This is WAR

Escrito por Marcella Ribeiro | Revisado por Mariana

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Em um futuro próximo

  A Terra estava dividida novamente entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos. Mas, desta vez, não havia acordos ou diplomacia entre os países.
  O mundo estava próximo ao que parecia ser o fim, e desde muito antes, as grandes potências como os Estados Unidos estavam de olho no Brasil, espiões sendo mandados para cá desde anos antes daquilo que eles procuravam por aqui finalmente acabar por lá. Água.
  Vivíamos um racionamento de água, e como todo país desenvolvido, a dos Estados Unidos foi a primeira a acabar, seguida de perto pelos países europeus. E tudo o que restava de água doce no mundo encontrava-se no Canadá e na Rússia, congelada. E, é claro, no Brasil, que estava sendo atacado constantemente.
  Planos e técnicas para tornar a água dos oceanos potável estavam sendo bolados desde muito antes, mas não havia como. Mesmo que conseguissem um modo eficaz de tornar a água boa o suficiente para matar a sede do mundo todo, o Oceano Pacífico inteiro estava contaminado por radiação, por conta de um acidente que ocorrera no Japão há cerca de 15 anos. O Atlântico ia pelo mesmo caminho, e desde muito antes da água acabar, já era possível encontrar anomalias genéticas nas crianças da África por conta disso.
  Então o alvo do mundo era o Brasil, sendo atacado constantemente pelos Estados Unidos, que só estava “pegando leve” conosco porque estava travando uma outra batalha no Oriente Médio, enquanto pessoas morriam em todo o mundo por doenças desconhecidas e pela falta de comida. Os países europeus não vieram ao nosso auxílio, pelo contrário. Metade estava preocupada em invadir a Rússia e a outra metade preocupada em criar alianças com os Estados Unidos nas suas duas frentes – O Brasil e os países do Oriente Médio – para que garantissem nossa água e as riquezas naturais de lá.
  Estávamos sozinhos, encurralados, perdendo território.
  Mas era verdade aquilo que nossos antepassados diziam, sobre brasileiro não desistir nunca. O mundo estava contra nós, mas a população que restava e que conseguia chegar às informações ainda resistia, criando alianças com países da própria América do Sul, afinal, nenhum país de qualquer outro continente sequer tentou fazer acordos conosco. Simplesmente invadiram nosso continente e subjugaram nossas primeiras e principais defesas para que pudessem assim nutrir as “pessoas importantes” dos países desenvolvidos. Pessoas importantes, é claro, eram aqueles que tinham dinheiro para pagar por proteção, pelos litros de água a mais por dia e para ter a chance de sobreviver por mais tempo.
  O que os governos ricos e poderosos fariam com o dinheiro que conquistavam dessas pessoas, era um mistério para mim. Eu às vezes esperava que nossas poucas sobras de fonte de água acabassem logo, para que eles então percebessem que não se pode beber nem comer dinheiro.
  Meu papel nessa guerra, é claro, é lutar pelo meu país. Porque depois que a população percebeu que o Brasil estava sendo invadido pelos países com maior índice de armamento químico e exército bem preparado, o nosso exército, a marinha e o que quer que fosse que existia há anos por aqui foi claramente insuficiente, então deixaram que as mulheres se alistassem também, já que não tínhamos mais soldados. Porque brasileiros não eram treinados para guerrear ou vangloriar a guerra. Americanos, israelenses eram. Nosso exército servia mais para o resgate do que para a destruição, e mesmo que esse fato não nos ajudasse agora, eu começava a me orgulhar de meu povo de verdade.
  É óbvio que se fôssemos nós no lugar dos invasores, acordos estariam sendo feitos para que o mínimo possível de pessoas saísse ferida, não entrando sem permissão por fronteiras e estraçalhando qualquer um que se colocasse no caminho, como estavam fazendo para roubar nosso bem natural mais precioso.
  E era essa, no fim das contas, a utilidade do Brasil para o restante do mundo: fornecer matéria prima. Sempre fora, e continuava a ser. A diferença é que nos subestimaram, e mesmo que estivéssemos longe de ganhar a guerra e suprir a nossa população com a água do nosso próprio país, era reconfortante saber, em tempos como esse, que a nossa humanidade não estava sendo roubada também.
  - – meu comandante, , chamou, e eu me apresentei, terminando de ajeitar a munição nos bolsos do casaco pesado e quente que eu usava.
  - Sim, senhor.
  - Você comanda a defesa do lado oeste hoje – me incumbiu – liderarei a frente, e preciso de você para assegurar que nenhum americano invada nossa concentração. Entendido?
  - Sim, senhor – repeti.
  - Leve quem quiser ir com você, . Mas os homens estão incapacitados, a maioria que sobrou foram as mulheres.
  Assenti novamente, e por um momento, nossos olhares se encontraram e ele suspirou.
  - Toma cuidado – pediu – Quando essa guerra acabar, quero que você esteja ao meu lado.
  Sorri um pouco, pensando que aquela guerra estava longe de acabar, mas sabendo que, não importava o que acontecesse, ainda éramos a razão um do outro para continuarmos lutando. Em tempos como aquele, com a morte iminente, as coisas explodindo e tudo parecendo meio perdido, por incrível que pareça era fácil se apaixonar.
  Me apressei a caminhar até a área de descanso e assim que reuni um grupo com pouco mais que trinta mulheres, soube que não era o suficiente. Enquanto os soldados americanos pareciam brotar de qualquer lugar, as brasileiras se escondiam. Eu não as culpava, no entanto. Muitas ali tinham filhos, maridos para quem voltar. E mesmo as que não tinham nada além da pátria, como eu, tinham medo de morrer. É fácil se alistar em uma guerra só de ida dizendo que não se tem mais nada a perder. Agora estar lá no meio, com bombas, mísseis e todo tipo de coisa mortal podendo te atingir, as coisas mudavam de figura. Todo ser humano tem um instinto de sobrevivência. E ir para a guerra contra um exército maior e mais forte não era exatamente obedecer a esse instinto.

