cobertas. Aquilo a fez sorrir. – Por que está parada aí há tanto tempo? Nem parecia que estava respirando.
  - Desculpe. – ela riu baixo e aproximou-se um pouco. – Queria saber se você está confortável.
  Estava bem escuro então ela não o enxergava com clareza, mas sabia onde era o sofá e os limites dele, então contornou-o até ficar onde achava que estava próxima dele. permaneceu um tempo em silêncio, mas depois suspirou.
  - Está tudo bem, obrigado por se preocupar. – respondeu. ainda estava de pé, gostaria de se sentar, mas não tinha mais o que falar apesar de tudo que passara em sua mente minutos antes. Ia dizer boa noite quando falou novamente: - Como eu tenho que agir amanhã?
  - O que você quer dizer? – ela perguntou, confusa com a pergunta. Mais uma vez pôde ouvir o farfalhar das cobertas, indicando que ele se movia, e agora que seus olhos se acostumaram um pouco com o ambiente pôde enxergar onde a cabeça de estava. Agradeceu-se mentalmente por não estar de costas para ele.
  - Bem. Temos que convencer seus pais, mas você conhece eles e eu não. Não sei como agir. É a primeira vez que vou encontrar pais de uma garota.
  - Essa situação está cheia de primeiras vezes, não é? – ela soltou um risinho, apesar de não achar engraçado. – Não sei como você pode agir. Seja você mesmo, sabe. Também não tenho ideia do que fazer.
  - Tenho medo que eles acabem ficando com raiva de você por minha culpa. – disse, o que a surpreendeu. Ainda bem que estava escuro e ele não pôde enxergar sua expressão. Ele continuou: - Eu já estou arruinando um monte de coisa na sua vida. Não quero agir de um jeito que os faça decidir que você é uma garota ruim e não lhe deixem voltar pra casa. Não posso tirar seu lar também.
   ficou em silêncio, absorvendo aquilo. No fim, parecia que estava tendo pensamentos tão altruístas quanto ela mais cedo. Por algum motivo seu coração ficou mais leve com aquilo. Sorriu para si.
  - Acho que se você mantiver essa atitude, não vai haver problemas. Vai dar tudo certo de alguma forma. – ela tentou manter-se positiva, apesar de que desde a hora que acordara a única coisa que dera certo era ser rico o suficiente para pagar aquele hotel. sentiu vontade de tocá-lo e passar essa atitude positiva, mas sabia que não podia. No dia seguinte teriam que se esforçar para parecerem um casal, mas não queria dizer que no backstage seriam um também.
  - Ok. Vou dar meu melhor. – ela pôde ouvir o sorriso na voz dele. – Você deveria descansar. Não deve ter dormido muito bem no carro. – comentou e a garota sentiu o rosto esquentar. Não ia dizer que na verdade estava até bem confortável.
  - Tudo bem. Boa noite, . – acenou com as mãos, meio sem saber o que fazer – não poderia se inclinar e dar um beijo de boa noite nele, certo? – e começou a se afastar. Estava quase na porta quando mais uma vez ouviu seu nome dito por ele, naquele sotaque que estava começando a adorar.
  - ? – ela parou e virou-se.
  - Sim?
  - Quando nos apresentamos, você disse que era , mas que eu podia te chamar como quisesse. – ele relembrou. Ela concordou, mas lembrou-se que estava escuro e ele não podia ver, então fez um som que indicava a ele que continuasse. – Eu ouvi suas amigas dizendo mais cedo... Tudo bem se eu te chamar de ?
   surpreendeu-se com aquilo. Só suas amigas e seus pais lhe chamavam de , e ela gostava porque sentia-se – era bem infantil, é verdade – como sua princesa favorita da Disney. Seu apelido, dito no sotaque britânico de , parecia ainda mais chique e monárquico daquele jeito.
  - Sim, tudo bem, . – ela disse, tentando não soar feliz demais. – Talvez seja bom para convencer melhor as pessoas, né? – acrescentou, para não assumir que queria que ele a chamasse daquele jeito por causa das cosquinhas que surgiam em sua barriga quando ouvia.
  - Sim, é o que pensei. Boa noite então, . Até amanhã. – despediu-se e ela ouviu-o se mexer pela última vez antes de se retirar da sala, um sorriso bobo brincando em seus lábios, que ela tratou de esconder antes de voltar no quarto e encontrar Madeline e seu radar para criar situações ainda mais embaraçosas.

Quinto Capítulo

  

revirou-se na cama. Que cama deliciosa. Era quase a melhor cama da vida dela. Os travesseiros estavam macios e ela passava o braço por baixo de um deles, encaixando-se bem. Os lençóis a aqueciam bem, assim como os edredons largos. A sensação de relaxamento de uma noite descansada espalhava-se lentamente pelo seu corpo. Sem nenhuma preocupação no mundo, ela poderia ficar daquele jeito para sempre. Experimentou virar-se para o lado, mas ao menor movimento ela atingiu alguém que soltou um resmungo, fazendo-a abrir os olhos imediatamente.
  Olhou ao redor e percebeu que dormira entre Maddy e Loren e que, se mexendo na cama, acabara dando uma joelhada em Maddy. A cama do quarto de Loren era gigante e assim as três dormiam todas esparramadas, querendo seu próprio espaço e conforto. Sorriu, satisfeita, apreciando aquele momento com suas amigas, como se realmente não houvesse nenhuma preocupação no mundo.
  Até se lembrar de dormindo na sala e de tudo que teriam que fazer naquele dia. Sentiu seu estômago revirar de nervoso.
  Estava em casa. Estava em sua pequena Westcliffe, no Colorado. Sua pequena cidade. Ela sempre mencionara pra que era de uma cidade pequena, mas ela tinha certeza que ele não tinha ideia da situação real. No dia anterior, em meio a todos os problemas e à correria – ela ainda nem entendia como Maddy e Loren tinham entrado em um avião, voado por 4h e chegado antes dela de volta ali – esquecera de mencionar alguns detalhes falhos do plano. Já viera refletindo sobre isso anteriormente, sobre o fato de que seus pais não seriam convencidos tão facilmente.
  Afinal, numa cidade de menos de 500 habitantes, todo mundo sabe o que acontece com todo mundo.
  E isso incluiria . Todos saberiam se ela tivesse saído com um cara depois do horário de trabalho. Ou antes. Ou encontrado com algum britânico bonitão em segredo durante anos, como seria a história que teriam que sustentar. A cidade pequena era lotada de olhos nas janelas e ouvidos nas paredes, e não havia lugar nela que pudesse ter um encontro às escondidas sem que no mínimo alguém reparasse. Não haveria como convencer seus pais daquilo.
  E o pior de tudo é que não era uma cidade afastada do mundo em que ela pudesse se safar dos boatos. Ela ficava apenas há uma hora e pouco de viagem de Colorado Springs, que era um ponto turístico conhecido do estado. E todo mundo tinha TV e celular. É o século XXI, por Deus. Todo mundo já deveria ter visto a notícia.
  Sentiu-se tola de repente. Devia ter dito tudo isso a . Devia ter explicado para Bill durante a reunião o quanto fazer aquele relacionamento parecer bonito ia ser difícil para uma cidade tão pequena quanto Westcliffe. Não ter falado nada ia trazer ainda mais problemas. Ela tinha que buscar uma solução. Mas não podia fazer isso sozinha.
  A de três dias atrás, ao se deparar com um problema, primeiramente iria acordar suas duas melhores amigas e discutir o assunto com elas até que achassem uma solução. Mas a de agora não podia fazer isso. Não como primeira opção. Porque por mais que as amigas tivessem boas ideias, nada daquilo dizia respeito a elas. Então desenrolou-se dos lençois e saiu o mais silenciosamente que pôde do meio das amigas, descendo da cama e saindo do quarto.
   dormia calmamente, o edredom que Loren trouxera na noite anterior cobria-o até suas orelhas. O cabelo estava um pouco bagunçado, mas não pôde deixar de admirá-lo um pouco, tão calmo, daquele jeito. Ele era mesmo bonito. Pelo menos com isso dera sorte. Sorriu sozinha e foi primeiro para a cozinha, esquentar uma água. Queria conversar com ele, mas estava morrendo de medo. Quanto mais pudesse adiar o assunto, melhor seria.
  Encarou o relógio colorido da cozinha, que indicava que eram apenas dez horas da manhã. Não entendia como podia ter dormido tão pouco, estando tão exausta como estava no dia anterior. Talvez ela tivesse dormido por um dia inteiro? Aquilo era provável. Quase como em resposta a esse pensamento, soltou um bocejo longo. Olhou pela janela, onde a vida na pequena cidade já tinha começado.
  - Bom dia. – ouviu atrás dela e deu um pulo de surpresa, encarando que esfregava os olhos, parecendo ainda sonolento. O sotaque dele realmente ficava mais acentuado em sua voz quando ele acordava. Ela corou ligeiramente.
  - Bom dia. Acordou cedo. – ela comentou, percebendo que a água havia fervido e agradecendo que poderia se distrair preparando um café. A carinha amassada de estava deixando-a desconcertada.
  - Eu percebi você acordar e depois que confirmar que era você, decidi levantar. – ele comentou, bocejando e tomando a liberdade de sentar-se em um banco da cozinha. sentiu o rosto esquentar ainda mais. Então ele percebeu que ela o observara por um tempo? Aquilo era extremamente embaraçoso.
  - Achei que ia dormir mais. – ela murmurou. Ele deu um sorriso de lado.
  - Você também. Afinal, foi um dia bem louco ontem.
  - Sim. – “E hoje vai ser pior ainda”, pensou consigo mesma, fechando os olhos em aflição. – eu...
  - Parece uma cidade bonita. – de repente ele estava de pé ao seu lado e encarava a mesma janela pela qual ela estivera observando mais cedo. – Como é o nome mesmo? Acho que você não mencionou muito sobre ela.
  - É, sobre isso... – ela mordeu o lábio inferior enquanto ele a encarava, percebendo que havia algo de errado. – Acho que temos um problema.
  E contou rapidamente a eles os dados básicos sobre a cidade. Como era uma cidade bem pequena, realmente não tinha como apressar mais as coisas. a encarava chocado.
  - 500 habitantes? – ele repetia, incrédulo. – Isso é menos do que o público do primeiro show que eu fiz com a !
   havia recostado na bancada da pia, completamente em choque. Ela lhe entregou a caneca com o café para ver se adiantava alguma coisa, mas ele não conseguia esboçar nenhuma reação além de olhá-la.
  - Eu sei. Eu sei. E sei que devia ter falado antes também. Desculpe. – levou as duas mãos juntas à altura da boca, numa oração silenciosa para que ele a perdoasse. O rapaz soltou a respiração lentamente e piscando atordoado algumas vezes, levou a caneca à boca. Seus olhos se estreitaram depois que ele tomou um gole e ele afastou a porcelana da boca, um pouco surpreso.
  - O que foi? – ela perguntou, receosa. Só faltava ele agora desconfiar que ela estava drogando ele ali também. Já não bastava toda aquela suspeita de ela tê-lo drogado em Vegas para se casarem.
  - Está bom. É do jeito que eu gosto. – ele comentou. Depois, pareceu um pouco envergonhado pelo que disse e apressou-se em tomar um gole. Um certo alívio perpassou pelo corpo de , mas eles não estavam em condições de se sentirem aliviados. Depois de mais alguns segundos, disse: - Não se preocupe. Vamos dar um jeito nisso também.
  - Dar um jeito no... quê? – uma Maddy selvagem de cabelos laranja bagunçados e quase de pé surgiu na cozinha, soltando um longo bocejo entre suas palavras. A caçula ficou um pouco tensa que Maddy fosse fazer alguma piada sobre os dois sozinhos ali na cozinha, mas ao ouvir que tinham que dar um jeito em algo, a ruiva imediatamente parava de brincar e prestava atenção na conversa.
  - No fato de que vai ser impossível enganar papai e mamãe e a cidade inteira com esse papo de que eu e nos conhecermos a tempos e sairmos escondidos. – explicou. Maddy aceitou a caneca de ursinho – sua preferida na casa - oferecida pela garota e tomou um gole, olhando-os com seus olhos astutos.
  - Como assim impossível? Eu já pensei em tudo. – ela lançou um sorriso maroto para o casal, que a olhou incrédulo. – Você sabe que pode contar comigo, .
  - O... o que? Mas... como assim? – pareceu completamente surpresa com a revelação da amiga. parecia duas vezes surpreso, por Madeline já ter pensado em algo e por sua esposa nem saber disso.
  - Oras. É fácil. Você lembra aquela vez, há uns anos atrás, que briguei e briguei com meus pais que quis ir num show lá em Nova Iorque? E fiz a loucura de ir sozinha, sem nem avisar você e Loren para não meter vocês na encrenca?
  - Lembro. – essa era outra burrada histórica que ficava no ranking das três. Antes de se casar, normalmente Madeline dominava esse tipo de coisa.
  - Então. Era o primeiro show da aqui nos Estados Unidos. – ela continuou com aquele seu sorriso meio misterioso, como se fosse uma esfinge com seus enigmas. – Eu comentei com você o nome da banda, mas você sempre foi desligada para esse tipo de coisa então imaginei que não se lembraria.
   estava estática. É verdade que era bem isso, ela nunca se interessara muito por bandas e nomes de grupos, enquanto Maddy estava sempre fuçando a internet em busca de novas músicas e novos estilos. Ela já sabia que a amiga gostava de , mas nunca relacionaria aquele show do passado com a banda.
  - É sério?
  - Sim. Então, tudo fica bem mais fácil. Podemos inventar – e agora ela apontou para . – que nos encontramos depois, ou antes, do show, de alguma forma. E então conversamos e você se interessou pela minha amiga, viu uma foto, sei lá. E ai você ligou para ela, vocês conversaram, se encontraram em segredo alguma vez já que seria ruim para sua imagem se fosse pego na gandaia com uma garota – ela deu um risinho da sua escolha de termos. – e depois continuaram a se encontrar escondido, como a história inicial sugere. – voltou-se então para . - As noites que você vinha passar na minha casa ou na casa de Loren podem ser um ótimo álibi, nós vamos fingir por você e ninguém mais vai contestar. Nós fazemos tanto isso que ninguém vai especificar por datas ou duvidar. – finalizou.
  Loren entrava nesse momento na cozinha, um pouco mais arrumada – ela tinha lá seu lado vaidoso – e sorriu em acordo com Maddy, o que fez perceber que as duas tinham pensado tudo aquilo anteriormente para protegê-la. Não conseguiu nem reagir conscientemente, mas quando se jogou nos braços de Loren para depois ser envolvida por Maddy, percebeu que estava com lágrimas nos olhos.
  - Obrigada! Obrigada! Vocês são as melhores! – ela falou, com voz abafada. Tudo sempre ficava mais fácil quando tinha aquelas duas perto de si. Elas riram, mandando-a parar de ser um bebê chorão, e ouviram a voz de no meio daquele momento.
  - Obrigado... de verdade... – ele parecia bem mais aliviado e arriscou um sorriso para as garotas.
  - Agora, me dê mais café ! – Madeline empurrou a caneca na cara da amiga, que rindo e secando o rosto concordou. Faria qualquer coisa por aquelas duas agora.
  - Eu também quero! Caneca de girafa, por favor. – Loren levantou o braço, enquanto ia até a despensa e buscava umas bolachas e torradas. – Maddy, pegue as coisas na geladeira, por favor.
  - Peça para ! Eu sou a salvadora da pátria, tenho direito a um dia de rainha. – ela disse, olhando as unhas com interesse fingido até ser acertada por um pano de prato.
  - Você ajudou muito mesmo, mas não custa nada esticar a porcaria do seu braço branquelo e abrir a droga da geladeira, não é? – Loren respondeu, ríspida, fazendo rir enquanto lhe entregava a caneca.
  , que observava a relação das três com um sorriso de canto, decidiu perguntar se havia algo que ele poderia fazer.
  - Não se preocupe. – Loren sorriu amavelmente. – Sente-se e coma um bom café da manhã, vocês dois vão precisar de bastante energia. Bolamos uma boa história, mas não quer dizer que os pais de serão convencidos tão facilmente. – ela disse.
  - É. Afinal, duvido eles deixarem a filha única deles ir pra Inglaterra tão subitamente assim. – Maddy disse, enquanto mastigava um pão de boca aberta. Loren lhe lançou um olhar de reprovação, como uma mãe, que a outra ignorou com um dar de ombros.
  - Vamos dar um jeito. – respondeu, sorrindo. Agora estava bem mais confiante do que quando acordara. Sorriu encorajadoramente para , que já se sentara e aceitava a pasta de amendoim que Loren lhe oferecia para passar na torrada.
  - Aliás, . – Madeline começou a dizer, com um risinho suspeito. percebeu que sua amiga estava de volta ao modo “causar confusão” e preparou-se psicologicamente. – Percebi que está usando a caneca de foca. – ela disse, soando acusadora e ao mesmo tempo divertida. corou, nem percebendo que havia feito aquilo.
  - Ah, então é uma foca. – ele pareceu surpreender-se, observando a caneca com mais atenção. – Eu estava mesmo imaginando que bicho que era.
  - É que é engraçado, sabe. Como você pode ver, temos nossas canecas favoritas. – Loren disse, mostrando a sua de girafa orgulhosamente. sabia onde as duas iam chegar, mas para Loren ter se juntado à brincadeira de Maddy, ela sabia que estava arruinada. – E a de foca é a favorita da . – ela soltou um risinho, ao passo que Madeline soltava uma gargalhada, provavelmente da cara vermelha da caçula.
  - Ela não divide essa caneca com ninguém. - a ruiva disse, aquele sorriso de volta no rosto. encarava as três, parecendo divertido e curioso.
  - Foi sem querer. Eu nem reparei que caneca era, devo ter pego inconscientemente e quando apareceu eu o servi primeiro sem nem perceber que era a caneca de foca. – ela apressou-se em explicar-se, mas não ia adiantar.
  - Então por que não pediu ela de volta?
  - Porque isso seria muito rude! Por Deus, é só uma caneca. – ela disse, enfiando a cara na caneca que depois havia escolhido para si (de corações, sem graça) e tomando alguns goles enquanto ouvia as duas rirem.
  - Acho que vocês podem estar começando a se comportar como um casal. – Maddy disse alegremente, esticando as pernas e balançando os pés. quase engasgou com o comentário e ficou com um sorriso amarelo no rosto.
  - Fique quieta. – murmurou. – É melhor assim, não? Assim parece mais verídico, e é o que precisamos. – ela respirou fundo, evitando encontrar seu olhar com o de .
  - De qualquer forma, vocês precisam praticar isso melhor se quiserem convencer as pessoas. É claro que vocês se conheceram há um dia, mas vocês têm que enganar as pessoas sobre o seu relacionamento. – Loren disse. – Podemos ver que vocês se dão bem, só que não é muito convincente. Tipo, parece que vocês estão tentando deixar o outro confortável, mas meio forçadamente. Dá pra entender?
  - Um pouco. – disse e finalmente o olhou. – Acho que nenhum dos dois quer causar mais nenhum problema, então estamos sendo cuidadosos. Talvez cuidadosos até demais?
  - Sim. Por exemplo, vocês estão tomando café juntos, mas está encostada na bancada como uma gata arredia e você está aqui sentado, bem mais à vontade na casa do que ela que praticamente viveu aqui. Você aí, senta do lado dele. – Madeline ordenou, e a caçula não teve vontade de retrucar, aproximando-se em passos curtos de e sentando-se ao lado dele. – Junta mais as cadeiras. – ela apontou. sentiu o rosto esquentar, mas depois de depositar a caneca na mesa, aproximou-se um pouco mais de e seus cotovelos se tocaram.
  - , você está um pimentão. – Loren comentou, desolada.
  - Mas... Mas...! – ela não podia evitar! era extremamente bonito e popular, e ela nunca ficara tão próxima de um homem assim antes. Claro, tivera seus momentos com uns adolescentes bobos de Westcliffe, mas foram só uns beijos e nenhum problema envolvido, era só diversão. As coisas eram bem diferentes agora.
  - , vocês já até transaram. Não tem porque ficar com vergonha de sentar ao lado dele. – Madeline foi direta e a caçula abriu a boca, indignada. Percebeu se mover um pouco desconfortável com o comentário ácido da ruiva, mas ele não disse nada.
  - Não... não... não fala... – jogou a cabeça para frente e encostou a testa na bancada fria.
  - Parece que você está prestes a explodir. – comentou, um pouco de graça na voz.
  - É que... – ela não conseguia nem formular uma frase. Ela estava com muita vergonha daquela situação, mas sabia que não podia continuar assim na frente de seus pais.
  - Bom. – Maddy disse, em tom de consolo. – Pelo menos seus pais sabem que você é extremamente tímida, então se você agir assim na frente deles vai ser compreensível.
  - Então por que tocaram no assunto? – ela perguntou, levantando o rosto e encarando a amiga.
  - Porque vocês vão precisar disso. Desse conselho. Vocês vão ter que se acostumar a ficar confortáveis na presença um do outro se quiserem que essa história toda dê certo. – Loren completou. – Mas confortáveis sem forçar isso no outro.
  - Então, pra começar, arrumem a cozinha, pombinhos! – Madeline pulou do banco e acenou. – Eu e Loren vamos nos arrumar primeiro, e depois vocês se trocam e nós vamos para a guerra.
  - Boa sorte. – Loren sorriu, também um pouco travessa, saindo da cozinha e deixando os dois a sós. suspirou, sentindo-se derrotada e exausta logo nas primeiras horas do dia.
  - Eu honestamente não sei se elas são boas ou péssimas amigas. – ela murmurou para si mesma. deu um sorriso, levantando-se do banco.
  - Elas parecem ótimas amigas para mim. Você tem muita sorte. – ele comentou, juntando os pratos. Ela percebeu o que ele fazia e pulou do banco, colocando os braços na frente dele.
  - Eu faço isso! – apressou-se em dizer, continuando o que ele fazia. Ele soltou um risinho.
  - , é para nós fazermos isso juntos. Não precisa me ver como um convidado.
  - Mas...
  - Você realmente não consegue entrar nem um pouco na atuação? – ele perguntou, arqueando as sobrancelhas. não gostou muito do leve tom acusador da voz dele e encolheu-se um pouco como se se desculpasse. Levou os pratos que tinha juntado em silêncio até a pia e ligou a água. Percebeu que a seguira. – Escuta. – ele desligou a água e a fez virar-se para ele.
  - O que? – sua voz tremeu um pouco e ela mordeu a língua por ter deixado esse deslize acontecer. estava bem próximo, seu corpo quase colado ao dela, e os braços apoiando-se na pia para que seu rosto pudesse ficar um pouco da altura do de . Os olhos dele a analisavam com calma.
  - Você está tão preocupada assim? – ele sussurrou, parecendo um pouco surpreso. Com o rosto virado, quente de vergonha, ela fez um aceno com a cabeça. – Por que a gente simplesmente não finge que é um relacionamento? – ele disse e ela virou seu rosto para encará-lo.
  - Como assim?
  - Acho que facilitaria tudo. – ele disse, depois pigarreou. – Sabe, se a gente começar a enxergar isso como um relacionamento.
  - Mas não é. Foi um acidente. – ela o lembrou e ele rolou os olhos.
  - Eu sei que foi. Mas se você não consegue lidar com isso sendo uma farsa, então finja que é verdade! – seu rosto estava bem mais próximo. – Você é uma garota bonita e eu não sou um cara de se jogar fora. – “bem modesto”, foi o que pensou. – Então podemos estar num relacionamento e você pode agir comigo como agiria com qualquer namorado. Sei que nos conhecemos há só um dia, mas pode ter qualquer liberdade comigo. É assim que seremos convincentes.
  - C-certo. – ela ainda estava atordoada, principalmente depois de ter sido chamada de “bonita” por ele. – Vou me esforçar.
  - Ok. – ele soltou o ar lentamente, mas não se afastou. Ele estava mesmo muito próximo dela. Ela poderia contar seus cílios se quisesse. Percebeu até que ele tinha algumas manchas suaves no rosto, como sardas bem dispersas. Os olhos dela estavam inquietos, passando pelo rosto dele e evitando a todo custo encarar os lábios avermelhados dele. Por que é que eles tinham que estar tão próximos? – Então, vou fazer isso com você consciente para que você se sinta mais confortável.
  “Fazer o quê?” ela pensou.
  Antes que pudesse perguntar, os lábios avermelhados que ela estivera evitando encarar esse tempo todo avançaram sobre o limite de sua visão e colaram-se suavemente aos seus, fazendo-a arregalar os olhos. Ela conseguia enxergar parte do rosto de , que mantinha seus olhos fechados, sua orelha, seu cabelo que parecia tão macio... acabou por fechar os olhos também e quando percebeu aquele beijo já não era mais um tocar de lábios, mas um movimento suave da boca dos dois que a arrepiava da cabeça aos pés. E dessa vez não pôde deixar de agradecer aos céus por estar consciente e lembrar-se daquilo com detalhes.
  Porém não durou tanto quanto ela previa (ou queria) e quando afastou seu rosto, encarava-a com um sorriso doce. Ela já mal conseguia respirar.
  - Tudo bem? – ele sussurrou e ela tentou concordar com a cabeça, ainda um pouco tonta com aquela situação. soltou um risinho, mas antes que pudesse falar alguma coisa, ouviram um gritinho de Madeline e imediatamente se afastaram. Encontraram-na rindo, atrás do batente da porta como se estivesse se escondendo e tentando espiar ao mesmo tempo.
  - Eu falei para ficarem mais confortáveis mas não sabia que a coisa seria rápida a esse ponto. Graças a Deus eu cheguei antes que vocês decidissem procriar. – ela comentou em um tom malicioso e alegre. – E vocês nem arrumaram a cozinha. E ainda está um pimentão. – a cada comentário da amiga, tinha o desejo cada vez maior de pegar uma pá e cavar um buraco tão fundo que a levaria até a China para se esconder de vergonha. parecia um pouco sem graça, mas lidou bem com a situação. Pelo menos, bem melhor que .
  O assunto poderia ter continuado, mas Loren entrou no cômodo, segurando um celular que a recém-casada logo reconheceu como seu.
  - Sei que o momento está ótimo e que você gostaria de fugir disso o quanto possível, , - ela disse, suavemente. – mas sua mãe acabou de ligar e está louca atrás de você. Acho melhor irmos.

Sexto Capítulo

  

Apesar de ser um dia relativamente quente na pequena cidade de Westcliffe, tremia. Ela queria que não estivesse tremendo, nem que suas mãos estivessem suando. Principalmente porque estava de mãos dadas com , parada em frente ao portão de sua casa, então seu nervosismo estava pra lá de óbvio. Apesar de ter sido menos de duas semanas que saíra de casa para sua viagem de comemoração à promoção no emprego, parecia que alguns séculos haviam se passado. Sentia que se pisasse dentro daquela casa que vivera a vida inteira, seus próprios pais não a reconheceriam.
  O nervosismo era, obviamente, tudo culpa daquela maldita aliança que parecia pesar dez quilos em seu dedo anelar esquerdo e do homem que enlaçava seus dedos compridos aos dela. Desde que deixaram a cozinha de Loren e apressadamente se arrumaram para ir até a casa dos pais de , a situação parecia que tinha piorado entre os dois. sabia que ele a tinha beijado pra que ela se sentisse mais confortável e eles conseguissem agir melhor um com o outro. Sabia mesmo? Parte dela sentia um medo profundo de que ele só estivesse fazendo aquilo para que ela se apaixonasse por ele. É claro que se ela estivesse apaixonada por ele, as coisas iriam fluir bem melhor entre eles, mas ele estava acostumado a ter milhares de garotas aos seus pés e seria tão fácil descartar-se dela depois. Até porque estava nos planos que ela fosse descartada. Por isso, não tinha certeza se gostaria de se apaixonar por e preferiria oferecer alguma resistência ao fato.
  Porém, querendo ou não, gostando ou não, era isso que teria que fingir para as pessoas que a criaram a vida inteira. Respirou fundo e expirou lentamente.
  - Tudo bem? – ouviu a voz de e voltou seu rosto para ele, imediatamente corando. Por quê? Por que ele tinha que beijá-la? Certo, ela estava pensando nos lábios dele e tudo mais na hora, mas não esperava que ele realmente fosse fazer aquilo. Seria muito difícil não se apaixonar por ele se ele continuasse fazendo coisas como aquela inesperadamente.
  - S-sim. – ela odiou-se por ter gaguejado. Respirou fundo mais uma vez e tentou de novo. – Sim. Acho que podemos ir.
  - Certo. Vou dar meu melhor. – ele lhe lançou o sorriso gentil e ela concordou várias vezes com a cabeça. Soltou sua mão da dele, porque o portão era pequeno e apenas uma pessoa por vez passava por ele, então ela foi na frente.
  Assim que o portão rangeu o seu costumeiro rangido, a porta escancarou-se, assustando o casal. Uma mulher típica do interior estadunidense saiu por ela, imediatamente pulando na direção de e abraçando-a.
  - ! Oh, minha pequena ! Eu estava tão preocupada! Como você pode fazer uma ligação daquelas e então demorar tudo isso para aparecer! – Amelie choramingava nos ombros da filha. – Eu sabia que aquela viagem seria uma loucura, mas já que Maddy e Lory estavam indo, é claro que eu não podia negar... Oh, que péssima mãe que eu sou! E só de imaginar todas as coisas horríveis pelas quais você deve ter passado! Oh, minha pequena ! – o escândalo provavelmente continuaria por algumas horas, se não tivesse afastado a mãe, um pouco rudemente. Sentia vergonha por sua mãe estar agindo daquele jeito na frente de , mas era impossível evitar. Amelie sempre fora extremamente protetora com sua pequena dos olhos de mel, sua única filha.
  - Mãe, menos, por favor. Eu estou inteira. Estou bem. Nada daquela lista de trezentos e setenta e sete itens que você enumerou antes da viagem aconteceu. – o que, ironicamente, era verdade. Amelie , em suas mil e uma recomendações de cuidado e juízo à filha, nunca nem pensou na possibilidade de ela acabar bêbada e casada em Las Vegas. Ela advertiu sobre as bebidas, porém. Não que fizesse a situação melhor. – O que eu tenho pra te contar é totalmente diferente.
  - Ah, é? – a Sra. sorriu brandamente, sem nem precisar limpar suas lágrimas de crocodilo, e acariciou uma mecha do cabelo da filha. – Eu sabia que as duas iam cuidar bem de você. Elas são sempre tão adoráveis e confiáveis, que bom que foi uma viagem ótima, estou louca para ouvir tudo o que vocês fizeram. Eu senti tanta saudade. Foi tudo bem ent... – finalmente o falatório interrompeu-se. percebeu por quê. Amelie, por incrível que pareça, demorara todo esse tempo para perceber , parado há alguns passos da garota. Seu rosto demonstrava que estava um pouco surpreso e talvez um pouco desconfortável, mas ele continuava parecendo asseado e educado. – Ora. O senhor precisa de alguma coisa? Desculpe, minha filha acabou de voltar de viagem e estou tão empolgada que acabei nem o notando. O que precisa, filho? Que eu assine alguma coisa para a igreja?
  Era isso. Sua mãe nem pensava na possibilidade que aquele fosse o marido de . Era por isso que ia ser tão difícil convencê-la. se vestira de forma tão educada (uma blusa social branca com as mangas dobradas no cotovelo e jeans azul-escuro lisos) que ainda fora confundido com um mensageiro da igreja. Um rockstar, confundido com um mensageiro da igreja. Eram essas as coisas incríveis que Amelie conseguia dizer. perguntou-se mentalmente o que sua mãe diria da tatuagem das costas de – a única que ela tinha percebido até agora e que não pudera ver em detalhes.
   parecia tão chocado quanto sua esposa pelo jeito que a Sra. o tratara. Ela pareceu perceber que havia algo errado, porque seu sorriso educado congelou no rosto, esperando que ele se apresentasse como o que ela sugerira.
  - Mãe. – começou, pacientemente. A guerra começava. – Eu te disse que tinha uma coisa importante para falar. – a mãe concordou com a cabeça, decidindo que não era importante e voltando sua atenção para a filha. Antes que pudesse voltar a tagarelar, a garota continuou: - É sobre mim. E sobre ele também. – apontou para trás. Os olhos azuis de Amelie voltaram a focar no garoto alto, avaliando-o uma segunda vez. respirou fundo. – Esse é . Meu marido.

  

  

- Você está louca, querida. – Amelie dizia, com um olhar preocupado estampado por todo seu rosto. Eles estavam sentados na sala de estar, acomodados confortavelmente no sofá laranja embaixo da janela que dava para a rua. Essa janela possuía cortinas brancas que tornavam a sala um pouco mais privativa, o que era importante em uma cidade pequena como Westcliffe. Os boatos corriam mais rápido que Usain Bolt naquelas ruas pavimentadas.
  Depois de dar a notícia no meio do caminho entre o portão e a entrada, achou que, como imaginava, sua mãe teria um ataque de pânico. A mulher ficou em silêncio, parecendo chocada (compreensível) e depois silenciosamente (surpreendente) voltou para dentro de casa. sabia que não teria escolha a não ser segui-la e, fazendo um sinal cansado para , foi o que fez. O rapaz permanecera em silêncio, escolhendo aquela opção como a mais segura, então apenas entrou na pequena casa de sua esposa.
  A sala de entrada era bem pequena, com uma mesinha cabeceira e sapatos amontoados. Próximo à porta havia um quadro para pendurar chaves e, do outro lado, um para pendurar casacos que estava vazio devido ao calor da temporada (ainda era Setembro, bastante quente no Colorado de ser Outono). Era tudo bem arrumado e decorado no estilo simples americano. Viraram na porta à esquerda, que era a sala. Dois sofás, um tapete listrado e bem limpo, uma poltrona e uma lareira. Pela lareira havia porta-retratos espalhados retratando diversas Annabelles que nem tinha ideia que existiam. Não pôde analisar muito porque a Sra. sentara-se numa poltrona, a mão no coração, ainda encarando os dois em silêncio. estava bastante surpreso por ela ter ficado tanto tempo quieta depois dos primeiros minutos que a conhecera. Depois que os dois se acomodaram lado a lado no sofá laranja de frente à mulher, ela soltara a frase.
  - Você está louca, querida. – ela agora repetia, como se agora estivesse falando para si mesma. Balançava a cabeça em negação e realmente preocupou-se com aquilo. – Quer dizer... Marido? Marido? – a voz de sua mãe estava fraca e ela não parava de olhar de um para o outro.
  - Eu deveria me apresentar propriamente. – disse, trazendo a atenção para si. começara a torcer as mãos secretamente entre as pernas, então agradeceu mentalmente a ele sua tentativa de melhorar um pouco a situação. – Meu nome é . Tenho vinte e cinco anos e...
  - Britânico? – Amelie rapidamente percebeu, interrompendo-o, e ele lhe deu um sorriso educado, concordando com a cabeça. Ela pareceu atordoada. – M-mas... Como?
  - Como o quê? – ouviram uma voz grave vindo de dentro da casa e à porta apareceu um senhor gordo, com um bigode relativamente notável. levantou-se e pôde percebê-la tremendo.
  - Pai. – ela disse, sua voz um pouco insegura.
  - ! Então é você que tinha chegado! – ele abriu um largo sorriso sob o bigode e ameaçou avançar, mas notou ainda sentado ao lado de . O sorriso desapareceu aos poucos, seus olhos castanho-escuros correndo de um para o outro enquanto tentava entender a situação.
  - Pai. – repetiu, tentando mostrar algum controle da situação, obviamente falhando. veio em seu auxílio.
  - Muito prazer Sr. . Meu nome é . Sou o marido da sua filha. – ele disse enquanto se levantava e esticava a mão para que Peter o cumprimentasse. Não aconteceu. O homem apenas continuou olhando-o, chocado com a notícia. sabia que aquilo ia acontecer e estava preparada para pular e fazer um CPR que aprendera na escola há muitos anos atrás caso ele sofresse um enfarte.
  - É o quê? – Peter perguntou, quase num rugido.
  - Pai, eu vou explicar. Só sente ali do lado da mamãe, certo? Sente-se ali que nós íamos explicar tudo.
  - o quê é que isso significa? – o rosto cheio de bochechas e bigode do Sr. começava a avermelhar-se e a garota realmente estava preocupada.
  - Pai, senta. – ela apontou e ajudou o homem a ir até o sofá em frente a ela e , acomodando-o.
  - ... – ele ia começar, mas ela fez “shhhh” e seus pais obedeceram, ficando em silêncio e encarando os dois. Aguardaram por explicações. trocou um olhar com , confirmando se estava tudo bem até agora. Ela sabia que seus pais não dariam uma ótima primeira impressão, mas imaginava que seriam um pouco mais compadecentes por que... Bem, porque era bonito. Ela estava contando com a versão Branca de Neve de sua vida que todos adorariam só porque ele era bonito, assim como a princesa. Mas no fundo ela sempre odiara a história da Branca de Neve. Nem sabia por que tivera esperanças bobas baseadas nela.
  Depois que o casal se acomodou corretamente, começaram a contar a história que Maddy e Loren haviam criado para eles. Do show em que Maddy fora (Amelie soltou um muxoxo lembrando a desgraça da garota) sozinha e como ela encontrara lá. Como depois disso se interessara por ele. Como se interessara por ela. Como conseguiram sair escondidos por todo esse tempo. E como, recebendo a promoção, aproveitou que o namorado estaria em Vegas e decidiu ir para lá comemorar também. Onde foi pedida em casamento e se casaram felizes. Contaram tudo. E os olhos de Amelie não acreditaram em um pingo da história.
  - E... E... Agora... Bem... – já não sabia mais o que dizer. sentiu que não precisava dizer mais nada e, para mostrar isso pra ela, esticou a mão e entrelaçou seus dedos mais uma vez, olhando firmemente para o casal mais velho à sua frente.
  - Vocês estão sérios sobre isso? – Peter resmungou incrédulo. – nunca nem sai da cidade direito. O máximo que vai é Colorado Springs e alguns outros passeios em cidades próximas.
  Ela sabia que tocariam nesse ponto. Ia falar, mas a cortou.
  - Eu contei muito com a bondade e apoio das amigas de nesse ponto, confesso. – ele disse. Sorriu, continuando a ser simpático apesar de tudo. – Elas foram um álibi muito fiel e me sinto um pouco mal por ter que contar isso dessa forma.
  - Então Maddy e Loren... Elas sabiam? – Amelie perguntou.
  - Claro que sabiam mãe. – rolou os olhos. – Eu não seria imprudente de fazer tudo sozinha.
  - Mas... Sua própria mãe... Você não... – aquilo parecia o que mais machucava Amelie. não queria deixar a mãe daquele jeito, mas não tinha outra opção. Costumava contar muitas coisas para ela, então deixar de fora que finalmente se apaixonara e tinha um homem em sua vida chegava a ser ofensivo para a confiança materna que Amelie possuía.
  - Desculpe, mãe. Mas você tinha esperanças que eu me casasse com o filho do padeiro ou o dono da mercearia. Se eu te contasse que estava apaixonada por um músico britânico, você nunca ia concordar. – essa parte nem foi mentira, então foi fácil para dizer aquilo. Sua mãe pareceu um pouco mais ofendida, porém.
  - E o que te faz achar que concordamos com isso agora? – Peter foi seco. – Irresponsável, é isso, . Você foi totalmente irresponsável... Você nem tem ideia do que é um casamento e resolve fazer essas coisas assim sem nem contar pros seus pais... – ele falava enquanto balançava as mãos.
  “Não tenho ideia mesmo”, teve que concordar. O que era um casamento? O que um casamento implicava? Não tivera tempo para pensar direito naquilo tudo, porque só o título de “esposa” já era assustador o suficiente. Mas agora não podia hesitar.
  - Eu sei, pai. Mas eu estou certa sobre isso. – ela tentou ser firme, mas se não estivesse segurando sua mão, ela estaria tremendo bem mais. – Eu... eu não espero que aceitem... – sua voz embargou e ela queria continuar sem chorar, mas não sabia se ia conseguir. – Mas vocês são meus pais... E eu tinha que contar isso para vocês.
  - E você vai para a Inglaterra? – Amelie perguntou, os olhos também brilhantes com lágrimas, agora, lágrimas de verdade. não sabia se conseguia responder, mas a salvou novamente e avisou que iriam no dia seguinte.
  - Amanhã? – Peter pareceu deixar sua muralha cair em pedaços. – Mas... Amanhã?
  - Desculpe. – disse, sinceramente, e percebeu que ele não se referia só àquilo. – Me desculpem por não poder dar mais momentos para vocês mas... eu tenho que voltar meio urgentemente. Mas não precisam se preocupar. Está tudo arranjando para lá e ela vai viver confortavelmente, eu vou garantir isso. Vocês podem acreditar em mim que vou fazer de tudo para que viva bem, uma vez que estou sendo egoísta e trazendo-a para mim. – ele disse, baixando os olhos e soando tão convincente que torcia para que ele não estivesse atuando, porque ela também queria acreditar naquilo. – Vocês podem ir visitá-la quando quiserem em nossa casa.
  Os ficaram um tempo em silêncio, mastigando todas aquelas informações. não sabia mais o que dizer então apenas apertou carinhosamente a mão de , tentando consolá-la. Ela sentiu-se grata por aquilo. Era fácil atuar com ele daquele jeito. Pelo menos, não estava mais explodindo de estar perto dele. Tudo mais era tão mais importante que sentir vergonha de estar ao lado de um homem que isso ficara completamente esquecido na mente dela.
  - Eu... Eu vou fazer um chá. – Amelie levantou-se, parecendo um pouco atordoada.
  - Talvez seja melhor eu sair um pouco. – sugeriu, levantando-se, mas tanto Peter quanto Amelie negaram com a cabeça, fazendo-o hesitar.
  - Fique e passe o dia conosco. Se você vai levá-la embora, pelo menos temos que saber que tipo de pessoa que você é. – Amelie disse. – Vou fazer o chá.
  - Eu vou ajudar, mamãe. – disse e dessa vez não houve negação. foi deixado sozinho na sala com Peter enquanto as duas seguiam por uma porta na parede oposta ao sofá que e se sentaram, que provavelmente levava à cozinha.
  As duas entraram lá e Amelie dirigiu-se imediatamente à chaleira e à pia. encostou a porta, torcendo para que seu pai não matasse enquanto as duas estavam fora. Percebeu que sua mãe a ignorava de propósito e hesitou, imaginando o que poderia dizer para ela. Mas não foi preciso. A ativa falante Amelie iniciou a conversa.
  - Mas que palhaçada é essa, ? Não foi assim que eu te criei. – ela falou, mostrando-se finalmente como incrédula da história que os dois haviam contado. já imaginava aquilo. Seus pais a conheciam muito bem, mas sua mãe ainda melhor do que seu pai. Ele talvez acreditasse, mas sabia que sua mãe não concordaria.
  - Eu sei. – foi tudo que pôde falar na hora. Não sabia mais o que podia fazer. O fato é que estava casada e que iria para a Inglaterra no dia seguinte.
  - É verdade? Tudo isso que me contaram? – Amelie, enquanto esperava a água ferver, perguntou, desafiadora. concordou com a cabeça. – Mas como você pode ir para Las Vegas e voltar casada com um desconhecido e estar bem com isso? – ela perguntou, chocada.
  - Mãe... Não é um desconhecido, eu disse... Não é assim... – tentou dizer, mas foi interrompida.
  - Você está grávida?
  - O quê?! – a garota ficou boquiaberta. – É claro que não! – pelo menos, esperava que não. Só faltava essa.
  - Então por quê? – Amelie pareceu cansada, como se fosse impossível de entender aquilo. meio que entendia o que a mãe sentia. Era realmente difícil. Mas não impossível. Suspirou.
  - Mãe... No momento... Eu não posso te contar por quê. Você disse que não me criou assim, mas... Foi sim. Você me criou com um senso de altruísmo, um senso de que, se eu puder, eu vou ajudar o próximo. Você me criou para que, quando alguém faz algo por mim, eu saiba retribuir. Não foi?
  - É esse o caso agora? – Amelie indagou, lançando um olhar para a porta que levava à sala, de onde podia-se ouvir os homens conversando.
  - Sim. Eu não posso te contar o que é, senão, não teria te contado essa mentira sobre conhecê-lo antes. Apesar de que Maddy realmente foi ao show deles. – ela rolou os olhos. – Só confie em mim, tudo bem?
  - Em você eu até confio, apesar de você estar na corda bamba depois desses recentes acontecimentos. É nesse aí que não posso confiar. – ela indicou com o queixo a sala. – Um músico ! E se ele for um drogado terrível?
  - é gentil mãe, de verdade. Ele realmente está fazendo muito por mim. Você não tem que se preocupar. Como ele disse, vocês podem me visitar. – ela tentou forçar um sorriso confiante, mas sua mãe apertou os lábios em uma linha fina, antes de se virar e começar a arrumar o chá nas canecas, depois que a chaleira apitara avisando que a água fervera. – De qualquer forma, eu vou voltar. Vou mesmo. É temporário. Logo estou de volta. – disse, indo até a mãe e a abraçando por trás. Ouviu-a murmurar, mas não entendeu muito bem o que ela disse. Algo como “Pois eu acho que não volta”. Não de um modo desafiador, ou de um modo alegre como Maddy faria. Uma frase repleta de insegurança e medo, proferida ali pela sua mãe em relação aos três meses que passaria longe. Se ao menos pudesse contar para ela toda a situação verdadeira!
  - Posso confiar em você que sustente essa história que eu e te contamos? – ela pediu, afastando-se da mãe. Amelie a olhou de sobrancelhas levantadas. – É importante. Por favor, mãe. Quando eu voltar, eu vou te contar tudo direito, eu prometo. Mas agora eu não posso. Confie em mim. Confie em também. Vai ficar tudo bem.
  Amelie soltou um muxoxo, começando a sair da cozinha com a bandeja na mão. Prestava atenção no caminho para não derrubar água quente em ninguém, mas antes de chegar a sala respondeu à filha.
  - Se você diz. Vou fazer meu melhor. E veja se não engravide, pelo amor de Deus. Não vou cuidar de neto nenhum.
   conseguiu soltar um riso enquanto seguia a mãe, mais aliviada e um pouco mais confiante em relação à aventura que a esperava nos próximos três meses. Se sua mãe dizia que não ia criar neto nenhum, é porque quando voltasse (de preferência sem um neto), ela seria aceita de volta.   E isso era o que mais importava para ela no momento. Um lugar para o qual voltar.

