Twilight Chase
Escrito por Letícia Leite | Revisado por Mariana
sempre fazia o mesmo trajeto a caminho da escola. Quando saía da sua rua e virava a esquina, dava um bom dia para o senhor da cafeteria onde ela comprava um donut e um café. Depois ela andava mais um pouco e parava na frente da casa de e de , dois irmãos e também seus melhores amigos, onde ela esperava por eles para seguirem, juntos, o resto do caminho.
Mas as conversas e brincadeiras sempre eram interrompidas quando eles tinham que contornar a maior atração do bairro: O cemitério.
- Vocês sabiam que, segundo a lenda... – começou.
- Esse cemitério é assombrado – completou a frase revirando os olhos – Será que todos os dias você vai ter que falar isso? – A garota cruzou os braços, irritada.
não sabia se era coincidência ou se era seu psicológico lhe pregando peças, mas todas as vezes que ela passava por ali, seu coração acelerava, um arrepio anormal a fazia estremecer e suas mãos começavam a suar.
- Olha só! – apontou para a amiga – Você está assustando ela, !
- Não – tentou manter sua voz firme, enquanto apertava a alça da mochila com as duas mãos – Eu estou bem, é que eu não comi nada hoje, então acho que me bateu uma fraqueza – A menina mentiu. Mas não acreditou, ela conseguia sentir o cheiro de café que vinha do hálito da garota ao seu lado, porém preferiu não dizer nada.
- Então por que nós sempre temos que contornar o cemitério? Não seria mais fácil a gente cortar caminho por dentro? – chutou uma pedrinha indignado com a falta de coragem da sua irmã e de sua melhor amiga.
- Não – As duas garotas responderam ao mesmo tempo – Esquece isso, vamos mudar de assunto – completou, enquanto olhava para a amiga discretamente, que tinha um olhar de alivio disfarçado. Mas nenhum assunto se seguiu por uns cinco minutos, até eles passarem pelo enorme lote e se aproximarem da escola.
- Meninas... – começou quando eles subiam pelos degraus que dava acesso a porta do colégio – Vejo vocês no fim da aula – Ele piscou e seguiu pelo caminho oposto as garotas, pois ele era um ano mais velho que elas e, consequentemente, não tinham nenhuma aula juntos.
- Vamos – puxou que estava olhando para o nada, em silencio – O que deu em você hoje? – A menina perguntou rindo. A outra também tentou forçar o riso, mas fracassou, então só deu de ombros e acompanhou a amiga para a primeira aula.
X
- Onde está ? – perguntou enquanto se aproximava de , que levou um susto com a aproximação repentina do amigo – Desculpe – ele riu de leve da expressão assustada dela – O que deu em você hoje?
- Por que as pessoas ficam me perguntando isso? – falou frustrada – E hoje é quarta, esqueceu? A tem aula de música...
- Ah sim – colocou o braço em torno dos ombros da amiga e eles começaram a andar. A garota tropeçou logo nos primeiros passos, o que fez o garoto rir e começar a fazer piadinhas sobre a sua falta de coordenação, o que gerou risos e uma briguinha durante parte do trajeto.
- Vamos, – apontou para o portão do cemitério – Vai ser mais rápido, eu prometo!
- Não, eu não gosto desse lugar, .
- Vamos, por favor – ele parou de andar e ficou de frente para a menina que tremia levemente – A gente tem que ter medo dos vivos, não dos mortos...
- E isso deveria me consolar de alguma forma? – A garota tentou brincar, mas o outro permaneceu sério.
- ...
- ... – ela tentou brincar de novo, mas dessa vez funcionou.
- Ótimo, vamos – ele começou a puxar a menina relutante pelo braço – Eu te protejo – Geralmente ela riria dessa possibilidade, mas eles já estavam do lado de dentro. Ela podia jurar que o ar havia ficado mais frio e pesado, o ambiente também estava mais silencioso, como se o ar houvesse se comprimido perto das orelhas da garota. ria da cara da amiga, mas até ele estava se sentindo desconfortável ali dentro. Porém não podia admitir isso, já que a ideia de cortar caminho havia sido sua.