xx
It's the moment of truth and the moment to lie
The moment to live and the moment to die

  Como sempre, a batalha foi um borrão. Meus ouvidos já não funcionavam muito bem, e eu sabia que o esquerdo já era praticamente inútil. Quando você vive em meio a explosões ensurdecedoras, é isso o que acontece.
  Eu estava correndo de volta para a minha formação, após explodir um casebre que antes daquele inferno começar fora um bar e se tornara um dos postos de vigia americanos. Meu tornozelo estava machucado, e eu mancava, tentando ignorar a dor e correr para chegar logo atrás das nossas linhas de defesa. Não eram exatamente seguras, mas era muito mais seguro que correr sem ninguém para me proteger em plena área que, diziam os americanos, era deles.
  Foi em algum momento passando por entre casas despedaçadas e o que sobrara de um pequeno matagal ali perto que aconteceu. Mãos envolveram a minha boca, me impedindo de gritar, ao mesmo tempo que outras imobilizavam meus braços, para que não pudesse atirar.
  Fui jogada ao chão sem a menor dó, e quando alguém puxou meu cabelo para cima, só pude pensar em três pequenas palavras antes que a mesma mão me empurrasse de volta e eu visse o chão se aproximando de meu rosto cada vez mais rápido, sabendo que desmaiaria ou até morreria.
  Vou matar vocês.

xx
A warning to the people
The good and the evil
This is war
To the soldier, the civilian
The martyr, the victim
This is war

