The Westbridge Mission

Escrito por Marcela Marche | Revisado por Mariana

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Prólogo

  obs: Você está lendo a versão reescrita da fic.

  por Ela

  - (…) E é por isso que vocês são agora oficialmente parceiros de equipe. – Leonard disse irredutível. abriu um sorriso sacana, cumprimentando nosso chefe como se estivesse realmente grato por aquela desgraça. Eu? Continuava imóvel com a boca escancarada no maior estilo ‘oi, eu como moscas’, encarando-os.
   Débora, a secretária loira e linda de Leonard adentrou a sala com duas pastas na mão, gentilmente empurrando-nos afora enquanto ditava algumas informações sobre o novo caso de espionagem que estaríamos protagonizando. Nós estaríamos... não eu. E esse nós significava... eu e o . Ok, alguém para o mundo que eu quero descer!
   É, você deve estar mais do que confuso nesse momento. Antes que comece a me xingar, vou explicar um pouco o porque da minha indignação e como chegamos até o ápice dela. Eis que a figura conhecida como , para os mais íntimos ou com mais raiva dele como eu, era um infeliz colega de serviço aqui na CIA com um passado um tanto quanto sombrio, o qual mais pra frente eu detalharei. Mas não bastava esbarrar com o cafajeste que adorava me irritar pelos corredores, ah não, isso seria muito fácil, então o lindo coisa fofa do meu chefe resolveu nos juntar na missão mais importante da qual eu já ouvi falar. Aparentemente, o terrorista número 1 dentre os procurados do mundo havia mandando uma cartinha amigável a Casa Branca dizendo que queria os melhores agentes da inteligência americana na sua cola e que se eles conseguissem descobrir quem, dentre vários moradores do condomínio Westbridge, ele era até o final do ano, ele se entregaria sem sequer pestanejar. E que caso eles não conseguissem, um atentado maior do que poderia ser imaginado viria a acontecer. Ah, com o adicional que ele não prometeu nada sobre ser bonzinho e facilitar a vida dos agentes. Nananinanão, ele deixou bem claro que aconselhava que não o subestimássemos, pois ele faria o que estivesse ao seu alcance para complicar o sádico jogo de tabuleiro humano que propôs. E adivinha? Eu fui uma das coitadas escolhidas para passar por essa provação mais tranquila que tirar doce de criança (só que o contrário). E pra ajudar me colocam como parceiro o cara mais detestável da face da Terra.
   Na realidade, não era tão surpreendente assim que eu e fossemos os escolhidos. Mais de uma vez, dividimos indicações de melhor agente do ano ou algo parecido e só nós contínhamos um histórico perfeito de missões bem-sucedidas. Mas qualquer um que tivesse olhos sabia que éramos inimigos. Como podiam achar que daria certo nos colocar para trabalhar juntos? Olha, antes que dê um chilique perguntando o porquê o odeio, vou explicar. É muito bem fundada a minha raiva do ser demoníaco. Primeiro: ele costumava ser chefe do contrabando de armas na Europa e da noite para o dia resolveu usar tais armas para defender crises locais e não para ficar um pouco mais rico. Como se isso me fizesse realmente acreditar que ele não negociou sua sentença de morte com algum juiz corrupto, trocando-a por anos de serviço na agência. Segundo: eu trabalhei alguns meses no caso do contrabando, o que significa que já vi o quão podre ele pode ser. Terceiro: ele era irritante e não prestava. E, feminista exacerbada que sou, não podia deixar de menosprezar um homem com esse defeito.
   E agora, eu teria que morar na mesma casa que ele dentro do tal condomínio e sorrir simpática para os vizinhos enquanto fingíamos ser um casal recém-casado. E tudo isso sob o perigo de morrer a qualquer segundo por estar procurando o homem mais doentio do Universo. É, as coisas não estavam indo muito bem naquele dia.

Capítulo 1 – Details

  por Ela

  Abri a porta do meu apartamento respirando profundamente o cheiro de camomila que ele exalava sabendo que aquela seria a ultima vez que o veria durante aquele ano. Eu realmente esperava que a casa onde moraria pelos próximos 12 meses fosse ao menos aconchegante. Dirigi-me até a suíte, roçando os dedos por cada móvel tão meticulosamente escolhido que eu iria deixar para trás. Peguei as malas de viagem e comecei a postar todas as roupas do closet lá dentro sem muita delicadeza. Depois de colocar também sapatos, lingeries e toda a parafernália feminina necessária para sobrevivência, fechei o último zíper e rumei até a porta, silenciosamente fazendo a promessa de que eu voltaria a pisar em casa com mais um caso bem-solucionado.
   Após Jack, o motorista, ajeitar minhas malas no porta-malas da BMW preta, seguimos para o aeroporto. Quando chegamos, o jatinho me aguardava prestes a decolar. Embarquei as pressas me jogando desajeitadamente no assento e ajeitando meus óculos escuros. Quando o avião decolou e deixou aos poucos Nova Iorque para trás, pude finalmente prestar atenção no que ocorria a minha volta. As paredes beges e o tapete azul marinho do jato eram de muito bom gosto, as poltronas largas confortáveis e chiques e a peste bubônica em forma de gente sentado ao meu lado tomando seu Whisky silenciosamente cheirava a 212 MEN. Tudo em quase perfeita sincronia. Claro, se não fosse pela companhia. A televisão imensa de tela plana emitiu um pequeno chiado e o rosto conhecido de Débora nos passava instruções finais. Quando o telão ficou preto novamente, escutei a voz propositalmente rouca do maldito:
   - Tudo bem, enquanto esperava vossa majestade embarcar, tive tempo de ler sobre a casa e alguns moradores na pasta que nos foi entregue. É um condomínio bem residencial, muitas famílias e madames que vivem de aparência. Portanto, pensei em um plano para levantar o mínimo possível de suspeita sobre a nossa chegada repentina e ao mesmo tempo abrir uma brecha de proximidade com os vizinhos. Apesar da CIA ter conseguido atrair mais duas famílias para se mudarem pra lá ao mesmo tempo que nós, para levantar suspeitas de qual das três casas abriga agentes, ainda precisamos convencer que somos tão inofensivos quanto os outros. – começou exibindo precariamente duas carreiras de dentes brancos e alinhados. Seus lábios rosados moviam-se rapidamente. Ele tinha as pernas cruzadas do modo mais masculino possível, apesar da camisa apertada demais nos seus músculos avantajados repuxar com esse simples fato. O que qualquer mulher via nele? Não havia qualidades ali, pois cada pequeno detalhe de seu ser estava mergulhado em um poço maldade e ironia. Eu o mirava com desprezo embora soubesse que esse ainda não era o momento de despejar toda a minha repulsa sobre ele. Eu era profissional, afinal de contas. Iria relevar por alguns minutos quem era meu parceiro em prol da missão.
   - E qual é o seu plano, ? – Perguntei direcionando meu olhar para seus glóbulos , tornando um pouco mais fácil o raciocínio lógico. Bem pouco. As nuances de um mar agitado estavam pintadas em cada milímetro das suas íris, e toda aquela movimentação apenas me dava mais vontade de começar a gritar com ele e puxar seus cabelos acusadoramente. Precisava de tranquilidade para me concentrar no caso e tentar superar o fato de que teria que trabalhar justo com ele, mas tranquilidade nunca foi algo que instigasse em mim.
   - Bom, teoricamente somos recém-casados. Pensei em carregá-la em meus braços até entrarmos na casa. Isso por si só já deve dar alguma veracidade, mas pra consumar, ao entardecer podíamos dar uma caminhada pelo condomínio de mãos dadas. Isso seria bom para vistoriar um pouco o lugar e passar para as pessoas que somos apenas um casal apaixonado e não espiões. – O plano era realmente decente, mas dizer isso a ele estava além do meu orgulho e a travar uma luta contra o próprio não me parecia coeso visto que eu ainda estava em estado precário de retenção de raiva. Na minha cabeça, entraríamos na casa simplesmente e depois à noite, vestidos de preto, faríamos uma vistoria pelas casas ao nosso redor. Mas isso era de fato muito bruto. Uma aproximação leve poderia nos levar mais longe.
   - Tudo bem, dessa vez vou concordar, infelizmente, em seguir seu plano. Uma abordagem teatral surtirá provavelmente um bom efeito na vizinhança que logo se acostumará com a nossa presença, tornando tudo mais fácil. – Ah , tão dócil... Quase não se desconfia que seja uma agente extremamente bem treinada.
   - Exatamente isso que eu pensei. Mas o 'infelizmente' doeu, . – Ele fez cara de magoado e postou a mão no peito, atuando exageradamente.
   - Você vai ver o que é doer se não mantiver uma distância segura de mim uma vez que estivermos dentro da casa, bonitinho. – sorri irônica, apertando sua bochecha. Voz serena, tom de brincadeira. Quem sabe eu pudesse me acostumar com essa passividade... Mas, espera, não, eu não poderia.
   - Infelizmente, - Ele imitou -, não podemos nos dar ao luxo de nos ignorar fora das ruas. A casa tem uma grande parte revestida de vidro, e sendo assim, qualquer pessoa determinada a nos observar facilmente perceberia algum distanciamento, colocando nosso disfarce por água abaixo. – minha testa enrugava conforme ele dizia as palavras. As reações exaltadas quase me escapavam pelos dedos agora. Então eu não teria sossego nem dentro do lugar onde moraria?
   - O quê? E a nossa privacidade? – Minha voz subiu algumas oitavas na frase. Eu estava mesmo agoniada. – Vamos por acaso ter que transar em frente a uma janela pra convencer os vizinhos? Ah, pelo amor de Deus! – pareceu considerar minha revolta por alguns instantes. Porém, no momento que eu fiz uma menção a fazermos sexo, sua sobrancelha se elevou e um sorriso torto tomou seu rosto. Aquela feição lotada de malícia fez meu estômago dar algumas voltas. Nojento. Decidi encarar a tela preta da televisão a nossa frente. Era mais seguro. Engoli em seco já amaldiçoando por qualquer motivo que me viesse à mente. Ele fazia de propósito para me tirar do sério, eu sabia que sim. No entanto, não ia dar esse gostinho a ele. Os carpetes marinhos não mereciam ver a cor do meu café da manhã.
   - Não que isso fosse ser uma má ideia, longe disso, mas teremos nossa privacidade na parte leste da casa, onde fica a cozinha estilo americana, um quarto que seria de hóspedes, mas a CIA o reformou fazendo uma sala de observação/escritório, onde pudéssemos trabalhar os possíveis suspeitos e a hidromassagem aromatizada. Estes cômodos não têm nenhuma parte de vidro e a passagem para eles é fechada, o que significa que ninguém conseguiria perceber em qual dos três cômodos estaríamos e nem o que faremos dentro deles. – terminou a explicação dando de ombros. Repuxei minha boca para um lado ainda incomodada com aquela situação, porém um pouco mais calma de saber que tinha onde me refugiar da peste ao meu lado.
   - E como é o resto da casa? – Indaguei, curiosa. Ele franziu a testa, estranhando a sempre tão autossuficiente indagando algo que podia simplesmente ler nos arquivos que nos foram dados. - Faz mais ou menos 48 horas que não durmo graças ao chamado urgente de Leonard e não estou com paciência para ler a pasta. E já que você parece todo feliz de finalmente saber algo a mais do que alguém, poderia aproveitar e me contar? – Disse inocente mordendo meu lábio inferior e curvando minhas sobrancelhas para cima, parecendo totalmente ingênua. Uau, eu bem que podia desistir da inteligência e ir pra Brodway. demorou-se um pouco no meu gesto labial e antes de responder, tomou um belo gole do líquido em seu copo. O oceano em seus olhos escureceu levemente e preferi não tentar avaliar os motivos daquilo.
   - Bem, err, as salas tanto de estar como de jantar ficam no térreo, logo após um pequeno hall de entrada e dividem uma parede totalmente de vidro. À esquerda, fica a passagem que eu mencionei escondida para os três quartos, no final do andar das salas tem uma porta, onde fica a sala de cinema, escura e com um telão imenso e não muito longe do hall, a escada majestosa abre caminho para o segundo andar. Nele há um longo corredor exposto por mais uma parede de vidro e dentre as portas estão um banheiro de visitas, a área de serviço, uma sala de jogos com frigobar, e, claro, a suíte que dividiremos. – seus lábios contorceram-se em um sorriso pervertido no final da frase, ao passo que eu controlava minha boca para não abrir. Olá, bile!
   - Dividiremos? Você vai dormir no banheiro, isso sim, não durmo com cachorros sarnentos! – Disse ainda tentando manter o controle, embora a indignação já fluísse pela minha fala. Como se já não bastasse ter ele roubando meu ar na maior parte do tempo ainda queriam que eu dividisse a cama com ele?
   - Acontece, amor, que na suíte a parede dos fundos, onde a cama está encostada com uma cabeceira grande que dê mais privacidade, é feita de um vidro fosco que permite identificar vultos pelo quarto embora não permita especificar contornos tão nitidamente e outros detalhes. – Ok, agora eu realmente estava decidida a matar o arquiteto daquela casa. Eu tinha uma bela pedra no sapado que aparentemente não sumiria tão cedo. Precisava retomar minhas sessões de meditação para aguentar o que me aguardava. Mantendo um silêncio orgulhoso, virei minha cabeça para o lado oposto de e observei a paisagem até chegarmos ao destino: Miami, Flórida.