O único som que se ouvia era as folhas secas de outono e esmagando debaixo de seus tênis e alguma gralha cantando morbidamente perto dali. O terreno era inclinado, formando um morro relativamente alto ao centro do local, impedindo quem estava do outro lado, ver a saída.
- Mais depressa, – olhou para o lado – ? – Sua voz falhou e a garota parou de andar ao perceber que o amigo não estava mais ao seu lado – ? – Ela perguntou de novo, ainda com a voz trêmula, sua garganta apertou e ela ficou com vontade de chorar. A garota mordeu levemente a manga do casaco e começou a olhar em volta, os sons ao seu redor ficaram mais abafados e sua respiração pesada. Virou de um lado para o outro até dar a volta completa em torno de si mesma, a procura de , que parecia ter evaporado. Ela apertou os olhos com força e uma lágrima escorreu pelo rosto, quando, de repente, duas mãos agarraram seus ombros a fazendo gritar em pânico.
- Ei! Desculpa! – corria atrás da menina que agora rumava para fora do lote, em parte aliviada por ter sido só uma brincadeira, mas extremamente chateada com o amigo por tal ato que, para ela, fora totalmente sem graça e desnecessário – ! – O garoto gritou um pouco antes de alcança-la alguns minutos depois, já na saída do lugar.
- Me deixa, seu imbecil! – Ela mexeu o braço, que o amigo segurava, violentamente, para que ele a soltasse – Isso não teve graça! – percebeu a burrada que ele havia feito, sabia que ela não iria gostar da brincadeira, mas nunca imaginaria que ela reagiria tão mal.
- Me desculpe – Ele tentou abraça-la, mas foi em vão – Não foi por mal.
- Até amanhã – A garota falou dobrando a esquina para pegar o caminho mais longo até a sua casa, o caminho que não passava pela casa de seus melhores amigos.
A noite, ligou para após seu irmão lhe contar do ocorrido.
- Não se preocupe, eu já dei a maior branca nele – ouviu a menina falando do outro lado da linha – Mas não fique chateada com ele, você sabe como meu irmão é, faz as coisas sem pensar.
- Deveria ter pensado, pelo menos dessa vez – disse com certa raiva. Como ainda defendia o garoto?
- Olha, minha mãe tá chamando para jantar, depois eu te ligo, ok? Ele não vai fazer isso de novo, não depois de ver como você ficou chateada, e principalmente depois de me ouvir falar por dez minutos seguidos de como ele é um completo idiota – As garotas riram de leve.
ficou pensando em como seria mais fácil se ela fosse um pouco mais corajosa... “Eu fiquei sozinha por um minuto e já estava chorando” – ela pensou um pouco envergonhada.
Sua melhor amiga lhe ligou novamente, como havia prometido, mas o assunto do cemitério não foi mais abordado entre as duas.
- Amanhã meu pai vai nos buscar no colégio, ele quer ajuda com algo... Tem certeza que não tem problema você voltar sozinha? – Merdith perguntou.
- Não, tudo bem, eu entendo e não tem problema – tentou rir, mas a verdade é que ela odiava ter que fazer aquele longo caminho sozinha – Mas nos vemos amanhã na escola, eu tenho que desligar...
- Então até lá – se despediu e desligou o telefone. , mesmo sabendo que não era culpa dos amigos, não pôde deixar de ficar um pouco chateada com o fato de ter de fazer o trajeto sem a companhia deles. Como já estava pronta para ir dormir, a garota só desligou a luz do quarto antes de se dirigir à sua cama. Ficou encarando o teto enquanto a imagem dos túmulos e flores mortas lhe vinham a mente sem autorização, e depois de pegar no sono se viu correndo por meio deles fugindo de alguém... Ou de algo.