  Eu achei que aquele era o fim. Que iriam me matar e, talvez, mutilar meu corpo antes ou depois disso. Realmente pensei que fosse o fim, mas se fosse mesmo, nenhum daqueles homens em seus uniformes com bandeiras dos Estados Unidos ao peito estaria tentando se comunicar comigo.
  - Do you speak english? – eles continuavam a me perguntar, mas eu ainda estava tonta e parecia que a parte do meu cérebro que aprendera a língua inglesa ainda estava dormindo, por isso eu ficava repetindo “eu falo inglês, eu falo” só que em português, e nenhum deles entendia que eu conseguia entendê-los.
  Demorou o que pareceram anos para que eu conseguisse lembrar que ainda podia fazer mímica e começasse a balançar a cabeça afirmativamente. Eu entendo o que vocês dizem, idiotas, eu entendo. Parem de me bater.
  Minhas mãos estavam amarradas, minhas armas jogadas a um canto do que parecia ser uma sala de reuniões improvisada, e eu não fazia ideia de onde aquilo ficava.
  Meu rádio não estava mais no meu bolso, não o sentia mais lá. Eu estava literalmente encurralada, com minha cabeça latejando e sentindo um filete de sangue escorrendo por meu rosto.
  - So, tell me... – em algum momento, o comandante, general ou seja lá quem fosse aquele imbecil se aproximou e me agarrou pelos cabelos, me forçando a olhá-lo, com um revólver apontado para a minha testa, parecendo brincar com a possibilidade de disparar contra mim sem querer e eu morrer ali mesmo – What you’re doing around here, little girl? Nobody told you, baby? This is WAR.
  - And this is my country!* – consegui dizer, entredentes, tentando não gritar de dor.
  Várias risadas foram ouvidas, enquanto alguns daqueles imundos falavam mal do meu sotaque e outros repetiam que eu deveria conhecer o meu lugar.
  Eu não sei quanto tempo se passou, não sabia se era dia ou se era noite, não tinha como sair dali e, para piorar, quando minha visão voltou a ficar normal – ou tão normal quanto era possível – percebi que o general que me segurava não era um qualquer, mas O General, com G maiúsculo. O tão temido General Walker, um sanguinário que fora subindo de posto matando quantos soldados inimigos podia, e que prometera fazer com que o exército americano terminasse vitorioso e com poucas baixas sob o comando dele.
  Eu lembrava do meu general falando dele, com ódio no olhar. “Foi ele quem exterminou minha família e muitas outras nesses meses. Se um dia eu cruzar com ele, só deixarei de lutar quando ele estiver morto.”
  A visão dele me fez ter certeza de que eu não morreria àquela hora. Não era importante o suficiente para ser morta por ele ou sequer na presença dele. O que me fazia ter calafrios e temer por meus companheiros de luta, por , pois aquele cara não estaria ali por acaso, ou ele queria informações ou... Mandar um recado.
  Perdi as contas de quantos chutes eu levei, e quantos tapas na cara também, até que o General Walker finalmente me dissesse porquê eu estava ali e desse o recado que queria que eu transmitisse ao meu exército.
  *”O que você está fazendo aqui, garotinha? Ninguém te disse, querida? Isso é GUERRA”.
  “E esse é o meu país!”

xx
A warning to the prophet
To the liar, to the honest
This is war
To the leader, the pariah, the victim, the messiah
This is war