Capítulo 2 – Welcome home

  por Ela

  Eu não pude parar de pensar em como as coisas seriam quando chegássemos na casa. Eu teria que fingir 24 horas que éramos mesmo apaixonados, eu teria que andar abraçada com ele, eu teria que dormir na mesma cama que ele. E o pior era saber que pelo menos metade das mulheres da CIA dariam tudo para estar no meu lugar. Ok, então eu odeio o cara. Isso não me torna cega. Eu via como agentes renomadas ficavam moles como gelatina com um simples olhar do cretino. E aparentemente saber todo o passado podre dele não as impede de ter seus hormônios se agitando perto dele. A palavra geral era que ele é, em uma palavra, gostoso. Costas e ombros largos, barriga e peitoral definidos e pernas trabalhadas. E “aqueles sorriso atrairia qualquer mulher, não acham?”. Hm, vejamos, não. Mas digamos que meu ódio me deixava imune de reparar nesse tipo de coisa. Eu, até então, me orgulhava de não ter olhado duas vezes para , e preferia que continuasse assim, muito obrigado. Infelizmente, a vida conjugada com ele tornaria isso um tanto difícil. Eu teria que me passar por louca apaixonada, eu teria que me passar por alguém que o ama e deseja. Eu teria que ficar do lado dele, tocá-lo e olhá-lo de perto sem contorcer o rosto em desgosto. Cá entre nós, uma parte mim tinha um pouco de receio de viver essa vida e acabar reparando nele e me igualando às minhas colegas descerebradas de trabalho, que babavam tão descaradamente por ele. A carne é fraca, dizem. Mas, ao mesmo tempo, eu tinha mais medo de ser incapaz de completar aquela missão por ter pura e simplesmente sacado uma arma e atirado na testa do meu parceiro em um surto de ódio. Ah sim, eu era dessas contradições ambulantes.
   Assim que minha mente parou de vagar pelos supostos atributos físicos do ser desprezível com quem viveria – e consequentes problemas mentais da ala feminina da agência -, o carro que nos foi designado e que conduzia desde o aeroporto até o condomínio diminuiu a velocidade.
   - É, chegamos. Hora do show, zinha. – sorriu torto e abriu a porta do carro, dando a volta no mesmo e abrindo a minha como um perfeito cavalheiro. Ah, a atuação. Coloquei minhas pernas para fora lentamente como se pudesse adiar o encontro inevitável com o inferno: a mão que estendia para mim.
   - Eu preciso dizer isso: eu te odeio. – Disse ainda dentro do carro para que apenas ele escutasse. - Ah, me sinto bem melhor. Agora AMOR, QUE LINDA NOSSA CASA! É PERFEITA! – Sussurrei a primeira parte o olhando com desprezo, logo em seguida aceitando sua mão e me levantando, aproveitando para levantar o tom de voz também para que as mulheres enxeridas que nos miravam na rua me ouvissem. Abri meu melhor sorriso e fiz um carinho leve na bochecha de com a mão que ele não segurava. Tinha que conter o impulso involuntário da minha palma que queria desesperadamente aproveitar o contato com sua face para estapeá-la.
   - Engraçadinha. – Ele disse com um sorriso falso e a voz baixa. – Bom, vamos cumprir a tradição não é mesmo, docinho? – Dito isso passou um braço ao redor de meus joelhos e apoiou o outro no meio das minhas costas, me pegando no colo. Coloquei meus braços ao redor de seu pescoço e brinquei um pouco com seu cabelo enquanto ele andava em direção à porta de entrada. Entramos, e como havia descrito, a sala era toda exposta para as pessoas que ainda nos observavam. Ele me colocou gentilmente no chão e me abraçou pelas costas, pousando a cabeça no meu ombro. Não, não, cotovelo bonzinho, ir de encontro ao estômago do nosso novo maridinho.
   - E ai, amor, o que achou da casa? – As pessoas não podiam mais nos escutar, embora nos avaliassem meticulosamente como se pudessem fazer leitura labial. Dei uma olhada pelo cômodo, todo muito bem decorado e aconchegante, se não fosse pela enorme parede de vidro. Virei-me nos braços de , dando as costas ao público e ficando cara-a-cara com ele, grudada em seu peitoral duro com seus braços ainda entrelaçados na minha cintura.
   - Ai, é tudo tão lindooo! – disse ironicamente (embora a casa fosse mesmo muito bonita) e dei alguns pulinhos de animação ao mesmo tempo que revirava os olhos, ato que apenas poderia ver. Ele riu da minha reação e aproximou o rosto do meu que automaticamente arregalei os olhos e sussurrei:
   - Ei, ei, ei, o que pensa que está fazendo? – inclinando um pouco minha cabeça para traz, criando alguma distancia entre nossas faces.
   - A plateia espera um beijo do casal apaixonado, . – Ele explicou entredentes, indicando com as sobrancelhas a parede de vidro atrás de mim. E ele estava certo. Um beijo era o que normalmente sucederia um momento como esse, se fosse real. Sem pensar duas vezes, coloquei minha mão sobre seus lábios e beijei as costas da mesma. Ninguém veria minha mão, apenas os movimentos de nossas cabeças, então não iria estragar nenhum disfarce. E desse jeito nós não corríamos o risco da plateia presenciar uma eu verde lavando a própria língua com palha de aço.
   me olhou meio atordoado, finalmente entendendo o que eu havia feito e revirando levemente os olhos. Se separou de mim e postou seu sorriso falso novamente, pegando minha mão e dizendo:
   - Anda, vamos conhecer o resto da casa. – Andamos pelas salas conhecendo inclusive a de cinema – a qual eu gostei muito - e nos direcionamos para a área ‘escondida’ antes de subir as escadas. A cozinha era muito bonita e de fato o nosso escritório seria muito útil. A hidromassagem também era um lugar que eu pretendia frequentar bastante.
   Quando saia de lá com a intenção de chamar a praga para continuarmos o teatro e subirmos, fui surpreendida pelo mesmo que no instante seguinte estava sobre mim, com suas mãos em minha cintura. Tentei pensar em esboçar qualquer tipo de reação, mas ele foi mais rápido, me prensando contra a parede entre portas. Eu podia ter os reflexos de uma agente bem treinada, mas , por habilidade natural, era duas vezes mais ágil.
   - Tudo aquilo foi medo de me beijar, ? Foi medo de gostar? – arqueou uma sobrancelha, prepotente. Seu tom de voz era baixo e irritado. Suas mãos grandes forçavam minha cintura. Permaneci em silêncio. Uma voz irritante no fundo da minha consciência indagando a mesma coisa. Eu não tinha a resposta. - Só espero que você seja profissional e não fique de frescuras o ano todo. – ele sussurrou tão perto da minha boca que eu sentia as rajadas de sua respiração acelerada diretamente nos meus lábios. Eu me sentia encurralada não apenas pela posição, mas também pelas palavras dele. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde teria que beijá-lo em público, e minha atitude precária há pouco havia sido uma maneira muito pobre de adiar o acontecimento. Por insistir no meu medo acabei abrindo uma lacuna para me atormentar. Com as mãos apoiadas no peito duro do meu parceiro e sem reação, minha única postura frente aquilo foi umedecer minha boca que parecia seca pela saia justa. Ridículo, eu sei. se demorou um tempo no meu ato e, engolindo brevemente em seco, aproximou-se ainda mais de mim, passando o nariz calmamente em minha pele, a respiração tornando-se ofegante. Eu permanecia imóvel, a cabeça a mil demais para sequer perceber o que eu devia fazer. Pra sequer entender o que diabos ele estava fazendo. Ele entendeu meu estado atônito como um convite para continuar e foi isso que fez ao avançar com os lábios nos meus, roçando seu superior ao meu inferior e vice-versa.
   O choque elétrico que percorreu meu corpo me fez acordar, e no momento seguinte eu arregalei meus olhos, grunhi um ‘fique longe de mim’ e o empurrei longe. Ele engoliu em seco novamente e, mesmo ainda fora do ar e com os olhos semicerrados, murmurou algo como ‘vamos logo’. Pegou minha mão sem qualquer delicadeza, respirou fundo para tornar possível a formação de mais um sorriso falso e subiu as escadas me arrastando sob os olhares atentos de várias madames fofoqueiras.
   Demos uma olhada pelo segundo andar da casa rapidamente e descemos para buscar nossas malas e nos instalarmos. Quando terminamos de guardar tudo – em um silêncio que só não foi mais gritante pelo tique insistente e detestável de de estalar toda e qualquer parte de seu corpo - não muito tempo depois, a campainha tocou. levantou o olhar para mim e ambos descemos as escadas, prontos para atender a porta. Uma mulher com cara de ser um pouco mais velha que eu, de cabelos ruivos longos e olhos verde-esmeralda, jazia parada com um grande sorriso e uma forma retangular coberta com papel alumínio.
   - Olá, meu nome é Elizabeth, sou a nova vizinha de vocês. – ela se apresentou simpática, embora sua expressão fizesse meus sentidos de ‘piranha’ gritarem.
   - Muito prazer, sou e essa é . – respondeu.
   - O prazer é todo meu. – Elizabeth disse, arqueando as sobrancelhas ao nos analisar. Ok, talvez não exatamente 'nos' e sim 'o' analisar. Sutileza mandou lembranças. - Bem, eu sei que devem estar ocupados, afinal acabaram de chegar, mas eu só queria desejar as boas-vindas. Fiz essa torta de palmito para vocês, imagino que estejam com fome e ainda não tenham feito supermercado. – Elizabeth estendeu o pacote que segurava e eu o peguei, abrindo um sorriso.
   - Ah, Elizabeth, quanta gentileza. A casa ainda está um pouco bagunçada da mudança, mas caso não se importe, gostaria de entrar? – Ofereci, como uma boa anfitriã.
   - Oh, não, agradeço o convite, , mas deixarei que se instalem em paz. De qualquer jeito, amanhã temos festa no condomínio, creio que nos vemos lá? – ela piscou seus grandes olhos para que na mesma hora colocou seu braço ao redor dos meus ombros e perguntou:
   - O que acha, amor? É uma ótima oportunidade de conhecer o pessoal.
   - Eu acho que nos vemos lá então, Elizabeth! – Sorri para a mulher já não aguentando mais sua presença e seu olhar canibal para cima do meu suposto marido. Não que eu sentisse ciúmes, longe disso, mas seu descaramento era revoltante. Se ela lançasse esses olhares furtivos para um homem que fosse realmente algo meu amanhã acordaria com conjuntivite.
   - Por favor, podem me chamar de Liz. – Disse com um sorrisinho maroto e dando um tapinha no peito de , que levantou uma sobrancelha. Nunca é uma boa ideia bater em um agente treinado, nem de brincadeira. Mas claro que a candidata à oferecida do condomínio não sabia da profissão do homem ao meu lado. - Será ótimo conhecê-los melhor e espero que gostem da torta. Qualquer coisa que precisarem não hesitem em pedir, afinal, eu moro logo ao lado. – Despediu-se com uma piscadinha ao fim em direção ao meu parceiro. Essa sim é cara de pau ao extremo!
   - Muito obrigado, Liz, tenha certeza que iremos. Até amanhã! – despediu-se cortês e fechou a porta, logo virando-se para mim. – Essa festa será uma ótima oportunidade, veio na hora certa! – Comemorou.
   - Com certeza. – Concordei profissional. - Agora o que acha de almoçarmos a torta que a linda da Liz trouxe e então fazermos o passeio que combinamos?
   - Por que será que eu senti um tom de desprezo ao falar da nossa tão amável vizinha? - Ele indagou, levantando uma das sobrancelhas com um sorriso debochado na face.
   - Qual é, a fofa estava te comendo com os olhos! Posso não gostar nem um pouco de você, mas teoricamente somos casados e eu não estou muito a fim de ser a corna do pedaço. - Revirei os olhos e tirei o papel que cobria a torta, me dirigindo para a cozinha.
   - Estamos evoluindo. Esta manhã você me odiava, agora apenas não gosta nem um pouco de mim. – me seguia de perto e mexia um pouco em meu cabelo, como um carinho. Me lembrei que estávamos passando pela sala, que era exposta. Não era dessa vez que ele perderia a mão.
   - Belíssima evolução. É quase como se eu estivesse tirando a roupa e pedindo que você me possuísse. – Rolei os olhos rindo sarcástica ao final da frase.
   me surpreendeu em seguia. Enquanto eu estava repartindo um pedaço para cada encostada na bancada da cozinha, ele passou um braço pela minha cintura, me apertando contra si e sussurrou em meu ouvido com sua voz rouca:
   - Ainda não. Mas vai. - Me soltou tirando os pratos das minhas mãos levemente trêmulas e os colocou sobre a mesa, logo indo se sentar para comer.