Sétimo Capítulo

  

Inesperadamente, o Sr. e a Sra. concordaram em deixá-los dormir no mesmo quarto. não sabia o que tanto e seu pai haviam conversado na sala enquanto fazia o chá com sua mãe, mas o resto do dia passou de forma agradável e bem menos turbulenta. Peter e Amelie sentiram-se no direito de fazer mil perguntas a , que não pareceu incomodado em responder nenhuma delas. Dessa forma, também acabou aprendendo muito sobre ele.
  Ele havia nascido em Leeds, porém quando tinha treze anos mudou-se para Londres com a família. Seu pai era mecânico e trabalhava em uma oficina decadente antes de receber e aceitar a oferta de um antigo colega de escola para administrarem uma oficina em Londres, o que causou a mudança da família. Sua mãe era uma advogada; tinha começado a vida como secretária, até que conseguiu, depois que crescera, entrar numa faculdade simples e conseguir um diploma. Sempre trabalhara duro e também se esforçara para oferecer aos filhos a melhor educação. Sim, filhos. Além de , o casal tinha outra filha, três anos mais velha que o rapaz, chamada Rowena. Aquilo surpreendeu . Ela não imaginava que ele teria uma irmã. E também ficou um pouco surpresa com as origens simples dele. Talvez por isso fosse tão simpático.
  Sobre a banda, começara quando tinha dezoito anos, tinha dezessete e , vinte. Como adivinhara, era o caçula, mas não tinha ideia que tinha idade diferente de . Os três nunca estudaram juntos ou moravam próximos um do outro, mas morava perto do primo de , Jackson, então acabaram se conhecendo em algumas situações e encontros aleatórios. Um dia, estourara o carro do pai perto da oficina do Sr. e acabou conhecendo enquanto esse brincava com um violão usado que tinha ganhado de presente. Como e já vinham “brincando” de banda há um tempo, decidiram chamar o garoto bonito e talentoso para se juntar a eles. O tio de , William , conhecido mais como Bill, já tinha gerenciado alguns projetos, então arriscou no sobrinho e nos amigos, o que acabou sendo uma ótima escolha.
   acabou crescendo mais rápido do que se imaginaria para uma banda iniciada no underground londrino, e o sucesso também acabou subindo rápido à cabeça, principalmente para e , mas sobre isso não entrou em detalhes com os pais de . Ela agradeceu. Eles pareciam estar gostando de , pelo menos, um pouco mais de quando ele se anunciou como marido dela, e ela não gostaria que a imagem de e atrapalhasse nisso de alguma forma, mesmo que ela ainda não soubesse o que eles tanto faziam.
  Eles não saíram de casa para não atrair a atenção dos vizinhos, então comeram um almoço caseiro delicioso – Amelie era realmente ótima cozinheira, como a forma roliça de Peter podia confirmar. imaginou se não ficaria cansado, falando tanto de si mesmo e não ouvindo nada sobre ela (afinal, ele também não sabia muito dela, só que os pais dela não podiam saber disso), mas torceu para que ele estivesse acostumado com as entrevistas intrusivas que as revistas de fama requeriam.
  Só foram ficar sozinhos à noite, depois do jantar. Como era domingo – eles nem sabiam direito que dia da semana era de tão perdidos que estavam – Peter não havia trabalhado, então ficara o tempo todo com eles. Amelie também não ia se separar de sua menininha, uma vez que ela no dia seguinte partiria para a Inglaterra. Então depois de pratos esvaziados e lavados, e subiram para o segundo andar da casa, onde ficavam os quartos, e conseguiram finalmente cinco minutos de descanso.
  - Desculpe por tudo isso. – ela sentiu-se no dever de se desculpar, jogando-se na sua própria cama, que não via há um bom tempo. sorriu de lado, parecendo cansado, e com as mãos no bolso deu uma volta em passos lentos no quarto de .
  Ele era cor de creme, com papel de parede simples, e uma janela com jardineira embaixo do lado de fora, algumas flores coloridas chamando a atenção. A cama dela era de casal, bem confortável, com um enxoval em tons de branco e verde claro. Havia uma porta em frente à cama que dava para o banheiro pessoal dela e uma escrivaninha no canto do quarto cercada por estantes de livros. Era tudo bem organizado e simples.
  - Não há por que se desculpar. Temos que parar de forçar o conforto um no outro, lembra-se? Sou seu marido e tenho que aguentar essa parte. – ele foi sincero, apesar de ser o marido dela em “termos”, porque na verdade não havia nada ali além de títulos. - Eu estou te arrastando para a Inglaterra, eles têm todo o direito de fazer todo o tipo de pergunta que quiserem. – finalmente parou de andar e sentou-se ao lado dela. suspirou. – Mas estou bastante surpreso que tenham nos deixado dividir o quarto. Achei que no mínimo iam me fazer dormir com os cachorros. – ele disse com um sorriso de canto, arrancando uma risada de .
  - Não temos cachorros. – ela contou, ajeitando-se na cama. – Também estou um pouco surpresa, mas, bem, eles não são idiotas. Sabem que, se já nos casamos, não tem mais nada para preservar aqui. – apontou para si mesma, um pouco envergonhada. – Mesmo sendo súbito e causando desconfianças.
  - Sua mãe não parece ter acreditado em nada.
  - E não acreditou. Mas aceitou de mal grado minhas explicações particulares e vai manter a história para nós aqui. Isso tenho certeza que ela fará. – disse, sorrindo fraco. Ainda bem que tinha uma mãe como aquela.
  - Isso é ótimo. Fico muito feliz por isso. – dito isso, os dois ficaram em silêncio por um tempo. estava um pouco curiosa sobre as coisas que ele contara. Sabia que poderia ter encontrado tudo aquilo que ele falara na internet ou em revistas para confirmar se era verdade ou não, por isso hesitou ao fazer a pergunta.
  - Como assim, se o que eu disse é verdade? – ele pareceu confuso com a possibilidade quando ela decidiu perguntar, fazendo-a se arrepender na hora de ter aberto o bico. – É claro que é, por que eu mentiria?
  - Não sei, só... não sei. – ela pareceu envergonhada. a encarou por alguns instantes, fazendo-a ficar ainda mais encabulada.
  - Se eu mentisse, eles poderiam descobrir toda a verdade na mídia. Seria ainda pior para a minha imagem, já que não devo estar num conceito muito bom pra eles. – ele deu ombros. – Também, não tenho nenhum motivo pra esconder minha identidade. A gente se acostuma com isso quando vira uma figura pública.
  - Entendo. – na verdade, entendia só um pouco daquilo. Ela não conseguia imaginar o que era ter uma vida pública e as pessoas se importarem com seus pais e onde ela nascera e como ela crescera e todo tipo de coisas. É claro que agora ia ter que começar a pensar nisso, mas deixaria seus pais de fora o máximo possível. Ela ia adorar mentir sobre sua antecedência, se possível. Apesar de tudo, morava desde sempre em uma cidade em que um burro deitado ficaria com o rabo de fora, então estava um pouco acostumada com as pessoas xeretando e se intrometendo o tempo todo na vida dela.
  - Seus pais são realmente incríveis. – ele comentou, sorrindo. – Quando você me disse isso, fiquei um pouco na dúvida. Mas eles são realmente bons pais.
  - É mesmo? – ela ficou um pouco surpresa com o comentário dele. Deu ombros. – Eu sou filha única, então eles sempre me deram de tudo e do melhor. Claro que, numa cidade pequena como Westcliffe isso não significa muito, mas eu tive minhas liberdades e meus mimos. – ela sorriu, um pouco culpada. Depois, seu sorriso morreu aos poucos. – Me sinto um pouco mal por enganá-los assim. Eu disse para minha mãe... disse para ela que quando eu voltasse, eu contaria toda a verdade para ela. Você acha que está tudo bem? – perguntou. meneou a cabeça.
  - Acho que sim. Acho que seria o justo.
  - Obrigada . – falou, percebendo que aquilo era algo que, havia já um tempo, gostaria de dizer a . – Essa situação é um baita problema mas... acho que o fato de ser você... está realmente fazendo as coisas mais fáceis pra mim. – ela corou com a última frase e evitou o olhar dele. Mas não durou muito tempo, porque logo ele lhe respondeu:
  - Eu também tenho que te agradecer. – ele falou, encarando o teto enquanto apoiava as palmas da mão na parte da cama atrás das costas, ficando recostado nelas. o encarou interrogativamente, apesar de ele não estar olhando para seu rosto. – Você também está fazendo muito por mim, concordando com tudo isso para proteger a banda. A banda é algo muito especial para mim e até mesmo você está se sacrificando por ela... Tudo que estou pedindo a você, tudo que estou exigindo... droga, você está até saindo do seu emprego! – ele fez uma careta, parecendo bravo consigo mesmo. lembrou-se da carta escrita que acabara enviando ao chefe aquela manhã, através de Maddy e Loren. Esperava que ele fosse compreensivo. – Você podia ser simplesmente egoísta e ter me mandado à merda e viver sua vida com um divórcio e só. Acabou. Final feliz. Mas não... – e então ele a olhou, os olhos gentis refletindo o rosto levemente pálido de em pequenas miniaturas. – Você não fez isso.
  - Bem... – ela ficou meio embaraçada com aquela declaração toda de agradecimento e não soube bem o que responder. Na verdade, por causa daquela maldita atitude que ele teve mais cedo, ela estava quase (só quase) esperando que ele a beijasse de novo. Mas ele não fez isso, apenas sorriu largamente.
  - Obrigado, . – falou, e ela deu ombros, virando o rosto avermelhado para que ele não a visse.
  - Acho que estamos quites então. – murmurou, relativamente satisfeita com o jeito que a relação entre eles se encontrava.
  - Na verdade, estamos quase. – ele disse e mais uma vez ela voltou seu rosto para encará-lo, surpresa ao encontrar um sorriso malicioso em seus lábios avermelhados. “Não olhe para os malditos lábios” ela tentava manter o autocontrole. Sobre o que diabos ele estaria falando? – Afinal, eu contei a história da minha vida hoje mas, além de conhecer seus pais e a sua minúscula cidade, não sei praticamente nada de você, . – ele disse, aliviando a consciência de , que em mais alguns segundos tomaria rumos bem perigosos e ainda não apropriados para o horário. Mas o que diabos que ela estava pensando. Ainda mais corada só com o pensamento que tivera, resmungou qualquer coisa sobre o voo até a Inglaterra ser longo no dia seguinte. Era verdade. Ela contaria qualquer coisa que ele quisesse saber, mas no momento não sentia vontade de falar sobre si mesma.
  - Bem, tudo bem então. Aguardarei. – ele espreguiçou-se e dessa forma sua blusa levantou-se levemente. não queria olhar, mas acabou olhando, e mais uma vez deparou-se com a ponta da tatuagem que observara logo que conhecera . Sua curiosidade pipocava e ela sabia que não ia aguentar mais.
  - Você se importa se eu fizer mais uma pergunta sobre você? – ela perguntou, mordendo o lábio inferior. a olhou e negou com a cabeça. – Queria saber... sobre sua tatuagem. Queria ver ela. – aquilo era basicamente um pedido de strip tease mas ela tentou não encarar daquele jeito. Os olhos de apertaram-se levemente, como se estivesse confuso.
  - Tatuagem? – seu tom realmente denunciava o que estava estampado em seus olhos.
  - Sim. A das suas costas. – ela apontou. Ela não entendia a confusão que ele estava passando.
  - Tatuagem?! – agora seu tom era urgente e espantado e ele apressou-se em ir até o armário de (cuja porta estava aberta e se podia entrever um espelho ali), já arrancando a camisa. ficou surpresa com a reação e o rápido strip que ele fizera, mas ainda mais surpresa com o grito indignado que ele soltou logo depois. – Não acredito nisso!
  - O quê? O que está errado? – era perfeitamente normal para ela que músicos tivessem tatuagens, então não entendia o motivo do choque.
  - Eu não tinha uma tatuagem! Eu... mas que bosta! – ele disse, encarando suas costas através do espelho. – Não acredito nisso... porra, Vegas! – reclamou em voz alta de novo. preferiria que ele mantivesse os palavrões em tom mais baixo, mas também estava preocupada.
  - Por favor, me diz que não é meu rosto estampado aí. – ela provavelmente desmaiaria se essa possibilidade fosse verdade. finalmente virou-se de costas para ela e ela pôde observar o desenho em preto que tomava parte de seu ombro direito. Tentou ignorar com muita força de vontade as costas bem delineadas de e analisou o contorno.
  Graças a Deus, não era uma tatuagem de um rosto e muito menos o rosto de . Era, na verdade, uma tatuagem até bonita.
  - Oras, não é tão ruim assim. – disse, tentando animá-lo. Era verdade. Ela tinha gostado bastante.
   gemeu qualquer coisa, voltando a colocar a parte das costas com a tatuagem no espelho para que pudesse observar mais uma vez. Os traços negros e bem desenhados mostravam uma coisa até simples, o que poderia ter sido feito rapidamente numa noite (obviamente a noite em que eles ficaram muito loucos e meteram-se naquela confusão toda). A ponta de tatuagem que aparecera levemente e que primeiro notara era um N. O N encontrava-se na ponta de uma seta bem detalhada, que seguia um risco longo e terminava em outra seta, esta apontando para um S. Essa linha era cruzada por outra, também com setas apontando para letras, W e E. Entre essas linhas havia outras típicas de detalhes de uma bússola. Era tudo bem simples e parecia um pouco torto em sua colocação total, de forma que o N chegava a aparecer onde o havia notado, mas acabava sendo um conjunto bonito. gostara bastante. Tentou animar .
  - Bom, pelo menos... compass, não é? – ela sorriu. – Eu gostei.
  - Gostou? – ele a encarou através do espelho. – Pensei que como era do interior, fosse odiar esse tipo de coisa.
  - Que tipo de opinião é essa sobre nós, caipiras? – ela fingiu-se de ofendida, tentando controlar a risada. – Eu sobrevivi aos braços do , não sobrevivi? – comentou, lembrando-se do baterista e de suas tatuagens coloridas.
  - É mesmo. Menos mal. – ele recolocou a camisa, ajeitando-a para não deixá-la tão amarrotada. – Mas ainda assim... – meneou a cabeça, desconsolado.
  - Por que ficou tão chocado em ter uma tatuagem? Aliás, você é músico e tem vinte e cinco anos. Não devia ter tatuagens e isso ser normal?
  - Que tipo de opinião é essa sobre nós, músicos? – ele imitou-a, um sorriso brincalhão surgindo em seus lábios. foi pega de surpresa por esse sorriso dele e encontrou-se sem palavras por um tempo. soltou uma risada sem graça e depois ajeitou uma das pulseiras que trazia no pulso, parecendo sem jeito. – Eu tenho medo de agulhas. Só estando muito bêbado mesmo para fazer uma coisa dessas.
  - É sério? – ela tentou segurar o riso. fechou a cara, seu rosto ganhando manchas avermelhadas nas bochechas e ela sentiu-se feliz por ver que era realmente humano e também tinha medos ou ficava com vergonha de certas coisas. – Bem, de qualquer jeito, não foi em vão. Pelo menos é uma tatuagem bonita.
  - É, acho que acabou ficando legal. – ele disse, dando ombros. – Ainda bem que não foi um autorretrato. Eu preferiria arrancar meu ombro a ter algo assim em mim. – estremeceu com o pensamento e riu. – Será que você não tem nenhuma também?
  - Nem fale isso! – ela arregalou os olhos, só agora pensando na possibilidade. Mais discreta que , foi até o banheiro e fechou a porta, arrancando a roupa e examinando todo o seu corpo. Nenhuma tatuagem aparente. Talvez ainda não estivessem juntos quando fez aquela tatuagem. Abriu uma fresta da porta, ainda vestindo apenas calcinha e sutiã. Ele ainda estava no quarto, examinando o quadro de fotos de , e quando ouviu o barulho da porta olhou para ela.
  - Tem? – perguntou, ansioso, e ela riu negando com a cabeça. Escondia todo seu corpo atrás da porta e deixava apenas a cabeça transparecer. – Ah, que droga. E eu aqui esperando que teríamos tatuagens combinando para convencer ainda mais as pessoas de nosso amor infinito. – ele disse, de forma irônica, fazendo-a rir.
  - Não diga uma coisa dessas. Escuta, pode pegar meu pijama para mim, por favor? – pediu, um pouco envergonhada. Apontou para onde as roupas se encontravam na cama e concordou, indo até lá e trazendo-as até a mão da garota. – Obrigada. A preguiça de colocar a roupa de novo para pegar a roupa e depois trocar a roupa foi muito grande. – ela riu sozinha. – Só um minuto.
  Trocou a roupa e já fez a higiene necessária. Quando saiu do banheiro, ouviu uma batida na porta e Amelie enfiou a cabeça para dentro do quarto, com olhos curiosos ao ouvir toda a animação que havia ali.
  - Oh, desculpem-me por interromper. Vim aqui dar-lhes boa noite mas ouvi um fato interessante. – ela entrou no quarto com as mãos atrás do corpo e imaginou o que a mãe estaria aprontando. pareceu sentir o perigo também, porque seu corpo ficou tenso. – , me desculpe por ter escutado atrás das portas, mas... – ela se aproximou dele em um passo. Ele se controlou para não recuar, apesar da tensão aparente em seu rosto. -... por acaso eu ouvi direito... – mais um passo. –... que você... – mais um, e dessa vez recuou, mas não acabou tão longe. -... tem medo disso?! – ela finalizou em um grito triunfante e tirou a agulha que segurava detrás das costas, exibindo-a na cara de . não pôde conter a gargalhada ao ver a cara atônita de e a surpresa de sua mãe. – Ora? Não? – ela se perguntava ao ver que ele não reagira. soltou uma risada e relaxou o corpo.
  - Sra. ... não é assim que funciona... – ele tentou explicar, mas mal pôde ser ouvido entre os risos de . Aquilo pareceu satisfazer Amelie de alguma forma, que finalmente deu boa noite e saiu do quarto com um sorriso alegre no rosto.

  

  

Os dois estavam deitados e o quarto estava escuro. sempre dormia com o quarto escuro, mas agora que estava de costas para do outro lado da cama e podia ouvir sua respiração calma, gostaria de ter uma luz mesmo que mínima, só para ter certeza que ele não estava virado na direção dela. Na sua cabeça, os dois estavam um de costas para o outro como um casal brigado – ou como um casal falso devia fazer – mas no escuro não tinha certeza disso e por algum motivo esse fato a impedia de dormir direito. Ou talvez fosse a ansiedade, já que na manhã seguinte teriam que se preparar para mais uma vez ir para o aeroporto. Madeline e Loren apareceram um pouco antes do casal se deitar para trazer a mala de , que havia ficado na casa de Loren, e para se despedirem da amiga. Uma despedida chorosa, do tipo que odiava. Contudo, ela estava um pouco mais confiante e segura. Sua relação com parecia ter melhorado muito desde a manhã – será que o beijo realmente fora eficiente assim? – e ela se sentia mais capaz de viver aquela mentira para ajudar , o que significava que em três meses estaria de volta para sua vida normal. Teria que se esforçar tendo aquilo como objetivo.
  Não aguentava mais ficar naquela posição, então decidiu virar-se só um pouquinho para ficar mais confortável. Assim que virou, porém, constatou que não só estava virado para ela como também estava bem mais próximo do que ela imaginara. Ela podia sentir sua respiração em seu rosto, parecendo profundamente adormecido. Sorriu para si mesma enquanto montava a imagem desse adormecido em sua mente. Sabia que era bobo, mas aquilo fazia seu coração bater um pouquinho mais rápido.
  Talvez, e não só por causa daquele maldito beijo bobo, estivesse mesmo se apaixonando por . Só não sabia ainda se isso seria bom ou ruim.

Oitavo Capítulo

  

Se não pretendesse voltar para o Colorado dali a três meses, afirmaria de pé junto que nunca mais queria entrar num aeroporto de novo.
  Depois de horas de espera no aeroporto de Chicago – a conexão até Londres – ela agora se encontrava no famoso e gigante Heathrow International Airport. Ela mal podia acreditar que aquele prédio enorme em que se encontrava era apenas um dos cinco terminais que o aeroporto apresentava. Toda a sua cidade podia se mudar para dentro de um deles e viver confortavelmente. Aquilo era um absurdo. Se ela não estivesse seguindo de perto – que andava por ali como se fosse a sala de estar de sua casa – provavelmente acabaria perdida e teria que morar num dos banheiros do aeroporto pelo resto da sua vida. Caso encontrasse os banheiros.
  A viagem, apesar de longa, foi bastante tranquila. Na primeira parte conseguiu descansar o que não foi possível anteriormente devido ao nervosismo e ansiedade e na segunda parte pôs-se a contar sua vida para , que escutava cuidadosamente para lembrar dos detalhes caso precisasse deles futuramente. lhe contou dos anos da escola – como era uma aluna na média e precisava sempre dar o melhor de si para passar com notas mais altas – e das suas comidas favoritas – spaghetti ao molho pesto e doce de abóbora – e até mesmo seu feriado favorito – o Natal – até chegar às coisas que aprontava desde criança com Maddy e Loren. Sua vida havia sido bem simples, então não se demorara muito na sua narrativa autobiográfica. também não parecia extremamente interessado e ela sabia que só estava fazendo aquilo por obrigação.
  - E do que você tem medo? – ele perguntara entre garfadas daquela refeição horrível servida pela companhia de avião. , tentando engolir um pedaço de frango suspeito, arqueara as sobrancelhas para ele. – Você já sabe o meu, então é apenas justo que eu saiba o seu. – ele dissera, apontando-lhe o garfo plástico. Ela suspirara, sem saída, e limpara a boca com um guardanapo.
  - Tenho medo de altura. – confidenciara, o que explicava sua grande necessidade de ficar o mais afastada possível da janela do avião. – É bem comum então não tem nada surpreendente. – começou a pensar que na verdade aquela frase definia-a por completo. Ela era uma garota bem comum, sem nada de surpreendente. Secretamente aquilo a abalou um pouco.
  - É mesmo? – ele sorriu. – Que pena. Acabaram-se nossos passeios românticos na London Eye. – comentou e ela riu de leve. Não podia nem pensar em chegar perto da London Eye, a famosa e enorme roda-gigante.
  Depois disso não conversaram muito mais. Ela assistira a um filme e ele cochilara boa parte do resto da viagem.
  Agora, já estavam se dirigindo à saída do check-out, depois de pegarem suas malas. estava um pouco temerosa do que a esperava do outro lado da segurança, porque podia ouvir um barulho estranho. Olhou para , que dessa vez não usava óculos escuros e olhava ao redor, parecendo preocupado. Ele empurrava o carrinho com as três malas maiores de (ele fingira que uma era dele para que ela pudesse levar mais coisas que a Sra. insistia em enfiar nos braços da filha) e a sua pequena, já que o principal dele havia sido levado anteriormente por Bill e os outros. Parecia ouvir o barulho que havia percebido e ainda não tinha identificado, porque parou e olhou para ela.
  - Certo, isso pode ser um pouco traumatizante. Mas fique o mais calma possível e sorria, se der. – ele a avisou, o que não ajudou muito.
  - O que pode ser traumatizante? – perguntou, enquanto ele tirava dois pares de óculos escuros e entregava um para ela. – Por que preciso disso?
  - Por causa das fãs. – falou, o que respondia as duas perguntas. A garota imediatamente sentiu o estômago afundar de nervoso e, tremendo, pegou os óculos que ele ainda segurava. – Fique calma.
  - Mas... elas vão me atacar? O que vão fazer? – perguntou, insegura. aproximou-se dela com um sorriso.
  - Não vou deixar que façam nada com você, . Não se preocupe. – e lá estava novamente, aquele irritante e maravilhosamente principesco que fazia seu coração disparar como se ela fosse ter um ataque do coração. – Prometi aos seus pais que cuidaria bem de você e que você viveria bem aqui. Não posso deixar que morra logo no aeroporto, cinco minutos de chegar.
  - Morra? – ela escancarou a boca. – Por que está usando palavras tão fortes assim? É nesse nível de perigo? Não é melhor sairmos separadamente? – obviamente, ela estava aos poucos entrando em pânico. Várias pessoas do voo deles já tinham saído pelas portas, mas alguns retardatários ainda passavam encarando o casal que parecia discutir.
  - , já disse para não se preocupar. Vamos sair juntos e você vai estar mais próxima da parede e eu vou empurrar o carrinho, então não vão chegar a você. Não que as coisas cheguem a esse ponto. De qualquer forma, Bill providenciou tudo porque sabia que ia ser uma loucura já que a notícia se espalhou bem rápido. Vão ter seguranças que vão nos acompanhar até o carro, e depois vamos seguir para a nossa casa. – ele explicou o plano com calma e segurou-a pelos ombros. Seu rosto estava próximo novamente e sentiu o rosto esquentar, mas ele não a beijou novamente, nem nada do tipo. Deixando-a um pouco desapontada, afastou-se e segurou o carrinho. – Pronta?
  - Relativamente. Mas vamos. – ela disse, aproximando-se dele. Hesitou antes de encaixar o braço ao dele, apesar de que o gesto foi aprovado com um sorriso gentil da parte dele.
   empurrou o carrinho e a porta automática se abriu, e então o barulho que ouvira tornou-se uma explosão de sons e gritos. Ela não pôde evitar se assustar, mas esforçou-se ao máximo para esconder sua surpresa e seguiu impassível ao lado de seu marido (ou, pelo menos, o mais impassível que conseguia ser). explodia em sorrisos, que a garota desconfiava serem falsos, porque ninguém sorriria em resposta a um cartaz “Morra, esposa! , case comigo!”. Ela esperava que ele não sorrisse para isso pelo menos. Ou que não tivesse visto. Ela viu e não se sentiu nada bem.
  Mas como a prevenira, assim que chegaram à parte que podiam ser facilmente atacados, uma barreira de seguranças os rodeara e conseguiram avançar sem complicações maiores além dos insultos gritados e dos gritos chorosos das garotas. estava decididamente surpresa com aquela reação a , porque não conseguia imaginar que aquele era um ídolo voltando para sua terra natal. Parecia mais um ídolo internacional à lá Davy que só pisava em terra a cada dez anos e olhe lá. O caminho até o carro foi meio turbulento, mas sem acidentes, e logo sentava-se confortavelmente no banco de trás de um SUV preto. logo estava ao seu lado, enquanto as malas eram colocadas por um segurança no porta-malas traseiro. Já havia um motorista a postos e, assim que a porta foi batida, antes que a legião de fãs descontroladas os alcançasse, ele pisou no acelerador e saiu do aeroporto com calma e cuidado.
  E assim se encontrava segura e sem danos ao lado de seu marido. Ela percebeu que seu corpo estava totalmente tenso então focou-se em relaxar, soltando o ar lentamente. sorria gentilmente para ela.
  - Não foi tão ruim, foi? – perguntou, retirando os óculos do rosto dela, que mais uma vez sentiu o rosto esquentar com o contato entre eles.
  - Sobrevivi, certo? – falou, não querendo confessar que além de medo de altura, agora também tinha medo de fãs. – Isso foi... incrível, de alguma forma. – ela falou enquanto se moviam pelas ruas levemente congestionadas que os afastavam do aeroporto.
  - Na verdade é a primeira vez que tem algo assim. – ele confessou, ajeitando-se no banco. – Nós vamos ter que ser bem cuidadosos, porque essa repercussão é de fato assustadora.
  - Parece que eu me casei com a Madonna. – a garota murmurou, mais para si mesma, mas ouvira e soltou uma risada.
  Ficaram os dois um tempo em silêncio até que subitamente se lembrou de algo que dissera anteriormente e arregalou os olhos. A essa hora já estavam se aproximando do centro da cidade, longe do aeroporto, e ela queria olhar a paisagem, mas olhava , que também a encarava interrogativamente.
  - Aquela hora... você disse nossa casa? – recuperou a fala do rapaz na memória quando ainda estavam dentro do aeroporto. refletiu um pouco e depois concordou com a cabeça.
  - Sim. Eu morava num apartamento pequeno, então não ia ser muito cômodo se a gente se mudasse para lá. Bill providenciou uma casa simples mas grande o suficiente para um casal viver confortavelmente e parece que minhas coisas já estão encaminhadas. Estamos indo para lá agora.
  - Vocês compraram uma casa? – ela perguntou. Imaginava que casas não eram baratas, ainda mais na capital britânica, então o fato deixava-a estupefata.
  - Você não se preocupa demais, não? Não, não compramos. Alugamos. Eu disse, tanto para você quanto para seus pais, que providenciaria tudo para que você pudesse ficar tranquila aqui e vivesse bem. Só espero que não tenha alergia a gatos, porque tenho dois, que vão ficar conosco. – ele explicou.
   ficou sem reação ao ouvir aquilo. estava se esforçando tanto. Mesmo que em três meses ela sairia e iria embora para sempre, até uma casa havia sido providenciada para ela. Uma casa. Ela mal podia acreditar. Era como se estivessem mesmo casados, e amargamente lembrou-se que essa era a impressão para todos os outros. Estavam mesmo casados e tinham que sustentar isso. Então viveriam juntos, numa casa, sairiam em encontros, fariam entrevistas, tudo aquilo para manter as aparências.
  - Você preferia um apartamento? Eu que sugeri a casa já que você morava em uma... – ele pareceu apreensivo. queria pular no pescoço dele e enforcá-lo por ser tão prestativo e adorável. Aquilo não ia dar certo.
  - Uma casa está ótima. – murmurou. – Qualquer coisa estaria bom, você não precisava se preocupar tanto... e não me importo com gatos... – falou, embaraçada. – Como é a casa?
  - Não sei, não cheguei a ver ainda. Bill resolveu tudo miraculosamente nesses últimos dias. – deu ombros, olhando agora para fora da janela, como se procurasse a casa. – Devemos chegar logo.
  E, de fato, cerca de dez minutos depois a SUV preta estacionava numa casa no estilo vitoriano que deixou boquiaberta. A casa de dois andares era aparentemente simples, mas transparecia e transbordava, aos olhos interioranos da garota, riqueza e luxo. As paredes eram num tom azulado meio pastel, com batentes e pilares brancos, o telhado com um ângulo agudo em seu pico possuía telhas de um cinza quase negro, contrastando com o resto da casa. A parte de baixo da casa exibia uma janela grande no canto direito e uma menor no esquerdo, e centralizada entre as duas uma grande porta branca, alta o suficiente para um elfo passar por lá. Ou o , talvez. E a parte de cima, duas janelas grandes como a de baixo e uma bem pequena no meio.
  Havia, entre o simples portão na frente da rua e a escada de três degraus que levava à entrada da casa, um caminho de pedras rodeado por uma grama verde e bem cuidada, e pequenos arbustos acompanhavam a pequena cerca branca. Na verdade, aquele pseudo-jardim era quase um milagre existencial na grande Londres, e mesmo que desse um ar bonito para a casa, achou-o um pouco inútil. As casas ao lado eram praticamente coladas e idênticas à do novo casal, com o mesmo espaço de grama para cada um dos pseudo-jardins por toda aquela rua. A rua, em fato, era sem saída, terminando em um retorno a cerca de cinquenta metros a um lado e retornando a outra rua que levaria a uma avenida do outro, a cerca de vinte metros. Na frente de quase todas as casas havia um carro, formando uma linha colorida metálica. não sabia nada sobre a localização do bairro em que se encontravam e se seria conveniente para ficar ali, mas antes que pudessem conversar sobre suas opiniões a respeito da nova moradia, um carro aproximou-se e estacionou atrás da SUV preta. Era um carro prateado e comum em Londres, do tipo que existiriam uns trinta no meio do trânsito ao mesmo tempo. Dele, Bill saltou.
  - Vejo que chegaram bem. Estão cansados? – perguntou, aproximando-se do casal. – O que acharam? – apontou para a casa em que estavam parados na frente.
  - Está boa, Bill. Obrigado pelas providências. – disse, virando-se depois para . – O que achou? Não é uma casa numa cidade do tamanho de um ovo, mas acha que pode se acostumar?
  - Sim. Eu gostei. Obrigada. – ela tentou não parecer ofendida, mas quando sorria para ela era difícil se ofender. – Desculpe o incômodo, Bill...
  - Não se preocupe. Você já está dando bem menos trabalho do que imaginávamos se você fosse uma fã louca. – ele sorriu de um jeito meio frio, já tinha certeza que não gostava muito dos sorrisos dele. De qualquer forma, ele parecia mais sucessível à possibilidade de que ela não drogara , então não reclamaria. – Sobre a localização, é um pouco afastada do estúdio e do centro, , mas há um mercado bom aqui perto e um centro comercial a uns quinze minutos de carro. Preferimos deixá-los longe da muvuca para que possam viver com mais tranquilidade. Quanto mais tempo as fãs demorarem para achar vocês, melhor.
  - Certo. , você dirige? – perguntou e ela concordou com a cabeça. – Aqui acho que você só precisa fazer uma prova simples para conseguir uma carteira temporária, como uma turista, sabe? – ele explicou e ela mais uma vez concordou. Ela duvidava que passaria nessa prova simples, porque quando foi tentar tirar sua carteira no Colorado ela teve que fazer a prova simples de lá três vezes. E olha que lá eles dirigiam do lado certo.
  - Mais duas coisas, . – Bill disse, enquanto estendia dois molhos de chave, um em cada mão, para cada um dos mais jovens. – Primeiro, o seu carro a partir de hoje vai ser esse. Ele chama menos atenção e pode usá-lo tranquilamente também sem ser reconhecida imediatamente.
   pareceu insatisfeito com aquela condição de Bill, mas não disse nada. ficou curiosa pelo motivo da insatisfação, mas antes que pudesse perguntar qual era o carro anterior de seu marido, Bill pulou para o próximo tópico.
  - Segundo, mesmo que eu tenha dito que preferimos deixá-los longe da muvuca, não quer dizer que vocês não vão aparecer juntos ocasionalmente no centro. Vocês têm que se deixar serem fotografados e vistos, e parecerem felizes pra essa coisa toda dar certo. Senão, vão pensar que demos cabo à . – Bill fez um gesto trespassando sua garganta com o polegar e fez uma careta. – Então, tratem de marcar uns encontros e agir lovey-dovey na frente das pessoas para elas comprarem o peixe.
  Os dois concordaram enquanto assistiam Bill se afastar do carro prateado e abrir a porta da SUV, que ainda estava ali. O motorista retirara as malas dos recém-casados do porta-malas e arrumara-as na rua enquanto conversavam; agora ele já se encontrava novamente no seu posto, pronto para sair a qualquer momento. Antes de se sentar, porém, Bill virou-se como se na verdade não fosse apenas aqueles recados e houvesse mais um. E de fato havia.
  - A propósito, vocês têm uma entrevista amanhã às onze horas na Jess. Estejam lá às nove e meia. Não se atrasem.
  - Juntos? – e perguntaram ao mesmo tempo, surpresos com a notícia, mas Bill já entrara no carro e se afastava. Surpresos, se entreolharam.
  - E eu que achei que a pior parte ia ser conhecer seus pais. – ela tentou fazer graça, mas tinha seus olhos arregalados em surpresa e medo. Defeito de : sofrer por ansiedade. Não sabia como ainda não tinha tido uma gastrite. também parecia ansioso. Ela imaginou que, apesar de saber lidar bem com a fama e aceitar essas entrevistas e eventos como parte de seu trabalho, era também a primeira vez para ele aparecer na televisão como essa situação. De certa forma, ele devia estar tão assustado quanto ela.
  - Isso vai ser moleza perto de aparecer na Jess. – ele disse, soltando um suspiro. – O Bill... ele deve estar pirando. – esfregou o rosto com as mãos, parecendo não acreditar ainda que aquela era a realidade dele. – Jogar a gente na Jess logo de cara... na TV! Rede nacional! Não era melhor uma entrevista em alguma revista antes? Você ainda nem está acostumada com essas coisas. Se der errado nisso, a gente já era...
  - O quê? Como assim? Quem é Jess? – na verdade, devia ter acabado de adquirir sua primeira gastrite. Já conseguia sentir o rombo se abrindo no seu estômago ao ouvir falar daquele jeito.
  - Ela é apresentadora do Jess&Them, é bastante popular aqui. Normalmente pessoas famosas vão lá. Já fomos como umas três vezes lá, e o foi uma vez sozinho. Ela é uma boa pessoa, mas... – ele parecia tão inseguro que a garota estava quase pegando-o pelos ombros e sacudindo-o, já que ele não podia surtar na área dele. E para ele estar surtando, a coisa devia ser horrível. – A audiência dá muito ibope pro que ela fala. Se ela decidir que nosso casamento é falso, a história ta arruinada.
  - Ou seja, sem pressão. – riu nervosamente. lançou-lhe um sorriso apologético. – Certo. Vamos ter que fazer isso dar certo então.
  - É isso ou você acaba voltando mais cedo pra casa. – ela percebeu que tentou fazer uma brincadeira, como fizera com o fato de ela ter medo de altura. O tom dele, porém, denunciava o quão assustado com a entrevista do dia seguinte ele estava. surpreendeu-se ao vê-lo daquele jeito e quase esqueceu o problema em si.
  Sem saber direito o que fazer, fez o que sempre fazia quando Maddy ou Loren colocavam aquela expressão no rosto: aproximou-se e passou os braços pelos ombros de , mantendo suas cabeças próximas e corpos colados. Seu coração batia bem rápido pela cara de pau de fazer aquela aproximação e ela torcia para que ele não notasse, mas aquilo era tudo que conseguia fazer na hora. Do mesmo jeito que ele lhe pedira para chamá-la de , do mesmo jeito que ele a beijara na manhã em Westcliffe, queria de alguma forma dizer para que tudo ficaria bem, mesmo que não conseguisse dizer aquilo com todas as palavras.
   pareceu surpreso com a reação dela (quem não ficaria?), mas depois de alguns segundos relaxou e passou os braços por volta da cintura de . A garota sentiu o rosto esquentar, mas permitiu-se ficar um pouco mais naquela posição. Mordeu o lábio inferior e, tomando ar, decidiu tentar falar algo.
  - , hum... eu... eu não sou boa com essas coisas de público... e eu sei que essa coisa toda é muito louca... é culpa minha também... – ela não sabia bem como elaborar e fechou os olhos, odiando-se por ser tão ruim com as palavras quando precisava delas. E se cometesse essas bobagens na entrevista? Ia ser horrível. Respirou fundo e se acalmou, antes que ele pudesse querer rebater qualquer coisa. – Você já fez muito por mim na minha cidade, está sempre tentando me deixar confortável e até mesmo conseguiu uma casa pra mim... pra nós. Eu sou péssima com essas coisas mas eu prometo pra você... que eu vou dar o melhor de mim amanhã para que tudo corra bem, já que essa é a minha parte nesse combinado. – Mais uma vez, puxou uma grande quantidade de ar para dentro de seus pulmões e se afastou um pouco de para que pudesse olhá-lo nos olhos e fazê-lo ver que estava sendo sincera quanto àquilo. Os olhos dele a encaravam, agora já menos vulneráveis e inseguros, mas com um brilho de curiosidade e de algo mais que não queria nem supor o que era, caso contrário sua mente ia levá-la bem longe e alto. – Amanhã, nessa entrevista, eu vou fazer não só a tal Jess e toda a plateia acreditarem no nosso casamento, como vou ser tão boa que até nós dois vamos ficar confusos com a verdade.
   riu, daquele jeito natural e bonito que rira quando lhe perguntara sobre por quê dividia o quarto com . Ela ficou atordoada por milissegundos ao estar admirando aquilo de tão perto, mas logo sorriu envergonhada.
  - Não é como se eu estivesse duvidando de você em algum momento, . – ele falou, analisando o rosto da garota. – Mas obrigado. Você está certa. Vamos fazer todos eles acreditarem nessa história.
  E então, com aquele sorriso macio e acolhedor, ele se inclinou levemente e depositou-lhe um beijo na testa.