  Quando me soltaram no meio do nada, eu caí de joelhos, e a minha roupa já rasgada rasgou mais ainda, deixando ralados meus joelhos e minhas mãos.
  Tirei a venda que colocaram sobre meus olhos e observei o local que me encontrava, sentindo um alívio ao reconhecê-lo. Era a apenas um ou dois quilômetros da base brasileira mais adiantada, e eu não teria de andar tanto. Ao menos, não tanto quanto achei que andaria.
  Meus pés se arrastavam pelo caminho, meu corpo doía e, quando eu tossia, sentia sangue na minha boca. Meus membros pareciam estar pegando fogo, e tudo o que eu queria era deitar ali, no meio do caminho, e morrer. Desistir.
  Mas eu não podia, porque todo um país dependia de um recado que um general inimigo me incumbira de passar. De guerrilheira para uma mera garota de recados, a vida estava sendo ótima comigo.
  Cambaleei por mais alguns metros até que tropeçasse nem sei no quê. Talvez minhas próprias pernas. Quando caí, senti meu rosto molhado e meu peito doer, e percebi que pela primeira vez naquela guerra, estava chorando. Soluçando como uma criança, sem ninguém para me consolar. Eu não tinha mais forças para andar, não tinha mais forças sequer para pensar e as lágrimas continuavam a vir, até que eu estivesse chamando pela minha mãe, pelo meu pai, pelas pessoas que me amavam, para que algum deles viesse me ajudar. Mas é claro que nenhum veio, estavam todos mortos. Só havia uma pessoa que eu sabia que ainda me amava viva, e essa pessoa estava longe demais para me ajudar.
  Deixei que meu corpo relaxasse na lama que havia se tornado o chão depois da chuva do dia anterior, chorando como nunca antes. Mãe, me salva, mãe. Por favor.
  Eu nunca havia entendido realmente a necessidade que os soldados tinham de, quando estavam morrendo, chamar suas mães. Era sempre a mesma coisa, parecia que nos seus últimos momentos de vida, era daquela figura que todos se lembravam, e eu simplesmente não entendia por quê. Mas ali, com sede, com fome, com dores por todo o corpo e exausta demais para continuar, eu entendi. Eu queria colo, queria alguém que me dissesse que tudo ficaria bem, que cuidaria de mim. Essa pessoa era a minha mãe.
  De novo, não sei quanto tempo se passou. Só me lembro de, em algum momento entre a consciência e a não consciência, sentir braços me levantarem e tentar lutar. Não poderia aguentar mais americanos me batendo, e se fosse para morrer, certamente não morreria pela mão de um deles. Mas não era nenhum americano e, não fosse pela voz grossa que me falava, eu teria pensado que minha mãe tinha finalmente vindo me buscar.
  - Eu vou cuidar de você – a pessoa repetia – Venha, vai ficar tudo bem.

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I do believe in the light,
Raise your hands up to the sky
The fight is done, war is won,
Lift your hands toward the sun

  Quando acordei, sabia que estava nas primeiras horas da manhã de um novo dia, apenas não sabia qual. E quando abri os olhos, percebi que finalmente estava em um lugar que eu conhecia, com pessoas que eu reconhecia.
  O primeiro que eu vi foi o meu general, apoiado na cabeceira de meu leito, esperando que eu acordasse.
  - Te achei – declarou apenas, passando aquela mão grande, forte e calejada por meus cabelos, em um toque estranhamente macio.
  - O que houve? – pergunto, minha voz falhando miseravelmente.
  - Você que tem de nos contar – ele parecia cansado, tinha um machucado logo abaixo do olho direito e seu braço estava enfaixado – Você sumiu depois de explodir uma das bases deles, então organizamos grupos de busca, e eu te encontrei caída a uns 200 metros dessa base. Achei que estivesse morta.
  Pude ouvir com facilidade o tremor na voz dele, sem saber se as outras pessoas que estavam na sala – enfermeiras, generais de uma ou duas outras bases, um correspondente da capital e outros soldados – puderam ouvir também.
  - Você precisa nos contar o que aconteceu – o general da base na qual estávamos disse, e eu assenti, sentando-me com a ajuda de e bebendo água antes de contar a minha história.
  Quando cheguei ao fim, depois de ter explicado toda a captura, passei-lhes o recado que o General Walker me dissera.
  - Ele disse “Avise aos seus superiores que nós vamos acabar com todos vocês e seu país de merda até meia noite de amanhã se não se renderem”. E então me soltou.
  Vi apertando com força a barra da maca na qual eu me encontrava, os olhos cheios de fúria.
  - Se ele pensa que eu vou deixá-lo chegar perto de nossas bases ou de qualquer um de nossos soldados novamente, eu vou...
  - Calma – um sargento que eu não lembrava o nome colocou a mão no ombro dele, fazendo-o interromper-se no meio da frase – Temos que analisar os fatos, general. A força de ataque do inimigo é muito maior que a nossa. Seu armamento é melhor e o exército muito maior. – olhou ao redor, esperando que alguém discordasse dele, mas não havia como. Não tinha o que negar – Precisamos de um plano para retardar este ataque para que possamos reunir força suficiente para combatê-lo.
  - Como? – um soldado se manifestou – O país está sendo atacado de todos os lados, há muitos feridos e muita gente se escondendo no sul e sudeste. Não há mais soldados para virem até aqui ajudar.
  - Podemos contar com os aliados, não podemos? – dessa vez, foi a enfermeira que disse. – Quero dizer, a Argentina, o Chile... Ouvi dizer que eles têm muitos soldados protegendo as cidades por lá.
  - Você acha que os chefes de estado mandariam seus soldados para cá e deixariam as fronteiras deles sem proteção? – voltou à conversa e a enfermeira deu de ombros.
  - Se tomarem o Brasil – ela disse, baixo – Não vai importar quantos soldados estão protegendo os outros países da América do Sul...
  - Porque todos vão ser tomados também – o sargento, mais velho que todos ali, sentou-se ao meu lado na maca e passou a mão pelo rosto, parecendo exausto. – Por favor, enfermeira, peça para que um mensageiro venha falar comigo em meu escritório. Mandaremos mensagens a todos os países que fazem fronteira recrutando mais soldados. É a nossa única chance.
  - Mas o que faremos para deter o ataque enquanto eles não chegam, senhor? – perguntou, e eu me intrometi pela primeira vez na conversa.
  - Acho que tenho um plano.