No dia seguinte a menina acordou atrasada, depois de uma péssima noite de sono, consequência dos pesadelos que a fizeram acordar tantas vezes no meio da noite. Sua mãe foi lhe deixar no colégio, ou então chegaria atrasada. Na sala de aula explicou para que havia pegado carona com a mãe e se desculpou por não ter avisado aos amigos. No fim da aula, depois de garantir um milhão de vezes (ou quase isso!) a que estava tudo bem e que ela não havia pegado carona com a mãe para evita-lo, ela se despediu dos amigos, que foram para a esquina do colégio esperar o pai deles, enquanto ela ia pela direção oposta seguindo o caminho que levava até a sua casa, se xingando mentalmente por ter esquecido de levar os fones de ouvido.
A respiração dela se acelerava a cada passo que se aproximava do velho cemitério do bairro. A garota diminuiu o passo até chegar em frente ao portão e parar definitivamente, olhando para o ferro enferrujado que era esculpido em delicados adornos com flores. Algo estava escrito em latim e logo ao lado uma data. 1854. O arrepio que acompanhava a menina em todas as vezes que passara por ali voltou. Ela esfregou a mão no braço coberto com o casaco grosso e respirou fundo antes de empurrar o portão pesado que rangeu alto. “Eu consigo” pensou, ela tinha que enfrentar seu medo e, talvez, se livrar do pesadelo da noite passada.
Era simples, andar em linha reta, sem olhar para os lados, em direção ao portão oposto. Bem, pelo menos deveria ter sido simples. Depois dos primeiros dez passos a garota começou a sentir um estranho formigamento na sua nuca, se sentiu observada. Ela parou e respirou fundo antes de virar bruscamente para trás. Nada ali. Mas o formigamento continuava, ela tentou seguir seu caminho, mas virou-se para trás bruscamente pelo menos mais quatro vezes, na esperança de pegar no flagra alguém a observando.
Então ela decidiu desviar seu caminho e seguir naquela direção, repetindo para si mesma que não havia nada ali, apesar de seu subconsciente gritar “PERIGO, CORRA!”, ela continuou indo em direção a alguns túmulos altos e com querubins assustadores a encarando com expressões vazias que pareciam querer perfurar sua alma. tremia, uma mistura de frio com medo, ela puxou as mangas do casaco e esfregou as mãos sem conseguir desviar os olhos de uma estátua especialmente perturbadora, de uma pessoa caída, olhando em suplica para o céu. Um anjo caído. Bastou se distrair por alguns segundos, que a menina veio ao chão, havia tropeçado em uma das lápides. Depois de esfregar os joelhos que haviam batido com força no solo, a menina se levantou e olhou pela primeira vez no que a havia feito cair.
Aqui jaz Jean-Antoine Petit
1903 – 1933
Era tudo que estava escrito ali, sem nenhum tipo de homenagem do tipo “amigo querido, filho exemplar” e essas coisas que escreviam em túmulos. Um vento forte veio de repente bagunçando o cabelo da garota e fazendo sua touca voar longe, ela correu até lá e a apanhou, logo em seguida olhou em volta e podia jurar ter visto um vulto ali, onde ela estivera segundos atrás, e que agora vinha em sua direção. deu um passo para trás desconcertada, diferentemente do dia anterior ela não sentiu vontade de chorar, sua reação imediata foi correr, ela correu como nunca havia corrido em sua vida. Tanto que quando chegou do lado de fora do cemitério, suas pernas fraquejaram, e ela teve que se sentar ali, encostada no muro, ofegante. Então as lágrimas vieram enquanto ela travava um debate mental contra si mesma, tentando descobrir se aquilo havia sido real ou se sua mente estava realmente lhe pregando peças.
Ela passou a mão no rosto frustrada. “E lá se foi minha tentativa de ser corajosa...” – ela pensou olhando para cima e mordendo o lábio inferior, apertou a touca com força na mão e a enfiou de qualquer jeito na mochila. “A menos que...” – Antes mesmo de terminar o pensamento ela já estava de pé, caminhando para dentro daquele lugar de novo. Assim que colocou os dois pés lá todos os pelos do seu corpo se eriçaram como se o seu próprio corpo indicasse que aquele não era o lugar certo para se estar àquela hora, já perto do anoitecer. não sabiam que horas eram, e não se importou com isso, rumou pelo caminho que veio até o tal túmulo. O problema é que a garota havia se preocupado tanto em correr, que não registrara o caminho por onde passara. Seus passos eram a única coisa que se escutava ali, até que o quase silencio foi quebrado por um barulho leve, mas que fez a garota parar, alguém a estava seguindo, e agora ela podia não só sentir, como ouvir também. Ela virou bruscamente para trás, como já havia feito anteriormente, e de novo, não viu nada. Voltou ao seu caminho original e voltou a ouvir as passadas que quase se sincronizavam com as dela. A menina virou para trás de novo, respirando fundo para não entrar em pânico.