Nono Capítulo

  

É claro que se arrependeu imediatamente daquele contato assim que se separaram e mantinha um sorriso suave no rosto. Tudo bem que ela estava se tocando que cada vez mais gostava de – e ainda não sabia se isso era conveniente ou não –, só que não era necessário que parecesse uma desesperada, certo? Embora estivessem casados e enfrentando essa batalha juntos, se conheciam há menos de uma semana, então era difícil dizer o quanto de contato era permitido entre os dois. Apesar de que foi ele quem começou, com aquele beijo. E dizendo para ela trata-la como um namorado. Mesmo que aquilo fosse uma grande mentira.
  - Vamos entrar e checar a casa por dentro? – ele convidou, tirando-a de seus devaneios confusos e pegando duas das malas. Ela concordou com a cabeça e pegou a mala restante, indo na frente.
  A primeira coisa que a garota notou quando entrou na casa foi o gato malhado e gordo que estava sentado no meio do corredor, como se os aguardassem, o rabo parecendo o balançar de um pendão desafiando as leis da gravidade. também notou imediatamente o animal e sorriu.
  - Bartholomeu! – e assim que pronunciou o nome naquele sotaque magnífico (na opinião de ) o gato soltou um miado fino e saiu de sua posição, rebolando o traseiro e o rabo até seu dono e começando a ronronar como um motor de barco.
  - Que gracinha! – disse, hesitando um pouco antes de abaixar-se e acariciar o pelo macio. Bartholomeu não pareceu ter se importado e miou curioso para ela. – Ah, que bom que ele não é desconfortável com estranhos.
  - Bartholomeu e Miles viviam na rua quando eu encontrei eles e trouxe para casa. Então eles são bastante acostumados com pessoas passando por eles o tempo todo. – sorriu e pôs-se a continuar trazendo as malas para dentro. começava a imaginar se haveria algum defeito em e se, pra compensar tudo de bom que ele era, não seria uma coisa insuportável e terrível. Aquilo começava a preocupa-la. Não se lembrava de as regras da vida permitirem pessoas tão maravilhosas assim andando entre os meros mortais.
  - Pelo que entendi, pra cá – ele apontou para a porta à esquerda deles, mais próxima. – é a cozinha e na porta do outro lado é a sala de estar. Ali no canto do fim do corredor é a escada que dá acesso aos quartos, e aquela porta do fundo dá pra um pequeno quintal. – ele foi explicando enquanto apontava, e ela seguia com o olhar suas indicações. – Do lado dela acho que tem um banheiro, mas deve ser meio suspeito. Lá em cima tem três quartos, duas suítes e um menor de hóspedes.
  - É surpreendentemente grande por dentro, não? – comentou. Depois soltou um suspiro. – Então vamos ter que levar isso tudo lá para cima. Agora me arrependo de ter trazido tanta coisa. – comentou, pesarosa, mas não pareceu se importar.
  - Vamos levar as malas juntos, mesmo que tenhamos que descer várias vezes, não fica muito ruim.
  - Ok. – ela concordou e pegaram a primeira mala, mais pesada.
  A escada era difícil de subir, ainda mais segurando uma mala e tentando não matar o outro esmagado caso derrubassem a sua parte do peso, mas de alguma forma conseguiram fazer isso com todas as três malas. O casal encontrou-se bufante ao terminar, decidindo por um intervalo para tomar ar antes de prosseguirem com a arrumação. Sentaram-se lado a lado no último degrau e inclusive recostou-se numa das malas, sentindo os braços doerem.
  - Aliás... – chamou-lhe a atenção e ela o olhou com mais atenção. O rosto dele estava levemente avermelhado e suado, com alguns fios de cabelo colados a ele. Não parecia horroroso, ao contrário de , que nem queria imaginar sua situação ao bufar em resposta para que ele prosseguisse. – Como temos dois quartos, você prefere dormir separadamente, certo?
  Ah. não tinha pensado naquilo. É verdade que na sua casa acabaram dividindo a cama, então não tinha muito problema com aquilo. Mas se pudesse escolher entre dormir juntos ou separados... ela escolheria separados... não é? Ela já não tinha certeza. Porque, bem, não era tão ruim assim dormir ao lado de . Não é como se ele soltasse puns fedidos durante a noite ou roncasse. De qualquer forma, aquele casamento todo era um fingimento então não precisariam se forçar àquilo. Não é?
  - Sim. Separados. – ela disse, meio mecanicamente, tentando tirar da cabeça a imagem da noite que passara em casa junto com ele. Forçou um sorriso e depois obrigou os músculos a se movimentarem. – Vou levar as malas para o quarto então, para começar a ajeitar as coisas enquanto ainda tenho força de vontade para fazer isso.
  - Eu te ajudo a leva-las até lá. – levantou também, mas antes que qualquer um dos dois pudesse dar um passo, uma coisa branca passou correndo entre eles, pulando as malas. – Miles!
  Ao ouvir o dono chamando, o gato parou e os encarou com um olhar de desdém. Ele era bem mais magro do que Bartholomeu, com o corpo praticamente todo branco mas com algumas manchas nos tons dos pelos do outro, e o rabo todo malhado. Soltou um miado agressivo e continuou correndo para um dos quartos.
  - Acho que ele está bravo porque passei muito tempo longe. Ele é um pouco mais ciumento que Bartholomeu, mas não se preocupe. Ele não faz nada. – disse, olhando com carinho para onde o gato desaparecera. surpreendeu-se ao ver aquele olhar no rapaz. Por algum motivo bem bobo, invejou o bichano.
  Levaram as malas para o quarto que seria de – já que descobriram que um dos quartos já estava lotado de caixas com as coisas de – e, recebendo uma ligação, ele a deixou sozinha para desarrumar a bagagem como queria. Ela mal havia começado a retirar as roupas quando ele voltou.
  - Desculpe, o Bill ligou e quer me ver no estúdio. Parece que temos que resolver umas coisas então tenho que ir para lá. Não sei que horas volto. Você fica aqui? – ele falou.
  - Sim, sem problemas. – não é como se ela tivesse alguma outra ideia para onde ir, e encontrar Bill de novo não seria tão prazeroso assim. - Vou arrumar minhas coisas. – ela sorriu. Ele concordou e acenou, saindo do quarto. Ela pôde ouvi-lo dizer algo para os gatos e depois bater a porta da frente, e de repente tudo ficou muito silencioso. suspirou.
  Pegou o iPod e selecionou a pasta do , que Maddy fizera questão de lhe passar para que ela tivesse a mínima decência de ouvir a banda do marido, colocando a música que mais gostara até o momento para tocar no alto-falante, assim não ficaria tão solitária. A voz de era deliciosa nessa balada chamada Pearl Eyes, e ela já estava até mesmo aprendendo a letra para cantar junto.
  Enquanto arrumava todas as suas coisas, Bartholomeu e Miles lhe pagaram uma visita. Bartholomeu chegou primeiro, já se enfiando dentro de uma mala relativamente vazia dela. Miles, um pouco mais tímido, demorou mais pra entrar na mala também, mas pareceu se divertir bastante quando o fez. tentava se distrair com a diversão dos animais, porque se deixasse sua mente viajar, ela ia acabar ficando cada vez mais deprimida.
  E ela não queria ficar assim porque ela não devia ficar deprimida! Ela e não eram nada além de um casamento falso, e temporário. Ela sabia e insistira nisso desde o começo, defendendo que preferiria divorciar-se a ficar junto com , até que o problema da banda entrou em jogo. Então por que o fato de ele sair e a deixar sozinha a abalava tanto? Ela queria passar mais tempo com ele, afinal, ele era seu único porto seguro naquele país totalmente desconhecido. Ela não saberia nem chegar ao supermercado que Bill mencionara mais cedo, sem contar que estava longe de suas amigas e pais. Mas também parte dela queria descobrir mais sobre , e não o que estava na mídia e sobre o qual ela poderia achar tudo na internet. Ela queria saber sobre aquele que acordara ao seu lado numa manhã em Vegas e que desde então tinha estado junto com ela. O que acabara de sair da porta e a deixara sozinha.
  Suspirou, cansada daquilo. Bartholomeu aproximou-se dela e aprumou-se em seu colo, ronronando alto. Ela sorriu e acariciou o pelo comprido.
  - Pelo menos tenho vocês aqui, não é? Mas vai ser bem difícil passar o tempo assim...
  Mais uma vez suspirou, e odiou-se por isso. O que ela era, uma menina bobinha apaixonada? Ela e eram adultos e estavam resolvendo a situação assim; não tinha que ficar amuada com essas besteiras infantis. Não é como se fosse para ser real mesmo, desde o começo.
  Como desistira logo de arrumar as malas, decidiu que estando sozinha em casa seria uma boa hora de buscar sobre e e descobrir o lado sombrio da . Mas assim que ligou o notebook, percebeu que não tinha a senha do Wi-Fi ainda e, uma coisa pior, não tinha o número do para ligar em caso de emergência. Não que seu celular estivesse funcionando fora do seu país, o que a impossibilitava inclusive de dar a seus pais e amigas mais notícias sobre sua chegada à Inglaterra (havia mandado uma mensagem com o Wi-Fi do aeroporto, já que tinha sinal antes daquela parte maluca de passar pelas fãs) e conversar com eles. Já estava começando a ficar com saudades deles, mas sabia também que eles tinham seus empregos e suas vidas e não poderiam ficar o tempo todo pendurados no telefone com ela. De qualquer forma, era um grande problema não ter o número de nem acesso à internet; como ele disse que não sabia que horas voltaria, ela também não tinha previsão nenhuma para comer já que não sabia onde era o supermercado nem nada do tipo. E ela estava ficando com fome, aquela porcaria de refeição do voo era impossível de sustentar uma pessoa por muito tempo.
  Decidiu ver a casa com seus próprios olhos para matar o tempo e ignorar as manifestações que sua barriga fazia, e como Bartholomeu ainda estava em seu colo, segurou-o com cuidado e levantou-se junto com ele. Ele era bem pesadinho mas ronronava satisfeito por ser carregado, e ela ponderou quantos cômodos conseguiria passar com ele naquela posição antes de desistir da jornada.
  O primeiro quarto que visitou depois do seu era o de hóspedes. Ele era bem menor e tinha dois colchões empilhados que poderiam servir como uma cama alta ou dois colchões individuais direto no chão. Um pequeno armário, cortinas simples para evitar a luz, não tinha muita coisa ali, então ela rapidamente passou para o próximo.
  Ela não pretendia demorar-se no quarto do , porque provavelmente era invasão de privacidade, mas deixando Bartholomeu em cima da cama (ao que ele miou em protesto) não resistiu à curiosidade e aproximou-se da caixa mais próxima e abriu-a apenas para espiar seu conteúdo, torcendo para não ser a caixa das cuecas. Por obra do destino ou de um demônio na pele de empresário, aquela caixa continha diversas revistas de fofoca. não tinha certeza se realmente colecionava as revistas que saía, porém aquela caixa parecia estrategicamente colocada ali para que uma esposa curiosa encontrasse. Mordeu o lábio inferior, considerando se deveria ou não mexer naquilo - não queria se render caso aquilo fosse um esquema de Bill. Entretanto, ela procuraria tudo aquilo na internet de qualquer jeito e ela teria que saber no que estava se metendo, logo, não haveria nada de errado em descobrir mais sobre o emprego de seu marido.
  Sentando-se ao lado de Bartholomeu, apoiou a caixa e retirou as revistas conferindo as datas. Depois de ter separado algumas – eram realmente muitas revistas e ela não queria passar a tarde toda lendo-as – pôs-se a pesquisar sobre e .
  Ao terminar sua pilha separada de revistas, encarava Bartholomeu um pouco chocada. Não sabia bem o que esperar, mas aquilo certamente fora inesperado. Quer dizer, fora até surpreendente. Pelo que ela entendera, ele não conseguia ir bem na escola não importa o quanto tentasse e isso lhe causou uma raiva pelas instituições e os professores que tanto o atormentavam por sua “burrice”, fazendo-o cometer diversos crimes de vandalismo. Logo depois da banda começar a estourar ele foi retido por algum tempo e aquilo marcou sua imagem, mesmo que estivesse tentando melhorar recentemente. Por ter feito aquilo, paparazzi sempre ficavam de olho em qualquer passo que ele desse para incriminá-lo de qualquer coisa, e mesmo incidentes com bebidas e mulheres eram tratados como um grande problema.
  O que, na verdade, comparado à não era. O baterista era justamente a imagem que tivera dele ao conhece-lo. Um grande safado que amava bebidas, drogas e mulheres. Os escândalos deles eram todos referentes a isso, mas seu ponto é que muitas vezes ele se envolvia com fãs – não groupies, fãs mesmo – e o pior acidente que aquilo levara foi o suicídio de uma delas por não ser amada de verdade pelo rapaz. Foi por causa disso que ele fora parar em uma entrevista individual com a tal Jess, que mencionara mais cedo. Para ele foi bom, já que no programa ele conseguira refrear um pouco a imagem terrível que estava se espalhando sobre ele e o caso foi mais controlado. percebeu aí o quanto aquela mulher era influente, e parou sua leitura aí, sem querer descobrir mais nada sobre aqueles dois e com dor de barriga pensando sobre o dia seguinte.
  Ela imaginava que, para o casamento de ela e ser tratado daquela forma, os dois tinham que ter feito muita coisa ruim. Ler sobre aquilo, porém, deixou-a com um gosto ruim na boca. Lembrava-se do rosto de feições bonitas de e seu jeito desleixado e sorriso maroto e imaginava-o naquela revolta que o levara à prisão. E , tinha aquele jeito de lhe chamar de gostosa e olhá-la com cobiça, mas o pensamento de alguém ter se suicidado por ele lhe deixava com dor de cabeça.
  Levantou-se, um pouco atordoada, e uma a uma guardou as revistas de volta à caixa. Sentiu que se Bill deixara aquelas revistas ali como um aviso para que ela soubesse onde ela estava se metendo. não conseguia deixar de imaginar se , mesmo sendo todo perfeito e adorável com ela o tempo todo, também não teria nada do tipo escondido dentro de si. Ela não percebeu nada nas revistas sobre ele, só que estava focando-se nos outros. E se algum dos títulos ali também se referisse a e algum escândalo horrível? Maddy saberia sobre isso e a avisaria, não é? Maddy lhe havia dito desde o começo que era o mais gentil dos três então não haveria problema para . Mas saberia Maddy tudo daquilo que acabara de ler? Sobre , sobre ? Por que ninguém nunca lhe falara nada e lhe deixara descobrir tudo por si mesma?
  Ouviu barulhos no andar de baixo, barulhos que gatos não fariam sozinhos, e olhou para fora da janela, reparando que já havia anoitecido. Percebendo que devia ser chegando, saiu rapidamente de seu quarto sendo seguida por Bartholomeu e desceu as escadas, antes checando se deixara as coisas em ordem no quarto dele.
  - ? – ouviu sua voz chama-la quando estava no meio das escadas e terminou de descê-las, aproximando-se da cozinha que estava com a luz acesa. Sentiu um cheiro maravilhoso de pizza e assim que chegou à porta deu um encontrão em , que pareceu surpreso em vê-la. – Ah, você já está aqui. Você é mais silenciosa que os gatos. – ele riu, afastando-se e olhando-a. De repente seu sorriso sumiu. – Você está bem? Está muito pálida.
  Ela gaguejou um pouco, pensando no que responder. Não tinha certeza se queria conversar sobre e agora. Tendo sorrindo ao seu lado já aliviara seus sentimentos, mas seu coração ainda estava apertado de tudo que lera e estava receosa do que seria na verdade. Antes que pudesse replicar, ele sorriu calmo.
  - Deve estar morrendo de fome, não é? Desculpe. Eu saí para o estúdio e esqueci que você não poderia fazer compras nem nada do tipo. Vamos comer, vem. – ele puxou-a pela mão e abriu as caixas das pizzas, servindo-a com uma fatia de marguerita. – Essa está boa?
  - Sim, obrigada. – ela forçou um sorriso. Realmente estava com fome e sede e puxou para perto de si uma das cervejas que trouxera. Ele, que se sentara à sua frente e servia-se também de uma fatia enorme, olhou-a surpreso. – O que foi?
  - Não sei. – ele soltou uma risada. – Acho que não imaginava você tomando cerveja. Quase comprei refrigerante para você.
  - Ei! – ela reclamou e ele riu mais uma vez. O peso em se esvaía aos poucos. Não teria como aquela pessoa à sua frente ter um passado obscuro, não é? E contara para seus pais como ele era, como sua família era. era , aquele quase príncipe dos contos de fadas que ela encontrara na vida real e acidentalmente se casara. Ela não tinha que se preocupar. – Não se esqueça que eu bebi tanto em Vegas que acabei até casada com você.
  - Ah, é mesmo. É certamente uma . – ele comentou com uma ponta de ironia antes de enfiar um pedaço de pizza na boca.
  - ! – ela apertou os olhos, apontando o garfo para ele, mas não fez mais nada além de rir.
  Continuaram a comer em silêncio, a refeição agora estava muito mais leve e sentia-se muito mais feliz. Iria se lembrar de nunca mais ler coisas ruins enquanto estivesse morta de fome.
  - Ah, lembrei. – disse de repente, mas parou antes para tomar um gole da cerveja. – Vamos repassar nossa história de passado direitinho e com vários detalhes. Temos que pensar em tudo que Jess pode querer saber e perguntar para respondermos sem hesitação. Como é a primeira vez que vamos a público, todos ainda vão estar muito duvidosos da veracidade desse casamento. – ele contou, remexendo o restante da pizza no prato dele. Já era seu quinto pedaço, enquanto parara no terceiro e agora só bebericava a cerveja.
  - Certo. – ela respondeu, tentando não aparentar todo o nervosismo que sentia. Falhou miseravelmente. lançou-lhe mais um de seus sorrisos adoráveis.
  - Se você estiver muito nervosa para falar, não fale, a menos que lhe perguntem diretamente. Isso vai reforçar aquilo de que você tem medo de público, e, sendo sua primeira entrevista, ninguém vai ligar para isso. – ele explicou.
  - Mas e se me perguntarem algo e eu não souber responder direito? – ela perguntou, temerosa.
  - Invente qualquer coisa. Eu vou assimilar o que você disser e adaptar pro que a gente tem em mente. Não se preocupe, . Vai dar tudo certo. – ele sorriu confiante e ela ficou tentada a se sentir assim também, mas ainda tinha um enorme medo de arruinar tudo apoderando-se de todo seu corpo.
  - Bem, eu não aguento mais. – ele disse, largando os talheres e reclinando-se na cadeira, colocando os braços atrás da cabeça. – Acho que seria uma boa tomarmos um banho e já irmos dormir. Como a entrevista é cedo amanhã, temos que descansar bem.
  - Certo. – não tinha nada a reclamar daquele plano. Depois de se alimentar, estava sentindo-se incrivelmente cansada.
  Deixaram a cozinha uma bagunça, mas subiram para os quartos em silêncio e desejaram boa noite um para o outro, como estranhos. , depois de uma ducha rápida, enfiou-se na cama e preparou-se para uma boa noite de sono.

  

Exceto pelo fato de que já fazia horas que ela estava deitada e não conseguia pregar os olhos. Encarava o teto, estranhando a cama, os lençóis, o peso de Bartholomeu – que parecia ter escolhido o quarto de como o seu favorito –, estranhava até mesmo o próprio pijama que trouxera de casa. Não sabia se estava nervosa ou sofrendo de jet lag, o fato é que não conseguia dormir de jeito nenhum. E faltava apenas algumas horas para a entrevista na TV com a tal Jess. Ela provavelmente ia estar parecendo um zumbi e a sua primeira impressão para o público seria horrível. Pensar nisso apenas a deixava ainda mais insone.
  Decidiu ir ao banheiro e, depois que terminou, pensou em checar se estaria sofrendo também. Tateando para buscar a saída já que estava escuro e desconhecia a arquitetura do quarto, encontrou a porta entreaberta do pior jeito possível: com a cabeça. Reclamando baixinho da dor e esfregando a testa, seguiu pelo curto corredor com a mão na parede até encontrar a porta do quarto de . Empurrou a porta também entreaberta e espiou. Como era noite clara e de lua cheia, mesmo que o quarto estivesse escuro ela conseguia ver graças à luz que entrava pela janela. estava em outro mundo, completamente apagado na cama. Vestia uma regata e estava agarrado a um travesseiro, parecendo confortável. Ela pensou que, sendo um artista que viajava de ônibus para turnês, dormir em qualquer cama já era muito melhor do que os bancos do veículo. Aproximou-se um pouco só para ter certeza que ele estava dormindo, mas logo se tocou de quão estúpida era aquela ideia. Mesmo se ele estivesse acordado, o que ela falaria para ele, invadindo seu quarto de madrugada?
  Dando meia volta para voltar ao seu cômodo e tentar dormir de vez, mal deu dois passos quando uma coisa branca passou rapidamente por ela e a assustou, fazendo-a recuar e tropeçar em uma das caixas de mudança, caindo com um estrondo no chão.
  Se não estava acordado antes, agora ele estava.
  - Bartholomeu? – ouviu o murmúrio sonolento do rapaz e levantou-se, sentindo-se explodir de vergonha. esfregava os olhos e ela não sabia o que fazer, querendo fugir. – Ah, .
  - Hm, oi. – o que mais ela poderia dizer?! gostaria de se enfiar numa das caixas e viver ali para sempre.
  - Não consegue dormir? – ele perguntou, aquela voz sonolenta e rouca carregada de sotaque arrepiando-a no pior momento.
  - ... Sim. – ela confessou, apertando a barra da blusa em nervosismo. sorriu, os olhos ainda meio fechados.
  - Vem cá então.
  - Quê? – ela perguntou, assustada. já levantava o lençol e deixava um espaço vazio para que ela entrasse. Entre o corpo dele e a beirada da cama. E ele parecia esperar. Era possível que ele estivesse com muito sono, certo? não sabia o que fazer, o rosto em chamas por ter se metido naquela situação. Hesitante, seu corpo se moveu quase por vontade própria – afinal, ela queria ficar perto de – e aconchegou-se no espaço que lhe era mostrado. O peito de tocava-lhe as costas e ela depositara a cabeça em um de seus braços, e o outro agora abaixava o lençol sobre ela, envolvendo-a. A respiração de estava absurdamente próxima e fazia a cabeça de revirar-se em êxtase. Ela engoliu em seco, estando aquecida e confortável e imediatamente começou a sentir-se sonolenta.
  - Desculpe por isso. – murmurou. Imaginou que já estivesse dormindo novamente, então surpreendeu-se ao ouvi-lo responder em voz baixa.
  - Não se preocupe. Você deve estar estranhando tudo aqui, então se eu posso ser o seu porto seguro e te fazer dormir em paz, eu vou ser.
   sentiu o rosto praticamente explodir ao ouvir aquilo, e apertou os lábios tentando refrear o sorriso bobo que queria brincar em seus lábios.
  E, quase inexplicavelmente, adormeceu logo depois como um bebê, como se não tivesse passado horas e horas em nervosismo e angústia, sofrendo com insônia.

Décimo Capítulo

  

ouviu à distância um som estranho, não o reconhecendo imediatamente. Na verdade, mal conseguia associar se estava acordada ou ainda dormindo. Talvez fosse um sonho. Quase certeza que era um sonho. Mas então ouviu um resmungo baixo e algo que a aquecia na altura da cintura moveu-se, trazendo-a um pouco mais perto da consciência.
  Ah, sim. Ela estava adormecida nos braços de , que agora se remexia por causa do barulho irritante que fazia parte da realidade. Uma realidade que ela estava adorando, por sinal. Ouviu o som parar e resmungar alguma coisa. O corpo de estava tão cansado que mal se moveu quando, num susto, o rapaz retirou o braço que estava por baixo da cabeça dela e sentou-se rapidamente, falando rápido em um sotaque tão forte que era quase indistinguível. Agora ela definitivamente acordara.
  - . . – O tom de era um pouco urgente e, se espreguiçando, ela abriu os olhos e encarou-o.
  Bem de perto.
  - Ah! – recuou um pouco, surpresa e embaraçada pela situação (só agora ela se lembrava de sua aventura noturna destruindo as caixas do quarto de até adormecer em seus braços). – Ah. Bom dia. – murmurou.
  - Sim, bom dia. – ele parecia nervoso, já pulando para fora da cama. Ela esperava que ele não estivesse bravo por ela ter entrado na cama dele no meio da noite, mas foi ele que a convidou. Sonolento, mas sim, a convidou. Antes que ela perguntasse se estava tudo bem, ele voltou a falar. – , precisamos correr. Estamos atrasados para a Jess.
  E com aquelas palavras o dia mais corrido da vida de começou.

  

Depois de um café da manhã apressado, de uma troca de roupas em que a garota só pegou a primeira roupa que tinha arrumado no dia anterior e uma higiene matinal em tempo recorde, o casal se encontrava na metade do caminho para o estúdio onde gravariam sua primeira entrevista ao vivo da televisão.
  Como se não bastasse todo o nervosismo por causa da situação, sentia-se ainda mais nervosa por estarem atrasados. Não estavam catastroficamente atrasados (ainda), mas só o fato de não poder chegar adiantada para fazer tudo com calma deixava-a uma pilha de nervos. Ela não tinha ideia do que fazer, como fazer, e ainda por cima não teria nem tempo para se preparar psicologicamente.
  , no volante, parecia quase tão nervoso quanto ela. Seu cabelo estava um pouco bagunçado, mas isso lhe dava um charme (enquanto parecia uma vassoura, malditos rockstars) e ele batucava levemente no volante, olhando com atenção para a estrada. Tentaram conversar, revendo o plano e a história toda, só que isso não durou muito tempo. Parecia que as palavras não iam sair, e mais uma vez preocupava-se se conseguiria falar qualquer coisa que fosse em público sem arruinar tudo.
  Deviam chegar às nove e meia, como Bill os instruíra, e por algum milagre divino às 9h27 cruzavam o portão do estúdio televisivo, depois de identificarem-se na portaria. A garota respirava um pouco mais calmamente agora, mas só porque conseguiram chegar no horário. Todo o resto lhe dava borboletas no estômago.
   estacionou numa vaga livre que sinalizava convidados e desligou o motor, sem tomar iniciativa de sair. Respirou fundo umas duas vezes e depois encarou , que esse tempo todo mantinha seus olhos nele, buscando qualquer coisa que a acalmasse. sorriu.
  - Fique calma, está bem? Vamos conseguir passar por isso. – ele esticou o braço e ajeitou uma mecha de cabelo nela.
  - Certo. – a voz dela fraquejou e ela virou o rosto para fora da janela, com vergonha de exibir o quão fraca se sentia naquele momento. Suas mãos já estavam vermelhas de tanto que se apertavam. Em certo momento, a mão grande de interpôs-se entre elas e interrompeu o movimento, apertando-as suavemente.
  - Eu vou estar do seu lado, lembra? – ele disse, apesar de ela ainda não olhá-lo. – Só seja a de sempre e o que combinamos. Isso vai ser suficiente.
  Ela virou-se para retrucar que agora que estava ali de verdade aquilo tudo parecia uma loucura e seria impossível, entretanto surpreendeu-se ao tê-lo perto de si novamente, inclinando-se para beijá-la na testa. Seu rosto esquentou e ela ficou sem palavras, apertando a mãos dele.
  - Vamos? – ele perguntou com um sorriso de canto e ela concordou com a cabeça, separando-se dele e abrindo a porta do carro. Assim que se encontraram na frente dele para seguir pelo estúdio, suas mãos automaticamente se entrelaçaram de novo e ela seguiu ao seu lado, levemente atrás dele como se estivesse se protegendo do que viria à frente. Estavam no mundo dele, e se ele não a guiasse, ela se perderia e cairia no limbo.
  Receberam crachás de identificação por um membro da staff vestido de preto e seguiram por corredores até encontrarem Bill, que encarava o relógio de pulso com ansiedade.
  - Até que vocês correram. – ele disse, tentando ser simpático mas tão nervoso quanto os dois. – Como estão?
  - Bem. Relativamente. – respondeu pelos dois, já que sentia-se como se pudesse desmaiar a qualquer momento, escondendo-se atrás dos ombros largos do marido e encarando tudo ao redor. – Repassamos tudo várias vezes, acho que dá tudo certo.
  - Tomara. Você sabe que a Jess te ama, e sabe lidar com ela. – Bill disse, enquanto começavam a andar. Eles falavam baixo, mas a equipe que passava pelos corredores também não parecia nota-los mais do que o suficiente para um cumprimento de cabeça apressado. – , estamos contando com você.
  Ela concordou com a cabeça, percebendo os olhos de de sobre ela. Engoliu em seco, olhando ao redor. Estavam agora entrando em uma sala de um corredor escuro, logo saindo numa área iluminada que mostrava vários camarins. Antes que pudesse se surpreender, duas moças apareceram na frente do casal e do empresário.
  - Sr. e Sra. , bem vindos. Vamos seguir para a sala de maquiagem agora. – disseram ao mesmo tempo e cada uma delas pegou um deles pelo braço e puxou-os em direções opostas. , afastada de , olhou-o uma última vez em pânico, mas ele lhe lançava um sinal tranquilizador e um sorriso amável, que dizia que tudo ficaria bem.
  Ela realmente queria acreditar naquilo.
  Foi levada para uma sala saturada de luz e, depois que sentou em uma cadeira na frente do espelho, foi maquiada. Fizeram uma maquiagem bem leve em seu rosto, destacando seus olhos cor de caramelo. O cabelo – que estava meio que uma bagunça catastrófica por causa da pressa matinal – foi arrumado com um secador apenas.
  Aparentemente sua roupa escolhida às pressas também não estava boa o suficiente, porque lhe foi entregue uma outra combinação para que trocasse para a entrevista. O estilo não era muito diferente do seu, mas era muito mais formal e arrumada do que a anterior.
  - Cinco minutos! – alguém gritou para dentro do camarim no momento em que a moça que a arrumava deu-se por satisfeita e aprovou-a com um sorriso. foi empurrada para fora da sala e encontrou-se no corredor novamente, onde Bill e a esperavam. Ela imediatamente corou enquanto olhava . Ele também estava um pouco maquiado, porém seu cabelo bagunçado nem parecia ter sido tocado.
  Aproximou-se dele querendo um abraço e chorar no ombro dele de nervoso, mas não pôde fazer nada porque da porta ao lado da qual estavam parados surgiu uma mulher jovem, magra e loira. Seu cabelo era chanel, perfeitamente arrumado sem um fio fora do lugar, e sua maquiagem realçava seus lábios e bochechas. Ela estava em um terninho feminino azul bebê e seu salto ecoava batidas enquanto ela caminhava com um sorriso largo até o casal.
   imediatamente reconheceu-a como Jess, mesmo antes de serem apresentadas. Percebeu que mais uma vez sua mão entrelaçara-se com a de , só não sabia quem tinha tido a iniciativa.
  - ! – o tom de voz e o sotaque dela eram lindos e seus olhos azuis faiscavam como estrelas ao observar o ídolo. Com os saltos, ela era quase do tamanho dele e parecia completamente ameaçadora para , que foi o próximo alvo das estrelas azuis. – E a esposa. – disse, aquele sorriso esticado de orelha a orelha colado em seus lábios. não tinha certeza se ouvira ou não um tom de ironia na voz de Jess, mas ignorou. Mesmo com as mãos entrelaçadas, deu um passo à frente de num ímpeto de coragem e sorriu da melhor forma que pôde.
  - Muito prazer, Jess. Sou . Espero que possa nos conduzir bem hoje. – falou, como sua mãe sempre falara para fazer educadamente no interior ao conhecer uma pessoa nova que cuidaria dela por um período de tempo, mesmo que curto. Era o que ela sempre falava na loja, quando o cliente era novo e os escolheram. Aquilo parecia ter sido há anos atrás. Ao ouvir suas palavras, os três ao seu redor pareceram levemente surpresos e ela imaginou se teria cometido um erro, voltando discretamente ao lado de e encolhendo-se de leve.
  Jess soltou uma risada entre escandalosa e angelical e olhou com muito mais interesse para .
  - Farei meu melhor, . – começou a afastar-se, acenando, já que entraria antes que o casal no programa.
  Ao vê-la longe, a garota murchou como se um peso tivesse sido retirado de dentro dela. Não sabia de onde viera aquela coragem que a incitou a tomar a iniciativa e falar, mas provavelmente a gastou inteira com aquele momento. Sentia que, se desse um passo sequer, desmoronaria em um montinho de pó. e Bill falavam algo, entretanto ela não sabia se era com ela porque mal ouvia. De repente, voltou à consciência, com passando os braços em volta dela e abraçando-a.
  - . – o tom dele soava como se estivesse achando graça e ela imaginou o motivo daquilo. Com o rosto apoiado no peito dele, porém, não conseguia pensar em muita coisa a fazer ou dizer. Respirou fundo e fechou os olhos.
  - e... e se eu entrar em pânico? Eu realmente não sou boa em falar em público eu... – ela exibiu suas inseguranças e se afastou dele, preocupada. – Isso vai dar errado!
  - Fica calma, . Não te falei? – disse, sorrindo. Ele parecia muito mais calmo agora por alguma razão. – Eu vou estar do seu lado então não vai ter nenhum problema. Além do mais, a ideia é que você tenha medo de público.
  - Sim. , você já foi ótima com essa atitude agora com Jess. Só mantenham-se fieis ao que combinamos e acho que tudo dará certo. Depois disso, tudo ficará bem mais fácil. – Bill complementou, depois de separá-los e apoiar a mão nos ombros dos dois, guiando-os pelo corredor.
  - Se perguntarem diretamente para você, você responde. Senão, pode deixar que eu cubro o que for preciso. – mantinha o sorriso amável e ela concordou com a cabeça, se sentindo um pouco melhor. Aproximaram-se da saída do corredor que dava para o estúdio montado em que gravariam. A sala era basicamente como todas as salas desse tipo de programa; um sofá roxo bem confortável para os convidados, com uma mesa de centro à frente servindo chá e bolachas, além de copos d’água. Ao lado do sofá roxo, a poltrona em que Jess sentava-se durante as entrevistas para conversar, mas o resto do programa ela apresentava de pé. Tudo isso estava intensamente iluminado, enquanto a plateia permanecia no escuro, ou pelo menos achava que havia uma plateia, já que não conseguia ver bem de onde estava.
  Enquanto Jess iniciava o programa, microfones foram colocados à roupa de e e eles aguardavam lado a lado, as mãos ainda entrelaçadas – embora as da garota estivessem começando a suar e tremer e ela envergonhava-se desse fato.
  - 30 segundos. – uma staff diferente das anteriores anunciou para eles, com o braço levantado para que não entrassem, não que estivesse com tanta vontade assim de pisar naquele palco iluminado. Sua barriga revirava-se novamente conforme a contagem regressiva aproximava-se dos números menores, e finalmente Jess, do palco, anunciou com uma empolgação absurda os convidados.
  - l).toUpperCase()) E SUA ESPOSA, ! – foi o que ela ouviu antes de ser puxada por para um mundo de luz e sons estrondosos de aplausos.

  

Inicialmente achou que sua maior preocupação seria a plateia, mas ao olhar para a frente a iluminação era tão forte que não conseguia ver nada além da câmera que os focalizava. Aquilo a tranquilizou de certa forma, e pôde focar-se em e Jess.
  - Ora, ora, ora. Se não é o grande casal do momento! – ela disse, o mesmo sorriso de sempre estampado em seu rosto como se fosse colado a ele. – Desde a grande notícia, vocês são o assunto mais comentado do mundo pop! – ela prosseguiu, convidando-os a sentar depois que eles cumprimentaram as câmeras timidamente. ainda mal conseguira produzir qualquer som, e imaginava que logo a staff trocaria o microfone discreto em sua camiseta por um megafone para que pudessem escutá-la.
  - Pois é. – deu uma risadinha nervosa. – As notícias realmente voam.
  - Mas vocês sabem que estão todos muito curiosos para saber de tudo, não é mesmo? Afinal, como pode nosso queridinho desaparecer por apenas alguns dias e voltar ca-sa-do! – Jess arregalou os olhos, olhando ao redor. Houve alguns sons de retorno da plateia e molhou os lábios com a ponta da língua, o nervosismo crescendo mais e mais.
  - Eu fiquei meio receoso quanto a dar a notícia dessa forma, afinal, podia trazer um choque inesperado, certo? Mas decidi arriscar. Infelizmente parece que está sendo uma notícia um pouco mal recebida, as pessoas estão interpretando errado e julgando muito, tanto eu quanto . – ele respondeu, apontando de leve para que só fez concordar com a cabeça por não ter outra alternativa. falava muito bem e ela provavelmente ia estragar tudo se abrisse a boca para comentar sua opinião.
  - Espera. – Jess fez um sinal de “pare” e mais uma vez olhou ao redor. – Quer dizer que você queria dar a notícia dessa forma? Como um escândalo?
   pareceu sem graça, percebendo a gafe que dissera. Antes que pudesse corrigir, , pensando rápido, saiu em uma missão suicida tentando salvá-lo.
  - O que quis dizer... – ela começou em voz baixa, surpreendendo tanto Jess quanto , que mudaram sua atenção como se tivessem acabado de descobrir que ela estava ali. – É que... eu... eu fico um pouco nervosa na mídia e tudo mais... então ao invés de fazermos uma conferência... e esse tipo de coisa... – ela engoliu em seco, sem ter certeza se o que estava falando ia ajudar ou não. – Preferimos só liberar as gravações que chegaram a nós, ao invés de oprimi-las... assim a notícia seria dada... – sua voz foi sumindo aos poucos e ela olhou para , buscando ajuda para que ele continuasse.
  - Sim. – ele disse, voltando-se a Jess. – ... ela fica bem insegura na mídia. – ele soltou um riso nervoso e apertou a mão dela. – Por isso também nunca revelei nada do relacionamento. Então, quando saíram aquelas imagens e vídeos do casamento e nós tivemos conhecimento delas, decidimos que era melhor lança-las do que montar uma conferência e anunciar tudo subitamente. Eu queria deixar as coisas mais confortáveis para , já que depois do casamento ela estaria se mudando para cá e mudando totalmente a vida dela. A gente não sabia que ia acabar indo tanto para esse lado negativo, que as pessoas desconfiariam tanto. – ele explicou melhor a ideia de e ela concordou com a cabeça, sorrindo um pouco insegura.
  Jess olhou para os dois por um tempo, quase desconfiada, e depois concordou com a cabeça, como se tivesse compreendido.
  - Então vocês já se conheciam há muito tempo? – ela arqueou as sobrancelhas.
   concordou e começou a contar a história que Maddy e Loren haviam elaborado, e todos os detalhes que combinaram anteriormente. também intrometia-se às vezes, soltando-se um pouco mais e acrescentando detalhes. Ao fim dessa parte, Jess já parecia muito mais confortável com o casal e um pouco mais convencida da história deles. Por isso, o casal já estava muito mais aliviado e conseguia lidar melhor com a entrevista. estava mesmo acreditando que as coisas iriam bem.
  - A maior parte do nosso tempo já passou! – Jess comentou, e sons desapontados surgiram da plateia. mal podia acreditar que o tempo estava passando tão rápido. – Mas ainda teremos mais uma parte do bloco com o casal do momento, assim que voltarmos dos comerciais! – ela anunciou como se aquilo fosse uma propaganda de pasta de dente e um som foi ouvindo indicando a pausa. – Muito bem, queridos. Podem descansar um pouco, fiquem à vontade para tomar água e comer alguma coisinha, vou retocar minha maquiagem e logo voltaremos! – ela avisou piscando para eles e saindo por um corredor.
  Tanto quanto relaxaram o corpo ao vê-la se afastar. A garota abanou-se um pouco, sentindo-se encalorada por causa da intensidade dos holofotes. aproximou o copo d’água para ela e ela agradeceu com um sorriso.
  - Acho que estamos indo bem. – ele disse, recostando-se e passando um braço por cima dos ombros dela. Ela tomou um gole da água tentando não se afogar com a reação dele, mas lembrou-se que ainda estavam em um lugar público e pessoas os observavam, então tinham que agir como o casal que estavam sendo.
  - Sim. Você acha que ela está acreditando? – olhou-o, um pouco insegura. Ele deu ombros e pegou o copo que ela segurava, tomando um gole também. Ela se perguntava como ele conseguia fazer tudo aquilo tão naturalmente quando ela tinha que controlar-se para não ter um ataque só de imaginar dividindo-se o copo com ele.
  - Jess não é levada muito facilmente. Acho que ela está mantendo nossa história por enquanto porque estamos parecendo firmes. Mas não podemos baixar a guarda até o fim. É capaz de ela ainda perguntar alguma coisa que vai nos quebrar a perna. – murmurou, devolvendo o copo para ela e focando-se em mexer em uma mecha do cabelo dela. Depois, enquanto ela o olhava, inclinou-se e depositou de leve um beijo em seus lábios, quase como um gesto gentil. Ela tentou não parecer muito surpresa, mas o difícil era fazer seu coração desesperado cooperar. – Você é uma esposa muito boa, sabia?
   nunca soube se realmente quis dizer aquilo, ou se apenas dissera porque no segundo seguinte ouviram um pigarro seguido de uma risadinha, e Jess estava de volta com um sorriso misterioso, sentada na poltrona os observando.
  - Não estamos no ar, estamos? – perguntou, sentindo a cara queimar de vergonha e apertando o copo que ainda segurava. Jess soltou outra risada.
  - Não, não se preocupe . Vamos entrar em um minuto. Ajeitem-se como preferirem, eu pessoalmente adoro a cena de agora. – seus olhos brilhavam mais que nunca, analisando-os.
  - Obrigado, Jess. – disse, sorrindo-lhe de volta. Ele apenas ajeitou-se um pouco, mas manteve o braço por cima de , acomodando-a.
  Ouviram a contagem regressiva mais uma vez e estavam no ar novamente, com Jess introduzindo-os animadamente. Eles não teriam muito mais tempo, então só teriam que aguentar firme. No começo da segunda parte, ela perguntou a eles como era morar junto depois de terem lidado com uma relação à distância, como eram os gatos de , como a banda estava lidando com aquilo e a reação das fãs. Mostraram também um quadro em que os telespectadores interagiam através do Twitter e, propositalmente ou não, vários tweets de apoio ao casal foram lidos em tela, deixando um pouco animada em relação àquilo. Talvez simplesmente tivessem ignorado os tweets cruéis – como aquele cartaz no aeroporto – para não criar uma imagem ruim, mas se o fizeram ou não, não se importava. Era um grande apoio ter aquelas mensagens ali.
  Quando ela pisara no estúdio pela primeira vez, achava que a entrevista ia durar uma eternidade, mas passara realmente rápido, e agora estava no fim. Era a última pergunta, segundo Jess anunciara, mas ela ainda não havia dito nada, criando um minutinho de suspense.
  - Bem... muito bem... – Jess de repente parecia mais séria, e com seu estômago afundando vários centímetros devido ao nervosismo, percebeu que aquele era o momento que mencionara; Jess estava deixando para aquele último segundo para perguntar algo que os quebraria ou não, dependendo de como eles respondessem. E assim que os olhos azuis encararam – dessa vez com um pingo de crueldade neles – ela soube que seria ela quem teria que lidar com aquilo. – Essa pergunta será direcionada especificamente para ... afinal, você é o motivo de estarmos tão curiosos! – ela sorriu, mas toda a segurança que a garota estivera construindo até o momento se esvaíra com aquele sorriso. Ela também pôde sentir os músculos de por cima de seus ombros retesarem-se, ansioso do que seria perguntado. – Percebemos por essa entrevista aqui que você realmente tem medo de público... não se sente confortável na frente das câmeras ou falando muito. Nós pudemos perceber logo no começo da entrevista que você estava morrendo de medo, coitadinha. – Jess soltou uma risadinha. - Fico feliz que tenha se descontraído conosco. Mas... essa pergunta não sai da minha cabeça. Por que, agora, depois de todo esse tempo, você decidiu se revelar para nós?
   sentiu o ambiente ficar pesado novamente como no começo da entrevista, e tudo ficou quieto, enquanto e Jess esperavam a resposta dela. Ela quis disfarçar o nervosismo que voltou a se instalar nela, mas não teve certeza se alcançou esse objetivo. Engoliu em seco e baixou os olhos, tentando pensar em algo. Não tinha conversado sobre isso especificamente com . Não entraram em detalhes, ou se entraram, ela não conseguia se lembrar de jeito nenhum. Eles não poderiam ter esquecido de falar sobre aquilo, certo? Então por que sua mente estava em branco? Enquanto os segundos passavam e Jess alargava seu sorriso quase de forma vitoriosa, sentiu tomar fôlego. Ele ia responder por ela? Falar que não queriam falar daquilo? Mas e se daí desconfiassem? E a pergunta era para ela. Ela deveria responder ou tudo seria arruinado. Ela já fora até ali, não podia estragar tudo naquele momento. precisava dela. Ele não podia responder.
  - Porque...! – ela falou rápido, para que interrompesse o que quer que fosse falar, e ele a olhou. Ela mordeu o lábio inferior, tentando pensar o mais rápido possível enquanto respirava fundo. Jess ainda mantinha o sorriso, parecendo voraz e faminta pela sua resposta, nem parecia mais humana, parecia um lobo olhando sua presa. suava frio, mas continuou como possível. - Porque... mesmo... mesmo sendo famoso, e tendo... diversas garotas querendo estar em meu lugar... e mesmo eu tendo medo de sair em público e começar a criar rumores sobre mim... mesmo que eu tenha vivido nas sombras e em outro país até agora... eu ainda sou uma mulher normal, e também é um homem normal. – agora que o pensamento se desenvolvera melhor em sua mente, ela arriscou seguir com mais confiança. - Eu não achei justo, comigo mesma, com , que eu fugisse desse relacionamento por causa de um medo bobo de que os outros estragassem a minha vida. Eu sou só uma mulher, e é só um homem. Nós devíamos poder ter um relacionamento normal como qualquer outro casal. E o fato de eu me restringir por medo de algo que ainda ia acontecer, e que talvez nem acontecesse, era ridículo. Eu... quis sair disso. Não me importo se for famoso, advogado ou catador de lixo. - Ela podia sentir o olhar do marido nela, também surpreso e ansioso pelo fim da resposta. – Eu... eu o amo pelo que ele é como pessoa, e quero tê-lo ao meu lado como qualquer pessoa normal quer aquele que ama. E vou lidar com qualquer coisa que estiver no caminho do nosso relacionamento, porque como mulher normal, eu só quero ser feliz.
   não teve certeza do quanto de verdade que existia naquelas palavras e o quanto fora inventado, mas sentiu que pelo menos tinha sido confiante o suficiente pois o sorriso faminto apagara-se do rosto de Jess e ela encarava-lhe, assim como , completamente surpresa.
  Todo o auditório, set de filmagem, palco, todas as pessoas estavam em silêncio, mesmo depois de vários segundos. sentiu a confiança que se instalara em seu peito se esvair pouco a pouco e ela murchou, quase se escondendo definitivamente atrás de .
  As coisas aconteceram rápido demais, e ela não soube a ordem exata delas. Houve um barulho ensurdecedor de aplausos, gritos. As luzes voltaram a ficar fortes nos olhos dela, enquanto Jess soltava exclamações surpresas e excitadas. só realmente percebeu o que aconteceu depois que já tinha seus lábios colados ao dela com carinho.

Décimo Primeiro Capítulo

  

O beijo não durou tanto quanto provavelmente imaginava que tinha durado. Em questão de breves segundos já havia afastado seu rosto do dela, encarando-a com bochechas levemente coradas e um sorriso largo no rosto. A garota podia ainda ouvir ao fundo aplausos e gritos e Jess falava algo com muito entusiasmo, mas ela não prestava atenção em nada mais além das íris castanhas do homem à sua frente. Reunindo todo pingo de concentração em seu corpo, ela decidiu voltar à Terra e prestar atenção no que estava acontecendo, afinal de contas, ainda estavam no ar.
  - Não acredito que temos que dizer adeus a esse casal lindo justo agora depois dessa grande revelação! – o tom de Jess era bastante empolgado e seu sorriso satisfeito alcançava os brincos de pérola que ela usava em cada orelha. Seu olhar brilhava mais do que nunca enquanto ela trocava o foco dele entre a plateia e o casal. Tudo estava muito ofuscante para naquele momento. – Senhoras e senhores, o casal mais fofo do ano: os !
   puxou uma esposa ainda um pouco atordoada pela mão para que se levantassem, sorrindo tão largamente quanto Jess. A garota ainda estava perdida, mas forçou um sorriso também e passou os braços pela cintura do marido, mais porque suas pernas tremiam do que para incentivar a imagem de casal fofo. Eles acenaram e depois ele a puxou para fora do estúdio, onde tudo estava escuro.
  Chegando lá, ainda ouviu alguns aplausos da equipe e elogios. Seu coração parecia que ia explodir no peito e uma sensação estranha lhe afundava o estômago. Encontraram Bill, que parecia extremamente satisfeito e deu-lhe tapinhas no ombro. Ela odiava-se por estar tão atordoada por causa de um beijo inesperado. Não é como se fosse o primeiro beijo que ele tivesse lhe dado. Ela era realmente muito tola. Como tinham saído de todo o clarão que era o estúdio para o backstage bem mais escuro, ela mal enxergava as coisas ao seu redor, sentindo seu rosto ficar quente aos poucos por algum motivo.
  - . – ouviu a voz de e olhou-o no momento em que ele colocava as duas mãos espalmadas em suas bochechas, aproximando-se mais uma vez dela. Ela nem tinha recuperado o fôlego e ele já estava fazendo aquele tipo de coisa de novo. E ela ansiava por aquela sensação, mesmo que lhe tirasse todo o oxigênio do corpo e lhe causasse aquele peso em seu estômago.
  Mais uma vez os lábios dele a tocaram gentilmente, dessa vez em diversos selinhos enquanto ainda segurava o rosto dela. Era como um sonho para . Provavelmente era um sonho. Ela devia ter desmaiado na pressão de responder a pergunta de Jess e agora estava em coma sonhando com tudo aquilo. soltou seu rosto e lançou os braços por cima dos ombros dela, apertando-a contra ele.
  - , já acabou. Fica tranquila.
  É mesmo. Já tinha acabado. Ela podia respirar em paz.
  Irônico, pois ela mal podia respirar.
   sentia que poderia chorar a qualquer momento, mas não queria chegar a esse ponto. Afastou-se de , lembrando-se que nos últimos segundos estava tão atordoada que nem sabia que cara fizera para as câmeras, e seus olhos preocupados denunciaram o que viria a seguir.
  - No palco... as câmeras...! – ela não podia ter feito uma cara de atordoada em público, certo? Ele sorriu e acariciou o rosto dela com carinho.
  - Você foi ótima. Foi genial. Não se preocupe. – ele rolou os olhos vendo que ela ia ter um ataque de ansiedade caso ele demorasse mais para responder. sorriu mais uma vez. – Está tudo certo.
  - Eu não teria tanta certeza, querido. – ouviram atrás de si e soltaram-se num susto, observando Jess e seu sorriso. Era intervalo novamente e ela viera falar com os dois.
   sentia-se petrificada. O que Jess queria dizer com aquilo? Ela não acreditara nos dois? Apesar de tudo aquilo, apesar de até ela mesma estar acreditando naquela farsa, Jess não acreditara? também parecia confuso, mas postara-se à frente de em um modo protetor. Jess apenas sorria. O casal aguardava em silêncio e logo a apresentadora prosseguiu.
  - Como está, ? Deve ter sido muito difícil ficar na frente das câmeras, não é? – Ela perguntou, como se fosse a pessoa mais simpática do mundo e não tivesse acabado de dizer uma bomba que poderia mudar todo o futuro de e de . – Devo dizer que foi uma encenação magnífica.
  Então era aquilo. Jess sabia da verdade e não fora boa o suficiente para salvar a . Mesmo que sua parte não fosse ser tão prejudicada naquilo como a de seria. E ela já se importava mais do que o bastante com para simplesmente ignorar aquilo. Mas então...
  Se Jess sabia que era uma encenação, por que não tinha exposto os dois durante o programa? Não era isso que ela fazia? tinha imaginado que era uma questão de vida ou morte aparecer na Jess do jeito que e Bill haviam reagido àquela entrevista. Em busca de compreender a situação, ela olhou para o marido, que encarava a apresentadora com uma expressão levemente tensa. Pelo visto, ele também não entendia muito o que estava acontecendo. Jess ainda mantinha aquele sorriso no rosto e estava começando a incomodar , que queria que ela resolvesse logo se ia arruinar a vida deles ou não.
  - Que bonitinhos. Estão tão surpresos. É fácil ver como convenceram todo mundo. – ela comentou, juntando as mãos em frente ao corpo. – Mas eu lido com pessoas o dia inteiro, e não sou enganada tão facilmente. Mas bem, foi bonito.
  - Mas você não dedurou a gente. – soltou, depois arrependendo-se pois não tinha pensado na possibilidade de a apresentadora estar jogando verde para colher maduro. não pareceu se importar e Jess apenas riu, então ela supôs que estivesse tudo bem.
  - Oras, eu por acaso tenho um coração de ferro? – o sorriso branco dela quase ofuscava seus olhos azuis, que brilhavam tanto com interesse que ela toda parecia uma estrela gigante. – A sorte do é que eu gosto muito dele. – soltou uma risadinha. – E amo o fato de ter um membro da me devendo algo.
   não entendia muito bem, mas supunha que era assim que o mundo dos famosos funcionava. Ter alguém endividado era algo muito mais valioso do que o dinheiro. Apesar de que ela não imaginava o que a apresentadora poderia querer de .
  - Além do mais, - Jess continuou. – ver vocês tentando tanto me fez imaginar que há um motivo por trás disso tudo. Provavelmente algo a ver com e . – ela deu ombros, ouvindo que voltaria ao estúdio em um minuto. – Acho que eu não seria tão impiedosa de destruir tudo dessa forma, quando vocês na verdade até que formam um casal bonitinho. – ela soltou outra risada e deu um aceno por cima do ombro, enquanto se afastava em direção ao grande palco de luz.
  Mesmo depois de ela desaparecer, não soube bem o que fazer. Agora definitivamente queria chorar, e sentia que nem se passasse o dia todo chorando seria o suficiente, mas provavelmente sairia correndo antes. Preferiria morrer a deixar vê-la chorando. Ele mesmo não estava reagindo, parecendo inseguro.
  - , vamos. – foi a voz de Bill que os incentivou a mover-se, surpresos. tinha completamente esquecido da presença dele ali com Jess ofuscando a cena. entrelaçou suas mãos, mas continuava sem olhar para ela, e ela se perguntou se ele estaria bravo por não ter conseguido provar pra Jess que aquilo era real.
  Os três foram até os camarins, onde pegou sua roupa de volta, e depois saíram juntos. recebeu uma ligação e afastou-se para atender, enquanto a garota ficou a sós com Bill, o que não lhe agradava muito. Imaginava que ele começaria a gritar com ela ou reprova-la por não ter agido direito. Ela ainda estava confusa sobre as ações de Jess e, depois de beijá-la daquela forma, ela nem sabia se ia conseguir se recuperar direito algum dia.
  - ... – Bill começou assim que afastara-se o suficiente. Ela o olhou, insegura. – Obrigado por hoje. Você foi muito bem, parecia mesmo que estava apaixonada por . – ele deu um sorriso cansado, quase paternal, e ela corou sem saber como reagir àquilo. Bill estava mesmo elogiando-a. E mais, estava falando que ela parecia apaixonada por , o que significava que ela continuava horrível em esconder seus sentimentos como sempre fora. – Obrigado pelo seu esforço em nos ajudar.
  - Mas ela não acreditou. – murmurou, sentindo-se derrotada. Queria que voltasse para ela o abraçar de novo e aí ela poder chorar. Ou queria ir para casa e abraçar Bartholomeu e ficar ouvindo seu ronronar pra sempre. Enquanto chorava.
  - Isso não importa. – Bill rolou os olhos. – É claro que convencê-la era importante, porque esse mundo da fama é bem complicado. Mas se ela não nos revelou ao mundo e vai manter o conhecimento em segredo, que era o mais importante, está tudo bem porque conseguimos isso. Toda aquela plateia e todos os telespectadores provavelmente acreditaram e tudo vai ser muito mais fácil a partir de agora. – ele explicou, fazendo-a se sentir um pouco melhor. retornou ao lado deles neste momento.
  - e viram a entrevista, querem sair conosco para almoçar. – ele disse, olhando para . Ele já não parecia mais tão preocupado e ela aliviou-se. Sorriu fraco para ele, concordando.
  Então lembrou-se de tudo que lera sobre e no dia anterior e mais uma vez ficou insegura em encontra-los. Odiava que desde que conhecera sua vida era uma grande montanha-russa de sentimentos, ora felizes, ora tristes, ora confusos, ora inseguros. Estava difícil de lidar. No momento, só conseguia pensar em como reagiria, principalmente com , que fora a causa da morte de uma pessoa. Mas , como sempre, veio em seu auxílio.
  - Não fique com essa cara. – ele sorriu, segurando sua mão mais uma vez. – Apesar de tudo eles ainda são meus amigos, não são? – mesmo que não tivesse contado para que tinha pesquisado sobre eles, ele parecia saber. Ela corou e concordou com a cabeça.
  Bill despediu-se deles e eles voltaram para o carro, agora um pouco mais aliviados do que estavam na última vez que haviam estado nele. colocou o endereço do restaurante onde encontrariam e no GPS e seguiram viagem.