Capítulo 3 – The Walk

  por Ela
  

  Almoçamos em silêncio e subimos para nos trocar. Coloquei um vestido leve e rasteirinhas, estava sol e iríamos apenas dar uma volta. , que se trocara no próprio quarto enquanto eu o fazia no banheiro, colocara uma bermuda xadrez e chinelos. Quando abri a porta que nos separava, ele pendurava uma regata no ombro enquanto colocava seus óculos escuros. De costas para mim, não pareceu perceber minha presença, por mais que a demora em seus gestos me fazia acreditar ser com o propósito de me dar a visão de suas costas musculosas tão comentadas pela mulherada da CIA. Se o dono de tal corpo não fosse o ser repugnante que é eu até me permitiria admitir que suas características físicas não são de se jogar fora. Quando se virou, meu olhar fixo e taxativo encontrou o seu, escondido pelos óculos. Um sorriso torto se formou em seu rosto enquanto ele colocava a maldita regata.
   - Pronta, linda? - Assenti ainda desconfortável por ter sido pega no flagra, erro fatídico que me custaria alguns dias suportando o ego inflado de , e desci as escadas com o ser na minha cola. Pelo menos ele pareceu não ter a intenção de me confrontar quanto aquilo, possivelmente prevendo que eu negaria até o fim. Ele abriu a porta da frente para nós, por onde saímos sem rumo pelas ruas de Westbridge. Concentrei minha respiração para expirar qualquer reação adversa ao meu parceiro já que a partir dali a atuação seria intensa e era de extrema importância que eu tivesse foco total na missão. Demos as mãos e caminhamos enquanto ele me contava em voz baixa o pouco que havia lido sobre nossos vizinhos na pasta. Avaliamos algumas opções, embora fosse difícil já que a única coisa que era certa sobre o procurado é que era um homem. Idade, aparência, nada disso era sabido. O condomínio tinha em média 50 casas, não era imenso, mas também não era pequeno. Resolvemos nos sentar em um parquinho não muito longe da nossa casa. Havia cinco adultos lá com seus filhos, de modo que lançou um olhar que deixou claro que teríamos que nos esforçar no papel. Cumprimentamos as mulheres e o casal de longe, com sorrisos, e o show começou.
   - Para, para aí mesmo! Nossa, você tá linda nessa luz. Deixa eu tirar só uma foto, amor. – havia me parado na frente de uma árvore e sacara o celular do bolso, me deixando muito envergonhada. Ele era muito bom no fingimento!
   - Amor, você está me deixando envergonhada. Para, vai. – Cobri meu rosto corado e caminhei até ele que ria discretamente. Passei os braços por seu pescoço e fiz bico (manhosa, imagina!), dizendo – Seu bobo.
   Ele me deu um sorriso que outras pessoas julgariam como terno e me abraçou pela cintura, logo me tirando do chão e dando uma volta no lugar. Comecei a rir, aproveitando para mirar as pessoas a nossa volta. Uma das moças se despedia, as outras duas babavam na nossa cena romântica e o casal prestava atenção em alguma minhoca que seus filhos mostravam.
   - Ei – me chamou, fazendo com que eu olhasse novamente seus olhos . – Eu te amo. – Ouvi as mulheres suspirarem e tive que me conter para não cair na gargalhada. Passei uma das minhas mãos pelo rosto do meu ‘marido’ e mexi os lábios em um ‘Eu te amo mais’ silencioso. O olhar de tornou-se divertido.
   - Mentirosa. - Ele me acusou, dando um selinho no canto dos meus lábio em seguida e saindo em disparada entre os bancos que havia ali.
   Eu estava tão em choque por ele ter realmente encostado sua boca na minha que nem assimilei o que estava acontecendo. Ele ria descontrolado como se fugisse de mim, em um convite mudo para que eu o seguisse. Olhei para as mulheres que sorriam para a cena com a boca escancarada e elas me incentivaram com as sobrancelhas. Ri internamente e sai correndo atrás da criatura. Perdi-o de vista por um momento, logo encontrando quando ele saiu de trás de uma árvore e me abraçou por trás. Tropeçamos em uma elevação da grama e caímos os dois no chão, ele em cima de mim.
   Felizmente (ou não), antes de cairmos, eu virei de costas, de modo que ficamos cara-a-cara deitados. Eu ri verdadeiramente da nossa trapalhada e ele me imitou. Como estávamos um pouco mais longe do parquinho, as mulheres não escutariam mais o que falávamos, embora com certeza ainda nos tivessem em vista. Aproveitei para tirar o foco das nossas posições no momento.
   - Bela atuação. Espera só até chegarmos em casa pra eu te fazer pagar pelo beijo. – Disse olhando-o com vingança liquida no olhar ainda que continuasse divertida pela gargalhada.
   - Esses aí, nós convencemos. E para de fingir que não quer mais, , curiosa do jeito que sempre foi, eu sei que você tá doidinha pra saber como seria me beijar mesmo. – Ele rebateu, a voz rouca e provocante soando próxima aos meus lábios e as mãos grandes e macias acariciando minha cintura. Parte da minha pose de ‘vou te matar’ foi por água abaixo. Meus olhos percorreram hesitantes o caminho até sua boca por um instante, mas a outra parte de mim, a racional, me forçou a dizer:
   - Está ficando tarde. Vamos para casa.
   - Como a patroa mandar. – ele se levantou e estendeu a mão para que eu também o fizesse. Voltamos para onde as mulheres e o casal estavam, para depois continuar nosso caminho. Uma delas nos parou.
   - Desculpe a intromissão, mas não pude deixar de notar que nunca os havia visto aqui. – Seus cabelos caramelo caiam em ondas largas até pouco antes do busto. Ela tinha olhos mel cativantes e algumas poucas sardas pintando a pele cor de marfim.
   - Bom, nós nos mudamos hoje, não é à toa. – Respondi com um sorriso educado.
   - Pois então, sejam bem vindos! Eu me chamo Pâmela. – Ela estendeu a mão que eu e logo apertamos, nos apresentando também. - e , se me permitem dizer, vocês formam um casal muito bonito.
   - Muito obrigada, Pâmela. – Agradeci serena. - Bem, é melhor irmos, não é, amor? Foi um prazer conhecê-la. – Virei-me para que concordou.
   Nos despedimos e marcamos de vê-la na festa do condomínio no dia seguinte, na qual ela disse que nos apresentaria seu marido, Joseph.

Capítulo 4 - The Dream

  por Ela

  - Para o primeiro dia, acho que fomos bem. Causamos boas impressões e conhecemos alguns vizinhos. Acho que amanhã deveríamos fazer compras e, quem sabe, considerar frequentar algum dos grupos esportivos do condomínio. Tem vôlei feminino, futebol masculino, tênis de duplas e a academia. – dizia enquanto caminhávamos para casa.
   - Tênis talvez seja uma boa. O grupo se reúne para jogar apenas aos domingos. Quanto aos times de vôlei e futebol que jogam duas vezes durante a semana é fundamental que entremos. Novas pessoas para conhecer, novas pessoas para avaliar. – Dei de ombros destrancando a porta e entrando em casa.