- Tem alguém ai? – Que tipo de pessoa estupida pergunta isso? Ela se repreendeu. Mas gostou de sua voz ter saído quase tão forte quanto ela esperava.
Um barulho de galho se partindo a chamou atenção e então ela virou-se para a direita com os olhos arregalados de susto. Bastou fazer isso para que um vento mais gelado que o normal viesse na direção contraria e a fizesse virar rapidamente para lá, onde outro querubim, dessa vez com ambos os braços quebrados, a encarava sorrindo em deboche, e a encarando com seus orbes vazios. Olhou em volta de novo sem conseguir se decidir para onde ir. O vento derrubava as últimas folhas de um grande carvalho a sua direita e então ela sentiu aquela sensação de novo, aquela em que parecia que o ar em sua volta estivesse a comprimindo, ela mal conseguia respirar quando ouviu passos de alguém, mas agora todos os sons pareciam distantes, como se ela estivesse envolta em uma bolha.
- , é você? – Ela perguntou sem folego, mas é claro que não poderia ser ele – Seja lá quem for – ela disse sem folego – Isso não tem graça – Sua voz já estava chorosa e ela tentou andar a passos trôpegos. Então o ar voltou ao normal tão rápido quanto ele havia ficado pesado, e ela respirou fundo. Um corvo começou seu canto mórbido em algum lugar acima dela, em um dos galhos quase sem folhas de uma das árvores.
- Bicho estúpido – ela murmurou abraçando o próprio corpo. Então se lembrou do que fora fazer ali. Quando finalmente retornou a direção a qual estava originalmente seguindo ela parou, viu mais alguém ali. paralisou, era como se ela tivesse virado gelo por dentro.
- O que faz aqui? – O homem perguntou tirando seu chapéu educadamente antes de falar com a garota. Ele se aproximou devagar, mas ela mal pode se mexer, o pânico a havia deixado sem reação – Está tudo bem com você? – Ele perguntou genuinamente preocupado.
-Si... Sim – ela gaguejou - Está tudo bem, você só me deu um susto.
- Uma menina como você não deveria estar passando por um lugar desses a essa hora, ainda mais sozinha – Ele sorriu e sentia que podia desmaiar a qualquer momento, a presença daquele homem a estava assustando mais do que deveria. Seus profundos olhos pareciam completamente negros àquela distância.
- Eu só... Eu só vim conferir algo.
- Ao crepúsculo? – Ele disse olhando distraidamente para o céu. Dizem que essa é a hora favorita das almas passearem por ai... – Quando olhou de novo para agarota seus olhos azuis faiscaram... “Mas o quê?”.
- Achei que fosse a meia noite – A menina disse morrendo de vontade de acabar essa conversa – Ou às três da manhã.
- Não confie em tudo que dizem, garota.
- Eu tenho que ir – Ela falou entrelaçando uma mão na outra, elas estavam gélidas, trêmulas e suavam – Tenha uma boa noite – ela falou esperando que ele não quisesse prolongar a conversa. Quando passou por ele, o homem desejou um boa noite de forma melancólica.
- Espere! – Disse depois que já havia conseguido respirar de alivio com sua distância – Deixou cair isso, senhorita – Ele balançava discretamente a touca, que a garota podia jurar que havia guardado na bolsa, enquanto se aproximava novamente dela.