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To the right, to the left
We will fight to the death
To the edge of the earth
It's a brave new world, it's a brave new world, it's a brave new world

  - Isso é loucura – Alexandre dizia, enquanto se esgueirava pelo lado inimigo, eu e Alexandre logo atrás.
  - Fique quieto, ok? – respondeu, virando-se para trás, e era incrível como, naquele uniforme roubado de um americano, ele realmente parecia com um deles. Suas feições, seu olhar superior, sua forma de se mover. Mas diferente de tantos americanos que eu combatera nas últimas semanas, eu não sentia nenhuma aversão. Óbvio que porque eu sabia que ele não era um deles, mas também porque, de certa forma, eu sabia que por mais que se parecesse com um, ele sempre seria o generoso e bondoso que eu conhecia.
  Alexandre continuou reclamando, e tive que dar um leve cutucão nele. Para mim, era mais difícil tentar não ser reconhecida entre as fileiras de americanos, pois tinha que trabalhar minha forma de andar e de me portar, isso sem falar em usar aquele capacete o tempo todo para esconder o máximo que conseguia de meu rosto. O exército inimigo não alistava mulheres, eles não precisavam disso.
  Não havia muitos deles ao nosso redor, mas eu conseguia ver que, quando nos olhavam, alguns ficavam nos encarando, como se desconfiassem de algo.
  Porém, seguimos o plano, e caminhou confiante até um soldado americano, e em um inglês perfeito, pediu informações sobre a localização do general, dizendo que trazia informações importantes de dentro das linhas brasileiras.
   chamou-nos com a mão quando obteve a resposta, e eu e Alexandre o seguimos, Alexandre tropeçando algumas vezes e parecendo aterrorizado. E eu queria bater nele, porque acabaria nos entregando. Eu entendia que ele estava com medo, e que se nos pegassem, nos matariam, mas daquele jeito ele faria com que fôssemos mortos sem nem mesmo chegar ao general, e isso estava fora de cogitação.
  Chegamos até uma tenda grande, parecida com a nossa para abrigar os feridos, mas dentro encontrava-se apenas o General Walker e mais dois soldados americanos armados para sua segurança.
  O plano era ganhar tempo para que Alexandre conseguisse armar nossa bomba mais potente na área dos dormitórios, onde a maioria dos soldados estava descansando. Sem soldados para combater, os americanos não poderiam nos atacar imediatamente. Mas não era só isso que queríamos.
  Sabíamos muito bem que, uma hora ou outra, as forças do Brasil seriam subjugadas. Não tínhamos força para combater um inimigo que era o mundo todo. Por isso eu sabia que estava atrás de outra coisa: o general. Sem general e sem exército, retardaríamos ainda mais o avanço do inimigo. E aquele general merecia morrer.
  Alexandre afastou-se de nós, em direção aos dormitórios, passando despercebido pelos americanos, enquanto eu e nos dirigíamos à tenda do general. Os dois soldados que lá se encontravam tentaram nos impedir, mas rápido como sempre, passou sua faca na garganta de um e ele imediatamente caiu no chão, morto antes mesmo que pudesse alertar qualquer um sobre nós, enquanto eu cuidava do outro.
  Ele pareceu atônito por um momento, vendo seu colega ser morto e percebendo que aquele era seu destino também. Quase desisti quando percebi que ele tinha no máximo 17 anos, a idade que meu irmão mais novo tinha, antes que eu segurasse sua cabeça e torcesse seu pescoço.
  O barulho pareceu despertar o general, e quando ele olhou para trás, já estava com sua arma apontada para ele, e eu revistando-o, retirando de seu cinto facas, munição e tudo o que pudesse nos matar.
  - disse, os olhos fervilhando em direção ao general – Veja o que aconteceu com Alexandre.
  Assenti e olhei para ele, sem saber se deveria ou não deixá-lo sozinho com o general. Ele era conhecido por se livrar das situações mais complicadas, e eu não queria que saísse ferido do meu plano que, agora, parecia idiota.
  Havia centenas de soldados americanos do lado de fora. Tudo o que o general precisava fazer era gritar, e mesmo que matássemos ele, seríamos mortos também. E Alexandre estava lá no meio, sozinho tentando armar uma bomba em meio a sei lá quantos americanos porque o exército brasileiro não tinha caças nem mísseis sobrando.