   - Está certo. Bom, eu vou tomar um banho agora, quer se juntar a mim? – Ele perguntou, maroto, como quem não quer nada.
   - Muito engraçado, . Prefiro passar um tempo na hidromassagem, na realidade. Só vou pegar meu biquíni e uma toalha e o quarto é todo seu. - Disse já subindo as escadas.
   Entrei na imensa banheira sentindo cada parte do meu corpo anestesiada pela água quente. Encostei minha cabeça na parte almofadada do contorno da hidro e fechei meus olhos por um instante. Oh, sim. Eu precisava mesmo de um tempo pra mim, pra relaxar e descansar a cabeça pelo stress dos últimos dois dias: A notícia de Leonard, o vôo de NY até Miami, deixar a minha casa para trás por um ano, a nova missão e principalmente a o estado de tensão constante que infringe em mim só de existir e mais intenso ainda de estar perto de mim. Eu sentia que aquele ano não ia ser nada fácil e que ele faria o que estivesse ao seu alcance para tornar a minha vida um inferno.
   Estava tão imersa em pensamentos que não dei atenção ao balançar suave da água ao meu redor, julgando ser apenas o natural das rajadas de água. Porém, ao sentir a água movimentar-se mais do que os jatos permitiam, abri os olhos.
   postava-se ao meu lado, como se nada estivesse acontecendo, semi-nu.
   - O que você está fazendo aqui? – Indaguei bastante irritada de estar sendo incomodada neste momento de paz. E também, confesso, muito sem graça por ele estar tão pouco vestido.
   - Aproveitando uma deliciosa hidromassagem com você. O banho estava muito chato, sabe como é. – Ele deu de ombros. Sua expressão era bastante relaxada.
   - Eu não te convidei, infeliz! – Retruquei batendo as palmas das mãos na superfície cristalina de modo que um pouco dela voasse na direção do cretino desgraçado. Ele tirou o excesso de seu rosto e desceu a mão pelo peito até ela se perder de novo na pequena piscina. Meus olhos desceram rapidamente por seu corpo acompanhando o trajeto, fazendo o contorno por todos os músculos maravilhosamente expostos. Me policiei na mesma hora, controlando esses impulsos distraídos e voltando a sua face, transmitindo o máximo de raiva que eu podia pelo meu olhar.
   - Não preciso de convite, meu amor. Embora seu corpo esteja bem convidativo nesse pequeno biquíni vermelho. – Ele passou vagarosamente a mão por minha coxa embaixo da água cristalina, espalmando-a pouco acima de meu joelho e seguindo. Segurei seu pulso, impedindo que a mão continuasse subindo. Ele só podia estar louco. Tinha esquecido que eu era eu, é a única explicação. riu baixo e rouco, dedilhando a parte na qual eu mantinha sua mão parada. Um arrepio subiu pela minha espinha, me fazendo respirar fundo para não perder o controle. Céus, quanta necessidade! , você já foi mais imune a toques masculinos do que isso. Lembrava-me a cada milésimo de segundo que os dedos dele não deixavam a minha pele que aquele era , e que eu não podia, sobre hipótese nenhuma, aliviar minha abstinência com ele. Isso só podia ser tensão sexual, não é possível. Afinal, quando se é agente da CIA, não há muito tempo para arranjar um homem decente para passar uma noite. Eles são frágeis demais e não sabem tocar os lugares certos. Uma desgraça. – Por que você não deixa todos esses pensamentos condenadores de lado por apenas um momento e se permite aproveitar? – Ele continuou com o mesmo tom supostamente sedutor. - Estamos presos em uma missão perigosíssima e só temos um ao outro para consolo. E se você admitisse que me quer tanto quanto eu te quero, eu tiraria nós dois dessa tensão e faria o peso que carregamos muito menor. – Eu continuava com a voz entalada na garganta e ele agora aproximara seu rosto de mim e roçava seu nariz pelo meu pescoço. Meu aperto em seu pulso titubeou e ele imediatamente aproveitou pra começar a distribuir pequenos apertões no interior quente da minha coxa nua. Ele não se arriscava muito, afinal apesar de mais frouxo, o meu aperto em sua mão ainda o restringia.
   A realidade demorou a me atingir, mas o fez. Eu me tornei ciente de que a pessoa que estava me causando àquelas sensações era o cara que eu odiava, o ser mais desprezível da face da Terra, e me vi finalmente disposta a acabar com aquela brincadeira de mau gosto. Me levantei em um impulso, já puxando a toalha e a enrolando no meu corpo.
   - Já disse que não quero você perto de mim. Pare de me tocar quando ninguém estiver olhando e não me olhe desse jeito. – Exclamei apontando meu dedo em sua direção.
   - Que jeito? – ele disse abrindo o sorriso torto que adorava fazer.
   - Assim! – Exclamei exaltada. - Como... se pudesse me comer com os olhos. – disse incerta. – E sabe do que mais? Eu vou dormir! Boa noite! – Me virei para deixar o cômodo, mas me chamou novamente.
   – O quê, inferno?
   - Você não pode ir dormir sozinha, . Vão suspeitar! – merda, ele tinha razão. Bufei e revirei os olhos.
   - Então levante-se! Vamos logo, o dia foi longo e eu quero descansar. – disse disparando na frente, mas me detendo antes de virar e subir a escada. Minha respiração estava falha pelo nervosismo e eu já imaginava como seria passar a noite na mesma cama que ele. Nada relaxante, eu diria. Ah, mas era hoje que eu cortaria a mão dele fora se no meio da noite ele ousasse encostar em mim. me alcançou rapidamente, também enrolado em uma toalha, embora a dele envolvesse apenas seu quadril. Nada bom. Pele demais exposta. Ignorei esses pensamentos injustificáveis. Ele passou um braço na minha cintura e abriu seu sorriso falso que eu já conhecia. Fiz o mesmo e subimos a escada em meio a risos sem noção e piadas sobre o suposto procurado para tornar os risos mais naturais. O clima ficou um pouco mais descontraído, de modo que eu voltei a me preocupar apenas quando já estávamos dentro do quarto.
   Colocamos nossos pijamas, o que no caso de era uma boxer e uma regata colada e no meu era uma camisola de seda preta – o melhor tecido do mundo para se dormir -, escovamos nossos dentes e fomos nos deitar.
   - Então, hm, boa noite, . – Ele disse me olhando cauteloso. Apenas acenei com a cabeça e me virei totalmente para o lado oposto dele.
  Fechei os olhos e tentei imaginar que estava em casa, no meu apartamento em Nova Iorque. Que podia ver o Hyde Park da janela, com todo aquele verde e a tranquilidade natural que ver aquelas crianças brincando sempre me passava. Demorei-me alguns vários minutos focada nessa paisagem, tentando desconectar do mundo real. Quando finalmente cai no estado de inconsciência, qual foi a minha surpresa ao sonhar com a noite toda?