- Obrigada – Quando esticou o braço e a pegou, seus dedos encostaram de leve nos do homem, que eram frios como gelo. Mas isso não foi o que deixou surpresa, e sim o fato de quando isso aconteceu ela sentiu seu coração parar por um segundo, sua visão escurecer, e ela sentiu por um momento como se estivesse morta. A garota arfou quando afastou a mão do homem que tinha um sorriso mínimo no rosto. Ela piscou depressa, se virou e correu para seu destino o quanto antes, sem ter mais tanta certeza se tinha visto mesmo um vulto, porque afinal, ela pode ter visto aquele homem. Olhou para trás discretamente e ele já não estava mais lá, talvez estivesse com pressa de ir embora e ela ficou feliz por isso.
Não foi difícil localizar o que ela estava procurando, mesmo que já estivesse mais escuro que a alguns minutos atrás, as luzes precárias se acenderam e ela se abaixou próxima ao tumulo menos adornado do local. Olhou em volta dele, se afastou e se aproximou. Nada. Até que um detalhe que havia passado despercebido por ela, a chamou atenção. A menina se agachou e passou a mão levemente por um amontoado de folhas que cobriam a foto do tal Jean-Antoine.
- Não... – ela sussurrou depois de olhar a foto, se levantou depressa na mesma hora que, acima dela, vários corvos passaram voando e cantando, fazendo-a levar um susto e cair para trás sentada. Ela podia jurar que no meio de todo aquele barulho ouviu uma risada que fez um frio anormal percorrer sua espinha. Ela olhou para os lados em pânico quando as luzes piscaram algumas vezes e passaram a iluminar muito menos que antes.
Como havia escurecido tão rápido? Ela tentou achar forças para se levantar, e depois de conseguir correu alguns metros antes de tropeçar na raiz de um grande carvalho, ela estava sendo seguida de novo, e dessa vez tinha certeza disso. O vento soprou com força como se a incentivasse a correr, mas tudo o que conseguiu com isso foi tropeçar em uma raiz alta e cair novamente.
As suas mãos ardiam, enquanto se levantava, ela olhou para cima e o que viu, não estava ali segundos antes, um homem pendurado de forma brutal pelo pescoço. Seu grito agudo foi abafado pelo zunido alto do vento que quase a derrubou quando ela finalmente conseguiu se levantar. Teve de passar a mão nos olhos diversas vezes para tirar as lágrimas dali, e não correr risco de cair de novo.
Ao longe pode perceber que os portões estavam fechados, mas ainda sim correu até ele e tentou abri-los, mas pesadas correntes os prendiam.
- ALGUÉM ME AJUDE! – Ela gritou em meio aos soluços – POR FAVOR! – Ninguém passava por aquela rua, mas o portão do outro lado dava em uma rua principal. Só de pensar que teria que atravessar aquele lugar de novo sentiu vontade de morrer... Morrer? Ela fechou os olhos e pôde ver toda sua família em volta de um caixão. O que estava acontecendo ali? A menina correu de volta para o outro lado do cemitério, mas decidiu dar a volta no morro que ficava ao centro dele para que não precisasse passar perto do tumulo de Jean. Pensar nisso a fez querer vomitar, talvez aquele homem que ela havia visto fosse parente dele, não era possível que fosse ele mesmo, ou será que era?
- – Alguém sussurrou no seu ouvido, o que era impossível, afinal ela estava sozinha, e correndo.
- ME DEIXE EM PAZ – ela gritou enquanto entrava na parte mais antiga do cemitério. Algumas cruzes pendiam em cima dos túmulos, os querubins ali estavam desgastados e a grama mal aparada, além de ter muito mais árvores.
Ela ainda podia sentir que estava sendo seguida, e podia jurar que vultos passeavam para lá e para cá entre os carvalhos ao seu lado. Varias vezes ela tropeçou nos próprios pés, mas se recompunha antes de ir ao chão.
Encostou-se em uma lápide particularmente alta e respirou o mais fundo que conseguiu, porém a garota sentiu o seu apoio ficar cada vez mais e mais quente, ela se desencostou em um pulo. Quando olhou para o pedaço de pedra esculpida, ele começou a pegar fogo, a menina deu mais alguns passos para trás, surpresa, mas quando piscou o fogo havia sumido. Ela foi até ele e encostou um dedo lá. Frio como um bloco de gelo. ouviu uma risada atrás de si que a fez correr sem olhar para trás.