  

O restaurante parecia um pouco chique, fazendo imaginar se aquilo seria algum tipo de comemoração pela atuação do casal no programa. Durante o percurso até ali, ela e mal trocaram palavras, e quando o fizeram evitaram principalmente falar do que tinham acabado de fazer. não sabia se estava bravo de alguma forma, mas preferiu não tocar no assunto. Não é como se o restaurante fosse tão longe também, a ponto de fazê-los ter tempo de ter uma D.R. completa dentro do automóvel.
  - Ah, esse restaurante é muito bom. Você gosta de comida italiana, não é? – ele sorriu-lhe, parecendo finalmente tranquilo. Ela sorriu também. – Spaghetti, se não me engano?
  - Você lembra? – ela riu, um pouco sem graça. Tudo bem que fazia só dois dias que tinham conversado sobre os gostos dos dois durante o voo até a Inglaterra, mas acontecera tanta coisa que ela se surpreendera de ele lembrar desse pequeno detalhe. – Sim, é o que mais gosto.
  - Você vai adorar aqui então. Tenho quase certeza que eles têm molho pesto também. – entrelaçou as mãos dos dois e puxou-a para a entrada.
  Click.
   teve quase certeza que ouvira o som de uma foto ser tirada em algum lugar, mas não teve tempo de olhar ao redor para ver se seria um paparazzo ou alguma fã. Já estavam dentro do restaurante e conversava com o maître sobre a reserva feita. Antes que pudessem terminar de conversar, porém, seus nomes foram chamados e e acenavam de uma mesa do canto. O restaurante não estava muito cheio, apesar do horário, e eles seguiram até os membros da sem problemas.
  - E chega o casal do momento! – comentou, imitando um apresentador de televisão, enquanto imitava com a boca um rufar de tambores. riu e sorriu tímida, acenando para os dois.
  - E aí . – piscou para ela, cumprimentando-a e ela se sentiu um pouco desconfortável. Mas lembrou-se do que lhe dissera ao saírem do estúdio, que apesar de tudo e ainda eram os amigos dele. Ela devia tratar bem os amigos do cara que gostava, mesmo em um romance falso, certo?
  - Bom dia. – ela lançou-lhe um sorriso, assim como para .
  Logo depois os cardápios foram entregues e ela se sentiu imensamente feliz por ver que, como dissera, havia spaghetti ao molho pesto ali. Os garotos comentavam sobre a entrevista com Jess, mas ela não estava tão interessada assim em reviver tudo aquilo que passara então manteve-se quieta a maior parte do tempo.
  Quando os pratos foram colocados na mesa, porém, e trocaram um olhar suspeito e inclinaram-se na mesa, olhando para . A garota encarou-os confusa, e olhou para tentando entender o que estava acontecendo tão subitamente, mas o rapaz estava bastante ocupado despejando queijo ralado em cima de seu prato.
  - . Nós temos uma coisa para dizer. – começou, entrelaçando os dedos na frente do prato e parecendo um pouco envergonhado pela primeira vez na vida. concordou com a cabeça, parecendo meio embaraçado pela situação também. Situação que ainda nem entendera.
  - Nós sabemos que você leu ou descobriu sobre as coisas que a gente fez no passado. – continuou, surpreendendo-a. – Você parece estar desconfortável com a gente desde que chegou. – ele deu uma risadinha, como se respondesse a ela como eles sabiam daquilo, apesar de ela estar se esforçando tanto.
  - Não é bem... – ela tentou dizer, sentindo o rosto esquentar.
  - Ah, é sim. – cortou aquela atitude recatada e se largou para trás na cadeira, ainda encarando-a. não soube o que dizer, por isso apenas esperou. – Eu e fizemos muita merda no passado e, mesmo que não sejamos uns santos hoje em dia, estamos tentando nosso melhor. A gente sabe o nível das coisas que fizemos, mas...
  - Ainda assim, ficou do nosso lado e não deixou o nosso sonho estúpido adolescente acabar. – falou, sem encarar . Este ainda parecia bastante ocupado com sua comida, e desconfiava que todo aquele “desinteresse” era proposital, para que os dois se sentissem menos desconfortáveis com a cena. Ela controlou um sorrisinho bobo que queria nascer em seus lábios. – E mesmo você... você que até menos de uma semana atrás não teve nada a ver com a gente... está fazendo tanto pela gente.
  - A gente quer agradecer você de alguma forma, em suma. – foi direto ao ponto e ela arregalou os olhos levemente.
  - Me agradecer? – ela repetiu. pigarreou.
  - Bom, é óbvio não? Você está se esforçando pela banda e está salvando a gente de uma enrascada daquelas. e têm se comportado bastante nos últimos tempos, mas a mídia não esquece. Qualquer coisa é motivo para quererem afundar a gente. – ele finalmente se intrometeu, olhando para ela. – Se você não fosse quem você é, a gente provavelmente estaria numa encrenca ainda maior com a mídia e a acabaria. Você sabe disso.
  Ela sabia. Mas ouvir aquelas palavras saindo dos lábios de foi a melhor coisa do dia dela. Ainda bem que ele se intrometera naquela hora.
  - Sim. – concordou com a cabeça. – Nós vamos nos esforçar também, ainda mais a partir de agora, para que você não faça tudo sozinha. Você não tem nada a ver com isso e a culpa de todos esses problemas é nossa. Por isso vamos te agradecer apropriadamente no tempo certo. Por enquanto, espero que permita que nós nos apoiemos em você mais um tempo.
  - Nós sabemos que estamos sendo egoístas. – aquilo saindo da boca de quase a surpreendeu mais do que as palavras de e a situação toda. Ele pareceu bastante envergonhado de ter que dizer aquilo, mas não desviou os olhos dos dela. – Mas por favor, nos ajude mais um pouco.
   estava, em fato, um pouco chocada com tudo aquilo. É claro que a primeira impressão que tivera deles não foi muito boa, no meio daquela confusão de se descobrir recém-casada com um ícone do pop mundial em plena Las Vegas. Os dois chegaram a assustá-la um pouco, ainda mais por causa de toda tensão do momento. A segunda impressão não melhorou em nada; depois de ler tudo o que eles fizeram, achou que nunca ia conseguir encará-los direito de novo. Mas ali estavam eles, na terceira impressão, surpreendendo-a. Eles pareciam... normais. E ela percebeu que estava fazendo um fuzuê maior do que o necessário. e eram caras que tinham feito coisas erradas na vida, mas não queria dizer que eram pessoas ruins o tempo todo. sempre tivera um bom sexto sentido em relação às pessoas que conhecia – um dos motivos pelo qual concordou em ajudar – e, apesar de seu sexto sentido ter se enganado no começo a respeito dos dois, ela agora percebia que não tinha motivo para temer os dois. Ela estava salvando aquilo que mais importava para eles, e, por isso, eles se sentiam agradecidos e se esforçariam também. Era uma coisa boa.
  Ela sorriu, olhando os três que a encaravam esperando por uma resposta.
  - Achei que estava claro que, de qualquer forma, eu me esforçaria para ajudar por três meses. Vocês não precisam se preocupar. Eu vou cumprir isso de qualquer forma. Agora a é algo importante para mim também, e eu vou ajudar vocês a salvá-la. – ela respondeu, corando um pouco por já estar considerando tanto uma banda que até uma semana atrás nem conhecia. Mas aquilo era culpa de . Queria que sempre sorrisse do jeito que agora sorria ao ouvi-la dizer aquilo.
  - Obrigado!! – os três disseram ao mesmo tempo, e abraçou-a de lado.
  - Eu disse pra você que você tinha que continuar casado com ela. – rolou os olhos pegando o copo e tomando um gole enquanto olhava . – Você não vai achar ninguém maravilhosa assim de novo.
   havia começado a comer seu prato, que já estava frio, mas não se importou com isso, porque em resposta ao que dissera, apenas sorrira. O gosto de ele não negar que casar com tinha sido bom foi melhor do que qualquer spaghetti ao pesto que ela comera a vida inteira.

Décimo Segundo Capítulo

  

nunca entendera plenamente a teoria da relatividade do tempo até se mudar para a Inglaterra, recém-casada com um ídolo pop. Ela achou que o tempo passaria lentamente, mas em duas semanas na terra da Rainha ela tivera tantas entrevistas em revistas, canais televisivos e até mesmo em uma rádio, que, quando se deu conta de que estava ali na Inglaterra há duas semanas, chegou a se assustar. E então de repente, depois de toda essa correria e de estar ao lado de o tempo todo no mundo dele, as coisas pareceram se acalmar subitamente, e ela encontrou-se morrendo de tédio na terceira semana.
  É claro que eles ainda eram a notícia do país na área da música, mas as entrevistas gravadas começavam a sair por volta daquela época, e não havia outras para gravar por enquanto. E se havia, era apenas com o , que era quem importava na história. era parte do escândalo por ser a esposa, mas se o não fosse o , aquele bafafá não teria a repercussão toda. E , como ela mesma suspeitara desde o início, não era lá grandes coisas para chamar tanta atenção assim. Como sempre ficava muito quieta nas entrevistas, já passara sua mensagem principal: era uma garota tímida que não gostava da mídia e contava a mesma história sempre. Para que as pessoas do ramo da comunicação iriam querê-la quando poderiam ter a mesma história contada por um cara sexy e maravilhoso, que renderia muito mais audiência?
  E então ela ficava em casa enquanto ele trabalhava e saía em entrevistas o dia inteiro. Ela checava as redes sociais e ler notícias e comentários com a tag Helle, nome do ship decidido pelas fãs de , acabara se tornando um hobby. percebia que havia bastante apoio da parte das fãs, mas que a aceitação não era completa. Muitos daqueles comentários na tag não eram carinhosos, e muito menos de apoio ao casal. Ela tinha que evitar deixar-se levar muito por eles, ou acabaria estacando na depressão.
   normalmente era bastante positiva e não se deixava levar por depressão ou sentimentos negativos, mas encontrava-se em um país completamente desconhecido, falando com seus pais e melhores amigas apenas algumas horas por dia por conta do fuso horário, sem ninguém por perto além de seu marido – que, aliás, era falso. Ela não conseguira descobrir nada em relação aos sentimentos dele ou avançar no relacionamento com mais do que já tinha conseguido fazer. O motivo maior para isso, infelizmente, é que desde que as entrevistas que ela participava acabaram, ela mal se encontrava com o marido.
  Bill dissera que mesmo que eles estivessem casados e tivessem que mostrar o lado positivo do casamento, aquela relação não deveria atrapalhar os compromissos do e a agenda, principalmente por ser falso. Eles tinham que mostrar que o casamento era “real”, mas ao mesmo tempo mostrar que estar casado não afetava em nada a produção do . Assim, seria bem mais fácil que as fãs aceitassem aquilo também. Dessa forma, seguia com o plano original como se não tivesse casado: depois das curtas férias nos EUA com a banda, ele produziria o novo álbum que seria lançado em breve.
  Como não era apenas o vocalista e guitarrista do grupo, mas também compunha e produzia as músicas no estúdio, ele passava a maior parte do tempo fora de casa, para infelicidade de . O tempo livre que o rapaz conseguia era preenchido por alguma entrevista ou sessão de fotos, e ele acabava retornando sempre tarde para casa.
  , sem emprego, sem entrevistas e, ainda por cima, deixada de lado por seu marido que acabara se mostrando um workaholic, passava os dias sendo uma dona de casa, limpando, cozinhando, lavando. O que a irritava profundamente, mas ainda lhe faltava confiança de sair na rua e explorar a cidade, principalmente por ficar um pouco assustada graças àqueles comentários maldosos da internet. E então, acabava afundando-se em tédio e tristeza durante seus dias na chuvosa Londres.

     

Em breve faria um mês que encontrava-se casada com , e ela assistia as notícias na TV, pois naquela tarde passaria uma entrevista breve que gravara há algumas semanas com . Ela não gostava de se assistir na TV, mas devido à falta do que fazer, era a única opção.
  Estava vestindo pijama ainda e dessa vez era Miles que estava em seu colo, espreguiçando-se e recebendo carinho. Como os gatos eram sua única companhia na maior parte do tempo e ela sempre os alimentava e cuidava da sujeira, os dois acabaram apegando-se bastante a ela, para sua alegria. Se ainda por cima os gatos a odiassem, ela não tinha certeza se sobreviveria mais dois meses naquele lugar. Olhou para a janela, um hábito irritante em sua opinião, como se esperasse que aparecesse ali, apesar de ela saber que ele estava ocupado no estúdio. Ela sentia falta de . Depois do primeiro dia, não chegaram a dividir mais a cama, então mesmo que ela estivesse dormindo, não o sentia chegar e ficar com ela. Umas três vezes apenas ela acordara antes de ele sair para o estúdio e pudera preparar um café da manhã pra ele, que acabou comendo apressado, mas com um sorriso que a esquentou pelo dia.
  Talvez estivesse ficando egoísta. Querendo mais do que poderia ter. Não era para ser um marido até mesmo dentro de casa, o combinado era que eles pareceriam um casal para a mídia, mas dentro da casa que dividiam não era necessário toda a encenação. Só , aparentemente, queria continuar com aquilo por causa de sentimentos.
  Antes que pudesse começar a choramingar, afundou a cara no pelo de Miles, que soltou um miado indignado.
  - Tenho que ser forte, Miles! – ela disse, mais para si mesma que para o gato. – conta comigo, e eu preciso fazer meu melhor.
  Desistiu de ver o programa no momento que viu sua cara estampada na tela plana, e depois de desligar foi até a cozinha ver o que poderia fazer. Tinha criado gosto, naqueles dias solitários, por fazer pequenos doces para um casal, apesar de quase nunca prová-los por estar com pressa. Ela notava que às vezes ele levava para o trabalho alguma coisa que ela havia feito, mas não chegava a comentar nada sobre a culinária dela, e sem feedback ela não tinha certeza do que ele gostava ou não. Abrindo as despensas, percebeu que na verdade ela deveria era estar fazendo compras, já que havia várias coisas em falta.
  - Parece que vou ter que sair. – murmurou, sem realmente estar animada com a ideia, correndo para o quarto para trocar de roupas.

     

Era a primeira vez que saía de casa sozinha na Inglaterra. Lembrava o caminho do supermercado porque fora junto com nos primeiros dias que estava ali, mas ir completamente sozinha era algo que a deixava insegura. Queria poder levar Bartholomeu e Miles junto com ela, mas sabia que não podia.
  O supermercado perto da casa deles não era muito cheio, e ela não podia evitar pensar que Bill planejara tudo direitinho para que eles não fossem atrapalhados com frequência. Pensar nisso a deixava mais tranquila, porque realmente não sabia do que fãs eram capazes, e nem queria descobrir da pior forma. Fazer compras tranquilamente era algo que nunca acontecera em sua vida, até porque quando fazia isso em Westcliffe sempre encontrava cerca de cem conhecidos fazendo compras ao mesmo tempo, e tinha que parar para conversar e informar as pessoas de como sua vida andava.
  Por isso, andar em silêncio por entre as prateleiras foi uma experiência incrível. Havia feito uma pequena lista antes de sair de casa, mas acrescentara outras coisas ao vê-las no supermercado, e já havia quase acabado quando o inevitável aconteceu. Uma mão surgiu e segurou em seu braço, e assim que se virou com o susto, encontrou uma mulher em seus quarenta anos que a encarava de olhos levemente arregalados. não sabia se a mulher estava surpresa em encontrá-la ou se aquilo era efeito de maquiagem. Maquiagem que, inclusive, a mulher parecia ter exagerado um pouco, considerando que ela só fora ao supermercado, e não a uma balada adolescente.
  - Com licença. – sua voz era fina e o sotaque era bastante carregado, mesmo naquelas duas palavras. – Você não é a jovem do casal que se mudou recentemente para a Smith’s Lane, no número 13?
  - S-sou. – hesitou, sem saber direito o que fazer. Aquilo era problema? Era para ser simpática? Por que não poderia estar com ela ali para saber o que fazer? E se a mulher fosse uma fã de e fosse causar algum infortúnio para eles?
  Ao ouvir a confirmação, a mulher sorriu largamente e virou-se para trás, de costas para .
  - Querido! Querido! – ela acenava com a mão freneticamente para um homem bem mais velho que ela, que se aproximou em passos lentos, como se tivesse alguma dor interna muito grave. – Eu falei para você que ela era familiar! É ela mesma!
   começou a sentir um mal estar por ter sido reconhecida e tentou fugir dali, mas a mulher virou-se de volta para ela naquele momento e segurou-a pelo braço. A garota surpreendeu-se não só pela força que a mulher possuía, mas também por todo aquele contato que ela achava que ingleses não teriam no primeiro encontro com um desconhecido.
  - Meu nome é Leelah, e este é meu marido Robert, somos seus vizinhos do número 15! – a tal Leelah sorriu largamente, e mais uma vez hesitou. Vizinhos? Estava tudo bem então, ou isso só piorava a situação?
  - Muito prazer... – murmurou, sem saber o que fazer. Já estava com praticamente todas as coisas que precisava no carrinho, então poderia dar uma desculpa que estava com pressa e sair logo dali.
  - Oras, ela é tão tímida! Isso é meio surpreendente. Seu marido parece ser bastante popular, não é? Eu vi vocês dois na TV. – Leelah sorriu e não tinha certeza se a expressão que colocara em sua própria face seria um sorriso ou uma máscara de horror.
  - Lee, você está assustando a coitada. – Robert finalmente pronunciou-se e segurou o braço da mulher para que ela soltasse a garota. gostou bem mais de Robert do que de Leelah. – Desculpe. Ela fica entusiasmada quando conhece celebridades. Precisava ver o escarcéu que aconteceu quando pegamos o mesmo voo que a Adele em nossa viagem para os Estados Unidos da última vez. Achei que o avião ia cair.
  Daquilo conseguiu até rir. Já passara a timidez inicial agora que Robert acalmara Leelah e não sentia tanta vontade de fugir.
  - Desculpe, não estou acostumada com essas abordagens. Não sou celebridade. – ela falou, apesar de não ter certeza de o porquê estar se desculpando.
  - Claro que é, querida! Você está na TV! – Leelah retrucou e corou. Aquilo não era motivo suficiente para se virar celebridade, era? – E é casada com um homem famoso e lindo. – provavelmente, aquele era o motivo.
  - Sim, mas... não sei. – ela soltou uma risadinha. Não podia falar que na verdade não estava exatamente casada com um homem famoso e lindo e que era tudo uma farsa. – Ainda não me vejo como celebridade, já que escondemos o relacionamento por tanto tempo.
  - Ah, é mesmo né! Acho que li uma matéria sobre isso no cabeleireiro esses dias. – Leelah pareceu pensativa, mas logo pareceu esquecer o assunto. – De qualquer forma, nunca vejo você sair muito de casa, apesar de seu marido passar o dia todo fora.
   percebeu que a mulher parecia ter tempo livre suficiente para observar a vida dos vizinhos, e gostou ainda menos dela por causa disso. Antes que pudesse responder, Leelah continuou tagarelando.
  - É estranho, sabe, vocês são um casal tão jovem. E ele passa o dia todo fora, quase parece que não se importa com você. Trabalho é importante, mas ele também deveria ter dar atenção. Para que casaram então? Meu Deus! – no meio da tagarelice ela pareceu surpreender-se e teatralmente virou-se para , os olhos ainda mais arregalados do que a maquiagem permitia. – Ele não pode já ter arranjado um affair, não é?   - Claro que não! – rebateu, ofendida. O que aquela mulher estava opinando sobre a vida dela e de ?
  - É, seria difícil. Você nem parece tão ruim assim. Só acho um pouco estranho, porque, sabe, vocês são recém-casados, mas ele nem ao menos parece se importar com você, coitadinha. Não passa tempo com você. Que horas ele costuma sair? E chegar? – a cada palavra que Leelah dizia, gostava ainda menos dela. O que é que aquela mulher intrometida tinha a ver com trabalhar muito ou não?
  Robert interrompeu Leelah antes que a garota pudesse retrucar, o que foi bom, porque era bem capaz que ela fizesse isso de uma forma bem mais mal-educada do que o recomendado.
  - Querida, não é educado falar assim da vida dos outros, eu já te disse. – Ele a afastou um pouco de e lançou um sorriso apologético à garota. – Realmente, me desculpe por isso...
  Robert realmente parecia um inglês, cheio de educação e desculpas, ao contrário de Leelah, que parecia um pouco confusa ao tentar avaliar o que estava fazendo de errado. , porém, já tivera o suficiente daquilo. Falando que precisava retornar para começar a preparar o jantar em breve, despediu-se do casal. Leelah ainda ousou gritar para ela que fosse tomar um chá com ela um dia qualquer, quando estivesse muito entediada. A garota ainda pôde ouvir naquelas palavras uma mensagem de “quando o seu marido lhe abandonar de novo”, e saiu ainda mais apressada em direção ao caixa.
  Aquela primeira experiência fora de casa não poderia ter sido pior. ainda agradecia que não tinha encontrado uma fã louca que a perseguisse e a atacasse, mas Leelah fora uma pessoa... extravagante demais. Ela não tinha certeza se gostaria de encontrar a mulher de novo, e só pensar que eram vizinhas fazia-lhe o estômago doer. E, ainda por cima, no caminho de casa ela não conseguia tirar as palavras da inglesa da cabeça.
  E se tivesse um affair? nunca considerara a possibilidade de já ter alguém que amasse na Inglaterra. Aquilo seria bastante triste, e a garota ia odiar ser uma personagem de uma tragédia dessas. Ainda mais a vilã. Eles nunca chegaram a entrar em assuntos pessoais demais além da família dele e dela. Ela não sabia sobre alguma namorada dele ou alguém com quem ele pudesse ter algum relacionamento antes de casar-se com ela em Las Vegas. Talvez ele não tivesse tanto trabalho quanto parecia e estava encontrando-se com aquela pessoa. não poderia evitar tal coisa, não é? Principalmente se julgava seguro manter o affair.
  Mas que besteira estava pensando! Tudo bem que tornara-se um workaholic assim que chegaram em Londres, coisa que a surpreendeu, por ele ter sido tão atencioso e cuidadoso antes, mas ele não parecia estar se relacionando com outra mulher. Como a era uma prioridade para ele, não devia estar afundando em outras distrações. Além do mais, era um pouco arriscado brincar com esse tipo de fogo no meio da turbulência que a banda estava passando. Ele não faria isso. tinha certeza.
  Mas ele de fato estava muito ausente de casa, e aquilo incomodava a americana. Ele realmente não se importava com ela? Depois de tudo que ele dissera, suas ações principescas, ele ia acabar se mostrando dessa forma? Não era possível, era? Aquele pelo qual ela se apaixonara, o que ele seria então se o verdadeiro era este que passava o dia fora e nem ao menos se preocupava com ela?
  Parou em frente ao portão da casa e olhou-a, fungando. Não queria entrar lá e ficar sozinha de novo, só com Bartholomeu e Miles. Logo ela piraria e viraria uma louca dos gatos, se as coisas continuassem desse jeito. Talvez fosse bom se ela falasse com sobre isso. Mas como ela podia se tornar egoísta dessa forma e falar “pare de trabalhar e fique comigo”. Nem esposa de verdade dele ela era para exigir essas coisas. Quer dizer, no papel ela era, e no sentimento ela até seria, mas e ele? O que ela era para além da salvadora de sua banda?
  - ? – ouviu atrás de si e num susto virou-se, deparando-se com saindo do carro. Estava tão absorta em pensamentos que nem sequer ouvira o carro parando atrás de si. – Está tudo bem? Por que está parada?
  - Ah... – como explicar todo o seu monólogo e debate interior por culpa dele mesmo?
  - Ah, as sacolas! – ele apressou-se a alcançar seu lado e segurar metade das sacolas que ela trazia e que já começavam a deixar os dedos vermelhos. – Você as carregou todo o caminho sozinha? – parecendo um pouco preocupado, ele assumiu as sacolas mais pesadas e a guiava para a porta, já que uma garoa irritante começara a cair sobre os dois e era a típica garoa britânica que causava aqueles resfriados dos fortes.
  - Sim, mas não teve problema... Eu não sabia que horas você vinha... – ela nem ao menos sabia que ele chegaria tão cedo.
  - Desculpe, acabei me esquecendo de avisar. – sorriu carinhoso e fechou a porta atrás dela, depois de depositar a sacola no chão da entrada. – Vamos guardar essas coisas?
  - Pode deixar que eu guardo. Já me acostumei com isso. – por algum motivo, agora que estava em carne e osso na sua frente, ela não sabia mais direito como reagir, tendo toda a tagarelice de Leelah pipocando em seus ouvidos. Ele se importava ou não com ela? Gostava ou não dela?
  - Eu ajudo. – ele a ignorou, rolando os olhos, mas mantendo o sorriso. Foram para a cozinha e na verdade ele acabou mais atrapalhando do que ajudando, desacostumado com os lugares das coisas. A maior parte do tempo ele pegava algo e imediatamente perguntava para aonde aquilo iria, fazendo-a rir e o clima melhorar. Ela achava incrível como ele tinha aquele dom de, de repente, fazer os problemas sumirem da mente da garota.
  Depois que terminaram de guardar tudo, guardava as sacolas e sentara-se numa das cadeiras, tendo Bartholomeu imediatamente sentado em seu colo.
  - O que você quer jantar? – ela perguntou, apreciando a chance de poder cozinhar algo para ele e finalmente ouvir o que ele pensava. O rapaz, compenetrado em acariciar os pelos espessos do gato sorriu para si.
  - Estava pensando em sairmos e irmos a algum restaurante. – ele a olhou. Ela sorriu, gostando da ideia, embora ainda preferisse a ideia de cozinhar algo ali mesmo. – Faz um tempinho já que saímos juntos e precisamos de mais umas fotos na cidade.
  Então era aquilo. Ele não desejava apreciar um jantar na companhia dela, só conseguir mais provas de que o relacionamento deles era real. sentia-se realmente uma boba. Ela se deixara levar tanto pelos seus sentimentos por que esquecera que ele ter sentimentos por ela não era parte do plano. faria o que era necessário para a banda, mas isso não incluía se apaixonar de verdade por ela. Aquele pensamento a deixava tão triste que ela desanimou com a ideia de jantar com ele.
  - Na verdade eu não estava muito bem para sair para jantar. Por isso pensei em fazer algo em casa. – ela falou baixo. imediatamente levantou-se e se aproximou dela, deixando Bartholomeu no chão.
  - Você não está bem? O que está sentindo? – e ali estava ele de novo, o que fazia sua mente rodar e preocupava-se com ela, como no começo daquela história toda. Com um nó na garganta, ela baixou o rosto, envergonhada por algum motivo tolo, e deu ombros.
  - TPM, acho. – resmungou qualquer coisa que lhe veio na cabeça, para não acabar dizendo “coração partido” ou coisa do tipo. soltou uma risadinha e ela ia olhá-lo com irritação, se ele não a tivesse puxado para perto e a envolvido num abraço.
   sentiu o coração disparar com aquilo, sentindo a montanha-russa dar suas voltas no estômago, os sentimentos vacilando perigosamente. Por que ele agia daquele jeito? Por que passava o tempo todo a ignorando e trabalhando como se nem ligasse para a existência dela, mas quando ela anunciava não estar bem ele se preocupava daquela forma? Suas dúvidas martelavam sua cabeça e ela resolveu que iria, sim, perguntar sobre os sentimentos dele pra resolver aquilo tudo de uma vez. Mas assim que se afastou para olhá-lo, o olhar que ele lhe retornara era tão cheio de ternura que ela não foi capaz nem sequer de mover seus lábios para formular pergunta nenhuma.
  - Se você não está bem, podemos ficar em casa. – ele disse, baixinho. – Mas você quer cozinhar?
  - Eu não me importo. Acho que está tudo bem. Não estou com muita vontade de sair, só. – ela só queria ficar com ele, sem flashes e câmeras ao redor incomodando. – Pode ser?
  - Claro que sim. – soltou-a para pegar um Bartholomeu chorão no colo de novo, sorrindo largamente para ela. – Se suas comidas salgadas forem tão deliciosas quanto os doces que você tem feito, Bill vai brigar comigo por eu passar a só comer em casa. – ele riu e sorriu.
  Mesmo que se sentisse uma tola, encontrava-se de novo em uma bolha de felicidade e decidiu adiar suas dúvidas e aquelas besteiras que Leelah havia enfiado em sua cabeça mais cedo. Porque com sorrindo daquele jeito para ela, o que mais ela podia ter coragem de exigir dele?

Décimo Terceiro Capítulo

  

A semana seguinte passou mais suavemente do que esperava. continuava na mesma configuração workaholic que estava desde o momento em que chegaram à Inglaterra, mas eles saíram mais vezes para jantar, e ela tivera mais tempo com ele. Sabia que parecia uma criança boba, querendo atenção assim. Só que estar perto de a tranquilizava, suas preocupações eram afastadas e, mesmo saindo apenas para publicidade, ela conseguia ter ótimos momentos ao lado dele. Era também nesses momentos que eles saíam e tinham a chance de conversar sobre diversas coisas, e conseguia saber mais sobre ele.
   na verdade nunca falava muito sobre si, e quando a história o envolvia, normalmente era sobre a . Ela conseguia perceber o quanto aquela banda era importante para ele, e então fazia sentido o quanto ele se sentia agradecido por ela estar ajudando-os. Talvez isso lhe desse alguns pontos extras e gostasse mesmo dela. Só de pensar naquilo, ela ficava ainda mais boba.
  As conversas mais sérias e sobre coisas que, sendo “namorada” dele, ela deveria saber, eles deixavam para ter em casa, quando ela cozinhava algo para eles ao invés de comerem fora. Foi numa noite dessas que, sentados no sofá com a TV ligada num volume baixinho, contou sobre como foi quando a fã deles se suicidou por conta de .
  Na TV estava passando uma reportagem sobre suicídios, e foi assim que o assunto veio à tona. Não que tivesse perguntado nem nada – ela não teria coragem. apenas trouxe o assunto e começou a falar, sem olhar para ela.
  - Foi um tempo bem complicado. – ele disse, recostado no sofá e parecendo muito cansado de repente. Ele encarava a TV, e seu rosto parecia mais pálido do que o comum, por causa do tom azulado do aparelho. interrompeu o que fazia – mastigar – para olhar atentamente para ele. Estava distraída, e não sabia se ele tinha falado alguma coisa antes, por isso decidiu prestar bastante atenção. suspirou. – Eu realmente achei que a banda fosse acabar naquela época. Nós ainda éramos novos e irresponsáveis, e mesmo sendo o mais velho, ele sempre teve problemas comportamentais. – ele mexia numa almofada, encarando qualquer coisa menos . Ela se perguntava por quê ele tinha tanta vergonha de falar daquilo.
  - Sempre? – ela repetiu o que ele havia dito. Lembrava-se das revistas que lera como se tivesse acabado de abri-las no colo, mas quem parecia ter mais problemas comportamentais era . Se bem que os problemas de podiam ser chamados de comportamentais também.
  - É. Se envolvia em briga fácil, bebia muito, usava todo tipo de drogas. Ainda usa, mas pelo menos consegue manter a imagem da banda. – tomou um gole de bebida. – Ele sempre foi meio carente. Pai que abusava da mãe dele e o espancava. Não era uma infância muito feliz. Quando ele entrou na banda e teve muitas meninas ao redor se interessando por ele, foi o paraíso. Ele não estava acostumado, mas gostou de receber a atenção, e se aproveitou disso. Mas uma menina só, por melhor que ela fosse, não era suficiente pra ele. Então ele saía com várias.
   estava um pouco chocada com toda aquela revelação sobre a vida de . É claro que ela estava curiosa, ainda mais pra saber a história por trás da tragédia, que a mídia não se preocupava em divulgar. Mas como o assunto começou subitamente, ela ficou na dúvida de como reagir ou responder, então apenas permanecia em silêncio, observando e esperando que ele contasse mais. Mastigava lentamente, como se para não fazer nenhum barulho que atrapalhasse a história.
   soltou outro suspiro antes de continuar.
  - Eu e , e até mesmo Bill, achamos que Jamie seria diferente. Acho que ele enganou todo mundo. Até ela. Ele parou de sair com outras garotas enquanto estava com ela, ou pelo menos achamos que tinha parado. Eles saíam em encontros frequentes, e parecia ser bem mais do que só sexo. Ainda mais que ela era uma raridade, uma fã sem nenhuma intenção ruim contra a banda, sem nenhuma intenção de se aproveitar de nós. Ela só queria amar o . É uma pena que foi isso que acabou a matando. – ficou tanto tempo em silêncio depois daquilo que entendeu que o assunto se encerraria ali. Ela deixou o prato de lado e inclinou-se no sofá, olhando-o.
  - E você, ? – ela perguntou em um sussurro, quase sem coragem para perguntar. Ele levantou os olhos para ela, parecendo um pouco confuso com a pergunta. – Você já amou alguém?
  Ela achou que seria um momento conveniente para levantar a pergunta e descobrir se estivera – ou estava – em um relacionamento antes de conhecê-la, e então acalmar seus ânimos. Só reunira coragem pra perguntar porque o assunto era relacionado. Ela esperava que ele não a achasse muito intrometida pra querer saber aquilo, mas, bem, ela era sua esposa. De mentira. Ela precisava saber se havia rivais em potencial alimentando ódio contra ela.
  Ele sorriu de leve e jogou a cabeça para trás no sofá.
  - Acho que eu nunca me apaixonei perdidamente por ninguém. Nunca cheguei a namorar também. Saía com umas garotas, é claro. Mas nada demais. – aquilo deixou um pouco desapontada, mesmo que ela tenha ficado feliz por não ter que se preocupar com affairs nem nada do tipo (viu só, Leelah?, pensou). O problema é que então também significava que nem mesmo por ela ele se apaixonara. Perdidamente, pelo menos. prosseguiu, mesmo que ela não tivesse falado nada. – A verdade é que meus pais sempre se esforçaram muito por nós, então eu valorizo muito o trabalho e quero ajudar como posso. Por causa disso, não dou muita bola para relacionamentos e tudo mais. Acho que acabo sendo um marido ruim. – ele olhou-a de soslaio e soltou uma risada. – Quando estou no estúdio, percebo que não te dei bom dia, que não falei que gostei das coisas que você cozinhou ou que não ajudei em nada em casa.
  - Ah... Não tem problema... – ela corou. Não sabia que pensava naquelas coisas, e ser informada disso fazia seu coração bater mais rápido.
  - Claro que tem. Eu falei pra você que seria seu porto seguro, mas mesmo assim faço essas coisas. Eu não estou acostumado a estar em um relacionamento... nem a ter outra pessoa dividindo a casa.
  - Bem, é realmente súbito. – ela comentou com um sorriso. Adorara o rumo que aquela conversa estava tomando.
  - Sim. – ele riu, voltando a mexer na almofada perto dele. Os pratos dos dois estavam no chão, terminados. Por algum motivo, ele agir daquele jeito dava a impressão de que estava envergonhado, e foi mais uma faceta dele que adorara ver. – Já que você está nos ajudando, eu só devo a você, e o mínimo que tenho que fazer é ser um marido bom. Mas nem isso consigo fazer direito.
  - , você não tem que se preocupar. – ela virou-se para ele para que pudesse enxergá-lo melhor, e ele permaneceu encarando-a também. Por mais que ela estivesse solitária e se sentisse abandonada, ouvir falar daquela forma já aliviava mais do que o necessário. Então ele se preocupava sim com ela. Só isso já a deixava feliz. – Eu estou aqui pra ajudar você a manter a banda viva... E mesmo que eu goste da sua companhia e queira passar meu tempo com você... Você tem que seguir com a , porque, afinal é pra isso que estamos aqui. Eu entendo. – ela apenas foi falando o que estava em seu coração, sem pensar muito sobre, e quando finalizou tinha seus olhos brilhantes fixos nela. Quando se tocou de suas palavras, sentiu a vergonha encher-lhe por dentro, mas nem teve tempo de esconder-se, porque a abraçou, cobrindo seu rosto com seu ombro.
  - Às vezes fico me perguntando como pode existir uma garota tão perfeita quanto você, . – ele murmurou e ela sentiu o rosto explodir em calor ao ouvir aquilo. O que era irônico, porque ela passava boa parte do tempo dela pensando em como ele era todo principesco e maravilhoso.
  - Eu estou longe de ser perfeita. – ela resmungou, tentando descontrair a felicidade e embaraço que sentia naquele momento. “Você, ao contrário...” pensou, mas não ousou dizer aquilo em voz alta. afastou-se um pouco dela e encarou-a de perto.
  - Não aceito que diga isso quando está fazendo tanto pela banda por tão pouco em troca. Eu nunca vou poder te agradecer suficiente, nem te pagar de volta de alguma forma que valha a pena. Quando o acidente com aconteceu, eu fiquei com tanto medo de aquele ser o fim... meio que me traumatizou. – os olhos dele analisavam o rosto dela enquanto ele falava, e ela tentou não notar que eles frequentemente corriam até os lábios entreabertos dela, caso contrário sua sanidade iria pelo ralo. – Eu não quero nunca mais achar que estou prestes a perder algo tão importante pra mim.
  Dane-se a sanidade.
  Depois daquela frase sussurrada tão perto de si, mais uma vez encontrou-se, sem saber como, com os lábios unidos aos de , e dessa vez não tinha certeza se fora ele que a beijara antes.
  Aquele beijo tomou proporções ainda não atingidas entre os dois antes, talvez pela emoção do momento, talvez pelo assunto, talvez por estarem num sofá, mas depois de alguns segundos, viu-se prensada entre as almofadas confortáveis do sofá e o peso de , o que não desgostou nem um pouco. Suas mãos foram até o cabelo dele, mesmo que tremessem um pouco pela excitação que percorria seu corpo todo ao senti-lo tocar sua cintura.
  , ao contrário de , tivera alguns namorados antes, mas também nada excepcional. Possivelmente, era a primeira pessoa que ela beijava que lhe causava tantos arrepios e um bater descontrolado de coração, chegando a preocupá-la se não seria na verdade algum problema cardíaco. Todos aqueles clichês de livros de romance que lera a vida inteira, quando tratavam sobre a reação da mulher, lhe pareciam impossíveis, até que o conhecera. Se ela o tivesse encontrado numa Starbucks enquanto usava um coque frouxo no cabelo, teria certeza que estava vivendo um livro desses.
  Mas não foi assim que se conheceram. E, para falar a verdade, estariam bastante próximos de reviver a noite em Vegas – com menos bebida e mais recordações, ela esperava – graças aos caminhos que aquele beijo estava levando-os... se não fosse o telefone de começar insistentemente a tocar e acabar com o romantismo erótico da sala de estar em plenas dez e meia da noite.
  Ela gostaria muito de amaldiçoar todas as forças existentes no universo que mandaram a infeliz pessoa ligar para ele naquela hora, e também todos os clichês de livro que indicavam que aquele era o tipo de coisa que acontecia naquele momento. viu afastar-se dela com olhos turvos e hesitantes, como se ponderasse se o telefonema valeria a pena. Não, não valia, ela pensava, tentando mandar esses pensamentos por ele através de um olhar insistente.
  Não deu certo. Com um suspiro e cabelos bagunçados, ele decididamente afastou-se dela e deixou-a deitada no sofá, a blusa um pouco amassada e levantada e o rosto queimando. Ele alcançou o telefone e virou-se de costas para ela enquanto atendia.
   quis enfiar o rosto numa almofada e morrer. Aquele momento estava tão bom... É claro que ia acabar. Se de repente não parecesse exaltado ao telefone e se apressasse para onde a chave do carro estava, ela estaria com muita raiva. Quando ele desligou o telefone ela olhou-o interrogativamente.
  - está com problemas. Eu... – ele olhou para ela, que começou a imaginar quão bagunçada se encontrava. – Eu tenho que ir ajudá-lo. Desculpe, .
  Sem nem olhar para ela duas vezes, saiu pela porta e bateu-a de leve. olhou pela janela, vendo-o correr apressado para o carro, por causa da chuva que estava caindo, e depois as luzes sumiram, deixando-a sozinha no sofá que antes estava tão aquecido com o calor dos dois, mas agora encontrava-se completamente frio.