- o sonho -

  Os corredores frios da imponente arquitetura da CIA passavam rapidamente por mim enquanto minhas pernas se esforçavam para estabelecer um ritmo acelerado de caminhada. Eu não queria parecer desesperada, embora fosse assim que eu me sentia. Minha sala preferida de treinamento finalmente estava ao meu alcance e eu não hesitei em adentrá-la intempestivamente, aliviada por ter finalmente atingido meu destino. Eu não sabia o que estava me fazendo agir daquela forma, mas a cena estranhamente familiar me fazia crer ser mais uma daquelas noites. Aquelas em que eu tentava sair para me divertir e tirar a cabeça do trabalho e acabava na cama com qualquer cara ordinário que não tinha o mínimo de pegada necessária para satisfazer uma mulher como eu. Aquelas em que eu acabava mais sexualmente frustrada do que já estava e com isso me encaminhava para a sala de treinamento número seis com o objetivo de me cansar tanto que eu não seria capaz de fazer o que meu corpo queria que eu fizesse. Aquelas em que eu chutava sacos de areia e atirava em alvos de alumínio para evitar a humilhação de ceder ao nó no meu baixo ventre e simplesmente... Me tocar.
   Mas aquela não era uma noite qualquer. Havia alguma coisa no ar, algo que o nublava e pesava, tornando aquele acontecimento tão mais importante do que realmente era. Enquanto eu começava a me alongar, o responsável por aquilo batia a porta pesada de ferro e caminhava lentamente na minha direção, quase como um tigre cercando seu jantar.
   - Eu esperava receber uma ligação sua mais dia menos dia, , mas duas e quarenta da manhã de um sábado foi uma grande surpresa. – disse enquanto deixava celular e carteira em um banco de madeira que ali havia e logo puxava o próprio braço direito por cima do ombro como se tentasse alcançar o meio das costas. Mas espera... Eu o havia chamado? Como, onde, por quê? Permaneci em silêncio, terminando de segurar a sola do pé e me levantando. – Finalmente entendeu que precisávamos treinar. Como parceiros é importante que estejamos sempre em sintonia... Se é que você me entende. – Um companheiro de luta. Era isso que eu queria de . Alguém que substituísse a frustração por ira. Mas então porque eu me mantinha calada? Se era ódio o componente que eu procurava, por que não o respondia? Não iniciava uma discussão?
   Observei meus lábios curvarem em um sorriso misterioso. Meus olhos semi-cerrados acompanhavam a agitação de ao dar um pulo e girar os braços em círculos. Por que ele estava tão hiperativo? E por que raios eu continuava quieta?
   - Confesso que a princípio eu estava mais que tentado a te mandar pra puta que o pariu, afinal eu estava pra me dar bem nessa madrugada, mas sua proposta foi tentadora demais pra que eu recusasse. – Espera, então ele deixou qualquer vadia chupando dedo por aí para vir treinar comigo? Foi então que eu reparei em suas roupas. Ele estava arrumado, com uma calça jeans negra, camisa social branca apertada e tênis brancos. Os cabelos bagunçados e uma boa dose de perfume masculino. estava vestido para caçar, bastante diferente do “marido” e dos uniformes da CIA a que eu já estava habituada. Não que eu estivesse muito diferente. Usava um vestido verde palmeira colado e apelativo, que de tão curto exigia a presença de um microshort preto por baixo. Eu não sabia qual era a minha tal proposta, mas sabia que boa coisa não devia ser se eu tinha conseguido arrastá-lo até aqui. – Vamos começar? Quero logo te derrotar e ganhar meu prêmio. – Certo, um prêmio. A proposta envolvia um prêmio. Aparentemente o vencedor de uma luta seria recompensado. – Você não devia ter aberto margem para pedir o que eu quisesse, . Não faz ideia das perversões que habitam minha mente. – E sem dizer mais nada, avançou.
   Cruzei os braços em X rapidamente de forma a amortecer o soco dele nos antebraços, em seguida dando um pulo para trás para fugir da sua joelhada. riu descrente ao ver que não havia conseguido me atingir. Aproveitei a deixa para acordar e revidar, dando um giro para dar o impulso necessário ao meu chute na direção das costelas dele. simplesmente segurou minha perna no ar e a enganchou no seu quadril, ficando assim colado em mim por trás. O que aconteceu a seguir não pode ser realmente considerado minha culpa. Veja bem, estávamos lutando há muito pouco tempo. De fato, tínhamos apenas começado. Eu não tinha tido a dose de adrenalina necessária ainda para esquecer o motivo que havia me levado àquela sala para começo de conversa. Eu ainda estava, sim, frustrada e necessitando uma forma de alívio rápido para o incômodo entre as minhas pernas. Então é por isso que digo que foi completamente compreensível eu ter deixado um suspiro extasiado escapar ao sentir o corpo másculo de em tanto contato com o meu.
   Ele, claro, não deixou isso escapar.
   - Mas o que temos aqui? Acho que chegamos à raiz desse chamado atípico em plena madrugada, huh? – indagou enquanto prendia meus braços que tinham acabado de conseguir lhe inferir algumas cotoveladas. Com um braço só ele segurou os dois para trás, o que a princípio me causou certo alívio, pois serviram de barreira para que nossos troncos se encostassem. Mas então eu percebi que estava presa e que nem toda a “debateção” do mundo faria eu me soltar.
   Principalmente porque eu não queria ser solta.
   Era tarde. Era simplesmente tarde demais. O pensamento já havia cruzado a minha mente e agora não havia volta. Eu estava sim excitada e não me restavam dúvidas que o motivo pelo qual eu havia chamado ali em primeiro lugar era pra resolver esse pequeno probleminha. Aparentemente, no entanto, eu só agora tinha especificado para mim mesma
como ele resolveria.
   E a “eu” do sonho parecia muito tranquila com isso. Ah sim, porque se restavam dúvidas de que aquilo era um sonho, a minha falta de nojo de havia encerrado aquela questão. E nem assim eu acordava. A vida não era justa.
   - Me responde quando eu falo com você, . – disse entredentes ao alcançar um punhado de cabelos meus e virar meu rosto bruscamente de lado para que eu pudesse vê-lo. – Está excitada, é? Algum idiota te deixou insatisfeita e você teve que recorrer ao ninfomaníaco incurável que é seu parceiro? – Me limitei a apertar os olhos bem fechados e esconder os lábios. Ele riu baixo com a minha muda concordância. – Só posso te dizer... Que veio à pessoa certa. – Completou.
   No segundo seguinte eu estava completamente apoiada em uma parede qualquer da sala. Tinha sido empurrada até ali e agora tinha os seios comprimidos e a lateral do rosto pressionada. estava trás de mim quase que imediatamente. Elevou meus braços até uma barra de ferro que ficava presa ali no alto, utilizada normalmente para flexões aéreas, e as amarrou lá com uma corda dessas de pular que estava logo ao nosso lado no chão. Eu apenas acompanhei os movimentos dele, sem nem reclamar. Não precisava nem dizer que aquela era uma de minhas fantasias.
   Quando se deu por satisfeito com o nó que apertava meus punhos, testou minha mobilidade, me girando até estar de frente para ele. Meus braços deram um nó, mas não chegaram a incomodar. Meu olhar encontrou o dele, sedento, ansioso. Senti meus joelhos fraquejarem, mas graças às amarras quase não deu pra notar. Ele começou a tirar botão por botão de suas casas e seu sorriso aumentava a cada espaço de pele exposta que surgia que meus olhos faziam questão de conferir. Devidamente descamisado, veio até mim. Suas mãos alcançaram as minhas, e trilharam um caminho de fogo pelo interior dos meus antebraços, lugar que eu não esperava ter uma relação tão direta com o meu baixo ventre, seguindo pelo lado de dentro dos cotovelos, então os bíceps e ombros. Minha respiração acelerou.
   Elas então tomaram o rumo da minha nuca e seguiram o trajeto da minha coluna, abrindo o zíper do vestido pelo caminho. Este se tornou frouxo e caiu até meu quadril. não parava de olhar fundo nos meus olhos enquanto executava toda aquela tortura chinesa e aquilo estava aos poucos me deixando tonta. A mistura da agitação dos mares em suas íris e a lentidão sensual com que me acariciava e despia estava me tirando a sanidade aos poucos.
   Ele voltou a subir as mãos para meus ombros apenas para descê-las na calma irritante de sempre pela frente do meu corpo, contornando os meus seios desnudos, que ele se recusou a tocar como eu queria, passando em caminhos tortuosos pela minha barriga e atingindo o quadril. Ele seguiu trajeto com as mãos por dentro do vestido e do short, assim arrastando ambos com ele. Toda aquela sutileza estava me deixando hipersensível, e acho que esse era, afinal de contas, o objetivo dele.
   Seu toque foi suave por toda a parte de fora da minha perna até o meu pé. Ele se livrou das roupas ali e, enquanto eu já ameaçava resmungar que não estava mais aguentando, percebi um brilho diferente no seu olhar, que escureceu consideravelmente. Agora sim a diversão ia começar.
   começou a percorrer o caminho de volta, mas dessa vez me tocando do modo como eu implorava para ser tocada. Suas mãos ásperas e fortes distribuíam apertões por onde passavam: Nas coxas, quadril, cintura, e finalmente peitos. Ele os segurou com firmeza, pela primeira vez desviando o olhar do meu para conferir como eles cabiam perfeitamente em suas mãos. Massageou aquela parte algum tempo e aproveitou para simultaneamente distribuir alguns beijos fortes e molhados pelo meu colo avermelhado com a ansiedade.
   Eu tinha conseguido me manter comportada até então, mas foi só beliscar meus mamilos túrgidos entre seu indicadores e dedões que um gemido irrompeu pela minha garganta. Ele pareceu apreciar o som, fazendo de novo, dessa vez com a boca. Minha calcinha a essa altura já se encontrava vergonhosamente encharcada.
   Os beijos e mordidas se estenderam por aquela região por mais tempo do que o aconselhado pela minha sanidade. Alguns suspiros ininterruptos já saiam com frequência dos meus lábios, e minhas pernas passaram a se apertar involuntariamente uma contra a outra. , percebendo esse fato, me lançou mais um olhar repleto de malícia antes de largar meus seios para postar as mãos em garras no meu traseiro. Isso aproximou seu corpo de mim e possibilitou que ele sussurrasse contra a minha boca.
   - Aproveita a discrição enquanto pode, . Hoje eu te faço gritar.
   E, sem aviso prévio, girou meu corpo novamente de costas para ele. apoiou uma mão no centro das minhas costas, me pressionando contra a parede, e com a outra despendeu um pequeno tapa ardido em minha nádega direita. Gemi mais alto.
   Ele pegou minha calcinha pelo elástico e a puxou em sua direção, fazendo a própria se esticar e esfregar precariamente minha intimidade pulsante. Mais um pouco de força e o frágil tecido cedeu, rasgando em dois mínimos pedaços de pano minha roupa íntima, que logo caíram no chão.
   me abraçou por trás, brincando brevemente com meu seios e logo descendo uma das mãos pela minha barriga. Comecei a tremer de antecipação. Ele acariciou sinuosamente meu baixo ventre, depois pulou para o interior quente das minhas coxas e foi aos poucos chegando próximo da minha virilha.
   - Vou fazer com você hoje, , só aquilo que você estaria fazendo se não me tivesse aqui. Vou te mostrar como posso ser bom sem nem sequer te foder da forma correta, da forma que quero. Você vai me pedir mais, deixar seu orgulho e aversão infantis de lado, e aí sim eu vou te dar tudo e não apenas essa amostra. – E feita sua previsão, senti seus dedos finalmente alcançarem a carne molhada entre as minhas pernas e passearem por lá como se estivessem conhecendo o território. Seu dedão encontrou meu ponto inchado de prazer e passou a desferir toques precisos, mas leves ali. Eu gemi profundamente finalmente sentindo aquela parte tão desesperada de mim receber alguma atenção. A massagem continuou, ficando a cada minuto mais intensa, como se me premiasse a cada gemido. – Você nunca mais vai ser a mesma, meu amor. Vai ter que olhar para mim todos os dias e se controlar para não pedir aquilo que só me deixou te dar em sonho. Vai chegar ao ponto de implorar pelo meu toque, de me deixar fazer quaisquer obscenidades minha cabeça formular. E eu vou esperar ansioso por esse dia. Mas não pacientemente. Oh, isso não. Eu vou te tirar dos eixos dia após dia, eu vou tornar o seu raciocínio lento e espaço, eu vou fazer você minha antes mesmo de te tomar em meus braços, simplesmente porque você vai não vai almejar ser de mais ninguém. Porque só eu vou saber onde tocar e como tocar. – A combinação da voz de fazendo todas aquelas ameaças no meu ouvido, com sua boca roçando sugestivamente ali e o dedo que ele escorregou por minha entrada para me penetrar me arrancou um soluço de prazer que eu não achava ser possível emitir. O meu prazer estava derretendo aos poucos, eu forçava as amarras para descontar a tensão e elas respondiam machucando meus pulsos. Meu quadril já acompanhava o movimento frenético que os dedos de tinham assumido em mim, e meu ápice estava tão perto que eu não achava ser possível durar nem mais um minuto. – Deixa vir, princesa. Goza na minha mão e assina sua sentença. Prova que você vai ser minha. Mostra o quanto eu te deixo louca.
   E, com essas palavras finais, eu encerrei o mais intenso sonho erótico da minha vida, gritando o nome de no meu orgasmo e caindo na inconsciência que estranhamente me trouxe...