Não parecia que ela estava no mesmo lugar que esteve ontem, estava tão escuro que ela mal pode ver os muros, o que dificultava ela saber em que direção tinha de seguir. Então ela parou de correr, mas o vento ainda zunia nos seus ouvidos como antes, ou melhor, havia algo quase imperceptivelmente diferente naquele barulho... Sussurros. Alguma coisa, ou várias dela, agora sussurravam coisas indistintas, lamentos, maldições. Era como se todos os sons estivessem abafados, mas aquelas vozes falassem dentro de sua cabeça.
- QUEM ESTÁ AI? - Ela se sentou no chão e abraçou os joelhos, abaixando a cabeça - Isso não é real, não é real – começou a falar para si mesma. Ela não havia se acalmado e a sensação de medo aumentava a cada segundo, até que chegou ao seu ápice quando alguém a tocou. Gritando pelo que pareceu a centésima vez aquela noite, mas agora o grito arranhou sua garganta já desgastada.
- Ei, garota, calma – Um senhor falou com a voz rouca e assustada ao ver a menina em estado de choque – O que faz aqui?
- Me tire daqui, por favor – ela mal conseguia falar entre os soluços. O senhor ajudou ela a levantar e deu apoio a menina até ela chegar ao portão fechado. O homem, que julgou ser o zelador, quando se acalmou, tirou um molho de chaves do bolso e abriu o portão para a menina, ainda em choque, passar.
foi para casa e como desculpa para seu atraso disse a mãe que havia encontrado um conhecido e se distraiu conversado. A jovem senhora não acreditou, mas deixou a menina subir a seu quarto onde se acabou em lágrimas até a hora que pegou no sono.
- Sinto muito de novo – falou – Se eu soubesse que você ia ficar assim...
- Tudo bem – respondeu – Eu só preciso agradecer ao senhor que me ajudou e eu nunca mais piso nesse lugar, combinado?
- Sim – falou enquanto eles se aproximavam do cemitério, e então ela apontou para um senhor que pintava a parede externa que estava pichada – Olha ele ali!
se dirigiu ao homem, junto com seus amigos, que parecia irritado.
- Olá! Será que eu poderia falar com o outro zelador daqui?
- Você acha mesmo que se tivesse outro zelador eu estaria fazendo isso sozinho, menina?! – arregalou os olhos.
- N-Não t—te-tem outro? – ela gaguejou – Mas ele me ajudou ontem... – A sua voz saiu como um sussurro.
- Vocês adolescentes acham que podem entrar aqui e usar esse lugar pra usarem suas drogas – ele ralhou – e depois ficam alucinando...!
- Desculpe, ela deve ter confundido – puxou a amiga e a irmã para longe.
- Tudo bem? – perguntou – Você está gelada – ela pegou nas mãos tremulas da amiga – e pálida!
- Acho melhor encontrarmos outro caminho para ir para a escola – Foi o que ela conseguiu dizer depois de alguns segundos tentando formular alguma frase.
Os amigos a olharam como se ela estivesse louca, chegou a considerar pergunta-la se ela não teria sonhado com aquilo, mas não teve coragem, não queria que a menina se chateasse com ele novamente.
- Não deveria fazer isso com pobres garotas assustadas, Jean! – O homem idoso que descansava em cima de uma das lápides falou para o jovem distraidamente encostado em um carvalho ali próximo.
- Mas que culpa eu tenho? – Ele sorriu enquanto tirava o chapéu – Ela deveria saber que não se entra em um cemitério ao crepúsculo – os olhos negros dele faiscaram e de repente estavam azuis como o céu – Quem foi que disse que ela tinha autorização para andar por aqui, logo essa hora?
O velho deu uma risada sarcástica e desapareceu, sendo seguido pelo outro, que mal podia esperar por mais alguma pessoa corajosa o suficiente para chegar perto de seu cemitério, para mais uma perseguição no crepúsculo.
FIM