     

demorou cerca de três horas para voltar.
  Quando chegou, estava na cama dele, ainda acordada, brincando com Bartholomeu. Ela pensara muito durante aquelas três horas que ele passara longe. Pensara e pensara, e decidiu que mesmo que se sentisse feliz com as coisas que dissera mais cedo, cansara de ser uma apaixonada idiota. Tinha certas coisas que ele não podia fazer com ela, porque não era justo. Se fosse o caso de aquilo ser uma paixão platônica e ele não ia retribuí-la de qualquer jeito, ela não se importaria tanto. Mas a questão é que apesar de parecer que não tinha intenções de se apaixonar por ela durante esse tempo que ela estivesse ali, – propositalmente ou não – brincava demais com seus sentimentos, e estava cansada daquilo. Se ele fosse falar coisas fofas, que falasse de um jeito que não lhe causasse esperanças. Que não a incentivasse com beijos e amassos no sofá, só para sair correndo depois.
  Ela decidiu que não aguentaria mais aquela montanha-russa, e perguntaria para ele se ele gostava dela ou não. Se não gostasse e dissesse isso claramente, ela acharia um jeito de lidar com aquele relacionamento ela mesma, como devia estar fazendo desde o começo. Se ele dissesse que gostava... Bem, melhor pra eles.
  Então, quando entrou no quarto, ela estava sentada, sentindo-se quase como se preparada para a guerra.
  - Ah, . – ele estava molhado por causa da chuva e parecia cansado, causando hesitação na confiança em . – Desculpe, eu v...
  - Podemos conversar um pouco? – ela decidiu ser direta e falar o mais rápido possível. Mesmo que ela estivesse decidida, ainda tinha medo do que podia acontecer naquela noite. Não é como se ela quisesse brigar com . Ela só queria resolver o que estava acontecendo logo, para que seus sentimentos se acalmassem e parassem de criar um rebuliço toda vez que ele falava alguma coisa bonita ou a deixava sozinha.
  - Ahm... – ele parecia meio relutante, provavelmente pensando num banho ou em descansar, mas depois passou a mão no cabelo molhado e encostou-se na porta. – Tudo bem. O que quer falar?
  - Você gosta de mim? – mesmo que seu rosto explodisse de vergonha ao dizer aquelas palavras, ela as disse o mais rápido possível, e só teve certeza que a entendeu pois seus olhos se arregalaram levemente.
  Não devia ser o tipo de conversa que ele estava acostumado a ter à uma da madrugada. Ele pareceu um pouco desconfortável por ela trazer aquilo à tona, e quanto mais ele demorava pra responder, mais um nó na garganta dela se apertava. Cada segundo a mais que ele permanecia em silêncio aumentava a conclusão de de que aquela noite não acabaria como aquela passada em Vegas.
  - Eu gosto. – ele respondeu, de um jeito que ela entendeu. Não era gostar como ela gostava dele. – Você faz muito por mim, e é uma pessoa incrível e...
  - Você sabe que não é isso que eu quero dizer. – ela falou, sem poder evitar que a voz tremesse e a encarou, ainda surpreso com aquela conversa.
  - Por que é que você está querendo falar disso agora? – ele resmungou e a primeira lágrima escorreu no rosto dela.
  - Porque eu preciso falar disso! Você às vezes fala as coisas como falou hoje mais cedo, e vem e me beija, mas depois você sai correndo como se eu não fosse nada! E aí você fala o quanto sou importante e o quanto eu te ajudo, mas passa praticamente o tempo todo longe de mim. Eu estou cansada de ficar me sentindo assim! – ela desabafou, odiando-se por já ter cedido e começado a chorar.
  - , eu não me lembro de termos combinado que eu teria que me apaixonar por você dentre esses três meses. – ele retrucou, desencostando da porta e indo para o armário separar uma roupa seca, como se desse a conversa por encerrado. – Se você está sent...
   não chegou a terminar a frase, porque quando voltou-se para olhar para ela, surpreendeu encarando-o com olhos levemente arregalados e as lágrimas escorrendo já fora do controle dela. Sem que ele precisasse completar a frase, ela baixou a cabeça correu para fora do quarto. Ele tentou chamá-la de volta, em vão. A porta do quarto dela fechou-se com um estrondo, e pôde ouvir a porta ser trancada.
  , do outro lado, escondia o rosto nos joelhos para não chorar alto. Não era como se fosse culpa de , porque ela trouxera aquilo para si mesma, mas ela precisava saber. Só não tinha que ser dito daquela forma, tão fria e impaciente. Aquele que sempre brilhara aos seus olhos agora quase se extinguia. Não é como se ele tivesse que se apaixonar por ela, só que ele praticamente afirmara que, durante o mês e meio que passaram juntos, ela não pôde nem ao menos conquistá-lo de alguma forma. Era sempre aquela simpatia por estar em dívida com ela.
  Encostada na porta, a garota continuou a chorar até dormir.

     

Quando acordou na manhã seguinte, sentia seu corpo todo dolorido. Se não tivesse acordado no chão, teria desejado que tudo aquilo fosse só um pesadelo e as coisas estivessem bem entre eles. Mas ela sabia que a partir de agora não estariam, e seria um esforço para que o tempo restante passasse tranquilamente. Eles não podiam deixar a ideia do casamento feliz esfriar ainda. E mesmo que ela estivesse chateada com ele, não era por isso que falharia com sua promessa de ajudar a banda.
  Com muito esforço, levantou-se e ouviu os barulhos da casa. Estava tudo silencioso, então ou tinha saído ou não tinha acordado ainda. Ela não estava com a menor vontade de encontrá-lo. Estava um pouco arrependida de ter começado o assunto, mas ao mesmo tempo achou bom que já descobrisse sobre os sentimentos dele para parar de se iludir. Mesmo que talvez não parasse de se iludir. Essa era a parte da qual se arrependia. Causara tudo aquilo, mas na verdade não era como se pudesse desligar um interruptor e parar de gostar dele. Só iria criar um clima pior na casa.
   não se desculparia, apesar de tudo. Por mais que se arrependesse da situação causada, ainda tinha uma parte dela que queria que refletisse sobre como estava tratando-a. Se não fosse se apaixonar por ela, não ficasse beijando-a ou criando momentos típicos de casal quando eles não fossem necessários. Ela estava ajudando a banda, e não sendo um brinquedo para ele.
  Um pouco mais animada, tomou uma ducha para tirar o cansaço e as dores, e quando saiu do quarto percebeu que estava sozinha. Miles e Bartholomeu já tinham comido, seus potinhos de comida ainda com restos de ração, então devia ter acordado e saído. Não achou nenhum bilhete, mas não se incomodou com isso. Não queria encontrá-lo, mesmo. Queria apenas que o resto do tempo que teriam que ficar juntos passasse logo, e ela pudesse retomar sua vida. Isso mesmo. Esse seria o melhor resultado. Ela nem tinha certeza se gostaria que o relacionamento deles se firmasse como algo real, porque significaria que estaria fazendo aquelas entrevistas e aparições na TV sempre. E então, quanto menos tempo passasse perto de , melhor seria, porque dessa forma não ficaria se apaixonando por ele de novo e de novo. Ela se conhecia bem o suficiente pra saber que era só ele falar outra daquelas coisas fofas que ela se derreteria e toda sua resolução seria arruinada.
  Quando estava socando algumas coisas numa tigela para fazer algo para comer, talvez com uma força um pouco mais intensa que o necessário, a campainha tocou, fazendo-a se interromper. Não seria , seria?
  Ela hesitou antes de sair da cozinha e ir até a frente da porta que a separava de quem quer que estivesse do outro lado. Talvez tivesse esquecido as chaves. Mas a porta não devia estar trancada. E se ela abrisse, ia encontrar com ele mais cedo que o planejado. E se fosse Leelah, vindo para atormentá-la? Talvez tivesse bisbilhotado a discussão e decidido vir encher ainda mais o saco da garota. Ou alguém da banda? Algo teria acontecido?
  Percebendo que nunca descobriria se não abrisse a porta, respirou fundo e o fez.
  Na sua frente não estava nenhuma das opções que pensara; na verdade, nem conhecia a moça que estava de pé na sua porta. Seus cabelos eram escuros e pretos, um pouco espetados atrás. Os olhos eram e o rosto era extremamente bonito, como se ela fosse uma modelo. Um piercing no nariz dava-lhe um ar um pouco rebelde. Talvez não só o piercing, mas também a roupa de couro preta e o capacete de moto que ela segurava. não tinha ideia de quem ela poderia ser, apesar de ela lhe parecer levemente familiar, e torcia para que ela não fosse uma fã pentelha que tivesse visto de longe em algum lugar, que era tudo que ela não precisava para aquela manhã.
  A visitante analisou-a assim que abriu a porta, da cabeça aos pés, deixando-a incomodada. Mas a primeira abriu um sorrisinho de canto, falando então com uma voz suave e um sotaque tão lindo quanto o de :
  - Você realmente não é tão ruim quanto eu achei que seria. Se importa se eu entrar, cunhadinha?
  E então percebeu que aquela semelhança se dava ao fato de aquela ser Rowena, a irmã de .

Décimo Quarto Capítulo

  

- -

     

Por ter ficado tanto tempo centrada em mim mesma e no meu relacionamento (ou a falta dele) com recentemente, eu tinha esquecido completamente que a família dele morava aqui perto e qualquer um deles podia aparecer a qualquer momento. Considerando isso, na verdade era até surpreendente que alguém tivesse demorado tanto tempo para vir. nunca mencionara nada de eu conhecê-los – provavelmente por ser um relacionamento falso – e não é como se eu quisesse insistir muito também, apesar de ter ficado curiosa desde que ele contara os detalhes da família dele.
  Mas ver Rowena esticando-se confortavelmente no sofá fazia eu me sentir, de novo, uma tola. Será que ela brigaria comigo por eu nunca ter propriamente me apresentado? Ou estaria tudo bem? Eu odiava quando não podia previr o que aconteceria neste mundo de . Em Westcliffe a rotina era tanta que você até sabia quem encontraria na rua ao sair a tal horário. Eu decididamente não estava preparada para uma vida repleta de surpresas e altos e baixos como esta aqui.
  Rowena me encarava com seus olhos , e a única coisa que consegui pensar em dizer naquele momento foi:
  - Você gostaria de alguma coisa pra beber? – Os olhos dela acenderam com um brilho diferente e ela deu um sorriso de modelo que me deixou encabulada por ainda estar vestindo roupas simples e o cabelo estar molhado do banho.
  - Uma água iria bem, obrigada. – ela agradeceu, e fui até a cozinha. Parecia meio que um sonho, a irmã dele estar mesmo ali. Minha cabeça ainda não estava 100% depois da discussão que tive com ontem, e o estômago embrulhava quando eu pensava no jeito que ele tinha dito as coisas. Não estava no melhor ânimo para conversar com alguém da família dele. Tinha me resolvido por não pedir desculpas, porque eu não queria ceder e dizer que na verdade estava tudo bem me tratar daquele jeito. Eu sabia que não era grande coisa, mas me dava o valor suficiente para não querer ser o brinquedo de ninguém. não precisava se apaixonar por mim, como ele mesmo disse. Só que ele precisava entender que mesmo que eu estivesse apaixonada por ele, não aceitaria ser tratada daquela forma. Ele não estava me fazendo bem nenhum dizendo coisas fofas e me beijando para depois sair e ser meu marido apenas para a mídia. O copo terminou de encher e eu voltei para a sala, tentando clarear a mente e conversar melhor.
  - Me desculpe por não ter ido me apresentar apropriadamente antes. – eu disse, depois de entregar o copo para ela. Rowena manteve seu sorriso estampado no rosto, e abanou com a mão livre em um gesto para que eu não me preocupasse.
  - Oras, eu também só apareci agora. E não é como se você fosse a esposa de verdade de , então, vamos pular as formalidades. – ela deu ombros e seus olhos pareceram aguardar pela minha reação, como se ela me provocasse. Eu não sabia bem o que dizer depois de uma afirmação tão direta assim. Quase soltei, com ironia, um “ah, jura? Obrigada, mas seu irmão já me lembrou disso ontem”. O fato de ela ter dito aquilo me magoou. Eu torcia para que a família de não soubesse da verdade porque, afinal de contas, eu tive que mentir para a minha própria (apesar de eles não terem acreditado completamente, mas, bem). Só que parecia que ninguém se importava com isso. Recentemente o jogo era “Vamos lembrar que não é mesmo a esposa de e que ele nem gosta dela de verdade”, fora da mídia, claro. Provavelmente era um sinal da vida me mandando parar de ser trouxa e colocar os pés no chão.
  - O que foi, está chateada com isso? – o olhar de Rowena era divertido e eu suspirei.
  - Por que eu deveria? Não sou casada com ele de verdade mesmo, não é? – retruquei de forma amarga, querendo cortar aquele assunto. Não sei por que a moça resolveu aparecer agora, mas não poderia ter um timing pior. E o jeito com que respondi mostrava claramente que eu estava sim chateada com aquilo.
  Mas então Rowena soltou uma gargalhada que me assustou. A risada escandalosa demorou a morrer, e quando ela encerrou, seus olhos estavam cobertos por uma pequena camada líquida. Ela estava literalmente chorando de rir da minha reação, e eu ainda não tinha entendido o que exatamente tinha sido tão engraçado no que havia dito.
  - Você é mesmo incrível, como ele disse. – a irmã de disse, mudando a atitude e me parecendo agora bem mais carinhosa. Eu não conseguia decidir se eu gostava da minha cunhada ou não. Ela parecia meio arrogante e prepotente, e parecia rude, mas ao mesmo tempo ela tinha uma aura que me atraía. Como se eu quisesse ser como ela, apesar de ser impossível. Ao invés de perder meu tempo me preocupando com isso, decidi continuar a conversa.
  - Ele disse, é? – murmurei. então agia daquela forma. Embora ele sempre falasse para mim o quanto agradecido estava e tudo mais, não imaginava que ele chegasse a falar isso para outras pessoas também. Principalmente para a família dele. O fato de Rowena ter compartilhado isso fez meu coração apertar um pouco, causando-me um pouco de arrependimento de ter agido daquela forma com ele no dia anterior.
  Rowena, tomando outro gole da água, olhava ao redor como se apreciasse o lugar. A nossa sala era bastante simples, sem quadros ou decorações. Apenas o básico, como uma verdadeira casa temporária. Eu fizera meu melhor sempre pra deixar a casa agradável e limpa, para que não tivesse que se preocupar em lavar coisas e pudesse passar o tempo que estava ali, que não era muito, comigo. Enquanto pensava nessas coisas, Rowena voltou a falar.
  - Disse sim. Quando ficamos sabendo do casamento, é claro que ligamos querendo saber que merda ele tinha feito. Ele explicou que, teoricamente, estava tudo bem e você ia ajudar, mas nem eu e nem minha mãe confiávamos muito nisso. Depois vimos aquela entrevista de vocês dois, e ficamos um pouco mais tranquilas. – ela deu ombros. – Você não parecia estar arruinando tudo, e confiamos nele. Sempre que ligávamos para saber como ele estava, ele dizia o quão incrível você era e como estava ajudando tanto eles.
  Eu ouvia tudo em silêncio, o arrependimento tornando-se uma bolinha um pouco maior e incômoda dentro de mim. Estava brava e de coração partido, mas tudo que dissera ontem não era mentira: ele não era obrigado a se apaixonar por mim. E não quer dizer que iria, ao passar dos três meses. Talvez eu devesse ter aguentado os sentimentos dentro de mim um pouco mais antes de explodir.
  - Ei. – Rowena chamou e eu pisquei algumas vezes, percebendo que tinha viajado na maionese por algum tempo. Ela agora me olhava um pouco preocupada e eu me senti embaraçada.
  - Desculpe, o que você disse? – perguntei, limpando a garganta.
  - Você gosta mesmo dele, não é mesmo? – dessa vez, minha cunhada não parecia estar brincando ou querendo me alfinetar de algum jeito. Seu olhar era protetor, como o de uma irmã mais velha. Aquele olhar me lembrou Loren, e meu coração apertou. Tenho certeza de que as coisas estariam muito melhores se eu tivesse ela e Maddy comigo para que eu pudesse desabafar tudo. É claro que estávamos conversando com frequência, mas era muito diferente de nos encontrarmos e passarmos a noite juntas e despejarmos nossos sentimentos, como sempre fizemos desde que éramos crianças.
  - Sim. – murmurei, a minha voz tremendo um pouco. – Não era pra eu gostar, e eu sei disso. E não é como se eu pudesse forçar ele a gostar de mim também. Mas... eu não tenho mais ninguém aqui. é sempre gentil, diz coisas boas e tem cuidado de mim. Eu não queria ser uma pessoa boba e ficar exigindo atenção porque eu sei que não faz parte do meu papel ser assim, só que não dá pra evitar... Eu estou sempre sozinha aqui... – uma lágrima estava prestes a escorrer por meu rosto, mas eu limpei rapidamente, percebendo que estava choramingando para minha cunhada sem nem conhecê-la direito e me calando. Talvez eu estivesse mesmo carente e solitária. Olhei receosa para ela, mas ela não parecia incomodada com isso. – Me desculpe por falar tudo isso assim. – dei uma risada nervosa que foi interrompida na metade por Rowena se levantando com agilidade.
  - Quer dizer que o bosta do meu irmão tem te deixado sozinha aqui? – ela se aproximou com as mãos na cintura, não parecendo surpresa, mas de alguma forma começando a ficar brava. Seu olhar me intimidou, e eu apenas concordei hesitante com a cabeça, sem saber o que reagir. – Mas ele não te leva para jantares e coisa do tipo?
  - Isso é quando precisamos sair para que os paparazzi nos vejam, como Bill pediu... – expliquei.
  - E sair para conhecer a cidade? – ela indagou, agora mais próxima.
  - E-ele nunca teve tempo pra fazer isso comigo... – balbuciei, completamente chocada com a aura que Rowena estava emitindo. Eu não enxergava auras, e ela não tinha uma expressão irritada em seu rosto delicado, mas por algum motivo eu quase podia ver chamas começando a sair de seu corpo.
  - É O QUÊ? – Ela gritou em resposta ao meu último comentário e eu tomei um susto, tendo em seguida minha mão agarrada para que eu me levantasse. – Quer dizer que aquele corno te deixou um mês e meio trancada em casa, te levando pra jantares obrigatórios porque Bill pediu e nem ao menos te levou para conhecer a porcaria da cidade mega turística que ele mora? – ela perguntou em tom de confirmação, já me puxando para a porta e pegando o capacete de moto no chão, os cabelos curtos eriçados.
  - S-sim. Mas eu também... – eu queria dizer que eu também poderia ter saído por minha conta e não dependido de , só que não terminei a frase. Eu precisaria depender de , porque eu nunca estivera em uma cidade tão grande quanto Londres antes em toda a minha vida. Eu provavelmente acabaria perdida e dormindo embaixo de uma ponte pelo resto do nosso contrato.
  - Não importa. Vamos dar uma volta, você precisa tomar um ar e conhecer essa cidade. Ou você vai acabar virando a louca dos gatos. – Rowena disse séria, enquanto eu voltava correndo para trancar a casa. Ela nem me dera chance de trocar de roupa, mas parecia que não haveria tempo. Quando retornei ao seu lado, ela tinha dois capacetes na mão e eu engasguei.
  - Nós vamos de moto? – perguntei, receosa. Eu nunca tinha andado de moto na minha vida.
  - Claro que vamos. Vai ser um sufoco para trazermos as compras de volta, mas, bem, aí ligamos para o babaca do meu irmão e ele busca você. – ela deu ombros, já enfiando o capacete na minha cabeça e prendendo-o corretamente. Quis dizer que eu não acho que queria me ver tão cedo, e nem eu estava com tanta vontade, mas o que saiu da minha boca foi:
  - Compras?
  Rowena finalmente voltou a sorrir daquele jeito magnífico, antes de colocar o capacete em si mesma.
  - Mas é claro, minha cunhadinha. O que há de melhor para levantar os ânimos de uma mulher com coração partido do que um bom passeio pela cidade e muuuuitas roupas novas?

     Descobri que eu gostava mesmo de Rowena. Minha impressão sobre ela não estava errada; ela era intimidadora, só que era impossível desgostar dela. Depois de eu lembrar que tinha que pegar minha bolsa e correr para dentro de casa com capacete e tudo, saímos em disparada em sua moto pelas ruas, meu estômago provavelmente ficando estacionado na calçada de casa. Era a primeira vez que eu andava de moto e a sensação era, admito, incrível. Se eu fosse ficar mais tempo em Londres, acho que pensaria em aprender a dirigir moto e pediria uma para . Dei uma risadinha baixa pensando nisso, um pouco triste porque sabia que nunca ia acontecer. Talvez eu comprasse uma moto algum dia em Westcliffe.
  Apesar de voar pelas ruas e provavelmente fazer os trajetos bem mais rapidamente que carros, Rowena pilotava com cuidado, e sempre parava para pedestres e em semáforos. Era um trânsito, em geral, educado e nada caótico, bem típico de ingleses. Nossa primeira parada foi Westminster, onde os símbolos mais conhecidos da cidade se encontravam. Apesar de ter visto muitos cartões postais, o Big Ben e o Palácio de Buckingham eram absurdamente mais maravilhosos vistos de perto. Rowena morava em Londres desde os dezesseis anos, e me explicou tudo como uma verdadeira guia. Conversando sobre a história de Londres e vendo os lugares turísticos, nem sequer pensava em e nossa briga ontem à noite. Fazia um dia maravilhosamente ensolarado e frio, coisa que eu achava impossível na chuvosa Londres.
  Perto da hora do almoço, minha barriga começando a roncar, Rowena encerrou a parte turística de Westminster, me colocou na moto de novo e em menos de dez minutos chegamos até Picadilly, onde o caos se iniciou. O trânsito aqui era bem mais frenético e havia letreiros luminosos mesmo de dia. Ao redor de uma estátua de Eros, o deus grego do amor, diversos jovens aproveitavam o dia, sentados e bebendo cerveja, apesar de ainda ser período letivo e eu me perguntar por que eles não estavam na escola ou universidade. Apesar de estarmos nos aproximando do inverno e de seu intervalo no ano letivo, vários jovens pareciam aproveitar o tempo livre. Nós rodamos um tempo a pé, enquanto Rowena falava de outros assuntos e contava como na época da faculdade vinha também para aquele mesmo lugar com namorado e amigos. Ela me contou que se formou em Publicidade e Propaganda, mas jurou que nunca fez nada relacionado à , apesar de eu não entender porquê. Quando eu achei que estava prestes a desmaiar de fome, ela me arrastou até um pub chamado The Red Lion para que comêssemos.
  Minha visão de pubs era totalmente diferente do que era de verdade. Eu imaginava uma portinha numa esquina escura, depois de uma escada suja e com uma placa de madeira pendurada em cima da porta, talvez com a cabeça de algum animal empalhado grudada. The Red Lion não era nada disso. Além do dia bonito, era um dos lugares mais adoráveis e lindos que eu tinha visto em toda minha vida. Com floreiras em cima do nome – que, mesmo quase sendo inverno, estavam floridas, o que me fez duvidar se seriam de verdade – ele encontrava-se quase na esquina, parecendo meio apertadinho em meio àqueles prédios de construção antiga. Sua fachada preta e dourada não parecia nem um pouco assustadora ou intimidadora no sol e, quando entramos, tive que me controlar para não soltar um gritinho animado. O interior, que parecia ter sido decorado com mogno escuro (ou qualquer que seja a madeira, já que nunca fui especialista em nenhuma delas), reluzia repleto de espelhos decorados e luminárias antigas. Até mesmo o teto era decorado no que pareciam detalhes florais.
  - Gostou? – Rowena provavelmente percebeu minha expressão espantada enquanto eu olhava ao redor boquiaberta, e eu só pude concordar com a cabeça.
  - É um dos lugares mais lindos que já entrei! – comentei. – Obrigada por me trazer aqui. – Agradeci, sorrindo largamente. Ela piscou pra mim.
  - Disponha. Venha, temos que fazer o pedido no balcão de refeições. – ela indicou onde uma pequena fila se instalava, por ser horário de almoço, e a segui. No balcão, diversos aperitivos como amendoins e algumas castanhas eram dispostos em jarros grandes, e eu podia enxergar o balcão das bebidas dali, repleto de diversos drinks dispostos nas prateleiras. Depois de pedirmos alguns sanduíches e escolhermos as mesas, Rowena foi ao balcão de bebidas e retornou após algum tempo com dois chopes em mãos, provavelmente do tipo lager, por causa da cor clara. A comida demorou um pouco para chegar, e eu ocupei esse tempo olhando fascinada ao redor. Antes que a comida chegasse, porém, Rowena puxou um assunto que evitamos o dia inteiro, enquanto bebericava seu chope.
  - Hoje de manhã quando abriu a porta, você parecia ter estado bastante chateada. – acho que ela quis usar um eufemismo para ser educada, típico dos ingleses, para não dizer que chorei até meus olhos incharem. – Aconteceu alguma coisa?
  Parando de olhar ao redor, foquei-me no canecão de chope e brinquei um pouco com os dedos antes de responder.
  - Hm, e eu meio que brigamos ontem à noite. – respondi, por fim. – Não foi bem uma briga, só... aconteceram algumas coisas e eu me senti cansada. – tentei fazer parecer as coisas menos piores, mas Rowena me olhava com atenção.
  - Quer falar sobre isso? – ela perguntou com calma, depois de outro gole. Apesar de tê-la conhecido hoje, acho que eu realmente estava carente por amizades, e ela me parecia confiável depois de como tinha agido comigo. Concordei com a cabeça e contei, evitando detalhes sobre o amasso no sofá, como tinha sido a discussão de ontem à noite e por que eu tinha ficado tão irritada.
  - Eu sei que ele não é obrigado a gostar de mim, mas... ele falou daquele jeito e... não sei. Acho que o fato de ele sempre ser gentil me iludiu demais. – terminei, murmurando. Nossos sanduíches haviam chegado há algum tempo, e eu mexia no pão de um enquanto falava. Não sabia bem o que Rowena pensaria das minhas atitudes ou das atitudes de , mas esperava que ela fosse sincera e me contasse como eu poderia resolver a situação com ele, já que eu não queria que ficássemos em maus termos, não só pelo contrato.
  - Hmmm... você disse que foi quem ligou, não é? – ela murmurou, tamborilando os dedos na mesa enquanto pensava. – tem um histórico com , que é como se o garoto fosse nosso irmão mais novo. Meu irmão sempre foi o caçula, mas tem um instinto natural de cuidar das pessoas, o que o faria um ótimo irmão mais velho. Até mesmo comigo. – ela deu um sorriso nostálgico, como se se lembrasse de algo. - Apesar da diferença de idade entre os dois ser pouca, acho que é assim que ele se sente em relação a , até porque quando aconteceram os problemas com ele, quem o apoiou e mais se importou com ele foi . Então conta muito com ele, em todos os momentos. E, bem, convenhamos que conhece há mais tempo que você, e se fosse uma ligação importante ele daria prioridade ao “irmãozinho”. – Rowena sorriu pra mim e estendeu a mão até colocá-la por cima da minha, talvez para me consolar, talvez para me impedir de continuar destruindo o pão. – Sei que ficou preocupada e brava, principalmente porque não tem te tratado bem recentemente e porque ele não te contou esse tipo de coisa, mas espero que entenda que meu irmão não deve ter feito aquilo por mal, muito menos ter dito aquele tipo de coisa para você.
  - Eu entendo... – murmurei, agradecida por ela ter me falado tudo aquilo. Eu sabia que era importante para , mas se soubesse de toda a história por trás teria sido muito mais compreensiva e evitado aquela briga. Suspirei, querendo socar por não dividir as coisas comigo, mesmo que eu não fosse a esposa dele de verdade. Rowena afastou a mão e, colocou-se numa posição estranha, meio de lado para mim, e puxou a blusa, revelando uma tatuagem em seu ombro. Era o contorno de um lobo uivando para a lua e, apesar de o lobo ser vazado, o fundo ao redor dele era em tons de azul e roxo, quase como uma aquarela, mostrando o universo. Eu entendi aquela tatuagem¹ facilmente. Para Rowena ter tatuado aquilo, ele realmente devia ser importante para ela. Sorri.
  - Sei que pode parecer difícil, mas não está acostumado com essas coisas. Ele cativa muito facilmente as pessoas, mas por sempre dar prioridade à família e amigos, não deixa muita gente nova entrar no universo dele, por isso você vai ter que ser um pouco paciente. Mas eu conheço o coração do meu irmão, e sei que ele está preocupado com você da forma dele, e agora que você demonstrou a ele o que sente, ele vai pensar mais cuidadosamente em como agir com você. Por isso, você não tem que se preocupar, ok? Tenho certeza que as coisas vão ficar bem pra vocês dois. – ela voltou à posição normal e sorriu para mim de volta.
  - Obrigada por me dizer tudo isso. Realmente me deixou muito mais tranquila, e acho que vai ser mais fácil encarar agora.
  - Ótimo! Porque, sendo sincera, - ela deu uma risadinha – eu acho que meu irmão precisa justamente de alguém como você perto dele para cuidar dele. Eu gosto de você, . Por isso, fique com ele! – ela apontou para a minha cara, dizendo as últimas palavras meio alto e chamando atenção das pessoas ao nosso redor. Para evitar meu constrangimento, peguei um sanduíche e enfiei a cara nele, vendo Rowena rir animadamente.

     

Depois do almoço, fizemos um passeio frenético baseado em compras. Ela pilotou sua moto até a Harrods em Kinightsbridge e me indicou diversas roupas novas e outros acessórios. Eu tinha um cartão que Bill entregara, dizendo que eu poderia comprar o que quisesse, mas como nunca fui muito consumista, ele estava acumulando pó em minha carteira. Eu não queria estourar os limites no primeiro dia de uso e nem causar problemas para , por isso controlei a animação de Rowena e a pilha de roupas que ela jogava em meus braços para provar. Saindo de lá com algumas sacolas, subi desajeitadamente na moto e ela me levou até Camden Town, um lugar informal e cheio de gente descolada e lojas barateiras. Acho que visitamos cerca de quinze dessas lojinhas, além do Camden Market, ao longo da Camden High Street, onde compramos trocentas quinquilharias e mais roupas. O mês e meio que fiquei trancada em casa sem fazer muito foi compensado só por esse dia de passeio com Rowena, e no fim eu tinha tantas sacolas que foi preciso que ela chamasse um táxi para que eu voltasse para casa. Enquanto esperávamos o automóvel chegar, notei em uma das lojas um aviso de “precisa-se de atendente”.
  Eu sabia que não podia me apresentar para nenhum emprego, porque supostamente eu deveria ir embora dali a algumas semanas, mas a vontade de fazer algo me incomodava. Eu sempre havia feito muitas coisas em Westcliffe, seja arrumar a casa, seja estudar e trabalhar para ajudar meus pais. Rowena deve ter notado que eu encarava o anúncio, porque perguntou por que eu não me inscreveria. Expliquei pra ela e ela pareceu pensativa.
  - Por que não se inscreve em algum curso ou coisa assim? Como um hobby. disse que suas comidas são boas, você podia tentar alguma coisa de pâtisserie ou culinária.
  - É uma boa. – concordei, pensando que gostaria de aprender mais coisas que pudesse gostar de comer. Desde criança eu gostava de estar na cozinha, já que minha mãe me chamava para ajudar. – Vou procurar algo assim. – sorri, vendo o táxi chegar.
  Despedi-me de Rowena, prometendo que manteria contato com ela e contaria como as coisas estavam indo. Ela disse que, se eu precisasse, ela apareceria de novo para me roubar de e levar-me para outros passeios, como Notting Hill e o Soho. Concordei, acenando para ela depois de dar o endereço ao motorista.
  Sentindo-me leve, observei pela janela o dia começar a escurecer e as luzes sendo acesas nas ruas e estabelecimentos. Não demoramos a chegar em casa, e eu paguei a corrida, saindo e observando minha casa escura. não devia ter chegado ainda, e isso me desapontou um pouco. Depois de Rowena me contar tudo e me distrair, queria vê-lo de novo e pedir desculpas por ter causado aquele momento ruim. Mesmo que ele não gostasse de mim de volta, eu me esforçaria para continuar ajudando-o e apoiando-o como pudesse.
  Entrei na casa, sendo recebida por miados e tentando equilibrar as sacolas que trazia. Subir as escadas foi um sacrifício e, quando voltei pra cozinha, notei que tinha passado lá, pois as tigelas dos gatos estava cheia. Era um pouco triste saber de sua presença ou ausência a partir de potinhos de comida de gato, mas já era alguma coisa. Me surpreendi, porém, por encontrar um bilhete em cima da mesa.
  Era a primeira vez que eu via a caligrafia de . Não era exatamente bonita, mas eu conseguia entender bem. Ele estava avisando que teria que fazer uma viagem a Liverpool por alguns dias e que esperava que eu ficasse bem. Nenhum aviso sobre a briga, nem nada. Fiquei um pouco desapontada, porque agora era certo que não o veria por um tempo.
  - Parece que ficaremos sozinhos de novo, não é meninos? – murmurei para Miles e Bartholomeu, sentados aos meus pés. Sorri para eles, agora que minhas energias tinham sido renovadas eles não pareciam companhias tão ruins. Fui até a sala, encarando o sofá e percebendo o quanto estava cansada, então me joguei nele e fiquei, como uma perfeita adolescente boba apaixonada, encarando o bilhete de até adormecer.

     

Quando dissera que ficaria alguns dias fora, não especificara nada. Depois de três dias, ele ainda não havia me dado nenhuma notícia, e eu não tinha coragem de enviar mensagens ou ligar, uma vez que ele não tinha feito o mesmo. Eu estava crente que ele havia encontrado uma mulher melhor e fugido com ela, e isso me fazia faxinar a casa todo dia, já que era o que eu poderia fazer para não pensar muito nisso. Os gatos devem ter começado a me achar a louca da limpeza, e pareciam irritados por tudo estar sempre limpinho demais.
  No fim do terceiro dia, enquanto eu assistia à TV, cansada e com as mãos doendo de esfregar os azulejos do banheiro, a campainha tocou, me fazendo dar um pulo. Apesar de não ter avisado nada, poderia ser voltando, certo? Ou Rowena aparecendo do nada de novo para uma festa do pijama. Qualquer interação com humanos – que não fosse Leelah – me agradaria, então saí do sofá às pressas e escancarei a porta, sem nem me preocupar com minha aparência de louca da limpeza. Mais uma vez, todas as minhas expectativas e opções estavam completamente enganadas, mas dessa vez para melhor.
  Quem estava na minha porta – ou talvez eu estivesse delirando porque eu não sabia como aquilo podia ser possível – eram meus pais e as minhas duas melhores amigas.

Décimo Quinto Capítulo

  

encarava as pessoas na sua porta sem expressar nenhuma reação, de tão chocada que se encontrava. Maddy e Loren resolveram logo o problema, pulando juntas no pescoço da amiga e esmagando-a, fazendo-a soltar um grunhido abafado que podia ser de alegria ou dor.
  - ! Que saudades de você! Tão bom te ver pessoalmente! – Loren dizia, afagando o cabelo dela enquanto Maddy esfregava sua bochecha na de com um sorriso bobo.
  - Estávamos tão preocupadas! – a ruiva disse e ia responder que sempre se falavam por telefone e mensagem, mas tê-las ali a abraçando era muito diferente.
  - Agora, deem licença, meninas. – ouviram a voz de Amelie e as duas se afastaram para que a mãe de aplicasse o mesmo aperto na filha. – Ah, meu Deus, , você está tão magra! Está comendo direito? Minha querida, sentimos tantas saudades! Essa tecnologia que nos permite até te ver aqui por vídeo enquanto conversamos é fabulosa, mas nada como poder abraçar você e sentir o seu cheiro! Parece que senti muito mais a sua falta do que parecia! – Amelie se afastou só um pouco para olhar o rosto da filha e secou o canto dos olhos. abraçou a mãe de novo e sentiu o pai se aproximar e abraçar as duas. Ficaram um tempo assim, até que todos se afastaram e esperaram ela falar alguma coisa.
  Ela, na verdade, estava tão chocada que tinha milhões de perguntas para fazer. Tudo bem que em breve seria dezembro, época de festas, mas por que eles haviam vindo? Como todos conseguiram folga do trabalho ao mesmo tempo? E o dinheiro, a viagem nessa época para Londres não era caríssima? Ela havia percebido que tanto os pais como as amigas estavam bem mais ocupados nestes últimos dias, porque mal se falaram, mas não imaginava que estavam planejando uma viagem para visitá-la. Já que faltava pouco para ela voltar, não achou que eles se dariam ao trabalho disso. Mas lá estavam eles, e ela queria perguntar tudo e saber de tudo, mas não sabia o que perguntar primeiro e ainda estava emocionada do reencontro, e o que saiu foi:   - M-mas... como...? – e continuou encarando todo mundo, até Maddy dar uma de suas típicas gargalhadas, das quais sentia tanta falta.
  - Adivinhe, queridinha. O seu fantástico marido, é claro. – ela disse, piscando para .
  ?
   tinha chamado os pais e as amigas de de tão longe só para vê-la? Por que ele teria feito isso? Seu coração se aqueceu e percebeu que também estava sentindo falta de , já que não o vira desde a briga que tiveram.
  - Nós estávamos preocupadíssimos, sabe? – Amelie disse, cutucando Peter para que ele concordasse. – Você aqui sozinha, três meses não é tempo suficiente para ser contratada pra algum emprego, então achamos que poderia estar meio no ócio, ainda mais que é rico e pode lhe dar o que precisa sem que você faça muito. – Ela começou a tagarelar. – Víamos os seus encontros na internet e conversávamos com você aqui, mas você nunca quis preocupar as pessoas, então sempre guardou tudo para si mesma. Nunca saberíamos se havia algo errado ou não, e estávamos tão preocupados! – ela voltou a dramatizar, limpando mais uma vez o canto dos olhos.
  - Esse rapaz, , - Peter disse, depois de pigarrear. – entrou em contato conosco e falou que estava disposto a pagar para que nós viéssemos pra cá visitar você, se conseguíssemos folga. Ele até incluiu as meninas. – apontou para Maddy e Loren, que concordaram.
  - Ele parece se preocupar bastante com você. Disse que estava ocupado e não havia feito muito por você, por isso queria que nós passássemos uns dias aqui. É claro que não podemos nos afastar por muito tempo, mas não íamos perder a chance de te ver, não é mesmo? – Loren explicou, e teve que se esforçar muito para não chorar que nem um bebê. Concordou com a cabeça e fungou, rindo sem graça.
  - Vocês devem estar muito cansados da viagem. Vem, vamos levar as coisas de vocês para cima. Querem comer algo?

     

Depois de instalar seus pais no quarto de hóspedes e suas amigas no seu próprio quarto, sugeriu que saíssem para comer algo. Pretendia levá-los ao The Red Lion, que gostara tanto quando fora com Rowena, mas os pais estavam cansados do voo longo e preferiram dormir. As amigas, porém, estavam pilhadas, e queriam ver a vida noturna de Londres, então se arrumaram e saíram pela rua.
  - Por que não vamos nesse Lamb and Flag? É longe? Diz que é em... Covent Garden. Parece que Dickens era um grande fã do lugar. – Maddy lia uma folha que havia imprimido antes de sair de casa, cheia de informações turísticas de Londres e indicações de locais. – A recomendação é muito boa.
  - Acho que Covent Garden não é tão longe. Não cheguei a ir com Rowena lá, mas ela me disse que é perto. Vamos procurar como chegar lá. – disse, tirando seu celular do bolso e começando a pesquisar. – Sim, fica na Rose St, podemos pegar um taxi até lá. – checou ao redor e já fez sinal para que um táxi se aproximasse, dando sorte. Percebeu que suas amigas a encaravam em choque e arqueou as sobrancelhas. – O que foi?
  - Rowena? – Maddy disse, sua pronúncia pingando veneno. – Quem é Rowena? Você já arranjou uma amizade assim? Nos trocou? E nós que viemos de tão longe por você pra descobrir que você tem passeado com a Row...
  - Maddy, menos. – Loren cortou a caçula antes que ela ficasse muito eriçada, mas também olhava de um jeito inquisidor enquanto entravam no banco traseiro do táxi. A garota rolou os olhos.
  - Rowena é a irmã mais velha de . – ela disse, simplesmente, e depois deu o endereço do Lamb and Flag ao taxista, que concordou e começou a corrida.
  - Ele tem uma irmã mais velha? – As duas pareceram chocadas, mas um pouco mais aliviadas.
  - Sim. Ela apareceu aqui do nada e me levou para conhecer alguns lugares em Londres, já que não tinha feito isso. – explicou. – Vocês não têm que se preocupar em serem trocadas. Ela foi minha primeira interação social além de , os gatos e uma quarentona esquisita do supermercado.
  Maddy e Loren animaram-se e começaram a perguntar de Leelah, soltando altas gargalhadas do que contava. Entraram na Rose St., e o taxista cobrou o valor, pago por , e ao saírem, ainda riam de Leelah e Robert e das aventuras de no supermercado.
  Lamb and Flag parecia, no exterior, um pouco como The Red Lion, com floreiras penduradas repletas de folhagens – não estavam floridas por estarem no começo do inverno, mas ainda havia um pouco de verde ali. Sua entrada de madeira contrastava com as construções de tijolos vizinhas, e os banners vermelhos anunciando o nome do pub e seus oferecimentos eram bastante chamativos. A rua toda estava bastante cheia, principalmente em frente ao balcão aberto da entrada, e ficou com receio de ser reconhecida, apesar de não ter havido problemas. Achou ver algum rosto conhecido na multidão, só que não tinha como saber quem era ou se era realmente alguém conhecido. Talvez fosse algum famoso que vira em alguma revista. O trio logo entrou e encontrou-se num ambiente decorado com vários porta-retratos, bancos acolchoados e totalmente agradável. Conseguiram, surpreendentemente rápido, uma mesa próxima a uma janela e a um grupo de universitários, e Loren e Maddy sentaram-se no banco acolchoado, enquanto repetia o processo de pedir a comida no balcão e depois as bebidas que vira Rowena fazer. Acomodadas, servidas com suas bebidas alcoólicas e finalmente reunidas depois de quase dois meses, as amigas começaram a fofocar.
   atualizou-as, não só sobre Rowena e Leelah, mas sobre sua relação com . Apesar de estarem em público e ela não devesse falar tais coisas fora de casa, estava bastante cheio, e ninguém poderia ouvi-la, então tomou as precauções necessárias e desabafou para as amigas.
  Loren e Maddy, como sempre, ouviram atentamente enquanto bebericavam a cerveja. Maddy, sempre mais explosiva que Loren, soltava exclamações indignadas ou coisas do tipo durante o monólogo de , mas nunca a interrompia completamente. Quando ela acabou, contando dos conselhos de Rowena para que esperasse que tudo se resolveria, agora que tinha sido sincera com ele. As duas garotas aguardaram um tempo, e depois Maddy deu um sorriso largo.
  - Eu sabia que você ia acabar se apaixonando por ele. Era inevitável. – ela falou, orgulhosa de si mesma, fazendo mais uma vez rolar os olhos. – tem um lado muito gentil, e mesmo que eu só o conheça por causa das entrevistas e da banda, eu o conhecia mais que você quando se casou com ele. Eu disse pra você que você tinha dado sorte. – ela completou, tomando um gole da cerveja.
  - Esse não é o ponto aqui, Sra. Vidente Fabulosa. – disse ironicamente, fazendo-a engasgar na bebida enquanto ria.
  - Eu meio que entendo o que Maddy quis dizer, . – Loren assumiu seu posto, olhando para as duas mais novas. – Nós te conhecemos e sabemos o quão fácil você se apaixona por pessoas gentis. E realmente é uma pessoa maravilhosa, e você teve muita sorte de acidentalmente acabar casada com ele porque ele te trata bem. Talvez ter agido com ele daquela forma não tenha sido a melhor reação.
  - É claro que a culpa foi dele também. – Maddy retrucou, ofendida, antes que pudesse baixar a cabeça e concordar pesarosa. – Tudo bem que ele está ocupado, mas não te levar para conhecer a cidade e só sair com você por obrigação? É de se admirar que você não tenha virado uma louca dos gatos mesmo. Achei que ele ia ser melhor que isso.
  - Pelo menos ele nos chamou até aqui para consolar você, já que ele não consegue fazer isso. – Loren falou e sorriu.
  - Estou muito feliz que ele tenha feito isso. – confessou. – é assim. Eu não consigo ficar irritada com ele. Mesmo que eu esteja me sentindo usada e um lixo, quando ele faz esse tipo de coisa ou diz coisas boas para mim e se mostra agradecido... eu não consigo refrear o sentimento. Acho que por isso me sinto tão boba. – suspirou. – Eu tenho consciência do papel de trouxa que estou fazendo, mas quando ele me recompensa com alguma coisa parece que tudo vale a pena. – resmungou, virando o resto de cerveja de sua caneca.
  - Awn, que bonitinha. Está mesmo apaixonada. – Loren disse, soltando risinhos. Maddy batucou alguma coisa na mesa.
  - É que nem aquela música do Fall Out Boy. “And I love the way you hurt me... it’s irresistible” (E eu amo o jeito que você me machuca… é irresistível). – ela cantarolou, e concordou com a cabeça.
  - Bom, acho que terminamos por aqui. Já gostei de Rowena, pois ela cuidou de você quando você precisava e te deu ótimos conselhos. Eu não diria coisa melhor. – Loren sorriu, pegando a bolsa e arrumando algumas coisas da mesa. – Vamos? Estou morta de cansaço agora.
  As três levantaram-se, pegaram as bolsas e entraram na fila pra pagar. A fila já estava um pouco grande, por ser quase hora de o bar fechar.
  - É impressão minha ou estamos sendo observadas? – Maddy perguntou, sentindo-se incomodada e olhando ao redor. olhou também, apesar de não ter percebido nada. Meio que se acostumara, ao sair com , a ter todos os olhos em si, por isso nem ligava mais.
  - Acho que não, Maddy. – Loren acalmou-a. Você deve estar sensível por causa da viagem. Ou nós estamos mesmo, graças a uma celebridade aqui. – ela piscou para , que soltou uma risadinha.
  - Não sou uma celebridade. – reforçou o que sempre dizia.
  - Sei não... – a ruiva ainda olhava ao redor, e pareceu incomodada até o fim da noite, mas ao entrarem no táxi de volta foi a primeira a capotar, como se não tivesse nenhuma preocupação na vida.