   À realidade.

Capítulo 5 - Interruption

  por Ela

  Abri meus olhos sentindo a claridade banhar o quarto. Maldita parede de vidro fosco, nem pra colocarem cortinas nessa desgraça. Depois de aceitar que não havia nada que eu pudesse fazer quanto a isso, avaliei meu estado de espírito. Nada mal! Para falar a verdade eu acordei mais descansada do que me lembrava. Nenhuma relação com o orgasmo que eu havia acabado de ter no melhor pesadelo da minha vida. Não, claro que não.
   Movi minhas pupilas lentamente avaliando minha posição na cama. Eu me encontrava do mesmo jeito e no mesmo lugar no qual estava antes de dormir. No entanto, um peso encontrava-se em minha cintura. Direcionei meu olhar e eis que encontro o braço de ao meu redor. Hm, interessante. Então detectei uma brisa, lenta, quente e ritmada, batendo em meu pescoço. A parte de trás do meu corpo também estava muito mais quente que o resto dele.
   Era oficial: Eu estava de conchinha com .
   - Bom dia. – A voz rouca com a qual sonhei a noite toda se pronunciou, o som vindo de detrás de mim. Ah, não. Era simplesmente cedo demais para ouvir aquele mesmo tom sensual que ele usou comigo o sonho praticamente inteiro. Eu ainda não estava pronta para enfrentar as causas e consequências de ter sonhado com ele, muito menos pra encarar o ser em pessoa. Pausa para respirar bem fundo antes de responder.
   - Bom dia. Posso perguntar por que está me abraçando? – Meu tom era definitivamente baixo, mas o suficiente para que ele escutasse.
   - Você não se lembra? Durante a noite você disse que estava com frio e me perguntou por que eu estava tão longe. – Ele explicou dando uma risada fraca no final. Corei violentamente. Que eu falava durante a noite não era novidade. Mas eu com certeza não fazia ideia que minha boca podia ser tão traíra assim.
   - Uau, eu devia mesmo estar fora de mim. – Esnobei ao mesmo tempo não querendo que ele se movesse um milímetro. Aquela era a posição mais confortável em que eu já havia estado em toda a minha vida. Eu morreria daquele jeito se fosse necessário. E isso não tinha absolutamente nada a ver com o fato de ser ali. Podia ser minha vovozinha que daria na mesma, desde que me esquentasse daquela forma e me envolvesse de modo tão... Deixa pra lá.
   - Quem sabe? Às vezes foi seu subconsciente externando seus desejos, . – riu mais uma vez fraco e fez menção de se levantar.
   - Hm, aonde você vai? – A voz levemente trêmula me entregou de modo que ele se aproximou novamente sussurrando diretamente em minha orelha.
   - Tomar um bom banho para ficar cheiroso para minha esposa. – Com mais um riso sarcástico e um beijo estalado em minha bochecha, levantou-se de vez, dirigindo-se ao banheiro. – Você já sabe, o convite para se juntar a mim estará sempre firme. – Tá bem; Cara de pau deveria ser o nome dele.
   - Nos seus sonhos, .
   - Nos seus também, . – E dito isso fechou a porta, logo depois ligando o chuveiro. Mal sabia ele o quanto estava certo. E eu preferia que continuasse sem saber.