  - Vai, disse, ainda sem olhar para mim, e eu espiei para fora da cabana, procurando Alexandre com os olhos, mas não o vi em lugar nenhum.
  - Não estou vendo ele – informei, e ouvi respirar fundo, sabendo o mesmo que eu: se Alexandre morresse, ou fugisse, estaria tudo acabado.
  O general riu, mesmo que estivesse com a arma em sua garganta, parecendo perceber que nosso plano era tão medíocre quanto poderia ser.
  - I’m gonna kill you – sussurrou para , e logo levou um chute na barriga, e eu sabia que não estava realmente apto a controlar aquela situação. Aquele era o homem que havia matado toda sua família, e eu tinha certeza que antes que eu pudesse fazer alguma coisa, ele já o teria matado.
  - – chamei – Vá checar o Alexandre.
  Por algum motivo, quando ele olhou nos meus olhos, a raiva pareceu desaparecer de seu olhar.
  - Se conseguirmos sair daqui vivos... – ele começou e eu sorri.
  - Sim. Mas concentre-se no plano, e depois veremos isso.
  Ele se foi, procurando Alexandre entre as linhas inimigas, e então encarei o general.
  Era preciso executá-lo antes que o lugar explodisse, ou morreríamos também, mas se eu o matasse na hora errada, os americanos teriam tempo de sair de seus postos e vir atrás de nós, e de qualquer forma o plano iria por água à baixo.
  Respirei fundo. Precisávamos de um plano B, e eu não conseguia pensar. Mesmo que conseguisse, não teria como avisar e Alexandre sobre qualquer mudança.
  O general me olhava com um ar malicioso, e eu soube que ele me reconheceu. Me reconheceu e sabia que estávamos sem saída, com ele em mãos, mas sem uma forma de impedir que seu exército atacasse nosso país.
  Com raiva, peguei o rádio que ele carregava no bolso do casaco e disquei o único número que me ocorreu.
  - Oi? – respondeu na mesma hora, e eu temi tê-lo entregado.
  - Preciso que você volte – disse, com a voz trêmula – eu não sei o que fazer. Achou o Alex?
  - Está morto, nos descobriram – ele disse baixo e, então, acrescentou: – Em poucos minutos estarão indo checar o general. Estou voltando.
  Quando ele voltou, o general ainda tinha aquela expressão de vitória no rosto.
  Eu pensei que estava tudo acabado, mas logo que entrou, afastou o general de mim e amarrou-o na cadeira, colocando uma faixa em sua boca para que não pudesse gritar.
  Então, em um ato inesperado, caminhou em minha direção, pegou meu rosto em suas mãos e me beijou com força, um tanto rude, mas ao mesmo tempo sendo delicado, o que eu não consegui realmente entender.
  Quando me soltou, sussurrou em meu ouvido:
  - Te encontro no outro lado, em outra vida, em outro mundo. Mas saiba que a gente ainda vai se encontrar de novo... e que seu plano vai dar certo.
  E então mostrou o detonador em sua mão, e eu soube o que ele quis dizer. Os americanos encontraram Alexandre, ele morrera por nós, mas conseguiu armar a bomba antes de ser pego.
  - Você consegue fazer isso? – perguntei, lançando um olhar ao general, e ele balançou a cabeça.
  - Eu fico com o detonador.
  Assenti, entendo que seria difícil para ele fazer aquilo. Estava abrindo mão de tudo para detonar aquela bomba: seu exército, seus amigos, seu país, seu futuro. E eu sabia que, para ele, dar tempo à nossa população valia mais do que uma vingança.
  E ele sabia que, para mim, usar meus últimos momentos para me vingar seria o paraíso.
  Abracei-o pela cintura e sussurrei em seu ouvido:
  - Você é o melhor homem que já conheci. Se tivéssemos a chance...
  - Eu sei – ele me interrompeu, sorrindo, e quando ouviu o barulho do exército americano se aproximando, me deu um beijo. – Vai.
  Me aproximei, então, do general, a mão de segurando a minha enquanto com a outra eu segurava a arma.
  Apontei-a para a testa do general, e sorri.
  Os passos dos americanos estavam mais próximos, e eu sabia que aqueles eram meus últimos segundos. detonaria a bomba e mataria os americanos no dormitório e os próximos a eles, e então os que sobrassem viriam atrás de nós e seria o fim.
  Sabia que não tinha chance de escapar, mas não morreria sem levar nenhum deles comigo. O mais importante. Por isso, aproximei minha boca do ouvido do tão temido general Walker e, com satisfação, disse:
  - Nobody told you, baby? This is WAR.
  E puxei o gatilho.