     

Os dias que se seguiram foram repletos de turismo. não sabia quando voltaria, mas aproveitava os dias com seus pais e amigas. Logo depois da noite no Lamb and Flag, levou os pais para conhecer tudo o que Rowena havia mostrado a ela na semana anterior. Foram aos pontos famosos turísticos de Londres e, dessa vez, pegaram o barco que saía de Westminster Pier, em frente ao Big Ben, e ia até a Tower Bridge. Tiraram muitas fotos no ponto histórico, e Peter insistiu que pagassem a taxa, já que gostava de coisas medievais e aquele era o principal castelo da época de Londres. recusou-se, por causa de seu medo de altura, a subir até a ponte suspensa, mas fingiu ter visto sua mãe acenando lá de cima quando os dois foram. Loren e Maddy queriam fazer o tour das compras, então deixaram a família sozinha naquele primeiro dia.
  Depois da tour normal, almoçaram em um restaurante italiano – apesar de estar em Londres, Amelie recusava-se terminantemente a comer o famoso fish&chips enrolado em jornal, e insistiu que queria um restaurante agradável e limpo. sugeriu que de lá fossem para Kensington, que de acordo com o que ela havia lido num guia, era onde se encontravam três ótimos museus: Victoria & Albert Museum, Natural History Museum e Science Museum. O Victoria & Albert Museum era famoso por suas artes decorativas e design, o que fazia os olhos de Amelie brilharem. Peter também se interessava muito por História Natural e Ciência, por isso o Natural History Museum e Science Museum, que ficavam bem próximos um do outro. Quando Peter estava na escola, teve uma excursão para Nova Iorque e nunca se esqueceu do Museu de História Natural de lá. achou melhor fazer esse passeio com os pais porque sabia que eles gostariam de passar o dia em museus assim, mas Loren e Maddy morreriam de tédio. Poderiam conhecer outras partes da cidade quando estivessem todos juntos.
  Como esperado, o casal adorou tudo. também se divertiu bastante, porque estar perto de sua família recarregava suas energias e a deixava com mais força. Ver sua mãe sorrindo e seu pai empolgado com aqueles passeios era a melhor coisa do mundo. Várias vezes tinha que se controlar para não começar a chorar no meio do museu, de tão feliz que estava. Não tinha percebido o quanto fazia falta ficar longe de seus pais, e ter uma espécie de férias como aqueles dias em Londres era uma coisa que ela nunca se arrependeria de ter acontecido. Ela poderia odiar depois de um tempo, ter um divórcio nas costas e voltar para sua pequena Westcliffe depois de tudo, mas sempre se lembraria daquele momento com seus pais.
  O dia seguinte foi reservado para Notting Hill, dessa vez com todos juntos. Loren era um pouco viciada no filme graças ao Hugh Grant, e quis passar o dia lá, o que foi extremamente agradável. Passeios por entre as casas coladinhas e de fachadas coloridas e pelas ruas estreitas foram o foco do dia. Pararam em alguns cafés para pausas, provando um pouco de cada coisa diferente, como tortas e tipos diferentes de bebida e chá. Muitas lojinhas e coisas de antiguidades chamaram a atenção do grupo, e se divertiam escolhendo coisas para levar para casa. , secretamente, comprou uma pulseira de couro para , achando que combinaria com o tipo de roupa que ele usava. Também viu brincos com penas de pavão e imediatamente comprou para Rowena, já que achou a cara dela. Para si mesma, fuçando nas lojas de antiguidade, achou um pequeno totem de lobo uivando. Achou bobo de sua parte, mas sempre que olhasse para ele se lembraria de , e talvez não ficasse tão solitária.
  Ao retornarem para casa, Amelie preparou um de seus jantares magníficos e comeram todos juntos na sala, comentando tudo o que gostaram de fazer ali. Dali a dois dias já iriam embora, e começava a se sentir solitária de novo, pouco a pouco. Ter sua família reunida com suas amigas era algo que ela agora ansiava. Talvez voltar para casa não fosse tão ruim assim. Ela ficaria sem , mas, é bem capaz que nunca tivesse tido ele de qualquer forma.
  O último dia para passearem pela cidade acordou chuvoso, e desanimou todos a saírem de casa. Ficaram por ali, dando conselhos a sobre o que fazer em relação à e à situação. Amelie, assim que soube de Rowena, insistiu para conhecê-la, mas não tinha como a garota sair do trabalho no meio do dia, então deixou para uma próxima vez que talvez existisse. Enquanto Amelie cozinhava o almoço e Peter assistia a algum jogo de futebol na TV, as três garotas se reuniram no quarto de e voltaram a conversar sobre .
  - Eu acho que você não pode desistir. – Maddy foi direta, mexendo no cabelo curto. – precisa enxergar o quanto você é maravilhosa e querer ficar com você. Ele não vai achar ninguém melhor.
  - Mas temos que ver o que a realmente quer, Madeline. – Loren comentou, rolando os olhos, enquanto brincava com Miles, a quem se apegou rapidamente. – Não é legal ser tratada como trouxa. Não vou deixar a ficar aqui se for desse jeito, não importa o quanto ela goste dele.
   sorriu ao vê-las discutindo sobre o seu bem.
  - Não se preocupem, meninas. Eu já decidi que vou voltar quando acabar os três meses.
  - Ué, mas você não gosta dele? Não quer ficar com ele? – Maddy aprumou-se na cama e a encarou de olhos arregalados.
  - Quero, mas... se ele só está seguindo a parte do contrato, eu também vou fazer isso. Eu gosto do , mas ao mesmo tempo não sei se gosto. É estranho. – ela coçou a ponta do nariz e deu ombros. – Acho que fiquei um pouco encantada por ele no começo, e então, por ele ser a única pessoa aqui para mim, eu acabei ficando muito dependente dele. Agora que vocês vieram para cá e passaram os dias comigo, eu pude perceber que ele não me faz tanta falta quanto achei que faria. Se eu voltar para Westcliffe e puder passar meus dias com vocês, eu vou ficar bem. – ela sorriu, decidida. Loren e Maddy trocaram um olhar preocupado que não entendeu direito, mas antes que pudesse perguntar, Loren soltou um suspiro.
  - Se acha que consegue se resolver assim, então está bem. Só não faça nada de que vai se arrepender. Nós vimos você com e vimos que aquele sentimento não é só dependência, . Acho que Maddy de certa forma está correta, tem que tentar fazê-lo se apaixonar por você enquanto há tempo. Pode ser que não se arrependa disso.
   parou, pensativa, e seus olhos vagaram até os embrulhos do que havia comprado naquele dia, lembrando do pequeno lobo uivando. Mesmo que tivesse dito tudo aquilo, ainda assim comprara o lobo para lembrar-se de . Deveria jogar o totem fora? Conseguiria?
  - Não queria ir embora amanhã. – Maddy fez bico, passando as fotos tiradas no celular. – É uma pena que a gente tenha que trabalhar e te deixar aqui de novo.
  - Sim... – Loren concordou, sorrindo triste. sentiu os olhos se encherem de lágrimas e pulou na cama para abraçar as duas ao mesmo tempo.
  - Eu vou estar lá de volta em breve. Me esperem. – sussurrou. – Vai dar tudo certo.
  - Vai sim, . Você vai conseguir se resolver com e vai conseguir uma vida maravilhosa, seja aqui ou em Westcliffe. – Loren disse, afagando seu cabelo. – Sabe de uma coisa, só vendo você agora já me faz pensar que você cresceu tano com esse casamento, falso ou não.
  Antes que as três caíssem em um chororô antecipando a nova separação, Amelie gritou lá de baixo avisando que o almoço estava pronto. Limpando o rosto e dando risadas, as três desceram correndo pelas escadas para comerem juntas mais uma vez a maravilhosa comida da mãe de .

     

No dia de retorno da família e amigas de , também choveu. Ela chamou um taxi, e foram todos apertados para o aeroporto logo cedo, já que o voo era antes do meio-dia. Todos estavam quietos, ouvindo o barulho da chuva. Pegaram um pouco de trânsito e, chegando lá, correram fazer o check-in e despachar a bagagem. Sem muito tempo para enrolarem, iniciaram-se mais uma vez as despedidas chorosas. Amelie deu-lhe mais mil recomendações para o mês e meio que faltava para retornar para casa, e mais algumas a respeito de . Loren e Maddy apertaram-na e a avisaram que era para ela manter contato constante e contar tudo que acontecesse entre ela e , o que ela prometeu imediatamente.
  Ao retornar pra casa, já se sentia solitária. Não sabia quando voltaria da viagem, mas agora sem seus pais e suas amigas ali, tudo ficaria mais difícil, ainda mais se ele não estivesse lá. Agora ela havia pensado sobre muitas coisas e aprendido mais sobre ele, e com a visita das pessoas que amava, parecia que suas energias haviam sido recarregadas, e ela se lembrou porque prometera aquilo para ele em primeiro lugar.
  Bem mais leve e de bem consigo mesma, desceu e pagou o taxi ao chegar em casa. A luz estava acesa e, quase acostumada com as surpresas que vinha tendo recentemente, não chegou a se surpreender completamente quando abriu a porta e encontrou com uma mala aos pés e acariciando Bartholomeu. Parou na porta, encarando-o enquanto ele a olhava e se levantava.
  - Oi, . – disse, com um sorriso.

Décimo Sexto Capítulo

     

Depois de alguns segundos sem nenhuma resposta, sorriu e fechou a porta atrás de si. Ela estava surpresa, mas não totalmente surpresa. não havia avisado quando ia embora, nem quando voltaria, mas como ele tinha preparado toda a visita de sua família e amigas, ela meio que esperava que ele fosse voltar depois disso. Só não esperava que fosse imediatamente depois.
  - Bem-vindo de volta. – ela se aproximou. – Foi tudo bem? – perguntou. analisou-a por um tempo, fazendo-a subitamente lembrar que, quando ele se fora, eles tinham brigado. Estava tão triste com a partida de seus familiares e amigas e em êxtase pelos últimos dias que, com sua súbita volta, por um momento esquecera daquilo, apesar de ter passado tanto tempo remoendo a situação. Era capaz que ele ainda esperasse que ela estivesse chateada e quisesse bater nele e desistir de tudo.
  Mas não estava se sentindo assim. Sozinha, ela pensara muito sobre as coisas que aconteceram entre os dois, e com a visita de Rowena e dos outros, pôde clarear os pensamentos definitivamente. Todos lhe mostraram lados diferentes de , e ela entendeu mais sobre o homem com quem havia acidentalmente se casado. Era uma coisa importante e que eles não haviam feito antes. Mas agora sentia-se mais capaz de enfrentar não só , como também toda aquela situação, pelo menos de uma forma melhor do que estivera fazendo até agora. Quando chegou a Londres, era uma garota de uma cidade de 500 habitantes que havia se metido em uma baita encrenca e não sabia o que a esperava. Ainda por cima, acabou se apaixonando pelo homem que mal conhecia.
  Agora, as coisas já eram diferentes. pareceu perceber aquilo só de olhar para ela, parada na soleira da porta, aguardando que ele a respondesse.
  - Sim, foi tudo bem. – respondeu, parecendo aliviado que estava tudo bem. – Escute... nós precisamos conversar... – o tom dele era mais apologético do que tenso, então não se sentiu assustada com o que poderia significar aquilo.
  - Sim, precisamos. – ela concordou rapidamente, parecendo mais uma vez surpreender . Ele provavelmente estava se perguntando o que teria acontecido com ela durante o tempo que se afastou. – Se quiser, leve as coisas pra cima e tome um banho, vou preparando o jantar e então conversamos, que tal? – ofereceu. Ele concordou com a cabeça, dando um sorriso fraco e pegando as malas do chão.
   imediatamente foi para a cozinha, ao passo em que os gatos seguiram escada acima. Com isso, ela poderia organizar melhor o que gostaria de falar com ele e como falaria, assim não teriam problemas. Ela nunca tivera problemas de comunicação antes, durante seu emprego e sua pacata vida, mas a briga da última vez resultara disso, e ela não poderia deixar isso acontecer de novo. Iria perdurar o tempo restante que combinara com e a banda, por isso era melhor que o clima ficasse bom.
  Seu coração ficou inseguro apenas em um momento: quando parou para pensar porque fora que iniciara a ideia de “precisamos conversar”. Teria acontecido algo? Se tivesse, ela provavelmente saberia pela mídia, certo? Não devia ter nada de errado, talvez ele apenas estivesse arrependido de tudo e quisesse se desculpar.
  Ela sorriu com esse pensamento. Gostaria que as coisas voltassem a ficar bem entre ela e . Aquilo nunca fora um relacionamento de verdade, mas os momentos que passara perto dele foram bons o suficiente para ela os querer de volta. Ter brigado com ele e ter ficado afastada dele sem nenhuma notícia foi algo que ela não desejaria passar de novo. Talvez só ela estivesse se sentindo desse jeito, como uma verdadeira esposa, mas que a deixara confortável e fazia seu coração palpitar quando estava por perto era uma verdade que ela nunca poderia negar.
   terminou o banho e voltou para a cozinha quando ela estava perto de terminar a torta de frango que havia preparado. Ele a observou em silêncio por alguns segundos, mas já havia notado sua presença ali e, terminando de arrumar a mesa, voltou-se para ele, preparada para o que quer que fosse ser falado naquele momento.
  Os dois se entreolharam, como se aguardassem quem fosse começar, e tomou a dianteira.
  - , eu... – ele hesitou, depois baixou os olhos . – Preciso me desculpar pelo jeito que agi com você. – ele disse, pigarreando. Ela arregalou levemente os olhos. É claro que a possibilidade de desculpar-se com ela havia passado pela sua mente, mas não achou que ele ia ser tão direto. Além do mais, ele parecia realmente envergonhado de estar falando aquilo, sendo extremamente fofo. odiava o quão injusto podia ser às vezes.
  - Hm, eu também não fui muito certa daquela vez também. – ela murmurou, encostando-se na bancada. Mal terminara a frase, já balançava sua cabeça negativamente.
  - Não estou me referindo só ao que eu disse naquela noite. – ele suspirou, passando a mão pelo rosto. A garota o encarou, um pouco confusa. voltou a levantar seus olhos para ela. – Estou me referindo ao tempo todo que você esteve aqui. Eu fiz tudo errado com você.
  - O-o quê? Como assim? – como ela passara a última semana martelando a briga entre os dois, nunca lhe passou na cabeça que estaria falando de outras coisas. Ela nem sabia que outras coisas eram.
  - Desde que você chegou aqui, eu só tenho te usado. Eu te deixava sozinha em casa e, quando era conveniente sairmos na mídia, eu te levava para jantar e atuava para tudo parecer real. Eu só fui perceber o quanto eu fui horrível quando te vi sentada na minha cama, chorando. – ele engoliu em seco, agora mexendo no cabelo da nuca, completamente constrangido. Ela ainda o encarava, surpresa pelo que ele falava. Fez menção de falar alguma coisa, mas a interrompeu. – Deixa eu terminar, por favor. Quando você disse que ia me ajudar, eu fiquei tão feliz que tudo seria resolvido facilmente. Nós fingiríamos que estávamos casados, teríamos uma história, nenhum problema. Quem se importaria de fingir estar casado com uma garota bonita? Eu não. – ele deu ombros. – Fiquei preocupado um tempo, se daria certo, se você ficaria bem, mas depois da Jess, eu pensei “ é forte”. Então assumi que você se viraria sozinha e eu poderia continuar minha vida do jeito que sempre fora. Eu só vivi com pessoas ao redor na época que eu vivia com meus pais, depois disso passei a ter uma vida totalmente independente e não me importar com outros, que estavam todos distantes de mim. Eu me focava no trabalho, saía com meus amigos da banda e ficava nisso. Enquanto você esteve aqui, era muito fácil eu me esquecer de que você estava em casa e ficar no estúdio apenas trabalhando. As pessoas já pararam de falar tanto da gente também, como uma notícia absurda, pelo menos. A meu ver, estava tudo maravilhoso. E eu achei que você poderia estar saindo e se divertindo na cidade, completamente alheio ao fato de que você é uma garota do interior, que foi jogada num mundo totalmente diferente do seu e está tendo que enfrentar diversas coisas que não são parte do que você está acostumada. E o pior de tudo, é que você teve que fazer isso sozinha. Eu não estava aqui nem no começo, para te ajudar a se adaptar à cidade e ao que fosse preciso. Como Bill falou que tínhamos que manter a produção dos singles e álbuns normalmente, foquei-me no trabalho, como sempre fiz. – ele deu um sorriso fraco. – Acho que eu realmente não estava pronto para ter uma vida de casado. – completou, hesitando um pouco antes de dizer ainda: - Realmente, me desculpe pelo que fiz com você, . Eu te arrastei pra um mundo totalmente maluco e desorganizado, mas na hora que você precisava, eu soltei sua mão e te deixei sozinha. Espero que possa me desculpar e me dar uma chance de fazer as coisas direito para você dessa vez.
   ficou em silêncio, estupefata pelas palavras. Aquele decerto não era o rumo que esperava que as coisas tomassem. No máximo esperava que se desculpasse por ter dito as coisas daquela forma para ela na última vez em que se viram. Ela não o culpava por ter dito aquilo, só a forma com que disse. Até porque ele estava certo, ele não era obrigado a se apaixonar por ela. Mas agora tudo estava confuso, e ela precisava digerir suas palavras.
  A primeira coisa que conseguiu dizer foi:
  - Eu acho que nunca pensei que você fosse uma pessoa ruim. – o que era verdade. pareceu um pouco surpreso, e até mesmo estava um pouco assim, mas mesmo em sua solidão ela não pensava com raiva de . Ela entendia o lado dele e sabia que também estava sendo meio parva ao não correr atrás das coisas que queria. Quando esteve sozinha, percebeu também o quão pouco se esforçara ali. É claro que, perdida numa cidade grande e sem nenhuma companhia, a situação era bem mais difícil para ela, e ela já estava fazendo um esforço concordando em ajudar sem aparentemente nada em troca. Por ter se apaixonado facilmente por ele, achou que o mesmo aconteceria em relação a ela, mas nunca colocou nenhum esforço em fazê-lo se apaixonar por ela. Talvez isso que a tivesse frustrado naquela noite da briga. não tinha sido o melhor marido falso, mas entendia completamente que a culpa não era só dele.
  Agora precisava achar um jeito de exprimir esses sentimentos para que também pudesse entender.
  Pigarreou, levantando os olhos para encará-lo. tinha um olhar ansioso, aguardando pelo que ela diria. Respirando fundo, começou.
  - Quando eu concordei em ajudar você, achei que seria o mais fácil pra nós dois. Eu era obviamente a parte que mais saía perdendo nesse nosso combinado, mas ainda assim concordei porque sabia que, se não concordasse, você sairia perdendo e seria muito pior do que a minha situação. Então aceitei entrar nesse mundo maluco a que você refere. O problema é que você assumiu que eu era forte, e eu não sou exatamente forte. Quer dizer, eu posso ser forte, mas não sempre. Principalmente não quando estou numa cidade grande e turística, sendo alvo de fofocas e notícias do mundo pop. Não sei ser forte nessas horas porque nunca antes passei por isso. Quando cheguei aqui, eu estava completamente dependente de você. Achei que, como combinamos que eu seria sua esposa por três meses, estaria tudo bem depender de você. – ela deu um sorriso fraco, desviando os olhos. – Eu me esforcei para conseguir fazer as coisas direito, mas nunca me esforcei para conseguir as coisas que eu queria, e eu não posso jogar a culpa em você por não tê-las conseguido. Também não precisava ter esperado você tomar a iniciativa sempre, e deveria ter saído por conta própria e feito o que queria fazer. Foi errado da minha parte achar que poderia depender de você, e foi errado você achar que eu seria independente e forte o tempo todo sem você. Mas não acho que seja uma pessoa ruim, porque, bom... – ela de ombros e riu. – Apesar de tudo, você sempre me tratou bem. Sempre foi gentil e sempre cuidou de mim. Você falou que seria meu porto seguro aqui, e eu acreditei nisso. Em nenhum momento você foi rude comigo, embora tenha me deixado sozinha. Por eu estar sempre tranquila e feliz ao seu lado, a dependência se tornou bem mais fácil. “Se eu estiver ao lado de , vai ficar tudo bem.” Talvez por isso que eu tenha me apaixonado por você. – corou, mantendo os olhos baixos. – E talvez por isso que eu esperava que você tivesse se apaixonado por mim, mesmo quando não era sua obrigação. Então, me desculpe também pelo jeito que agi, exigindo algo de você que você nem sabia que eu queria.
  Quando terminou de falar, permaneceu de olhos baixos, um pouco envergonhada de ter falado tudo. Realmente falara tudo. Esperava que tudo ficasse bem agora.
  Foi surpreendida pelos braços de envolvendo-a, de forma que sua testa ficou apoiada no ombro dele. De olhos levemente arregalados, tentou afastar-se por reflexo, mas ele a manteve ali. Aguardando a explicação para aquela atitude, ouviu:
  - É muito injusto da sua parte ser assim. – ele não parecia bravo, só que pôde ouvir um tom de mágoa em sua voz. – Eu tento me redimir por ter sido um babaca, e ao invés de você pisar em mim e se aproveitar da chance, você faz esse tipo de coisa. Como é que você consegue ser tão incrível? Assim fica difícil para mim. – ele resmungou o final e ela não entendeu o que estava difícil naquela situação para ele. Talvez a culpa fosse do cheiro de , que invadia suas narinas e chegava a arrepiar os cabelos de sua nuca. O calor dele a envolvia, e ela podia sentir perfeitamente todos os pontos em que ele a tocava. Aquilo decerto era perturbador, então não podia se sentir culpada por não entender nada direito.
   afastou-se alguns centímetros, apenas para que pudessem encarar-se nos olhos sem se tocarem. manteve os olhos fixos nos dele, aguardando ele dizer mais alguma coisa, já que estava sem palavras. Na verdade, estava inclusive sem fôlego. Ele a chamava de injusta, mas ela não concordava com isso. Ele conseguia deixá-la sem ar nenhum só de estar tão próximo dela. Parecia que sua espinha dorsal tinha derretido e ela ia cair a qualquer momento. Quando ele finalmente abriu a boca para falar, seu hálito suave atingiu o rosto da garota e ela teve que se controlar muito para não ficar na ponta dos pés e beijá-lo.
  - Você pode me dar mais uma chance de fazer as coisas direito? Ainda temos mais ou menos um mês, e eu não quero que essa seja uma experiência horrível para você. – ele pediu, os olhos baixos encarando todo o rosto de , parecendo inquietos. – Dessa vez, não vou te deixar sozinha. – sussurrou.
  Ela sabia que devia responder algo decente e parar de ser parva, como ela mesma tinha dito que tinha sido anteriormente. Mas era impossível. Com esforço, concordou com a cabeça e afastou-se um pouco dele, pelo menos para que pudesse respirar um pouco de ar fresco e voltar a pensar claramente.
  - O que foi? – ele perguntou, observando-a, e o rosto da garota esquentou ainda mais. Ela estava achando que logo poderia fritar um ovo em suas bochechas avermelhadas.
  - N-nada. – respirou fundo e forçou um sorriso fraco. – Fico feliz que a gente pôde conversar desse jeito. Esclarecer as coisas acaba sendo sempre a melhor opção, né?
  - Sim. É uma pena que a gente não tenha feito isso antes. – ele riu. Um silêncio constrangedor podia estar prestes a se instalar na cozinha quando exclamou:
  - Ah, a torta! – e correu até o forno, onde o jantar já estava cheirando bem. recebeu uma ligação e saiu por alguns segundos da cozinha para atendê-la, deixando servir a mesa e a torta sozinha. Quando retornou, tinha um sorriso em seu rosto.
  - Depois do almoço, vamos fazer um live em uma rádio. – ele contou, sentando-se e tendo seus olhos brilhantes ao ver a torta que a esposa preparara.
   sentiu seu estômago afundar um pouquinho. Agora que se resolveram, ela queria poder passar um tempo ao lado de , conhecendo-o mais e mais. Ele pareceu perceber que a notícia a abalou um pouco, mas inesperadamente soltou uma risadinha.
  - , você não está pensando que eu não escutei nada da nossa conversa há cinco minutos, está? – ele arqueou as sobrancelhas, ao passo que a garota corara e tentara colocar uma expressão inocente em seu rosto. Às vezes ela odiava como parecia que lia sua mente. – Eu não vou ser um idiota e sair correndo direto para o trabalho depois que discutimos tudo aquilo. – ele falou, antes de soprar um pedaço da torta e colocá-la na boca, parecendo apreciar o sabor.
  - M-mas... – ela franziu levemente as sobrancelhas. – Você não pode simplesmente não ir trabalhar, ainda mais se é um live numa rádio, não é?
  - Claro. – ele concordou e lançou mais um sorriso largo para ela, que ficou ainda mais confusa. – Mas dessa vez você vai comigo.

     

ainda não tinha entendido as intenções de ao pararem no estacionamento particular da rádio. Os dois receberam crachás e entrelaçou sua mão à dela. Ela apareceria ao vivo? Precisaria ser entrevistada? Por que ele a estava levando junto?
  - !! – e levantaram os dois braços e acenaram para ela quando se aproximaram, dando largos sorrisos. – Já faz um tempo, como você está?
  - Er... bem, obrigada. – ela retribuiu o sorriso, mas ainda completamente perdida. Olhou interrogativamente para , que deu ombros.
  - O que foi?
  - Por que eu vim? Vou ser entrevistada? – perguntou, seguindo os dois outros membros da banda para dentro do prédio, com ao seu lado.
  - Nah. Hoje você vai ficar do lado de fora. Pensei que você gostaria de interagir um pouco mais com a banda e talvez entender um pouco do que eu faço. – podia ser impressão de , mas ela achou que havia corado um pouco. Depois, ele pareceu surpreso. – Ah! A menos que... que você não queira. – e então a animação dele se esvaiu, enquanto ele a encarava um pouco hesitante, mordendo o lábio inferior. Tentando não se focar em seus lábios e sim no que precisava dizer, deu um pequeno sorriso.
  - Não, tudo bem. Acho que eu gostaria muito de ver.
   sorriu novamente ao ouvir essas palavras. Os dois entraram no elevador, atrás de e , que já haviam pressionado o botão do sétimo andar. Eles começaram a falar sobre um assunto qualquer relacionado às pessoas que trabalhavam ali, e calaram-se assim que chegaram ao andar, saindo para cumprimentar quem os recepcionava.
   ficou um pouco para trás, sem saber o que fazer. Mas não precisou esperar muito, alguém a encarou em dúvida e apressou-se em apresenta-la com um largo sorriso e uma nota de orgulho que fez o coração da garota bater rápido por algum motivo. Ela não sabia se estava atuando naquele momento, apesar de que ele provavelmente atuava muito bem.
  - Meninos, vamos entrando, vamos. Querida, você espera aqui, pegue esses fones. – o homem grisalho com uma gravata laranja-berrante que havia primeiro cumprimentado o grupo impediu-a de seguir e os outros pela porta, e ofereceu-a uma cadeira em frente ao painel com milhares de botões, atrás de uma janela de vidro que mostrava a sala na qual eles haviam acabado de entrar. acomodou-se com um violão na cadeira que possuía um microfone na altura do rosto e outro na altura de suas mãos. acomodou-se em algo que parecia uma caixa de madeira, suas pernas longas parecendo estirar-se por todos os lados. Deu umas batucadas e soltou um sorriso largo, parecendo adorar aquilo. , para a surpresa de , segurava um violoncelo, parecendo completamente deslocado. Sentada e observando em silêncio, colocou os fones que haviam lhe entregado e ouviu o que eles conversavam, apesar de uma lâmpada acima da janela indicar que eles estavam fora do ar ainda.
   percebeu que os olhos de estavam fixos nele e sorriu para ela, acenando. Ela corou, porque tinha imaginado que aquele vidro era como aqueles de interrogatórios criminais, que não seria vista por quem estava dentro. Talvez ela assistisse mesmo CSI Las Vegas demais. Era óbvio que e os outros podiam vê-la, porque o homem com a gravata fazia alguns gestos para eles e eles concordavam.
  - ! – perguntou de repente e ela deu um pulo no lugar, levantando-se para enxergá-lo melhor. – Qual é sua música favorita?
  Ela surpreendeu-se um pouco com a pergunta. É claro que tinha estado ouvindo todas as músicas do desde que viera para a Inglaterra, não só porque havia se casado com , mas por serem muito boas. Achou inesperado que a perguntassem algo do tipo.
  - Não me diga que você nunca ouviu nada nosso! – começou a levantar-se quase ameaçadoramente e a garota apressou-se a responder.
  - Ouvi, ouvi! – falou com ansiedade, fazendo os três rirem. – É Pearl Eyes. – respondeu, lembrando-se da balada que mais gostava de ouvir deles. Os três soltaram um “ohhh” como se a admirassem por isso, o que era estranho, e mais estranho ainda, juntaram as cabeças e começaram a cochichar coisas. tocou algumas notas no violoncelo e depois concordou logo com a cabeça.
  Um toque no vidro do homem grisalho chamou a atenção deles, e ele começou a fazer uma contagem regressiva, a partir do dez, com os dedos. ajeitou o fone e aguardou, e quando o último dedo se foi, ela ouviu a vinheta e a luz indicou que estavam no ar.
  “E aqui estamos com a querida banda ! Tendo estado nos holofotes recentemente, sem deixar de preparar um novo álbum quentinho para as fãs, eles vieram tocar algumas acústicas para nós ao vivo! Soltem as vozes, rapazes!” ela pôde ouvir o locutor dizer. arrumou-se na cadeira e começou a falar. Todos eles cumprimentaram as fãs e se apresentaram, e logo depois anunciou que tocariam uma balada e um trecho de uma música nova, inédita, que não haviam tocado em lugar nenhum ainda. Então ele anunciou Pearl Eyes, piscando para , que arregalou os olhos de leve. Eles tinham planejado aquilo ou acabaram de mudar por ela falar que gostava da música?
  De qualquer forma, o violão suave começou, e imediatamente começou a cantar, quase em um sussurro. , sentada na cadeira o encarando, sentiu os pelos do corpo inteiro se arrepiarem. Ela tinha ouvido todas as versões gravadas das músicas, mas aquela era a primeira vez que via cantando ao vivo. Pearl Eyes era uma música com uma melodia lenta, mas a letra poética era quase cantada em um sussurro rouco, até que alcançava o refrão e adquiria uma força que fez o coração dela bater ainda mais forte, uma sensação esquisita no estômago.

     

“Pearl eyes
  Pearl eyes
  A miscellaneous of colours
  Of lights and sparkles
  Everything inside those
  Pearl eyes
  Pearl eyes”

     

cantava colocando emoção em cada palavra e sussurro, enquanto e acompanhavam a melodia com a cabeça e tocando seus instrumentos. sempre achou que o baixo tinha um som profundo, mas aquela música ao som do violoncelo podia se tornar ainda mais incrível. continuou cantando enquanto dedilhava no violão, e finalmente atingiu a última estrofe da música, levantando os olhos para , e não os movendo até que a última palavra tinha sido cantada.

     

“You are staring at the stars
  They still shine so bright
  A miscellaneous of colours
  Of lights and sparkles
  Everything reflected on those
  Lovely pearl eyes
  Pearl eyes”

     

A música encerrou e ainda encarava , dando-lhe um último sorriso e depois desviando os olhos, pronto para responder aos comentários feitos pelo locutor. A garota, percebendo que tinha prendido o ar de repente, soltou-o, mas a sensação que lhe prendia o interior não se foi. O coração dela parecia prestes a saltar do peito, e sua cabeça rodava ligeiramente, talvez pela falta de ar. Seu rosto também estava quente, porque não fora a única percebendo encará-la durante aquele tempo. Ela não sabia o que havia acontecido com ele de repente, mas não era uma mudança de todo ruim. Ela só teria que se acostumar para quase não morrer de arritmia toda vez que ele fizesse esse tipo de coisa.
   Depois de uma breve conversa com o locutor, eles anunciaram a música inédita, chamada Travelers of Skies, e cantaram uma versão curta dela, de cerca de um minuto e meio, apenas para mostrar o que as fãs deviam esperar desse novo álbum. Mais animada do que Pearl Eyes, manteve acompanhando o ritmo com o pé e um sorriso em seu rosto enquanto admirava a letra e o modo com que cantava. A voz dele parecia cada vez melhor, ainda mais ao vivo. Pareceu extremamente curta, na opinião dela, e ela logo quis ouvir todo resto. Imaginou que as fãs ficariam muito felizes com isso.
  Mais um pouco de conversa e eles se despediram, a luz acima dela voltando a indicar “fora do ar”. Levantou-se, entregando o fone para o homem grisalho com um sorriso, e aguardou de pé que os meninos arrumassem as coisas e voltassem para onde ela estava.
  - Muito bom, muito bom! – o homem os aplaudiu quando eles saíram da sala à prova de som e eles sorriram. Toda a staff que estava lá aplaudiu também, assim como , que os encarava com olhos brilhantes. encarou-a, fazendo seu rosto esquentar mais uma vez, mas ela não desviou os olhos.
  Enrolaram mais um pouco nas despedidas e seguiram o caminho. espreguiçou-se e bateu palmas.
  - Eu toparia uma Starbucks agora. O que acha, ? – ele sorriu largamente, parecendo mais simpático do que sempre fora, e ela voltou a estranhar a atitude deles. É claro que nunca a trataram mal, só que toda aquela proximidade era inusitada.
  - Ela parece estar se perguntando por que vocês estão tão grudentos com ela assim. – rolou os olhos e ela o encarou espantada. Ele não poderia ler mentes, poderia?
  Os dois riram, apertou o botão do elevador e voltou-se para ela.
  - Soubemos de que estava te tratando como um lixo. – ele fez uma cara feia para , que rolou os olhos. ia rebater para dizer que não era bem assim, mas sorriu como se planejasse algo. – Então decidimos que vamos ser super legais para você, para que você goste mais da gente do que dele. – soltou uma risada e também abafou o riso, apesar de ficar sério.
  - Não é engraçado. – ele pareceu se incomodar bastante com a brincadeira. – Eu já repensei minhas ações e não vai acontecer de novo. – rebateu, empurrando o mais novo para dentro do elevador que acabara de chegar. seguiu-os, sorrindo.
  - Mas mesmo assim, queremos que a goste da gente também. – disse, entrando por último. Sua cabeça quase batia no teto do elevador, e , a mais baixa entre eles, sentia-se dentro de muros quando estava de pé ao lado dos três. – Vai ser mais fácil pra ela se ela se der bem com todo mundo e se divertir com a gente, não é? – ele agora voltou-se para ela, piscando.
  - Suponho que sim. – ela murmurou, lançando um olhar de soslaio para , que a encarava. Ele suspirou.
  - Bom, não é como se eu pudesse impedir ela de ser amiga de alguém. Mas cuidado com eles. Eles são idiotas, e isso pode ser contagioso. – ele piscou para ela, fazendo-a rir. , saindo primeiro já que estava mais próximo da porta, não pareceu incomodado.
  - Então ela devia também se preocupar com você, que passa tanto tempo perto da gente. – rebateu, e dessa vez todos riram.
  Seguiram para o carro de , que os levaria até uma Starbucks. , sentada no banco da frente ao lado de seu marido com os outros dois no banco de trás, pensou que essa era a primeira vez que se divertia de verdade desde que chegara na Inglaterra, tendo seu coração bem mais leve agora que conversara com e pudera resolver tudo.
  De fato, do jeito que as coisas seguiam, ela ficaria bem triste de voltar para casa dali a um mês.

Décimo Sétimo Capítulo

  

- , você está pronta? – ouviu o grito de , provavelmente vindo da cozinha, e arregalou os olhos. Já estava na hora?
  - Só mais um minuto! – respondeu de volta, correndo para a frente do espelho e encarando sua franja, que hoje decidira ser sua inimiga mortal, e não sabia o que fazer com ela. Bufando, revirou sua bolsa de coisas para o cabelo e achou uma presilha preta com um laço embutido, puxando as mechas da franja para trás e prendendo-as. Observou-se.
  Seu vestido preto era um pouco curto, revelando suas pernas não muito longas e um pouco branquelas. O vestido, bem apertado no busto e de frente única, ao passar da cintura soltava-se em uma saia leve e confortável, com um shorts por baixo, por garantia. No pescoço, trazia um colar com um pingente de prata, combinando com os brincos que escolhera. Ela não costumava usar saltos, mas já que ia a um jantar com toda a , decidiu que não ia ficar parecendo uma anã, como sempre. Rowena, dois dias atrás, lhe ajudara a escolher todo o conjunto, com um patrocínio gentil de .
   sorriu de leve, gostando também da maquiagem que fizera. No seu último emprego não precisava se maquiar sempre, mas o que aprendera era mais do que suficiente para um look simples, mesmo que aquele fosse um jantar formal.
  Alguns dias haviam se passado desde que voltara, e as coisas não poderiam parecer melhores. Os outros rapazes da banda também a tratavam melhor e mais gentilmente, agora que saíam mais. Eles conversavam mais livremente sobre as coisas, e até mesmo Bill parecia mais simpático com ela. sentia como se realmente fosse esposa de .
  Lembrando-se dele, arregalou levemente os olhos delineados e pegou sua bolsa e um casaco pesado que combinava, já que faltava cerca de um mês para o Natal e estava bastante frio. iria embora antes do Natal, de acordo com os três meses, mas, talvez, se as coisas continuassem daquele jeito, ela ficasse só mais um pouco...
  Desceu as escadas com pressa, tentando equilibrar-se nos saltos sem se estatelar no chão e acabar no hospital. Ao chegar na metade da escada, percebeu que a aguardava no fim dela, os olhos dele a observando atentamente, uma leve expressão surpresa em suas feições. corou, pensando que devia ter feito charme e descido lentamente, seduzindo-o aos poucos, mas logo afastou a ideia. Primeiro, não conseguia seduzir ninguém. Segundo, estava atrasada e odiava estar atrasada.
  - Desculpe. – murmurou, finalmente alcançando o fim da escada e parando em frente a . Estava um pouco mais alta do que normalmente, era e o encarava de um ângulo um pouco diferente. Era capaz que ficasse ainda mais bonito daquele ângulo.
  Seu cabelo estava aquele misto de arrumação e bagunça como sempre, mas o terno negro que ele usava parecia cair-lhe perfeitamente bem. A blusa branca por baixo estava impecável, assim como o colete do mesmo tom escuro que o paletó e a calça. conteve um sorriso ao ver a gravata borboleta que ele usava, ao invés de uma gravata normal. Se ela estivesse de branco, ela provavelmente fantasiaria sobre o casamento dos dois naquele momento. Mas os dois vestidos de preto acabava tornando as coisas um pouco mórbidas. Ainda bem que era um jantar formal, e não um funeral.
  - Você está ótima. – ele sorriu, seus olhos brilhando aos poucos. O estômago de afundou e ela finalmente sorriu, baixando os olhos. Ela se sentia ótima. Fantástica, na verdade. Poderia dar cinco piruetas no ar de tanta felicidade, apesar de saber que isso não seria algo muito inteligente a se tentar, usando saltos. – Vamos, então?
  - Sim. – passou pelo braço estendido dele, que indicava a porta como um mordomo, e saiu na frente, encarando o frio. Sua pele inteira se arrepiou ao sentir a temperatura externa, bem contrastante com a interna, onde o aquecedor estava ligado. tratou de jogar o casaco por cima dos ombros, enquanto trancava a porta e deixava a luz de fora acesa, para quando chegassem sabe-se lá que horas.
  Trocaram um sorriso e começaram a se dirigir para o carro estacionado em frente, quando parou subitamente, apalpando os bolsos do paletó.
  - Ah, cacete! – ele xingou, procurando agora nos bolsos da calça. – Eu fiquei te apressando e agora estou sem a chave do carro. – resmungou, fazendo rir. – Quer esperar lá dentro enquanto eu procuro? – ele ofereceu, já tirando a chave de casa do bolso onde acabara de guardar.
  - Não, eu espero aqui. – assim ele ficaria com dó de ela congelando lá fora e se apressaria. Brincadeirinha.
  - Certo. Vou ser rápido. Se fosse meu carro antigo, eu nunca esqueceria a chave. – soltou mais um resmungo e correu para a porta, destrancando-a e entrando com pressa. nunca perguntara desse carro, mas lembrava-se que parecera chateado com Bill por lhe entregar um carro simples, assim que chegaram.
  Mal ficara sozinha, um vulto se aproximou com passos rápidos, assustando-a. encarou a pessoa completamente coberta de cachecóis e casacos e, com surpresa, reconheceu Leelah, sua vizinha. Mesmo àquela hora da noite, a mulher usava uma quantidade incrível de maquiagem, mantendo aquele olhar arregalado.
  - Ora ora, a senhorita celebridade! Como você vai, meu bem? – perguntou, tentando ser gentil. sorriu forçadamente de volta, não muito interessada em conversar com ela, lembrando-se de seu encontro do supermercado. Dessa vez, Robert, o marido de Leelah, não parecia estar à vista para conter a mulher.
  - Bem, obrigada. E a senhora? – respondeu polidamente, lançando um olhar para trás, de onde esperava surgir a qualquer momento para irem.
  - Maravilhosa. Tenho visto coisas incríveis sobre seu marido. Continua bonitão, não é? – a mulher riu. não teve tempo de responder, porque Leelah continuou a tagarelar. – É bom que ele tenha começado a te levar para sair. Faz o quê, quase três meses que você está aqui? E o rapaz só começou a te enxergar agora. Fico me perguntando se o affair dele deu errado, para ele começar a te dar atenção. – ela soltou uma risada, fazendo fechar a cara.
  Quando encontrara Leelah pela primeira vez, a mulher lhe incomodara com aquela ideia de affair e toda a tagarelice. ainda não tinha se acostumado com as pessoas, e muito menos com as pessoas a reconhecendo, mas agora era diferente. Ela já passara por muita coisa, tanto com tanto com outras fãs (principalmente na internet) para aceitar coisas como aquela de boca fechada.
  - Então a senhora está sugerindo que eu sou a segunda escolha do meu marido? – perguntou, friamente. Leelah pareceu surpresa com a firmeza da americana, provavelmente porque sua atitude estava bastante diferente da anterior.
  - Ora, querida, mas que ele só começou a te dar atenção agora é algo que você não pode negar... as pessoas pensam coisas, sabe? – ela pareceu tentar consertar a situação com sua amabilidade fingida. já não estava com paciência para aquilo.
  - As pessoas podem pensar o que quiser, mas sair acusando coisas sobre a vida dos outros é uma intromissão muito mal educada. – rebateu. Não sabia por que exatamente estava sendo tão fria com a mulher, mas não se sentia confortável em sua presença e, na primeira vez que se encontraram, Leelah não fizera mais nada além de arruinar sua autoestima e colocar caraminholas em sua cabeça. Não precisava mais daquilo, e não deixaria nenhuma abertura para isso. – Talvez, se a senhora cuidasse um pouco mais de sua vida ao invés de procurar defeitos na dos outros, provavelmente viveria melhor. Não precisa ficar se preocupando em como anda meu relacionamento com o , nem se preocupando em me avisar caso ele tenha um affair. Acho que posso lidar com essas coisas sozinha.
  Leelah pareceu completamente chocada com o discurso de , que estava começando a ficar boa em colocar as coisas para fora. Ouviu passos se aproximando e olhou para a porta, que agora trancava mais uma vez, parecendo com pressa.
  - Boa noite. – acenou sem emoção para Leelah, ainda parada encarando o casal. cumprimentou-a com a cabeça e destrancou o carro, abrindo a porta para sua esposa. Depois, deu a volta correndo e entrou no lado do motorista.
  - Era aquela vizinha do 15? – ele perguntou, franzindo as sobrancelhas ao observar a mulher, que agora dera meia-volta e se afastava com passos rápidos, parecendo irritada. ponderou se fora muito rude, mas não queria mais nada com a vizinha, ainda mais se ela só fosse lhe trazer pensamentos negativos.
  - Sim.
  - Você já a conhecia antes?
  - Esbarrei com ela no mercado uma vez. – contou, enquanto manobrava e seguia o caminho até a festa. – Ela foi incrivelmente rude e, apesar de não ser do meu feitio, acabei retribuindo o favor.
   soltou uma risada, fazendo sorrir de canto sem nem se arrepender de sua atitude, e seguiram para a festa.