  Tomamos café da manhã em uma cafeteria próxima ao condomínio e aproveitamos para fazer supermercado e dar uma volta de carro pela região para conhecer um pouco do bairro. De volta a Westbridge, nos matriculamos nos esportes que tínhamos combinado e encontramos Elizabeth que me prendeu em uma conversa interminável sobre roupas, enquanto descarregava o carro. Quando já não aguentava mais suas dúvidas sobre o que vestir para a festa de condomínio, apareceu, me abraçando por trás. Fiz uma prece de agradecimento mentalmente.
   - Liz, se me dá licença, preciso roubar minha mulher. O almoço está quase pronto e hoje combinamos de passar um tempo a sós. Se não se importa, nos vemos mais tarde. – Ele sorriu para ela que tinha os olhos brilhando (provavelmente de inveja, aquela cobra) e ele me deu um beijo no ombro.
   - Desculpe, Liz, depois continuamos a conversa, tudo bem? – Tentei parecer que não estava aliviada por ter que deixá-la e acho que deu certo. Elizabeth deu um meio sorriso e se despediu, com a promessa de que se continuasse em dúvida apareceria em casa para que eu a ajudasse. Como se eu estivesse super a fim de discutir isso com ela.
   Nos afastamos e quando chegamos na cozinha, o lugar cheirava muito bem.
   - Nossa! Não achei que estivesse falando sério sobre o almoço. Que surpresa, é um homem que cozinha, e a julgar pelo cheiro, bem! – Dei uma risada, mirando-o impressionada.
   - Tem muitas coisas que você não sabe sobre mim, linda. – Ele piscou para mim e deu os últimos toques. Sentei-me e aguardei ansiosa, estava com fome. - Aqui está, madame, me avise se quiser mais tempero. – colocou o prato a minha frente e estava com uma cara ótima.
   - Muito obrigada, chef, parece muito bom. – Dei um sorriso cortês. Sim, eu podia ser educada quando queria, é só que com ele isso não acontecia muito. Aliás, isso não acontecia nunca. - E obrigada também por me salvar da Elizabeth. Ela é bem falante, se quer saber. – Ele sorriu, afirmando que não tinha feito nada de mais.
   O almoço seguiu tranquilo, não trocamos muitas palavras. No entanto, a cada garfada de comida que eu dava, um calor se apoderava de mim, me revirava o estômago e arrepiava a pele. Uma vontade exacerbada de agarrar o ser sentado a minha frente passou a me comandar. Eu estava achando realmente muito estranho todo esse descontrole. Mesmo depois do sonho, que me fez querer olhar pra ele diferente, eu não achava normal um impulso tão forte como esse. Enruguei a testa mirando o que restava de comida em meu prato e de volta a . Alguma coisa estava errada, meus hormônios estavam, sim, loucos nessas últimas horas, mas não é possível que até durante um pacato almoço! não estava nem semi-nu ou me provocando ou algo do tipo. Quando eu já considerava entrar em uma clínica para pervertidos psicóticos, os lábios tentadores de meu parceiro se moveram... Espera, ele estava falando alguma coisa!
   - O que foi, ? Está me olhando estranho... Por acaso o afrodisíaco da pimenta libanesa na comida não está fazendo efeito, está? – segurou o riso ao passo que o entendimento e a vontade de matá-lo se apoderavam do meu ser. Vontade de matá-lo de prazer. Damn it.
   - Você é desprezível. – exclamei, mais para lembrar a mim mesma do que para ele, enquanto me levantava e colocava meu prato na pia, mais preocupada em me manter ocupada (e consequentemente longe das vontades com relação a ) do que me importando com manter a casa limpa.
   - E você adora. – disse na minha cola, se apoiando na minha cintura e pendendo seu corpo para frente de modo a colocar seu prato junto com o meu, colando-se a mim no processo. Respirei fundo e sai rapidamente dali, indo para a sala. Planejava assistir algum programa idiota para me distrair, porém, parecia decidido a não deixar isso acontecer. Sentou-se comigo no grande sofá e colocou seu braço ao meu redor.
   - Arg, , qual é? Será que você pode parar um pouco de dar em cima de mim? - Perguntei revirando os olhos e olhando com tédio embora por dentro eu quisesse ficar mais e mais perto dele. Maldita pimenta libanesa.
   - Pode parar, princesa, estamos na sala, paredes de vidro, lembra? Cuidado para não rejeitar seu maridinho tão dedicado. – Ele riu em deboche, sabendo que eu nada poderia fazer a respeito daquele argumento incontestável.
   - Então esse é o seu plano? Se aproveitar de mim quando eu não puder fugir? Muito macho da sua parte. – Revirei meus olhos novamente. Aquilo estava se tornando um hábito. – Afinal é só assim que você consegue mulher, é isso? Pra que conquistar quando se pode forçá-la a ficar com você...
   - Isso não é verdade e você sabe. – havia se aproximado subitamente, enfiado uma mão pelos cabelos da minha nuca me fazendo olhá-lo de perto. Igual ao sonho. Ele estava nervoso. O maxilar travado e um brilho raivoso no olhar. – Eu simplesmente estou aproveitando dos artifícios que eu tenho, já que no particular você mal consegue ficar perto de mim sem fugir como uma gatinha encurralada. – Ele levantou uma sobrancelha como se me desafiasse a contrariá-lo.
   Eu já disse que simplesmente adoro desafios?
   - Eu não fujo! Eu simplesmente não sou obrigada a aturar sua ousadia. Você acha que qualquer mulher se derrete por você, mas não é o dono da verdade! – Ainda bem que quem olhasse de fora acharia que estávamos nos provocando e não brigando. Se bem que eu nem sei mais se a intenção ali era fazê-lo sair do meu pé ou perder o controle e me beijar. Novamente, maldita pimenta libanesa. Maldito sonho erótico.
   - Eu tenho certeza que se você parasse de ser medrosa e me deixasse te tocar direito, mudaria de opinião. Um beijo e você ficaria perdida por mim, . – É isso. Agora eu estava mesmo irritada. Ele tinha conseguido. Eu não perco apostas, simplesmente não é parte do que eu sou. Aceito qualquer desafio que me derem. E esse não seria diferente.
   - Você é realmente muito cheio de si, não é mesmo? Pois eu vou te mostrar que sou mais forte do que qualquer mulher que você conhece. – Enganchei meus dedos em sua camiseta de algodão, segurando ali como apoio e passei uma perna por seu corpo, sentando-me em seu colo pronta para dar-lhe o melhor beijo de sua vida. Nossas respirações misturaram-se e ele notou o que eu ia fazer, já que abriu um sorriso pecaminoso. Apoiou uma de suas mãos em minha cintura e permaneceu com a outra em minha nuca. Respirei fundo, mirando aqueles lábios pecaminosos. Era agora ou nunca. A vontade que eu tinha ficado no sonho se concretizaria. Fui ao seu encontro. Ao mesmo tempo em que encostamos nossas bocas, a campainha tocou.
   Cazzo.
   Empurrei e me levantei na mesma hora, no susto, querendo matar a pessoa que nos interrompera. E o pior era saber que se apenas com um encostar de bocas eu já estava ofegante e francamente um pouco trêmula, imagino o que ele faria comigo se mais do que isso ocorresse. Esfreguei meu rosto na tentativa de limpar minha mente.
   Abri a porta dando de cara com uma Elizabeth desesperada adentrando a casa sem convite. Ela falava sem parar sobre como não sabia o que fazer com seu cabelo cor de abóbora quando pôs os olhos em . E pôs os olhos nela. E ela estava apenas de toalha.
   OK, que tipo de pessoa entra na casa de quem acabou de conhecer de toalha sabendo que teria um homem por lá? Obviamente, a vadia em questão. E a cada segundo que passava, eu gostava menos dessa mulher.
   , que parecia atordoado pela interrupção, levantou-se e deu uma boa olhada nas pernas da nossa vizinha, logo indo cumprimentá-la com um beijo demorado na bochecha. Eu sentia meu sangue todo borbulhar, ainda desacreditada. Era muita petulância.
   - Liz, pode nos dar um momento, por favor? Preciso só resolver algo com e já te ajudo. – Sorri (falsa) e puxei pelo passante da calça jeans, já adentrando a cozinha e fechando a porta, mas não antes de escutar a puta ruiva dizer “Tudo bem, casal, só não demorem! E se forem demorar, me chamem para participar!” e dar um riso ridiculamente pervertido. Arg.
   - O que você pensa que está fazendo, ? Eu tenho cara de palhaça por acaso? – Levantei minhas mãos num gesto que deixava claro o quão brava eu estava.
   - O que exatamente eu fiz? – Ele perguntou cauteloso como se estivesse com medo de mim. Ou como se eu tivesse duas cabeças e fosse verde. Mais provavelmente a segunda opção.
   - Quer saber? Acho que pra deixar mais claro é só você voltar lá dentro e comer a porra da nossa vizinha na minha frente. Isso seria ÉPICO. – Revirei meus olhos e bufei irritada mais ainda com o fato de ele se fazer de inocente.
   - Ah, então é isso. Ciúmes, amor? – A compreensão se espalhou pelo seu rosto e o sorriso torto conhecido deu as caras.
   - É, até parece. Mas nós temos uma imagem para manter, ok? Se liga! – Desconversei, mas logo me puxou pela mão e me abraçou pela cintura fazendo meus braços apoiarem-se em seu peitoral. Sussurrou realmente próximo “Não se preocupa. Eu quero você, ” e me deu um selinho inesperado e provocante. Espalmei as mãos, o empurrei pelo peito e sai andando com minha expressão de brava comprometida pela atitude de , virando um ultimo olhar de aviso antes de abrir a porta e ter que me fazer de boazinha.