I believe in nothing, not in satan, not in god
I believe in nothing, not in peace and not in war
I believe in nothing, but the truth of who we are

xx

FIM



Comentários da autora


n/a: Essa fic foi muito, muito, muito difícil de escrever. Eu quase surtei quando descobri que tinha pego logo uma música que eu adoro, de uma banda que eu também adoro, porque a primeira coisa que eu pensei foi “PQP, vou estragar a música!”. E eu passei dias sem a menor ideia do que escrever, até que depois de assistir Jogos Vorazes pela __ (insira aqui um número alto) vez, tive uma ideia razoável, mas só consegui terminar de escrever MESMO no último dia do prazo VIP (um beijo pra quem criou o prazo VIP, se não fosse ele, essa fic não estaria aqui! Haha). Então, espero que a fic não seja tão decepcionante assim pra vocês (pra mim foi, juro. Quando tive a ideia, achei que ficaria MUITO boa, mas desenvolver tudo correndo e em apenas oito páginas prejudicou um pouco).
Enfim, é isso! Me digam o que acharam, ok? E se tivessem outras fics que abordem alguma guerra, deixem nos comentários! A-M-O fics assim!
E ah! Juro juradinho que não tenho nada contra os Estados Unidos, ok? Apenas me envolvi no enredo! HAHA
Beijos!