     

ainda não se acostumara de todo com os eventos da . A maior parte do que fizera durante aqueles dois meses e pouco fora sair com em encontros públicos e parecer completamente apaixonada por ele (o que não era tão difícil assim, já que não estava tão longe da realidade). Mas eventos junto com a banda eram uma raridade, e aquele jantar era o primeiro do tipo que participava. Pelo que ela havia entendido, era um encontro da gravadora, com várias bandas participando, além da , e muita gente importante que ela não tinha ideia de que era.
  Encontraram e na porta, ao lado de Bill, e foi mais uma vez elogiada. Seu braço estava entrelaçado ao de , e ela mantinha-se perto dele, um pouco receosa de fazer ou falar algo que fosse atrapalhar. não parecia se importar com a proximidade, lançando sorrisos tortos para ela e apertando sua mão às vezes.
  Ao entrar, deparou-se com muito mais gente do que imaginava, fazendo-a se encolher levemente.
  - Fica calma. É só ficar perto da gente e cumprimentar as pessoas com seu sorriso lindo. – disse, piscando para ela e recebendo uma careta de . – Você já devia ter falado isso para ela, se não queria que eu falasse, . – gargalhou.
  - Nós contamos quem é a pessoa para você depois. – disse, imitando e também lhe mandando uma piscadela. Os homens estavam bastante galanteadores naquela noite, pelo visto.
  Como se tivesse se materializado, Jess de repente estava na frente deles com um sorriso largo, o mesmo sorriso faminto que dera durante a entrevista deles. sentiu o nervosismo aumentar consideravelmente, já que Jess obviamente sabia que o relacionamento deles era falso. A mulher pareceu não dar nenhum sinal disso, porém, parecendo animada ao ver o casal.
  - Os ! Estou com saudades de vocês, queridos. Acho que seria bom se eu chamasse para uma entrevista solo, não é mesmo? – ela abraçou a americana, que ainda estava um pouco desconsertada com tudo aquilo, e piscou um de seus olhos intensamente azuis. – Poderemos descobrir muitas coisas reveladoras... – e soltou um risinho.
   sorriu fraco, apertando-se contra .
  - Acho que não sou tão interessante para ser entrevistada sozinha, Jess. – respondeu timidamente. – Você vai perder tanta audiência que vai se arrepender. – acrescentou, fazendo a mulher gargalhar.
   - Você continua fascinante, . Pensei isso desde o primeiro momento que a vi. – Jess alargou o sorriso e ouviu alguém a chamando no fundo. – Bem, nos encontramos depois. Até mais. – acenou e afastou-se com passos rápidos.
  A garota sentiu o nervoso se esvair aos poucos, e sorriu-lhe, parecendo satisfeito com o que ela dissera. e já tinham desaparecido no meio da multidão, e Bill estava perto deles, mas conversava animadamente com um senhor muito bem vestido. Trocando um olhar, o casal andou pelas rodas de conversa até encontrar uma mesa livre para depositar as coisas. O salão estava bem aquecido, e os casacos não eram mais necessários, além de que era bom encontrar uma mesa para quando o jantar fosse servido.
  Depois de arrumar tudo, entrelaçou seus dedos e a guiou pelas pessoas, parando e cumprimentando pessoas de todos os tipos, apresentando-a carinhosamente e conversando um pouco. não sentia dificuldade em seguir com a conversa dele, representando o papel de esposa de , e assim que se afastavam do grupo, lhe explicava que acabara de conhecer o cantor de banda tal, um produtor renomado ou um membro de outra banda bastante famosinha. Mesmo que a garota não fosse muito inteirada no mundo pop, alguns nomes ela chegava a reconhecer, e passava alguns segundos em estupefação. Mas, bem, estava casada com um nome famoso desse mundo, então não devia se surpreender tanto assim.
   frequentemente perguntava se ela estava bem, o que a fazia bastante feliz. Vê-lo preocupado com seu conforto e bem-estar era agradável, de certa forma. Ele havia mudado muito desde a conversa dos dois, e chegava até a ponderar se aquilo era normal. Ele não poderia estar atuando apenas para fazê-la se sentir mais confortável até ir embora, poderia? Às vezes ele era tão gentil que ela quase acreditava nessa possibilidade. Mesmo que fosse assim, o jeito como ele segurava sua mão e sorria para ela, o jeito como conversava com os outros e a apresentava, quase orgulhoso, era suficiente para fazê-la suspirar. Só mais um pouco e ela começaria a enxergá-lo rodeado de flores e pétalas rosadas, como num filme.
  - Atenção! Atenção! – um homem de cerca de 50 anos bateu de leve um garfo contra uma taça de vinho, fazendo um barulho agudo para chamar a atenção. , de braço entrelaçado ao de , virou sua cabeça em direção ao som, e não foi a única. Logo o burburinho diminuiu, e todas as cabeças estavam viradas para o senhor que, de acordo com o sussurro de ao pé de seu ouvido, era o presidente da gravadora deles. Ela concordou com a cabeça, fingindo ter associado a informação imediatamente, quando na verdade só havia prestado atenção em como a voz de ficava ainda mais rouca e seu sotaque mais acentuado quando ele sussurrava.
  É fato que o sussurro dele lhe levou por caminhos bem impróprios e a fez perder a linha do pensamento por tempo suficiente para não ouvir nada da introdução do homem. Quando aplausos irromperam por toda a sala, saiu de seus devaneios com um sobressalto, e imediatamente começou a aplaudir também, sem nem ter ideia do quê. Olhou para de canto, e ele exibia um sorriso um pouco disfarçado, como se soubesse que ela não prestara nenhuma atenção naquilo. só esperava, mais uma vez, que ele não lesse mentes. Ou talvez, àquela altura do campeonato, ela até aceitaria que ele o fizesse, se aquilo os levasse para onde ela estava imaginando ao ouvir o sussurro dele...
  - Está cansada? – e lá estava ele novamente, soprando em seu ouvido suavemente como uma melodia gentil. Sentindo o rosto em chamas, virou-se para aqueles olhos e balançou a cabeça em negação. Depois repensou.
  - Só um pouco. Mas está tudo bem. – talvez ele se apiedasse dela e eles fossem embora mais cedo e ficassem sozinhos em casa...
  - O jantar vai ser servido depois desse anúncio. – ele disse, levantando o braço que não estava entrelaçado ao lado e colocando uma mecha do cabelo dela atrás da orelha. Ele estava bem próximo dela, seus narizes quase se tocando. Se se inclinasse só mais um pouco... – Depois de comermos podemos ir. – Ele sorriu e se afastou um pouco, fazendo-a concordar com a cabeça, sentindo-se um pouco atordoada.
  A garota voltou a prestar atenção no senhor, e viu que agora haviam cinco homens vestido de ternos brancos, com gravatas de cores diferentes, ao lado dele. O senhor falava apontando eles e sorrindo largamente, então ela se focou em suas palavras.
  - ... nos trazendo tanto orgulho internacionalmente. Agora que essa turnê mundial está encerrada, eu gostaria de recepcioná-los de volta com muito prazer e felicidade. Senhoras e senhores, uma palavrinha de Cameron, líder do Match5.
  Mais aplausos, e observou o homem mais alto, com uma gravata azul, aceitar o microfone e sorrir largamente, cerca de 52 dentes mostrando ao mesmo tempo. Ela arqueou as sobrancelhas, um pouco surpresa. Match5 não era o nome do carro do Speed Racer? Aplaudiu educadamente junto com e , que surgira ao seu lado. O mais novo inclinou-se com um sorriso.
  - O carro do Speed Racer é Mach Five, caso esteja imaginando. – ele falou em um tom brincalhão, e a garota arregalou os olhos. Agora toda a podia ler mentes, era isso? No fim da noite ela descobriria que eram todos vampiros e ela seria o sacrifício da noite? riu-se, provavelmente da cara que ela fizera e voltou o rosto para o tal Cameron. Ela mais uma vez perdera metade do discurso, mas como era curto e só palavras de agradecimento, não foi muito. Logo estava aplaudindo de novo, as mãos já começando a arder de tanto fazer isso.
  - Comeeeeeeeer! – brotou perto deles, passando um braço por cima do ombro de e enunciando os sentimentos do estômago de .
  - , onde estão seus modos? – o vocalista arqueou as sobrancelhas, checando se ela estava bem ao ser arrastada pelo outro.
  - Depois de aguentar toda aquela puxação de saco para cima do Perfeitão Um Metro e Noventa e Quatro, eu quero mais é comer mesmo. – reclamou, chegando à mesa em que o casal havia depositado as coisas mais cedo.
   teve a impressão de que ele falava sobre Cameron, e que ninguém da parecia gostar muito dele, já que permaneceram quietos aos “elogios” declamados por . Sentaram-se à mesa, que era redonda e grande, ficando entre e .
  - Ainda tem três lugares. Vai ficar vazio? – olhou interrogativamente pra , que deu ombros. Antes que alguém pudesse responder, três homens se aproximaram. não fez questão de disfarçar uma careta.
  - Esses lugares estão livres? – Cameron perguntou, seu sorriso largo no rosto. percebeu que ele era realmente alto, e olha que ela estava se acostumando com as alturas do . Por algum motivo, ele não tirou os olhos dela quando perguntou, como se ela fosse a dona da mesa. Sem saber o que fazer, ela virou o rosto para , pedindo ajuda, e ele suspirou.
  - Fiquem à vontade. – respondeu, recebendo um sorriso ainda maior, se é que era possível, de Cameron, e uma expressão indignada de .
  Mesmo sentado, Cameron parecia ocupar toda a mesa. Os outros dois membros de sua banda eram altos como ele – nem sabia que a Inglaterra produzia tantos homens altos daquele jeito – mas não tinham o mesmo carisma que o líder, parecendo um tanto ofuscados. Bem, era bastante claro por que Cameron era o líder. Ela reparou que os olhos dele eram tão azuis quanto a gravata que usava, e ao ser pego sendo observado, lançou-a uma piscadela.
  Aquilo não pareceu fazer ninguém muito feliz na mesa, principalmente , que fechou a cara e pigarreou, voltando-se para como se não houvesse mais ninguém na mesa.
  - O que você vai querer, querida? – perguntou, oferecendo-lhe o cardápio que um dos garçons que agora circulavam pelo salão havia lhe entregado.
  , ao ouvir aquilo, decidiu que adorava a presença de Cameron ali perto. Controlando um sorriso bobo, juntou sua cabeça um pouco mais com a de para enxergar o cardápio melhor, apesar de enxergar perfeitamente bem da distância que se encontrava. Escolheu algo que parecia gostoso e voltou à sua posição, lançando um olhar rápido ao líder da Match5. Constatou que ele ainda a observava, curioso. , que estava sentado próximo a ele, parecia borbulhar de irritação.
  - Acho que não cheguei a apresentar minha esposa a você, não é, Cameron? – falou em voz alta, parecendo incomodado com alguma coisa.
  Talvez fosse que Cameron tinha aquela presença intensa de líder, chamando a atenção de , e estivesse um pouco ofendido que ela se esquecesse de que ele também era um líder. Mas é claro que a garota não havia se esquecido dele. De jeito nenhum. Inclusive, estava secretamente adorando o rumo que a situação estava tomando. De todas as vezes que a apresentara naquela noite, nenhuma fora tão intensa e firme quanto aquela.
  - Ah, acho que vi algo sobre isso. Então essa é a famosa Sra. . – Cameron respondeu, seu sotaque suave ressoando em seu sorriso de gato de Cheshire. gostava muito mais do personagem louco de Alice do que daquele homem são e incrivelmente bonito, mas deu um sorriso tímido e falou:
  - Muito prazer.
  - Realmente, uma pérola. Deu sorte, . – Cameron ergueu uma taça de vinho até a altura dos olhos, como se brindasse . – Não a deixe escapar.
  - Sei perfeitamente disso. Não é como se eu precisasse do seu conselho. – pareceu frio, algo que era novidade para , que sempre fora tratada com calor e sorrisos por ele. Mesmo quando haviam brigado, ele não lhe parecera tão distante e seco como naquele momento. Secretamente, ficou feliz por não tê-lo deixado bravo de verdade.
  O jantar prosseguiu em silêncio após isso, com o burburinho das conversas ao redor preenchendo o que não era dito naquela mesa. Os membros do Match5 vez ou outra sussurravam algo para Cameron e permaneciam em sua própria bolha social, parecia cortar as coisas com uma força desnecessária e cantarolava, aproveitando um prato de carne com nome estranho que não quis provar.
  Escolhera um spaghetti alla puttanesca, já que era fã das massas. saboreava um prato com um grande pedaço de filet mignon com batatas, cortando-o em pedaços pequenos.
  - , aqui. – chamou-a de repente e quando ela virou-se para encará-lo, encontrou o garfo dele flutuando em sua frente, um pedaço da carne preso à ponta.
  - O quê? – ela corou, sem saber como reagir. sorriu de lado, sem tirar os olhos dela.
  - Prova. Está uma delícia. – ele falou, depois abriu a própria boca como se falasse com uma criancinha. – Ahhh...!
   abriu a boca, deixando que guiasse o garfo até dentro dela, e mordeu a carne sem afastar o olhar. Ele pareceu satisfeito, sorrindo largamente do olhar intenso da garota.
  - Você quer um pouco também? – ela perguntou, um pouco hesitante, apontando para seu prato. Ele concordou com a cabeça, já fechando os olhos e abrindo a boca. cuidadosamente enrolou um pedaço da massa ao redor do garfo e, com atenção, levou-o até a boca do marido, que aguardava pacientemente. Ela estava completamente alheia a qualquer outra coisa ao seu redor, focando-se apenas nos lábios avermelhados de a aguardando entreabertos. Engoliu em seco e depositou a comida ali, vendo-o fechar os lábios ao redor do garfo e abrir os olhos, encarando-a por longas eternidades. Ou talvez apenas alguns milésimos de segundos.
  - Está ótimo. – ele comentou, enquanto mastigava com uma cara prazerosa. Ela teve uma vontade insana de acreditar que ele se referia a seu serviço de entrega, e não ao macarrão, mas depois de se lembrar que haviam outras pessoas ao redor, tudo que fez foi corar intensamente e baixar os olhos para seu prato.
  - Ei, casal! – reclamou alto, fazendo-a pular na cadeira de susto. – Tem pessoas tentando jantar aqui, querem parar com isso? Até parece que não tem uma cama na casa de vocês... – resmungou, fazendo rir. sorriu, sabendo que seu rosto estava mais vermelho do que o tomate seco de seu molho. Acidentalmente (ou talvez nem tanto), levantou seus olhos até Cameron, que encarava seu prato de comida como se houvesse um rato ali. Talvez fosse o calor que estava passando, ou o vinho que havia tomado, ou o jeito com que o joelho de encostava no seu por baixo da mesa, mas ficou com muita vontade de rir de Cameron. Sabia que seria estranho fazer aquilo, então finalizou seu prato com um sorriso em seu rosto e aguardou até que o resto terminasse também.
  Imediatamente após comer, o sono bateu. Aproveitando o momento e uma chance que sabia que talvez não tivesse de novo, inclinou-se até que sua cabeça alcançasse o ombro de e parasse confortavelmente ali.
  - Cansada? – a voz dele era baixa, criando uma bolha social para apenas os dois, os outros presentes na mesa sendo ignorados. Ela mexeu com a cabeça, indicando que sim e fechando os olhos apenas por milésimos de segundos. levantou a taça de vinho até os lábios, mas antes que o vidro colidisse com eles, murmurou: - O desgraçado não tira os olhos de você. Precisava ser tão linda, ?
  Ela riu abafado, sem saber como reagir de outra forma. a elogiando tão abertamente fazia seu estômago todo revirar e, tendo acabado de comer, aquilo não era confortável.
  - Quer ir pra casa? – ele perguntou, baixando a taça e entrelaçando uma mão com a dela, os dedos longos dele acariciando cada pedaço que tocavam.
  - Quero. – decidiu que não era hora de hesitar. Desde aquele maldito sussurro, tudo que queria era ficar sozinha com , nem que acabassem vendo um filme e tomando sorvete lado a lado. Ela aprendera a não ser gananciosa, e aguardava por todos os pequenos momentos que podia aproveitar quando estava com ele. O problema é que essa noite era um completo jackpot em quesito de “pequenos momentos”, virando uma grande bola de neve prestes a engoli-la.
  - Então vamos. – ele resolveu, simples assim, afastando-a de leve para que pudesse retirar o guardanapo de pano em seu colo e olhasse ao redor da mesa. – está cansada e com dor de cabeça, por isso já vamos indo.
  - Você quer um remédio, ? - perguntou, parecendo preocupado. Ela não tinha um pingo de dor de cabeça e olhou para meio acusadoramente, por inventar tal mentira.
  - Não precisa. Tenho certeza de que, se eu chegar em casa e tomar um chá, fico boa logo. – sorriu. Ia se despedir deles, mas os dois se levantaram. pareceu aliviado.
  - Acho que é bom irmos indo também. Assim não parece que vocês estão saindo para fazerem coisas de casais. – ele foi direto, rindo ao ver a expressão no rosto da garota. – Ninguém vai interpretar isso como você tendo dor de cabeça, .
  Os membros do Match5 pareceram confusos com aquela saída estratégica da . Acenando, os três e se afastaram. Despediram-se de Bill e de praticamente todas as pessoas da festa no caminho, até chegarem aos carros.
  - Espero que eles não achem que eu sou horrível por estar te tirando mais cedo da festa por causa da dor de cabeça. – murmurou para , quando e se afastavam.
  - Na verdade, vai ser como falou. – ele comentou com um sorriso, que se alargou ao ver a expressão de choque no rosto de . – Todos vão achar que saímos pra fazer alguma coisa. Afinal, você era a mulher mais linda daquela festa, então obviamente eu sou o mais sortudo.
  - Mas... – ela não ia falar que eles não iam fazer alguma coisa, porque, afinal, eles nem haviam entrado no carro ainda, e as chances eram grandes, principalmente por tudo que ela estava pensando desde o sussurro ao pé de seu ouvido mais cedo. abriu a porta para ela, sorrindo para que ela entrasse. Ela agradeceu num murmúrio, aproximando-se dele e sentindo o ar frio tocar-lhe as bochechas. Antes de entrar, porém, ouviu:
  - Além do mais, você nem está com dor de cabeça.
  E não pôde evitar a risada ao sentar-se no banco do carona.

     

A casa estava exatamente do jeito que deixaram, a luz acesa na entrada e porta trancada. Miles e Bartholomeu miavam alto, reclamando da ausência dos donos por tanto tempo. Ao entrarem, agachou-se para acariciar o pelo dos dois, acalmando-os enquanto trancava a porta e certificava-se do alarme. Bocejando, ela tirou os saltos e levantou-se, espreguiçando-se.
  - Ainda não está acostumada com essas coisas, não é? – o tom dele era divertido, e ela fez bico.
  - Eu ia muito a baladas e ficava acordada até altas horas com Loren e Maddy, mas desde que comecei a trabalhar, acabei perdendo essa habilidade. – deu ombros.
  - Entendo. Quer que eu faça um chá para você? Para a sua dor de cabeça? – ele riu, passando por ela e indo para a cozinha. mostrou-lhe a língua, mesmo que ele não tenha visto, por estar de costas.
  - Não, obrigada. Acho que só preciso dormir mesmo. – encostou-se no batente e observou as costas largas de . Ele havia retirado o paletó, ficando apenas de colete e camiseta, e a gravata pendia solta em seu pescoço. Porque aquilo era tão absurdamente sexy? Já era muito tarde para ele provocá-la daquele jeito.
  - O que foi? – ele perguntou, virando-se para ela. Mantinha um sorriso no rosto, como se adivinhasse o que ela estava pensando. Talvez ele soubesse mesmo. Ela já havia aceitado a teoria de que ele lia mentes.
  - Você está sendo injusto. – ela grunhiu, não querendo dizer mais nada que aquilo.
  - Estou é? – ele aproximou-se aos poucos, quase colando seus corpos. O batimento cardíaco de dobrou de velocidade e, quando ele levantou o braço e colocou outra mecha de seu cabelo delicadamente atrás da orelha, parece que decidira fazer 100 metros rasos. A mão dele parou ali, mexendo distraidamente na ponta do cabelo. Seus olhos estavam fixos nos dela, observando-a com cautela, talvez procurando algum indício de que ela não quisesse aquela proximidade. Mas ele estava bem enganado. Ela queria até mais proximidade que aquilo.
  - Está sim. – disse, lentamente. riu.
  - Não sou o único sendo injusto aqui, . – ele sussurrou, realmente próximo dela agora. Mais uma vez seus narizes estavam prestes a se tocar. E o que é que ele estava dizendo? – Aguentar você assim a noite inteira... sem poder fazer nada... e ainda mais aquele babaca do Cameron. – ele resmungou a última parte. Ela riu de leve.
  - O que é que vocês têm contra ele, de qualquer forma? Ele não me pareceu uma pessoa ruim. – ela decidiu provocar um pouquinho. Provavelmente culpa do vinho.
  - Quando nós passávamos por momentos ruins, o presidente sempre jogava mais lançamentos para eles, e eles se usavam da nossa fama ruim para criar uma boa para eles. Era irritante. Éramos sempre comparados. E nossa música é mil vezes melhor que a deles. – explicou, parecendo irritado. Ela concordou com a cabeça, compreendendo e acidentalmente fazendo seus narizes se tocarem.
  Ficaram um tempo em silêncio, apenas encarando um os olhos do outro e brincando com seu cabelo, como se nem prestasse atenção no que estava fazendo. E aí bocejou.
  É claro que o momento romântico tinha que ser cortado de um jeito ridículo. Ainda bem que não foi um espirro.
   soltou uma risada e ela escondeu o rosto entre as mãos, embaraçada por aquilo. Mal tapara os olhos, os braços dele a envolveram com firmeza, e ele apoiou os lábios no topo da cabeça dela, depositando um beijo ali. Surpresa com o carinho súbito, ficou sem reação, aguardando o que viria depois. Como não disse nada, deixou suas mãos escorregarem silenciosamente pelo peito dele e passarem pelas costas, fechando-se ali num abraço. Sabia que agora seus corpos estavam colados, e que ele poderia ouvir perfeitamente todos os seus batimentos cardíacos desvairados, mas não se importava. Ela não estava se importando com mais nada.
  - Obrigada por hoje. Eu me diverti muito. – sussurrou contra a pele dele, coberta por aquele colete que o deixava ridiculamente maravilhoso.
  - Também achei ótimo. Sua companhia foi perfeita hoje. – ela podia ouvir que ele estava sorrindo ao dizer aquilo, e sorriu também. Apertou-o de leve, relutante em deixar que aquele dia acabasse. Mas ele acabaria. Talvez o que viesse depois não fosse tão ruim. Afastou seu corpo do dele e olhou-o mais uma vez nos olhos.
  - Boa noite, . – ficou na ponta dos pés e depositou um beijo em sua bochecha, sentindo-a quente contra seus lábios.
  Ao abaixar os pés para retornar ao chão, foi pega de surpresa. As mãos grandes de seguraram-lhe lado a lado e giraram seu corpo suavemente, até que ela ficasse prensada entre o batente da porta e o corpo dele, um tanto surpresa com a situação. Sem explicar nada, porém, apenas aproximou-se mais e mais, até que seus lábios estivessem colados aos dela, pedindo gentilmente passagem para um beijo que, assim que cedeu, descobriu ser repleto de carinho e desejo. Retribuindo na mesma intensidade, passou os braços pelos ombros dele, finalmente recebendo o que desejara a noite inteira.
  As mãos de desceram até sua cintura, puxando-a o mais perto possível do corpo dele, mesmo que não houvesse mais para onde ir. Dali, de alguma forma, caminharam até o pé da escada, um tanto bambos, quase se chocando em tudo. teve certeza que um dos gatos soltou uma exclamação ofensiva, mas não é como se pudesse prestar atenção neles naquele momento. Estava bastante ocupada.
   quebrou o beijo, que já estava tão intenso que ela sentia seus lábios formigarem. Ela quase gemeu em protesto, ao mesmo tempo em que ele perguntava, um olhar sério entre a franja bagunçada:
  - Seu quarto ou o meu?

     

acordou, mas não queria abrir os olhos. Não queria que fosse outro dia, não queria que tudo passasse de um sonho. Queria manter as imagens coladas em sua pálpebra por todo o tempo que fosse possível, mesmo sabendo que provavelmente nunca esqueceria. Porque não havia sido um sonho. Ela podia ouvir o ressonar de ao seu lado, o braço dele ao redor dela, os lençóis tocando sua pele. Era quase igual àquela vez em Vegas, se ela não se lembrasse dessa vez. E ela se lembrava. De tudo. De todos os detalhes, de todos os pedaços de pele de e de todos os beijos que ele lhe dera e de como a abraçara. Certamente, não esqueceria aquilo tão fácil. Mal conseguia acreditar que esquecera algum dia sobre o que acontecera na noite em Vegas.
  Virou-se na cama, ficando agora de frente a ele, e finalmente abriu os olhos. Ele parecia profundamente adormecido, seus lábios entreabertos e seu peito movendo-se conforme sua respiração. Os cílios dele eram longos e seu cabelo era uma bagunça, e pensou que nunca o achara tão bonito quanto naquele momento. Permitindo-se estender a mão e acariciar o cabelo dele, sorriu sozinha com a leveza que estava sentindo.
   pareceu nem notar seus movimentos. Decidiu que faria um café da manhã para ele, simplesmente porque queria. Saiu da cama silenciosamente, recolhendo sua roupa no chão conforme saía do quarto. Acabaram indo para o quarto dele, então ela correu até o próprio para vestir algo mais quente e pegar um elástico de cabelo, já que enfrentar um espelho era a última coisa que queria fazer naquela manhã. Desceu as escadas lentamente, bocejando e esfregando os olhos, sentindo partes do seu corpo doerem conforme os músculos eram utilizados em seu percurso. Mesmo em dor, sorria, sorria largamente, sorria quase tão largamente que era quase o Cameron da noite passada. deve ter achado que ele era um rival romântico, ela pensou. Que engraçado. não sabia se algum dia iria se apaixonar por outra pessoa que não fosse . E não sabia se isso era bom ou ruim.
  Alcançara a cozinha e ouviu o barulho do celular de tocando no andar de cima. Como o barulho parou rápido, supôs que ou ele havia atendido ou haviam desistido de ligar para ele.
  Ligou o fogão, colocando água na chaleira para fazer o café, quando houve um estrondo vindo do quarto de . Franzindo a testa, aproximou-se da porta da cozinha.
  - ?
  Ele surgiu logo, apressado, vestindo só a calça da noite anterior, aparentemente enfiada às pressas, já que não estava abotoada. Desceu as escadas correndo, assustando-a, e foi direto para a sala.
  - ? Tem algo errado? – ela o seguiu, nervosa só de ver a atitude dele. Imaginou se fora algo da noite anterior ou se Bill o estaria chamando com alguma urgência. Qualquer que fosse a opção, ela não entendia porque ele estava ligando a TV, o rosto corando enquanto observava tudo.
  - Merda, merda, merda... – ele resmungava, procurando algum canal de TV.
  E foi aí que percebeu que talvez aquilo tudo não tivesse sido um sonho, mas que o pesadelo estava prestes a começar.

Décimo Oitavo Capítulo

  

A televisão agora estava desligada, refletindo em sua tela escura todo o ambiente da sala. No sofá em frente ao aparelho, sentava , encarando o nada havia um bom tempo. Desde que saíra, ela estivera ali, sem forças para fazer qualquer outra coisa. Seu cabelo continuava uma bagunça, já que não o penteara depois de acordar, e a xícara na mesinha em sua frente estava vazia, visto que nem conseguira preparar o café.
   não costumava ser uma pessoa pessimista, mas naquele momento ponderava se seria possível alguma vez as coisas darem certo em sua vida. Ela não tivera nem tempo de curtir o clima maravilhoso que se instalara com desde a noite anterior. Não pudera nem ao menos fazer um café da manhã e receber um beijo de bom dia, ou algum outro carinho que viera desejando desde que se mudara para a Inglaterra. Quando finalmente tudo parecera se encaixar e ela pudera se sentir feliz de verdade estando ali, uma rachadura que ela nem ao menos percebera cedeu, e tudo que se apoiava nela caíra junto.
  O novo mundo de , que ela havia se dedicado a construir nesses últimos meses, ruíra.

     
     

- Merda, merda, merda... – resmungava enquanto passava os canais de TV numa velocidade absurda. , com a caneca que ia depositar na bancada ainda em mãos, aproximou-se temerosa. Aquilo era como um déjà vu. Um déjà vu horrível. E então, achou o canal que precisava, parando em frente a TV de olhos arregalados e cabelos bagunçados, suas costas ainda exibindo algumas marcas vermelhas deixadas por ela na noite anterior. Sem conseguir se distrair até mesmo com isso, a garota aproximou-se dele, os olhos focados na televisão também.
  A televisão que, ligada, exibia diversas fotos dela e de , em singelos momentos durante seus encontros que não se olhavam, ou que parecia entediada, ou que estava encarando qualquer coisa menos ela. O encontro do dia poderia ter sido maravilhoso, mas para a mídia, só aquele breve momento importava.
  Porque eles desmascararam o casamento. Porque as letras garrafais em cima da tela, junto à palavra “URGENTE”, diziam que aquele casamento era uma fraude e que fora tudo um estratagema da empresa para ganhar público. Que a estivera caindo de popularidade graças aos erros de e , e, perdendo público para Match5, decidiram usar para atrair a mídia. Com o casamento inesperado bem próximo do lançamento de seu novo álbum e nova turnê, todos os holofotes se voltaram para os três. Por que uma garota desconhecida? Por que uma garota de outro país? Por que alguém que só apareceria quando saísse com ? Justamente para que ninguém pudesse desconfiar de nada.
  E aquelas imagens, daqueles curtos instantes em que parecia cansada ou insatisfeito, eram a prova daquilo. Eram a prova de que era tudo uma grande farsa e uma atuação da parte dos dois. A garota provavelmente havia sido contratada e recebia para sustentar a imagem de esposa de .
  Havia até mesmo menção a uma fonte que jurara ouvir da própria a verdade sobre o esquema. Uma fonte que ainda carecia de confirmações e confiança, mas que poderia ser o elemento decisivo para aquele caso.
   e encaravam a televisão estupefatos, sem nem ao menos reagir. Ela podia ouvir o celular de , ainda durante a ligação que o acordara, emitindo vários sons que provavelmente eram ordens e gritos do outro lado da linha – com certeza de Bill. Mas nem ao menos piscava, encarando o programa. Ela estava até com medo que ele não estivesse respirando. Naquele momento, porém, ele soltou um suspiro, quase derrotado, e voltou ao telefone ao mesmo tempo em que clicava no botão do controle para desligar a TV.
  - Eu já vi, Bill. Eu estou indo, me espera. – ele falou, parecendo sem forças, desligando em seguida. Passou a mão pelo rosto e encarou , que aguardava a reação dele, um pouco receosa.
  O que fariam agora? Ela se perguntava se aquelas evidências seriam suficientes para arruinar tudo mesmo ou se dariam um jeito. Porque apesar de a conclusão ser verdade, toda a teoria não era. Quem os exporia daquele jeito? Cameron, ciumento da fama que a estava alcançando agora? Jess, decidindo parar de apoiar eles? por um instante perguntou-se se Jess continuaria a ajudar. Aquilo poderia ter consequências para ela também, caso a farsa fosse exposta, pois ela encobertou o casal. Seria muito grave fazer aquele tipo de coisa? Não aconteceria o tempo todo na mídia? mais uma vez chegou à conclusão que não sabia de nada sobre isso tudo.
  - ... – a voz de tirou-a de seus debates internos e ela focou seus olhos nos dele. – Eu tenho que ir. – ele virou as costas, indo para as escadas para se trocar.
  - Eu vou com você! – ela disse, indo atrás. Aquilo também era referente a ela, e ela queria ajudar como pudesse. Mas interrompeu seus passos e colocou suas mãos nos ombros dela, encarando-a. surpreendeu-se de ver que todo o calor que houvera naqueles tons na noite anterior sumiram, e que agora havia apenas confusão e insegurança.
  - Acho melhor não, dessa vez. – foi o que ele disse, deixando-a ali e subindo rapidamente para buscar uma blusa e pegar o que precisava. Ela se encontrava no mesmo lugar quando ele desceu, apenas alguns minutos depois, um pouco mais arrumado. Ele deu um sorriso mínimo para ela, mas sem nenhum calor. – Eu te aviso quando resolvermos algo.
  E saiu pela porta, deixando sozinha com seus pensamentos e a televisão desligada.

     
     

, então, aguardava. Aguardava notícias, aguardava . Sem coragem de ligar a televisão e ver mais daquela baboseira. O jeito com que saíra da casa não saía de sua mente, e ela não precisava de mais incentivos para se sentir insegura. Ele não poderia acreditar que ela tivesse realmente arruinado tudo, não é? Seu olhar fora quase acusador e ela não podia suportar aquilo, não depois da noite anterior quando tudo pareceu começar a dar certo. Porque ela não fizera nada, ela dera seu melhor em todos os momentos que estivera ali, inclusive aguentara dias sem dar-lhe a mínima atenção. Depois de se comprometer, ela nunca trairia nenhum dos garotos, principalmente depois de a relação deles ter melhorado consideravelmente nos últimos dias.
  Era isso tudo que estava entalado em sua garganta e ela gostaria de falar para . Só que ela sabia que ele não estava ali para ouvi-la, e ligar para ele no momento estava fora de condições. Ela gostaria que ele a tivesse levado para a reunião e ela pudesse deixar claro não só pra ele, mas também pra todos os outros, que ela não queria nada daquilo acontecendo.
  Infernos! Ela queria até ficar mais ali, se as coisas permanecessem do jeito que estavam. Ela gostaria de passar o Natal com os três, e ir a algum show, que não tivera a chance. Ela nunca arruinaria as coisas para eles.
  Seu celular, jogado ao seu lado no sofá, acendeu e começou a tocar. , levemente desesperada, pegou-o rapidamente e sem olhar o número do visor, torcendo para que fosse .
  - Alô?
  - Querida! – a voz de sua mãe quase a desapontou. Antes que reagisse, porém, Amelie continuou: - Você sabe que eu não sou de ficar vendo fofocas, mas desde que você está longe eu tenho acompanhado para ver se há algo de errado, e então hoje de manhã saiu uma grande notícia sobre seu casamento ser falso! O que é que está acontecendo? Você está bem? está com você?
  - Ah, mãe... – relaxou o corpo, sem nem ter percebido que estava tensa, e recostou-se no sofá.
  - Pode me explicar por que está soando tão desapontada, ? Sou sua mãe, olhe o respeito. – ouviu a reclamação e não pôde evitar um sorriso. Quis corrigir a mãe que ela era , mas nem isso era certo mais.
  - Desculpe. Está sendo uma loucura. – esfregou as têmporas e colocou uma mecha do cabelo para trás. – Você viu as notícias, não viu? Mas é tudo mentira.
  - Eu desconfiava que esse era um casamento falso faz um bom tempo. – Amelie parecia nem ouvir quando a filha falava, fazendo-a rolar os olhos. – Desde que vocês vieram aqui, senti que havia algo errado, não parecia natural. Mas minha filha, eu nunca imaginei que você iria se vender para apoiar a ascensão de um grupo! Você nem ao menos ia a shows, que nem Madeline!
  - Será que você poderia, por favor, não dar bola para fofocas sujas e ouvir a versão da sua filha? – foi seca, odiando ver a mãe acreditar naquele monte de baboseiras ridículas. Até parece que não conhecia a própria filha.
  - ...Desculpe. Mas sim, conte-me o que realmente aconteceu, por favor. – sua mãe pediu, e , olhando ao redor para ver se não havia nada suspeito pela casa para gravar ou qualquer coisa do tipo (não queria piorar ainda mais a situação, não é mesmo?), contou a versão real dos fatos para sua mãe.
  - Mas então é um casamento falso. – Amelie comentou, ao fim da história. concordou. – Pelo menos seus motivos foram mais puros, querida. Fico mais tranquila.
  - Obrigada. – grunhiu.
  - Mas querida, que loucura. Você nem ao menos conhecia o moço. E você passou três meses com ele nessa casa.
  - me passou uma confiança e tranquilidade desde o primeiro momento que nos conhecemos. – foi direta, apesar de aquilo ser parcialmente verdade. Houve o chilique antes de eles se entenderem, mas sua mãe não estava pedindo tantos detalhes assim. Aguardou a resposta dela, e surpreendeu-se ao ouvir, quase em um tom triste:
  - Ah querida... você gosta dele. – E era uma afirmação. não sabia se tinha falado muito apaixonadamente sobre ou se sua mãe apenas tinha poderes extrassensoriais, o que era bem provável, considerando que ela era mãe.
  - Gosto. – decidiu responder, um pouco amargamente, mesmo que não tivesse sido uma pergunta. – Gosto tanto que não consigo parar de me preocupar. Ontem... ontem tivemos um momento incrível. É quase como se tivesse sido um encontro de verdade, um relacionamento de verdade. E então tudo caiu. – formou-se um nó em sua garganta e ela parou de falar. Amelie suspirou.
  - Deve estar sendo muito difícil. Não se preocupe, minha . Lembre-se sempre do que te ensinei: tudo que tiver que ser, vai ser no seu tempo certo. – ela disse, sua voz suave soando confortante aos ouvidos da garota.
  - Eu sei. Vou me lembrar disso, mãe. – sorriu.
  - Ótimo. Mantenha-me informada, certo? Não quero ficar sabendo das coisas pelos outros. Muito menos por essa mídia mentirosa. – agora parecia que estavam do mesmo lado.
  - Pode deixar. Até depois, mãe. – desligou depois de ouvir mais algumas recomendações de cuidado e suspirou, voltando a encarar a tela preta. Mal teve tempo para isso, porém, pois mais uma vez seu celular tocou. Lançando um olhar para o visor dessa vez, viu o nome de e, com o coração aos pulos, atendeu.
  - ? Está tudo bem? – já perguntou, nervosa. Até levantou-se do sofá em sua ansiedade.
  - ... vou te passar um endereço por mensagem. Você pode vir de táxi para cá? – a voz dele estava um pouco rouca, como se estivesse cansado. Considerando a confusão, era bem capaz que ele estivesse.
  - Sim. Me envie, vou me arrumar e estarei aí o mais rápido possível.
  - Obrigado. – a voz dele não pareceu sorrir. Com o coração apertado, ouviu a linha ser desligada.
  Correu escadas acima e, em tempo recorde, ficou pronta para enfrentar o que quer que fosse.

     

Ao parar na frente do prédio cujo endereço lhe passara, surpreendeu-se ao não encontrar mídia nenhuma por ali. Talvez eles fossem muito bons em manter segredo. Pagou ao taxista e encarou o prédio por alguns segundos, pensando em por que fora chamada. Ela esperava que eles tivessem resolvido tudo, esperava que as coisas fossem ficar bem. Ela não queria causar mais problemas para a , aqueles rapazes deram o melhor deles o tempo todo e sempre trabalharam duro, ela sabia bem o quanto eles mereciam. Principalmente . não queria nunca trazer nada de ruim para ele.
  Mas eles não poderiam culpá-la, não é mesmo? Não havia feito nada. Tinha dado seu melhor, também. Sentia-se um pouco infantil pensando daquela forma. “Não fui eu”, a famosa frase de crianças. Por que ela sentia-se culpada, de qualquer forma?
  Adentrou o prédio e encontrou já na recepção, aguardando-a. Ele não a olhava, vendo alguma coisa em um jornal, e seu estômago revirou ao pensar que até na mídia escrita estava sendo divulgado a farsa do casamento. Aquilo não era bom. Não era nada bom. Lembrou-se então que sua mãe nos Estados Unidos já havia ficado sabendo também, então era ainda pior do que pensava.
  Aproximou-se dele e ele finalmente levantou os olhos para ela. tentou sorrir, mas foi impossível. Estava muito tensa, querendo saber logo o que havia sido aquilo e se consertariam e ficaria tudo bem.
  - Hey. – disse, analisando-a. Ela sentiu-se desconfortável com aquele olhar e passou a observar os sapatos dele. – Vamos? Estão esperando você.
  - C-Certo. – ela falou, receosa. Esperando ela? Por que ele soava tão mórbido?
  Suas pernas se moviam, mas ela sentia como se fossem dois chumbos. O clima estava muito pesado naquele prédio, e ela gostaria que desse, no mínimo, um sinal de conforto. Ela se sentiria muito melhor se ele ao menos segurasse sua mão, mas nem isso ele fez. Ela o olhou de canto e ele parecia muito absorto em sua própria mente para notar que ela estava ali. Suspirou, desejando mais uma vez naquele dia que nada daquilo tivesse acontecido e ela pudesse finalmente ter um dia de “esposa de ”.
   abriu a porta de uma sala e deu-lhe um mínimo sorriso quando indicou-lhe para passar na frente dele. Ela retribuiu do mesmo jeito, tendo aquela vontade de abraçá-lo e dizer que ficaria tudo bem. Era como se fosse um grande déjà vu daquela noite em Vegas.
  Bill estava sentado em uma das cadeiras, parecendo mais sério do que ela jamais o vira. e estavam lado a lado, e levantaram os olhos para ela assim que ela entrou. Havia mais umas duas pessoas que ela não conhecia, e ela os cumprimentou gentilmente com a cabeça. O baixista e o baterista sorriram de leve, mas sem aquele ar brincalhão que tinham adquirido recentemente. Sentiu uma mão apoiar-se em suas costas, mas era apenas guiando-a ao lado da cadeira em que ele devia estar sentado antes.
  - Olá, . – Bill cumprimentou, parecendo igualmente exausto. Ela murmurou um cumprimento para ele também. – Esses são Mitch e Marcus, da imprensa. Estamos tentando controlar a onda, mas está um pouco difícil. Ainda há algumas informações que eles conseguiram segurar, mas não sabemos o quanto a suposta fonte espalhou por aí, e quando outras coisas vão ruir. – ele foi direto em não só apresentar os dois desconhecidos como em também ir ao assunto.
  - Certo. – ela não soube bem o que falar e por que tinha que saber de tudo aquilo, mas não queria interromper.
  Bill puxou umas pastas para perto de si, remexendo o conteúdo. lançou um olhar de soslaio para , que parecia desinteressado, provavelmente já tendo visto tudo aquilo que estava sendo mostrado. Bill voltou a chamar sua atenção, empurrando algumas fotos em cima da mesa para que ela visse. Inclinou o corpo levemente e seus olhos se arregalaram.
  - Parecia que você tinha um stalker bem dedicado, . – Bill comentou, apontando para a diversidade de fotos de em sua casa, cozinhando sozinha ou ficando no sofá, mexendo no celular ou assistindo notícias. Também tinha muitas fotos de ela saindo de casa sozinha, e saindo diversas vezes e voltando bem tarde da noite no mesmo dia (por causa das roupas, ela supôs que era o mesmo dia). Tudo sendo mostrado como provas de que ela vivia sozinha e sem nenhuma atenção da parte de . Dava-lhe um embrulho no estômago ver as coisas daquele jeito, lembrar-se do que sentia naquela época. Tudo aquilo tinha sido apagado facilmente com a noite anterior.
  Chegava a ser assustador ver o número de fotos que havia ali. Sua cabeça rodava e ela mal conseguia processar a informação. Recostou-se na cadeira, desviando o olhar para qualquer outro lugar.
  - O que vamos fazer com isso? – perguntou, em um murmúrio.
  - Esse não é o problema, . – Bill foi seco. Ela ergueu os olhos pra ele, assustada.
  - Qual o problema então?
  - A fonte dessas fotos tem uma gravação sua conversando sobre como a tratava quando estavam dentro de casa. Como era um marido só para a mídia e como em casa ele mal lhe dava atenção. Uma gravação, . Sua. – Bill disse, puxando um pendrive.
   arregalou os olhos. Uma gravação? Como assim?
  - Mas! Mas isso... Não pode ser, eu nunca fal... – então sua mente clareou. O único momento que aquilo poderia ter acontecido foi quando estava no pub com Maddy e Loren. Quando desabafara para suas melhores amigas como sua vida estava sendo e como ela queria que agisse mais como um marido. Lembrou-se de Maddy comentando que parecia que estavam sendo observadas, apesar de ela nunca ter notado nada.
  - ? – Bill perguntou, trazendo-a de volta àquela sala. A americana já sentia a garganta fechar e seu rosto esquentar. Baixou os olhos para o colo e fechou as mãos com raiva. – , se você nos disser que isso é forjado nós tomaremos as providências corretas. Acreditaremos em suas palavras, como prometemos a .
  Ela levantou os olhos marejados imediatamente. Promessa a ? Olhou para ele, que mantinha os olhos baixos. Ele murmurou, sem nem levantar o olhar:
  - Eu fiz eles prometerem que aceitariam sua palavra. Eu acredito que você não falaria essas coisas em público, muito menos para arriscar a segurança da banda. E eles me prometeram acreditar nisso também, se você disser que é forjado e que você nunca disse essas coisas. – ele finalmente olhou para ela, dando um sorriso mínimo. – Só fale a verdade, . A gente vai resolver isso.
   nem tinha terminado suas palavras e as lágrimas escorriam pelo rosto de enquanto o encarava. dissera aquelas coisas. acreditaria nela a qualquer custo. Só que se ela dissesse que aquilo era forjado, seria mentir. Ela mentiria para sua própria felicidade com ? E se mentir resolvesse tudo aquilo e ficasse tudo bem? Sim, ela mentiria. Mentiria? Conseguiria conviver sabendo que confiara nela e ela quebrara essa confiança, e ainda por cima mentira na hora de encobrir seus próprios erros? Ela conseguiria dormir à noite? O que seria feito caso aquele pendrive não fosse forjado?
  Engoliu em seco, sabendo o que tinha que fazer.
  Enxugou as lágrimas e voltou seu olhar para Bill, que aguardava sua resposta. Não conseguiria falar aquilo encarando .
  - Isso não é falso. – ela sussurrou, sua voz falhando graças ao enorme nó que estava em sua garganta. A sala pareceu ficar ainda mais tensa e ela achou que e pareceram desapontados a ponto de pararem de respirar. Prosseguiu, sem olhar para ninguém em especifico. – Eu disse tudo isso em um pub lotado para minhas amigas. Como estava lotado, eu nunca pensei que estaria sendo observada. Não vou tentar achar desculpas dizendo que não estou acostumada a ser observada e famosa, porque sei que o que fiz não foi certo. Eu quebrei... a confiança de vocês. – ela baixou os olhos, que teimavam em se encher novamente. – Mas eu queria dizer que nunca fiz nada, absolutamente nada, no intuito de prejudicar ou a banda em qualquer maneira.
  - ... – murmurou ao seu lado, mas ela não ousou olhar para ele. Apertou as mãos no colo enquanto esperava alguém dizer qualquer outra coisa.
  - Eu entendo, . – Bill finalmente disse, e ela mais uma vez ergueu os olhos para olhá-lo. Ele, porém, não a encarava, girando o pendrive em mãos e parecendo perturbado por alguma coisa. e evitavam olhar para ela também, e ela não sabia como estava . Ela olharia para tudo, menos para naquele momento. Não o , a quem ela acidentalmente traíra a confiança, o de quem ela tanto gostava e quisera proteger todo esse tempo, falhando miseravelmente. Bill soltou um suspiro, largando o objeto. Depois, levantou os olhos para ela. – Sinto muito, . Mas você vai ter que ir.
  E ela soube que ele não se referia àquele prédio apenas.

Décimo Nono Capítulo

  

O clima estava bem frio, e a respiração de condensava-se na frente de sua boca conforme ela expirava. O cachecol cobria parte de seu rosto, apesar de não haver muitas pessoas na rua e ela não se importar tanto assim. As sacolas de compras chacoalhavam em suas mãos, as latas batendo-se uma contra a outra em sons abafados.
  Alcançou o portão de casa e empurrou-o, fazendo-o ranger como era normal. Não era a primeira vez que ela saía e retornava para sua simples casa em Westcliffe desde que voltara da Inglaterra, mas cada vez que ouvia aquele rangido, uma sensação estranha apoderava-se dela. Aquele barulho era normal, pois o ouvira sua vida inteira.
  Mas, agora, o que era normal em sua vida?
  - Cheguei. – avisou, baixinho, depois de pisar dentro da casa aquecida e iluminada. Pendurou seu casaco e cachecol e foi até a cozinha. Sua mãe já preparava o jantar, cantarolando alguma música, e ela ouvia o barulho do chuveiro no andar de cima, onde seu pai tomava banho.
  - Ah, querida, obrigada. Conseguiu encontrar tudo? – Amelie voltou-se para ela, um sorriso exagerado em seu rosto. Fuçou as sacolas e agradeceu mais uma vez. – Você sempre escolhia errado quando eu pedia para trazer, mas finalmente aprendeu! O que viver fora não f... – a mulher interrompeu-se, seu sorriso fraquejando ao mencionar o fato de que havia ficado um tempo fora. A garota, sentada à mesa, prestes a descascar batatas, suspirou.
  - Mãe, você não tem que evitar mencionar o tempo que passei na Inglaterra. – ela disse, simplesmente, cansada daquela situação. – Aconteceu, não é? Então não vamos fingir que não.
  - Mas ... – Amelie remexeu nas panelas do fogão e depois virou-se para a filha de novo. – Você tem estado tão triste e cabisbaixa. Parece que qualquer coisa que eu disser vai te fazer quebrar. – murmurou. soltou outro suspiro, cansada de preocupar a mãe com aquilo.
  - Não vou quebrar assim, mãe. – apesar de ser como ela se sentia. – É só por causa do fuso horário. – respondeu, focando-se nas batatas. Amelie, que estava ficando melhor em não tagarelar o tempo todo, observou-a por mais alguns segundos e depois voltou-se para as panelas, murmurando coisas para si mesma.
  Fazia mais ou menos uma semana desde o retorno súbito de . Ela ligara para os pais, avisando, logo depois que a reunião com a acabara. Iria fazer as malas e pegaria o próximo voo para os Estados Unidos, como havia sido discutido. Não havia mais nada o que fazer. Agora já não era mais problema dela. A única coisa que fizera fora gravar, junto com , um aviso sobre o divórcio por não ter aguentado a pressão da mídia, ainda mais depois dessa última revelação falsa. Era o que haviam combinado desde o começo, e Bill falou que se ela pudesse fazer aquilo, talvez as coisas ficassem mais amenas.
  Amenas ou não, voltou. Não houve opção para ela. Seus pais a receberam no aeroporto, e as amigas no dia seguinte, em sua casa. Ninguém falava sobre , ninguém perguntava sobre a . Havia a mídia, mas todos aqueles próximos a ela sabiam o suficiente que confiar na versão na mídia não era inteligente. Eles não a forçaram a falar sobre nada, apenas a acolheram de volta à sua vida normal.
  Normal.
  Aquilo não era mais normal para . Normal era acordar e ter Bartholomeu em cima de sua barriga, ronronando como um trator. Era descer as escadas de sua casa e chegar à cozinha, às vezes se deparando com no caminho. Era limpar aquela casa enquanto expulsava os gatos do caminho e os arrancava da vassoura, quando se prendiam a ela.
  Em apenas três meses, acostumara-se com um normal completamente diferente do que havia sido sua vida inteira, e sentia falta daquilo. Ainda era um pouco confuso, e ela se sentia entorpecida quando pensava naquilo. Ela entendia, mas ao mesmo tempo não entendia. Por que as coisas tiveram que ser daquele jeito?
  A campainha tocou, tirando-lhe dos pensamentos. Visto que havia acabado as batatas e sua mãe ainda estava ocupada com as panelas, levantou-se, limpando a mão num pano e indo até a porta, o coração batendo um pouco descompassado.
  Ela sabia que era idiota, mas todas as vezes uma parte de si torcia para que fosse .
  Dessa vez, era Maddy e Loren, as convidadas para o jantar. As duas, que passaram a semana trabalhando, conversaram pouco com a amiga durante aquele tempo, e só agora passariam um tempo juntas para que pudessem se atualizar em detalhes.
  - Trouxemos sorvete! – a animação delas era quase tão falsa quanto a de Amelie, a preocupação estampada em seus olhos. sorriu e as deixou entrar, segurando as sacolas.
  - Chegaram na hora meninas! Acabou de sair! – Amelie disse, chamando-as para dentro. Peter também descia as escadas, pronto para a refeição.
  - Yaaay! – Maddy bateu palmas, os olhos brilhando ao ver toda a comida preparada em cima da mesa. – Parece que já é Natal!
  - É em breve, né? , você já fez suas compras? Podemos ir semana que vem, na minha folga. – Loren sugeriu.
  - Sim, pode ser. – ela concordou, servindo as amigas. – Só tenho que ver como vai ser no trabalho. – ponderou, lembrando-se que Maddy havia arranjado uns contatos para que ela trabalhasse numa empresa em Colorado Springs, e ela começaria na próxima semana.
  - Acho que deve ficar tudo bem, essa primeira semana é treinamento e eles vão te liberar logo. – Maddy respondeu.
  - O que você vai fazer, ? – Peter perguntou, e a conversa manteve-se até o fim do jantar ao redor do trabalho novo dela e as experiências das outras em seus presentes empregos.
  Amelie poupou-as da louça, e elas subiram para o quarto de com o sorvete e três colheres, prontas para a noite. Loren e Maddy estavam ansiosas, sabendo que agora poderiam ouvir melhor a versão da amiga sobre porque ela voltara tão subitamente, e ela própria sentindo seu estômago revirar. Já havia uma semana que ela havia chegado e dormido naquele quarto, mas não podia esquecer a vez que dividira a cama com ela ali. Já parecia ter sido há tanto tempo.
  Acomodaram-se na cama e, depois de algumas colheradas em silêncio, Maddy finalmente perguntou.
  - Mas por que você voltou, ? – seu tom era magoado, e Loren levantou os olhos, receosa por abordar o assunto. continuou mexendo no sorvete, recolhendo o máximo possível para uma colherada.
  - Porque a farsa foi descoberta. – respondeu, em um murmúrio. Como ela não pareceu quebrar nem morrer por tocarem no assunto, as duas amigas decidiram que poderiam continuar com ele.
  - Mas sério? Eu vi as noticias e tinha tão pouca evidência, eles realmente não podiam se esforçar mais um pouco para encobrir a verdade? – Maddy rebateu, soando irritada. - Pra quê fizeram todo o escarcéu e te levaram para lá se, no fim, na primeira coisinha que desse eles iam te chutar de volta? Eles te usaram, usaram descaradamente e... - antes que Maddy virasse a casa de ponta cabeça, Loren enfiou uma colher de sorvete em sua boca para calá-la, observando em seguida a garota fazer uma careta e se encolher ao choque térmico. soltou uma risadinha.
  - Não foi bem assim...
  - Por que você tá tentando defender eles? – Loren perguntou, arqueando as sobrancelhas. – Apesar do jeito exaltado, Maddy está certa. Eles praticamente te usaram e te jogaram fora. Foi melhor mesmo você voltar do que continuar com eles. Sinto muito, mas é a verdade. – ela deu ombros, pegando mais sorvete. rodou a colher na mão, pensando. É verdade que eles poderiam ter tentado um pouco mais. podia ter feito mais do que simplesmente deixá-la ir. Isso a machucava um pouco, mas sabia que havia feito algo errado, em parte.
  - ? – Maddy pareceu receosa.
  - Havia um contrato. – ela disse, suspirando. - Não é bem assim a situação que vocês falaram, porque existe um contrato. Não só um contrato de casamento, mas um contrato de sigilo, de silêncio. É claro que eles iriam me fazer assinar aquilo e, sendo que eu estava ajudando eles, não me importei de fazer. Li o contrato atentamente e concordei com tudo ali.
  - O que tinha nesse contrato? – Loren indagou. recostou-se na cama, tentando lembrar os termos especificados.
  - Se os termos fossem quebrados por , eles me enviariam de volta com uma indenização monetária e eu seguiria minha vida normal, com eles arranjando uma desculpa que não me prejudicaria. Caso fossem quebrados por terceiros, eu seria indenizada com 50% do valor total combinado, sem qualquer difamação ou danos morais, e poderia voltar. Bom, em todos os casos eu voltaria. – ela soltou uma risada pelo nariz. – Já que eles obviamente não faziam questão que eu ficasse lá. – completou amargamente.
  - E se você quebrasse o contrato? – Maddy perguntou.
  - Eles me mandariam de volta, só que sem nenhuma indenização e com uma história pra me acobertar. – deu ombros.
  - Foi isso que fizeram? Mas não foi sua culpa! – Loren retrucou, indignada. – Foi culpa da pessoa que nos ouviu falando no pub! Você devia ter liberdade de falar sobre essas coisas, nós também sabíamos da verdade e tínhamos nosso contrato!
  - convenceu Bill a tratar como um caso de terceiros, e não culpa minha. – Ela disse, lembrando-se do que fizera. Apesar de tudo, ela só queria que ele tivesse dado um jeito para que ela ficasse. No final das contas, ela não significara nada? – Eles me indenizariam com 50% do valor, como combinado, e lançariam o vídeo de eu dizendo que pedi o divórcio por não aguentar a bagunça da mídia e a fama de , ainda mais por ter sido perseguida e tido fotos minhas tiradas dentro de minha própria casa. Eles ainda estão indo atrás da pessoa, que eu suponho ser aquela vizinha nojenta. – grunhiu. – Só porque a tratei mal ela me vem com essa. Idiota.
  - Mas você ganhou o dinheiro, então? – Maddy arregalou os olhos. – Quanto foi?
  - Eu não aceitei. – disse, ouvindo exclamações de espanto. – Apreciei o que fez, tentando me tirar da culpa, mas eu não queria aquele dinheiro. Se eu aceitasse, seria exatamente como a história que a mídia achou que era verdade: eles haviam me comprado pra fazer aquilo. E eu não fiz aquilo porque fui comprada. Eu fiz aquilo porque achei que era certo, porque achei que podia amenizar os danos de uma pessoa sem nem pensar em mim mesma, e porque depois me apaixonei por . Meus motivos passaram longe de dinheiro, e se eu aceitasse essa indenização, eu estaria voltando atrás nos meus princípios.
  As três permaneceram em silêncio por um tempo, comendo em colheradas pequenas o sorvete.
  - Mas eu achei que o não ia te deixar ir... ainda não acredito que ele fez isso... depois de tudo... – Loren murmurou, baixinho.
   não respondeu, dessa vez não tendo nem ideia do que dizer contra aquilo, porque nem ela mesmo entendia por quê ele simplesmente a deixara ir, e pensar sobre aquilo doía mais do que ela admitira a si mesma.
  Talvez ela estivesse mesmo prestes a quebrar.

     

podia ouvir seu celular vibrando na mesinha cabeceira. Apesar de estar deitada em sua cama, entre Maddy e Loren, não havia conseguido dormir nem um pouco. As duas, que normalmente ofereciam proteção e a deixavam descansar, não pareciam mais ter esse efeito, infelizmente. Ela adoraria fechar os olhos e dormir um sono sem sonhos, mas estava ficando complicado.
  Mesmo sendo cerca de cinco da manhã, o celular estava sendo bastante insistente. Com cuidado, afastou-se das amigas e o desconectou do carregador, atendendo antes de sair do quarto silenciosamente.
  - Alô? – murmurou, descendo as escadas para ir para a sala, assim não atrapalharia ninguém.
  - ? – a voz era preocupada. – , onde você está?
  - Rowena? – surpreendeu-se. Não imaginava que a ex-falsa-cunhada ligaria para ela, ainda mais em plenas cinco horas da manhã. – Há algo de errado?
  - Sim, há algo de errado! – ela parecia ansiosa e sentiu o estômago afundar. Haveria acontecido algo com ? Por que Rowena estava ligando para ela? – Acabei de voltar de uma viagem que fiz de moto pela Inglaterra, estava sem acesso nenhum a nada e aí descobri que deu o maior rolo com seu casamento! Você está bem? Onde você está, o bosta do meu irmão se enfiou num estúdio e não quer falar comigo...
  - Rowena... – sentou-se, um pouco chocada com o atraso da notícia. – Desculpe, eu acabei de acordar. São cinco da manhã aqui. Eu estou em casa.
  - Em casa? Cinco da manhã? – a outra respondeu, do outro lado da linha, parecendo hiperativa. – Mas... ah! Ah não... você voltou? – de repente ela parecia despontada.
  - Sim... achei que você ia ficar sabendo. – murmurou, encolhendo as pernas e abraçando-as. Estava frio na sala. – Não pude me despedir, desculpe.
  - Mas o que diabos houve? – Rowena perguntou, aflita.
   então se pôs a repetir o que havia dito para suas amigas, parecendo um pouco mais à vontade agora que falava pela segunda vez. Talvez devesse ter dito para Rowena ligar em outra hora, porém, pois os gritos que ela dava do outro lado da linha no fim da história poderiam acordar a casa inteira.
  - Eu não acredito que aquele desgraçado do Bill fez isso! Nem foi tão importante assim, eles podiam muito bem cobrir aquilo... – ela falava sem parar, enquanto a outra escutava com calma e um sorriso fraco no rosto. – Você me aguarde, , se você acha que vou deixar meu irmão estúpido impune por deixar você ir dessa forma, ahhhhh você está bem enganada!
  - Obrigada, Rowena. Você me ajudou bastante aí e eu nem pude dizer tchau. Se um dia vier fazer um passeio de moto por aqui, não deixe de me avisar. – falou, mexendo na calça do pijama. – Mas acho que não tem o que fazer agora. Eu já voltei, e me deixou ir. Ele fez o que pôde também, mas devo ter desapontado ele de alguma forma...
  - . – o tom de Rowena mudara, e inconscientemente a garota aprumou-se no sofá. – Por favor, imagine que estou segurando seu rosto com minhas duas mãos, esmagando-o, fazendo você olhar com muita atenção pra mim. Está imaginando?
  - S-sim. – por algum motivo, era bem fácil para a americana imaginar aquilo.
  - Ótimo. Agora me escute. - e então ela falou, pausadamente, como se estivesse ensinando o abecedário para uma criança: - Você-não-fez-nada-de-errado. Certo? Coloque isso na sua cabecinha. Você apenas conversou com suas amigas num pub, a culpa não é sua que alguém ouviu e jogou isso contra vocês. Você tinha uma pessoa que tirava fotos de você em casa, e sabe-se lá o que mais fazia, e isso é muito mais sério. Eles deveriam estar protegendo você dessa pessoa, e não te mandando embora. Talvez te mandar embora tenha sido o jeito deles de proteger você, você sabe como homens têm um tato zero pra algumas coisas. De qualquer forma, te mandar embora como se você fosse a culpada não é certo, porque não foi sua culpa. Estou desapontadíssima com meu irmão por estar te tratando assim. Francamente... – Rowena encerrou com uma bufada irritada. – Eu achei que ele tinha mudado tanto com você lá.
  - Eu também... – respondeu, murmurando tão baixo que não tinha certeza se a outra ouvira. Se ouviu, Rowena ignorou, porque sua próxima pergunta, repleta de preocupação, veio como:
  - Você vai ficar bem?
  E percebeu que, de suas amigas, mãe e pai, Rowena fora a única que perguntara a coisa certa. “Você vai ficar bem?”. No futuro. Porque ela sabia que agora não estava bem. E não tinha certeza se ficaria. Ela talvez conseguisse remendar as rachaduras dentro de si com o tempo, mas talvez não. Talvez ela tropeçasse e quebrasse qualquer dia desses. Mas não se deixaria quebrar. Ela tinha que ser forte.
  Não seria usada e descartada como um objeto inútil. Não seria mandada embora tendo feito nada de errado. Não deixaria simplesmente soltá-la, quando ele havia dito que ia segurar sua mão. E se ela não conseguiu fazer aquelas coisas, não se deixaria quebrar por conta delas também.
  - Acho que vou. – decidiu responder. – Vou me esforçar pra ficar bem. – ouviu um suspiro do outro lado.
  - Eu estou muito deprimida que não foi atrás de você... Aquele idiota. Espero que ele apareça alguma hora aí. Como nos filmes, sabe?
   soltou uma risada rouca, vendo pela janela o horizonte começar a clarear.
  - Acho que isso está meio longe de ser um filme, Rowena...
  - Você acha? Eu ainda tenho esperanças. Está bem parecido, pra mim. – a britânica riu. – Eu só quero que você tenha um final feliz, .
  - Sabe, acho que a pior parte de ter voltado é ter perdido uma cunhada como você. – brincou, fazendo Rowena rir ainda mais. – Talvez eu deva investir em você, e não no .
  - BELLE! – A outra gritou, rindo alto. A própria teve que controlar uma risada. – Acho que você precisa dormir, olhe as coisas que está falando. Mas, bem, se meu irmão continuar te tratando como lixo, talvez eu considere a oferta. – imaginou-a piscando no fim da frase e riu baixinho.
  - Eu acho que agora ele não vai me tratar como lixo, nem como nada.
  - Ah é? – Rowena cantarolou. – Pois eu acho que ele gosta de você sim. Meu irmão é um idiota pra certas – não, muitas – coisas, e é por isso que ele talvez demore um pouco. Não estou falando pra esperar ele! – seu tom de repente era ameaçador. – Na verdade, seria incrível se você não o esperasse e, caso ele apareça, você pise de salto bem alto em cima dele, mostrando que não é assim que se faz com o coração de uma mulher.
  - Não tenho certeza se eu teria confiança para tanto.
  - Bem, então apenas mostre a ele que há certas formas para se agir, porque ele está precisando aprender. Talvez eu o sequestre e o leve para o interior para ter umas aulas de bons modos. Francamente...
  - Se você sequestrá-lo, vai ser uma notícia e tanto. Assim talvez as pessoas parem de achar que tudo que eles fazem é por atenção. – comentou. Começou a ouvir barulhos no andar de cima, então supôs que seus pais haviam acordado.
  - Eu sei, é terrível, né? A incapacidade de deixar a vida de uma pessoa em paz me fascina. Mas não se preocupe, pelo que percebi, a poeira vai baixar logo. Vou fazer algo com aquele babaca da Match5, e aí a atenção vai pra eles e todo mundo se esquece de você e do .
  - Tente não ir para a prisão, por favor. E não atrapalhe a vida da . Eu... não quero que nada de ruim aconteça com eles. – disse. Rowena ficou um tempo em silêncio.
  - Acho incrível como, depois de toda a bagunça que eles te meteram e ainda forçaram você a ajudar a limpar, você ainda não deseja nada de ruim pra eles. Você é incrível, .
  - Incrivelmente idiota, talvez. – ponderou, fazendo mais uma vez a ex-cunhada rir.
  - Ter um coração bom é algo incrível hoje em dia, . É por isso que estou tão preocupada com ele. Se o desgraçado do quebrou um coração como o seu, ele que se prepare. Vou quebrar é as bolas dele a próxima vez que eu o encontrar.
   não deixou de rir dessa vez, sentindo-se mais leve agora que conversara com Rowena. Despediu-se da inglesa, prometendo que ficaria bem e aguardando notícias do “Intensivão de Bons Modos” que Rowena pretendia dar a ele.
  Ao levantar-se do sofá, a janela já exibia um dia claro e sem nuvens. Ao conversar com a ex-cunhada, sentira-se muito melhor, mas agora que o telefone estava desligado e sua cidade começava a acordar, a solidão começava a abater-se sobre ela. Logo seria Natal e, naquele Natal, ela teria e a banda. Não conseguia deixar de pensar que as coisas estavam indo bem e ela gostaria de ter tido pelo menos mais um pouco de tempo com eles.
  Era um pouco egoísta da parte dela, e isso era o que mais a machucava, porque quando pensava no jeito como a mandaram embora, parecia que eles não faziam mais questão de ter tempo com ela. Talvez nunca tivessem feito.
  Apesar de tudo, ela fora sincera com Rowena; não desejaria nada de ruim para eles. Eles eram especiais para ela de alguma forma, mesmo com todos os problemas. A culpa não era deles também por tudo que acontecera. Talvez eles não tivessem o poder para mantê-la ali. ainda tentara mudar para que o contrato tivesse sido quebrado por terceiros, assim ela sairia ganhando alguma coisa naquilo.
  Mas a coisa que mais queria ganhar ela não conseguira. Não conseguira mais momentos com ele, não conseguira seu café da manhã com e manhãs com abraços e beijos de bom dia. Não conseguira ir a um show de verdade e sair mais com os outros membros, não conseguira apoiar em seus futuros lançamentos e projetos. Não conseguiu ter a vida de esposa de que fantasiara e secretamente desejara nas últimas semanas, quando tudo que pôde fazer estando em Londres fora apaixonar-se por ele.
  Enxugou uma lágrima teimosa que havia escorrido por sua bochecha e respirou fundo, acalmando-se. Aquele seu coração rachado pelo menos ainda batia. Ela não sabia se batia por ou pelo quê, mas estava ali, e ela seguiria em frente de seu jeito, remendando as feridas da forma que achasse melhor.

Vigésimo Capítulo

  

A neve deixava tudo branco e lindo. adorava a época de neve, onde tudo ficava claro e macio, como se fosse um mundo totalmente novo. É claro que ela odiava quando tinha que retirar a neve da frente da loja dos pais ou da casa, agora que seu pai estava meio velho para fazer isso. Também odiava quando a neve derretia e tudo ficava marrom e enlameado, muito mais sujo do quando não havia neve.
  Mas a neve, aquele momento branco, impecável, reluzente, ela adorava. Ela aprendera a adorar o momento das coisas antes que elas se tornassem sujas e corrompidas.
  Além do mais, adorava as luzes de Natal. Porque elas combinavam com a neve, e combinavam com as ruas. Elas deviam ficar ali o ano todo, porque tudo Sempre parecia mais alegre e brilhante quando elas piscavam noite afora.
  Dois dias atrás, havia ajudado seus pais a colocarem as luzes brancas e azuis em sua casa. Eles não tinham feito isso antes porque sabiam o quanto ela gostava das luzes, e o Natal era a época em que, se tudo corresse bem, o contrato com a se encerraria de qualquer forma. Então estaria voltando por aquele período e poderia pendurar as luzinhas. Mesmo que ela tivesse voltado antes, por conta da correria do novo emprego e de se readaptar a uma cidade de 500 habitantes, só alguns dias antes do Natal pudera parar e enfeitar a casa como tanto gostava.
  Ainda nem tivera tempo de sair para comprar os presentes das pessoas, mas finalmente conseguira um dia livre que encaixava com o horário de suas amigas e, no meio da tarde de um dia bem frio, foram para Colorado Springs, onde fariam as compras.
  ― Vamos começar nos separando e nos encontramos daqui a uma hora para comprarmos os outros juntas! Certo? – Loren combinou e e Maddy concordaram. Elas sempre faziam daquela forma, assim nenhuma veria a outra comprando o presente. Comprariam os de família e pessoas do trabalho juntas.
  , enrolada em um cachecol que cobria-lhe do pescoço ao nariz, vestindo um sobretudo bege que ia até a metade das coxas, já sabia o que daria para cada uma das amigas, e conforme se afastava, seus passos se dirigiam para a loja que compraria o presente de Maddy. Agora que começaram a trabalhar em Colorado Springs, ao invés do lugar anterior, conhecia melhor a cidade e já descobrira uma loja vintage de roupas com algumas peças que ela tinha certeza que a ruiva amaria. Para Loren, alguns discos de vinil seriam o suficiente. Loren mantinha o gosto que seus falecidos pais tinham, e muitas das músicas eram encontradas em vinis. , como uma boa frequentadora da casa da amiga, sabia alguns que faltavam e passaria na loja depois de pegar as roupas de Maddy.
  Suas compras foram rápidas, já tendo pensado no que faria, e voltou calmamente para o ponto de encontro, olhando as vitrines. As ruas estavam meio cheias, todas as pessoas naquele desespero divertido da compra de presentes próxima da data. O Natal seria dali a três dias, e mesmo assim sempre havia um monte de gente comprando coisas de última hora.
   passou em frente a uma vitrine e tanto seus passos quanto seu coração pararam.
   a olhava.
  E então a câmera mudou para , na bateria, e para , no baixo, em seguida. Era um clipe. Um clipe novo, pelo visto. Ela leu a legenda no canto esquerdo da tela, Travelers of Skies, e ela lembrou-se da melodia acústica que ouvira na rádio.
  Seu coração batia rápido, mas de uma forma dolorosa, e ela gostaria de poder mexer suas pernas para se afastar daquilo. Seus olhos, porém, estavam fixos na tela, e ela observava cada detalhe de cada um deles. O cabelo de estava um pouco mais comprido e um pouco mais bagunçado. O de , mais curto e aparentemente com uma mecha azul elétrico. parecia manter-se no visual de sempre, lançando sorrisos dóceis para a câmera quando era focalizado. Parte do clipe passava-se em um estúdio branco, onde eles tocavam os instrumentos, e a outra era sob um céu estrelado ao ar livre, com closes lentos e uma fotografia linda.
  A respiração de estava tremida enquanto ela tentava controlar o choro. Ela não queria chorar em plena rua, e não queria chorar por causa de , que estava a milhares de quilômetros de distância, mas naquele momento ela queria tanto ter estado ali para ver a gravação daquele clipe. Ela gostaria tanto que a segurasse e eles ficassem para trás depois que a staff tivesse ido embora, embaixo daquele céu.
  Mesmo que não tivesse som saindo da televisão, ela podia muito bem ler os lábios de e, já tendo ouvido a música, sabia qual era a linha dela que ele a pronunciava naquele momento, o close em seu rosto e seus olhos , e um sorriso mínimo no canto de seu rosto.
  And I’ll travel through the stars so I can be everywhere, just look up at the sky and call my name, I would wait forever if it meant you’ll be there.
   (E eu viajarei pelas estrelas para que eu possa estar em todo lugar, apenas olhe para o céu e chame meu nome, eu esperaria para sempre se isso significasse que você estará lá.)
   finalmente deu as costas à vitrine, afastando-se rapidamente dali. Não ia aguentar muito mais tempo daquele jeito, e realmente não queria chorar em público. Piscou várias vezes enquanto andava, afastando aquela sensação. Queria encontrar . Por um momento, ficara tão assustada em vê-lo ali que seu coração parara, ela apenas pudera perceber o quanto sentia falta dele. Não queria que as coisas tivessem acabado daquele jeito.
  Ela poderia ser a maior idiota do mundo por ainda gostar dele depois de ter sido mandada embora daquela forma, mas ela não podia mandar em seu coração e mandá-lo parar de amar . Se ela pudesse, ela já teria feito isso desde o momento em que ele a deixara sozinha em casa.
  ― , aqui! – ouviu um grito e percebeu que estava passando reto pelo ponto de encontro de suas amigas. As duas tinham sacolas em seus braços e acenavam para que ela as visse. Como se Maddy, sem usar nenhum gorro, não tivesse seus cabelos avermelhados sendo revolvidos pelo vento e chamando toda a atenção do mundo.
  ― Ah, desculpem. ― correu até elas, suas sacolas balançando em seus braços. ― Me distraí.
  ― Seu rosto está todo vermelho, você está bem?
  ― Sim, é o frio. ― respondeu rapidamente. As outras duas se entreolharam, mas não disseram nada. ― Temos que ver os presentes dos meus pais, dos pais da Maddy...
  ― Do meu chefe, da dona Maggie... ― foram contando nos dedos. Em breve iria anoitecer e ficar mais frio, mas elas não se importaram, andando pelas vitrines e conversando animadamente sobre os planos e o trabalho. Maddy e estavam bastante curiosas sobre esse chefe que Loren sempre falava e não paravam de atormentar a mais velha com infinitas perguntas.
  Passaram por uma loja de acessórios e bugigangas antiquadas, onde todas as três surtaram por coisas diferentes. Separaram-se e começaram a olhar tudo que havia. parou em frente a um mostruário onde havia pulseiras de couro masculinas com pingentes, e Maddy subitamente se aproximou.
  ― Seu pai não gostaria disso. ― afirmou, trazendo nos braços um abajur. deu uma risadinha, remexendo uma pulseira com um pingente de estrela.
  ― Estava pensando... em ... ― confessou, a cabeça ainda no clipe e a imagem do céu estrelado sobre eles. Maddy arregalou levemente os olhos.
  ― , não faça isso. Eles nem ouviram seu lado e te expulsaram, você não deve nada pra eles.
  ― Eu sei, mas... ― acabou não completando a frase. Sabia que a amiga estava certa. Só parecia errado, depois de tudo, não dar nada para ele, nem mesmo uma lembrança para que ele usasse e também se lembrasse dela. Ela nem sabia se ele usaria, mas gostaria de enviar algum presente.
  Suspirou. Iria ouvir Maddy, porque era verdade. Não podia fazer essas coisas quando estava tentando esquecê-lo e superá-lo. Mesmo assim, agarrou uma pulseira roxa com pingentes diversos, que mandaria para Rowena. Ela definitivamente merecia um presente, e esperava que não fosse esquecida pela ex-cunhada.
  Ao saírem da loja, passaram por outra vitrine com televisões e mais uma vez o clipe do passava. parou e encarou tudo de novo, mesmo sabendo que suas amigas estavam perto e tentariam impedi-la. Mas não tentaram. Maddy e Loren apenas pararam ao seu lado e ela sentiu-as se entreolharem por trás de si.
  ― Esqueci que o clipe novo deles saía hoje. ― Maddy murmurou, baixinho.
  ― A música é muito boa. Gostei da fotografia do clipe. ― comentou, tentando fazer sua voz não sair tremida. Mais rápido do que da outra vez, afastou-se da vitrine. Agora já estava escuro, e suas adoradas luzes de Natal estavam acesas, mas ela queria apenas voltar para casa e não encarar mais nenhuma TV pelo resto de seus dias.
  Mesmo que tudo tivesse sido falso e ela soubesse que uma hora teria que voltar para o Colorado e continuar sua vida, não esperava que tivesse sido dessa forma. Gostaria de ter tido uma boa despedida, uma chance de reencontrá-los, uma chance de dizer a claramente que gostava dele, não por ele ser o famoso , mas por ser o com quem ela acidentalmente se casara. O que ela sentira por ele fora real o suficiente, mesmo que todo o resto tivesse sido falso. Seus sentimentos, ela tinha certeza absoluta, não eram uma mentira. E isso a fazia desejar ardentemente que as coisas tivessem dado certo de alguma outra forma.
  Suas amigas a acompanharam, entrando todas no carro de Maddy – que havia sido rebocado desde Las Vegas até o Colorado da última vez, pelo que ela ouvira a amiga contando. Uma bagunça, pensou. Precisava de tanta pressa assim pra elas chegarem que não poderia ser de carro? Pelo menos Bill bancara todos os custos.
  Como Maddy teria que levar Loren para um outro lugar ainda, ao chegarem em Westcliffe, insistiu que elas a deixassem numa rua próxima, já que a rua de sua casa era mão única, e Maddy teria que fazer um retorno gigante e desnecessário. Falou que andando veria as luzes de Natal melhor.
  Só queria ficar um pouco mais sozinha e observar a neve e as luzes que tanto gostava.
  As amigas concordaram, deixando-a no ponto planejado.
  ― Vê se liga quando chegar em casa. ― Loren disse, preocupada.
  ― São duzentos metros. Eu não vou morrer. E, se eu morrer, perguntem pro vizinho, ele vai saber quem foi. ― grunhiu, novamente se enrolando em seu cachecol e pegando as sacolas para sair do carro. ― Vocês também conhecem essa cidade, se um burro deitar ele fica com o rabo de fora. ― as duas riram e despediram-se dela, que bateu a porta do carro e observou-as se afastarem com um aceno.
  Apesar dos apesares, havia sido um dia divertido.
  Alguém havia passado pela neve na calçada, que estava com marcas de pé. seguiu-as de cabeça erguida, observando todas as casas com as luzes acesas, piscando e iluminando a rua inteira. Francamente, só Loren para se preocupar com ela em uma rua tão iluminada e curta.
  Mal dera alguns passos e mais neve começou a cair do céu, fazendo parar e observar a imensidão escura e estrelada acima de si. Era tão gostoso, tão relaxante ver aqueles floquinhos flutuantes caindo um por um, com as estrelas brilhando ao fundo. Se não estivesse com frio, poderia passar a noite inteira ali os observando.
  Continuou seu caminho até sua casa, já vendo-a à distância. Conforme se aproximava, percebeu que havia alguém na frente do portão. Por causa das luzes, podia ver a fumaça que a respiração da pessoa fazia. Ponderou se seria algum vizinho precisando de ajuda ou sua mãe aguardando-a. A neve caiu um pouco mais forte, e puxou o cachecol para cobrir sua boca, mantendo-a mais aquecida.
  Quando estava a três casas de distância da sua, percebeu que a figura em frente a ela era alta, e um homem. Hesitou alguns segundos antes de se aproximar mais e, ao ouvir seus passos, o homem virou-se para ela.
  Mais uma vez, tanto os passos quanto o coração de pararam naquele dia. Ela interrompeu-se ainda cerca de vinte metros, sem conseguir acreditar nos seus olhos. Era provavelmente uma ilusão.
  Porque não poderia estar de pé em frente a sua porta.
  Poderia?
  Tudo bem que ele estava completamente enrolado em um cachecol grosso, e seu sobretudo cobria quase todo seu corpo. Mas ela podia ver a ponta avermelhada do nariz dele, e seus olhos encarando-a, e ela sabia que aqueles olhos eram de .
  ― . ― e seu sotaque dizendo seu nome era só o que faltava para completar aquela certeza. Mesmo assim, não conseguiu reagir, apenas encarando o vulto negro a sua frente.
  ― H-? – sua voz tremeu e ela não conseguiu esconder sua confusão. ― ? – repetiu.
  Ela pôde ver em seus olhos que ele sorrira, pelo menos um pouco. passara tanto tempo observando que mesmo estes pequenos sinais eram reconhecíveis.
  ― Oi . ― ele aproximou-se alguns passos. ― Você está bem? – ele passou os olhos por ela, de suas sacolas até seu cachecol enrolando em seu rosto, parando ali.
  ― O que você está fazendo aqui? – seu coração batia tão rápido e alto que ela pensou se ele estaria ouvindo. Sabia que era impossível, mas a sensação era essa. E por mais que aquele coração estivesse feliz em ver mais uma vez, seu cérebro não deixava de lado o fato de que ele estava ali. Depois de tudo. Sem nem ligar ou dar a mínima para ela nos últimos dias.
   pareceu um pouco surpreso e embaraçado com a pergunta. ponderou se deveria convidá-lo para entrar e conversarem no calor, mas sabia que seus pais não ficariam muito felizes com isso. Ainda que algo acontecesse e ela o perdoasse, os pais e as amigas dela demorariam muito mais para fazer isso. E ela ainda nem sabia se realmente o perdoaria.
  ― Rowena mandou você aqui? – perguntou, imaginando se fora feito da ex-cunhada. Mesmo que Rowena quisesse um final feliz para ela, não deveria sair fazendo essas coisas.
  ― Rowena? – pareceu ainda mais confuso. ― Não, não, eu... eu tive uns dias de folga... e aí pensei em ver como você estava. ― sua voz foi baixando aos poucos e ele olhou para o chão. Aquilo era um pouco surpreendente. Ele parecia até envergonhado. não pôde deixar de arregalar os olhos de leve.
  ― Me ver?
  ― Sim. ― ele parecia um pouco impaciente por ela estar demorando tanto a entender aquilo. olhou para trás, para ver se não havia derrubado seu corpo em algum lugar na neve e sua alma estar em um tipo de transe, encontrando uma ilusão de que queria vê-la.
  ― Ah... ― foi o que conseguiu responder, ao constatar que aparentemente aquilo tudo era real.
  ― O jeito que eu te deixei ir... pareceu quase como se nós tivéssemos te expulsado, e não foi isso eu... não consegui parar de pensar nisso. ― ele enfiou as mãos nos bolsos do sobretudo e aproximou-se mais alguns passos. Agora havia poucos metros entre eles, e podia enxergá-lo com clareza, até mesmo os flocos de neve presos em sua franja. Era mesmo . ― Por algum motivo... pareceu que eu não ia conseguir seguir se você estivesse brava, ou chateada comigo. ― ele disse, sua respiração e suas palavras transformando-se em fumaça.
  ― Mas... eu não estou... ― murmurou, ainda encarando-o. levantou os olhos para ela. ― Não acho que eu tenha ficado brava com você. Fiquei chateada de ter que partir tão rapidamente, quando comecei a esperar que as coisas fossem dar certo... fiquei chateada de não poder passar o Natal com vocês, nem ter ido a um show, nem ter me despedido de Rowena... ― ela sentiu sua garganta começar a fechar e piscou várias vezes. Se não chorara até aquele dia, não choraria naquele momento, ainda mais na frente de . ― Mas não fiquei brava ou chateada com você.
  Suas mãos, cobertas pelas luvas, estavam quase dormentes, de tanto que ela apertava as alças das sacolas. Tentava não tremer e esperava que, se estivesse tremendo, associasse ao frio. Se ele viera para limpar sua consciência, ela já havia dito tudo que ele poderia querer ouvir, e então ele poderia ir embora.
  Mas permaneceu no lugar, observando-a. Depois, com um riso fraco, cortou a distância entre eles, ficando realmente próximo. podia ver todos seus cílios e contá-los, controlando a vontade de esticar sua mão e afastar os flocos presos em sua franja.
  ― Como é que depois de tudo você ainda tem um coração tão bom, ? – ele sussurrou, olhando-a nos olhos. Ótimo, tudo que ela precisava agora era tirando sarro de sua bondade. Ia comentar algo rude, quase saindo de seu transe, quando ele levantou as mãos e segurou o rosto dela entre elas.
  Ele não usava luvas, mas suas mãos estavam inesperadamente quentes. Surpresa com o toque súbito e a proximidade, engoliu suas palavras, encarando-o e aguardando o que estava por vir. Ele não se atreveria a beijá-la depois de tudo aquilo, não é? , entretanto, apenas continuou falando:
  ― Tudo que já fiz pra você... o jeito como Bill te tratou... o jeito como eu te tratei... os escândalos e as situações pelas quais você teve que passar... e, ainda por cima, você teve que voltar sem absolutamente nada. Você me ajudou tanto, e não teve absolutamente nada em troca no fim... ― seus olhos estavam inquietos, enquanto ele sussurrava e o calor de suas mãos espalhava-se pelo rosto de , que apenas mantinha seus olhos presos no rosto dele. Talvez na boca. Mas no rosto, definitivamente. ― Não tem nada agora que eu possa fazer por você?
  Ela teve que se segurar muito para não pedir um beijo naquele momento. Sabia que não deveria, mas com ele tão próximo dela depois das últimas semanas, era quase inevitável pensar em outra coisa. Seu coração ainda doía por ele enquanto batia, porém pouco a pouco ela sentia-se melhor, só de tê-lo ali perto dela. Era realmente uma idiota, como desconfiava.
  ― , eu... isso é meio súbito. ― ela soltou uma risada desconfortável, dando um passo para trás para que pudesse respirar e pensar melhor. Mordeu o lábio inferior. ― Eu... eu estou feliz que você está aqui, mas... você não ligou... você não mandou mensagem... você simplesmente... apareceu. ― ela passou a mão pelo cabelo, ajeitando o gorro. permanecia encarando-a, prestando atenção nela. ― Você simplesmente aparece e eu nem sei quando você vai embora de novo e... você não pode ficar fazendo isso comigo... ― sua voz foi sumindo aos poucos. Ela suspirou. ― Nosso contrato acabou, então achei que você simplesmente ia continuar vivendo a sua vida. Você disse que não estava acostumado a viver com pessoas desde que saíra da casa dos seus pais, e ia se esforçar por eu estar ali. Agora você não precisa fazer isso porque eu não estou lá, então creio que você consegue facilmente seguir em frente. ― aquelas palavras doíam enquanto ela as pronunciava, mas continuou. ― Eu não sei por que você está aqui.
   permaneceu em silêncio. Ele levantou os olhos para o céu, de onde flocos brancos ainda caíam, e soprou o ar de seus pulmões.
  ― Eu não sei direito também. ― ele disse. ― Mas eu não quis voltar para meu antigo apartamento. Bartholomeu e Miles se acostumaram com a casa, e eu também. Nem meu carro antigo, que Bill me devolveu, parece ter graça. Eu achei que se eu viesse até você e conseguisse seu perdão, eu ficaria em paz. Eu estou sendo completamente egoísta de novo. ― ele riu sozinho, sem achar graça nenhuma. ― Mas agora você diz que não tem o que me perdoar. Então eu vou voltar para casa e... ainda parece que falta alguma coisa. Ver você, tocar você, ainda assim parece que não está completo. ― ele soou desapontado. Baixou os olhos para ela. ― Por que é que eu me sinto tão vazio?
   não soube responder aquilo. Decidiu aproximar-se lentamente dele, segurando todas as sacolas com uma mão só, ousando estender sua mão coberta por luvas e afastar a franja de , removendo os flocos de neve dali. Os olhos dele permaneceram fixos em seu rosto, aguardando qualquer coisa. Mas não sabia nem o que sentir nem o que dizer naquele momento. Ela estava feliz, e parecia que seu coração se remendava aos poucos ao ver e tocar . Ao mesmo tempo, contudo, sentia-se partir um pouco mais. O que eram todas aquelas coisas que estava falando, e o que elas significariam dali para frente?
  Percebendo que o silêncio de provavelmente se prolongaria por mais tempo, voltou a falar. Dessa vez, sem que ela percebesse, as mãos dele seguravam de leve sua cintura e ele não desviava os olhos dos dela.
  ― Você ficou pouco tempo lá... naquela casa... e menos tempo ainda comigo, que fui um idiota com você desde o começo. ― conforme ele falava, a condensação de sua respiração cobria o rosto de ambos por alguns segundos. ― Ainda assim... parece que você não estar lá... faz toda a diferença. A casa fica vazia, fica suja, fica bagunçada. Fica escura e fica silenciosa. Fica fria. ― os olhos dele pareciam tristes e tentava não tremer nos braços dele conforme ia ouvindo, além de se segurar para não dizer algo como “então todo o tempo que estive lá você nem ao menos percebeu que eu limpava a casa?”, aguardando o que mais ele diria ao invés disso. ― Eu acho que... eu odeio isso. Eu acho que eu odeio você não estar lá. ― ele desviou os olhos rapidamente, parecendo envergonhado, e piscou, atônita, depois de ouvir suas palavras. respirou fundo, dando um sorriso fraco em seguida. ― Eu vivo fazendo pedidos egoístas, mas será que você pode ouvir só mais um deles? Só ouvir. Não vou ser egoísta o suficiente para pedir que você o conceda.
  ― O que é? – a voz dela saiu tremida, sem saber o que esperar daquilo. Seu pescoço já estava começando a doer de tanto olhar para cima, mas o que importava aquilo naquele momento? Os lábios avermelhados de ergueram-se em um sorriso fraco.
  ― Antes de a notícia do casamento falso sair, você tinha prometido uma chance para eu poder fazer as coisas direito para você daquela vez. Eu acho que... eu gostaria de realmente me esforçar... me esforçar pra ficar com você e não te soltar dessa vez. Nunca mais. Começar do começo, do jeito certo, e fazer tudo direito. ― disse, fazendo prender a respiração. Com um sorriso um pouco envergonhado, completou: ― Será que ainda teria outra dessas chances sobrando?
  Ela não soube como ou o quê responder para aquilo. estava pedindo – claramente pedindo – que ela ficasse com ele? Que eles dessa vez tentassem, sem nenhuma catástrofe de Vegas, nenhum escândalo ou relacionamento falso? Ele estaria dizendo que , aquele , e não o da , queria ficar com ela, ela sendo e apenas ?
  Como resposta, tudo que pôde fazer foi largar as sacolas no chão e enlaçar os braços pela cintura dele, afundando o rosto na aba do sobretudo e no cachecol dele, ambos repletos de flocos de neve. imediatamente passou os braços pelas costas dela também, apertando-a contra si.
  ― Posso considerar isso como um sim? – ele soltou, soando risonho, e sorriu. Concordou com a cabeça, ainda sentindo a ponta da orelha fria dele tocar-lhe a lateral do rosto. Ficar perto de assim era o que remendava melhor seu coração. Ela mal podia acreditar que aquilo estava realmente acontecendo, sentia-se como uma adolescente em seu primeiro amor. Mas, bem, era seu primeiro amor. E, melhor ainda, era um primeiro amor que estava dando certo, depois de tudo.
  Permaneceram em um silêncio confortável, até quebrá-lo novamente.
  ― Minha mãe escolheu meu nome por causa de um livro... Chamado ’s Moving Castle. É de uma autora inglesa, Diana Wynne . Ela lia sempre para Rowena na cama, e Rowena insistiu que esse fosse meu nome. ― ele contou, e ela afastou-se para olhá-lo enquanto ele prosseguia. ― Nesse livro, tem uma frase que eu gosto muito, por algum motivo.
  ― Qual? – ela indagou, segurando um sorriso. piscou algumas vezes, depois sorriu e inclinou-se, beijando-a. Os lábios dele estavam frios como os dela, já que estavam há tanto tempo de pé do lado de fora, e o toque macio dele fez o coração de esquentar e bater mais forte, mesmo com suas pequenas rachaduras. Aquele tipo de beijo que ela ansiara durante muito tempo, um beijo que mostrava e transmitia os sentimentos de , fazendo-a entender o que se passava no coração dele.
  Logo ele quebrou o beijo, afastando-se apenas o suficiente para dizer:
  ― “Eu acho que nós deveríamos viver felizes para sempre”.
   riu, como se uma chama tivesse sido acesa dentro de si. As luzes de Natal pareciam incrivelmente bonitas, assim como a pequena nevasca em que se encontravam. E os olhos de , o sorriso dele colado ao dela, era provavelmente a cena que ela mais amou ter visto em toda sua vida. Mesmo que tivessem passado por muitas coisas, a chance de ouvir aquelas palavras e receber aquele beijo compensaram todos os desastres e problemas, fazendo-a se sentir forte e feliz. Beijando-o mais uma vez, os braços cruzados atrás da nuca dele de forma que pudessem manter os rostos o mais perto possível, sabia que aquele era o lugar onde mais amava ficar. Dentro dos braços do .
  Quebrou o beijo, sentindo a ponta gelada do nariz dele tocar-lhe a bochecha. Sorriu, dizendo:
  ― Pois eu tenho uma frase que uma pessoa muito idiota escreveu. Apesar de tudo, eu gosto muito dela.
  ― Da pessoa ou da frase? – ele arqueou as sobrancelhas, e ponderou se ele já sabia o que ela ia falar. Ignorou-o, rolando os olhos.
  ― Essa frase... acho que posso usá-la para justificar algumas coisas, principalmente o fato de eu estar com você agora, apesar de tudo. ― ela disse, passando a mão pela nuca dele e acariciando o cabelo escuro macio, mantendo seus olhos fixos aos dele.
  ― E qual seria ela? – ele perguntou, os olhos focados nos lábios levemente inchados e avermelhados dela, provavelmente ávidos para retornar ali. alargou o sorriso.
  ― “Eu esperaria para sempre se isso significasse que você estará lá”.
  E voltou a beijá-lo.

FIM



Comentários da autora


Nota da autora: Alô alô!

Espero que gostem da versão interativa de UNEV! Como eu escrevi ela sem ser interativa, foi bastante difícil não deixar milhões de perguntinhas. Por causa disso, espero que não se importem caso alguns personagens tenham características fixas e suas amigas sejam Maddy e Loren (para quem ainda não as conhecem, elas são um amor e não tem problema nenhum ser amiga delas! ♥)
História Original no Wattpad
História Especial no Wattpad (POV do PP dos dois primeiros capítulos)
Grupo do Facebook
Nos vemos em breve <3
xx Anne



Nota Final da Autora

Muito obrigada por ter acompanhado a versão interativa de UNEV até aqui! Espero que tenha gostado e que os personagens tenham te cativado.
Lembrando que eu mantenho um grupo do Facebook para contato e você pode ler muitas outras histórias minhas no Wattpad! Pretendo voltar logo com algumas histórias, então fiquem de olho!
Também deem uma olhada no meu perfil do Wattpad, pois lá em “Uma Noite em Vegas – Contos”, tem alguns contos extras sobre os personagens originais, que vocês talvez gostem de ler. Recomendo fortemente Cumulonimbus.
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Muito obrigada mais uma vez e até a próxima!
Beijos,
Anne