Capítulo 6 - The party

  por Ela

  Consegui dispensar Elizabeth apenas duas horas depois. fez o favor de ficar conosco todo o tempo, aproveitando cada brecha que tinha pra me irritar mais um pouco. Quando ela finalmente foi embora, deixei meu ‘marido’ assistindo a um jogo qualquer de futebol na televisão da sala e fui começar a me arrumar.
   Tomei um longo e demorado banho, com direito a cantoria e banho de creme. Coloquei meu roupão felpudo e comecei a fuçar dentre todas as minhas roupas até achar o que queria. Optei por um vestido preto básico, curto e colado com as costas de fora. Nos pés um peep toe vermelho de verniz e bem alto. Deixei a roupa separada junto com a lingerie e o sapato em cima da cama e fui secar meu cabelo. Deixei-o liso sem nada de mais, afinal, era apenas uma festa de condomínio e eu estava com preguiça. Sentei-me frente à penteadeira e passei a me maquiar ao passo que adentrou o quarto anunciando que tomaria banho. Não sem antes lançar um olhar nada casto para o conjunto de calcinha e sutiã sob a cama. Pervertido.
   Cerca de 20 minutos depois, a porta do banheiro foi aberta e o vapor invadiu o quarto junto com o cheiro de sabonete. saiu enrolado em uma toalha e com outra nas mãos bagunçando seus cabelos para secá-los. Ele abriu os armários em busca da roupa que queria e eu me levantei pegando tudo que precisava e me trancando no banheiro para somente sair quando estivesse pronta. A maquiagem estava quase terminada: meus olhos estavam delineados com lápis preto e levemente esfumaçados, os cílios volumosos e a pele de porcelana. Na boca, só faltava passar o batom vermelho vivo. Passei meu perfume preferido e me vesti. Então finalmente passei o batom e me olhei no espelho, ajeitando algumas mexas do cabelo. Satisfeita com o que vi, abri a porta dando de cara com um de camisa social branca dobrada até os cotovelos, calça social preta e sapato fechado. Exatamente como no sonho do dia anterior. A essa altura eu começava a achar que o destino tinha algum problema comigo. Ou, pior, que eu tivesse dito mais alguma coisa em voz alta enquanto sonhava. Sentia-me no Purgatório: A um passo do Céu, mas com entrada vip e carona garantida para o Inferno.
   Aproveitei que ele olhava para baixo, mexendo em algo no celular e não havia notado minha presença ainda, para disfarçar o máximo qualquer olhar incrédulo que eu pudesse direcionar a ele e recuperar o meu juízo. Eu precisava ao menos fingir que nada daquilo me era familiar.
   - Nada mal, . – Minha voz chamou sua atenção de modo que seu olhar fixou-se primeiro em meus pés e seguiu vagarosamente por cada pedaço do meu corpo até chegar aos meus olhos. Sua boca estava levemente aberta enquanto eu detinha um sorriso fraco no rosto.
   - Uau. Você está linda, . – Seus olhos hipnotizantes me transmitiam uma sinceridade desconcertante.
   - Obrigada, você também está. – Não sei. De verdade, não sei qual é a minha. Eu devo estar com alguma falha cognitiva grave pra ser amável desse jeito com a pessoa detentora do maior ego do mundo. Balancei a cabeça, tentando afastar por um momento a autocrítica. – Vamos? – apenas assentiu, estendendo a mão para mim que aceitei na hora. O salão de festas era próximo a nossa casa, de modo que fomos caminhando com as mãos entrelaçadas.
   O lugar estava lotado. Aparentemente, todos os moradores de Westbridge não perdiam uma festa de condomínio. Logo de cara, encontramos com Pâmela e seu marido Joseph, que parecia ser uma boa pessoa por sinal, mas era bastante reservado. Conversamos algum tempo sobre banalidades até que pediu licença para pegar bebidas para nós. Eu não era a pessoa mais forte para álcool, mas um pouco de diversão não ia me fazer mal, de modo que aceitei o copo com um líquido azul desconhecido de bom grado. Pâmela nos apresentou a algumas pessoas, em um total de três casais, duas moças com mais ou menos a mesma idade que nós e quatro homens com os quais se identificou na hora. Deixei que ele conversasse com os rapazes tranquilo enquanto dava uma volta com Pâmela. Pegamos mais uma bebida, esta alaranjada e mais forte, e encontramos com Elizabeth no balcão que servia como bar.
   Qual não foi minha surpresa ao perceber que Pâmela não ficara confortável com sua presença? Ela logo se retirou me deixando a sós com a baranga dos cabelos ferrugem. Liz me arrastou para um grupo de homens que nos olhavam e começou a conversar com eles, não soltando meu braço. Edward (o único que eu guardei o nome) começou a beijá-la ali mesmo. Com o vestido daquele cumprimento (era possível ver seu útero, pelo amor de Deus!) era de se esperar que Elizabeth não fosse exatamente difícil. Os outros rapazes fizeram um circulo a minha volta e tudo que eu pensava era em dar o fora dali. Onde estaria ?

  por Ele

  Estava tão entretido na conversa com os caras que não notei que havia desaparecido. Um segundo atrás ela estava no bar com Pâmela e Elizabeth e agora não via nem sinal dela. Notei que duas meninas me encaravam distantes com sorrisos. Ah, o flerte. Engoli em seco resolvendo que era melhor procurar a minha ‘esposa’ antes de fazer besteira.
   Dei pelo menos três voltas no local e nada de encontrá-la. Já quase desistia de procurar socialmente e partia para a investigação apurada quando passei pelo que seria a chapelaria (o que na verdade era um cômodo cheio de casacos) e senti uma mão me puxar. Atrás de uma boa quantidade de casacos, falava tão rápido que não entendi sequer uma palavra. Olhei bem para ela e ao seu redor, tentando entender o que estava acontecendo e quando mirei para baixo vi um corpo desmaiado.
   - , respira. O que aconteceu? Quem é esse cara e porque ele está desmaiado aos seus pés? E o que você está fazendo dentro da chapelaria sozinha com ele? – Ela soltou um longo suspiro e tentou explicar novamente.
   - Elizabeth é uma piranha. Ela me levou para conversar com um grupo de homens e do nada beijou um deles, me deixando sozinha com os outros. Eles começaram a dar em cima de mim, todos bêbados, e eu dizia para pararem e me deixarem em paz, mas eles não escutavam. Então resolveram me jogar aqui dentro com um deles. Eu esperei que os amiguinhos dele não estivessem na porta e bati a cabeça dele contra a parede, apagando-o temporariamente. Onde você estava? Por que não me ajudou? – Seus olhos se encheram de inquietação e até mesmo um bom tanto de angústia. Ok, isso não era bom. Uma agente treinada da CIA ficara receosa pelo que um bêbado sem noção poderia fazer. Ou alguém estava de TPM ou o álcool estava fazendo efeito. Ou quem sabe os dois.
   - Ei, calma... – Envolvi com meus braços e encostei sua cabeça em meu peito. Ela passou os braços pela minha cintura, tentando se acalmar. Fiz um carinho de leve em seu cabelo e passei a mão por suas costas. Ela respirou fundo parecendo um pouco mais tranquila, embora só a minha presença ali já não a permitisse relaxar 100%.
   - O que vamos fazer com ele? Quero dizer, não podemos deixá-lo aqui... – Me separei dela calmamente, sentia que a qualquer movimento brusco surtaria. Não estou brincando, nunca a vi tão desestabilizada, o que era bem estranho a julgar tudo que já tinha passado sem se abalar. Gostei da versão frágil da minha parceira quase tanto quanto gostava do seu eu destemido e corajoso. Tal dependência e sensibilidade eram características que eu gostaria de explorar/reaver mais vezes, em outras ocasiões.
   Peguei um dos braços do cara e arrastei-o para o fundo do cômodo onde ninguém o veria. Ela me seguiu.
   - Esse cara foi um idiota com você, e ele está somente desmaiado. Com certeza podemos deixá-lo aqui, você não tem que se preocupar com ele. Além do mais, se ele estava bêbado mesmo, mal se lembrará do que ocorreu. – Ela pareceu avaliar minha proposta um tempo e por fim assentiu com a cabeça. Peguei sua mão e depositei um beijo nela, pronto para tirá-la daquele mundo de ácaros quando alguém entrou no quarto e fechou a porta. Parei onde eu estava.
   - O que você quer, merda? Já disse que eu estou investigando, só que eles são agentes e não burros, leva tempo até pegar algum defeito no disfarce! Se é que há disfarce! – Escutei uma voz fina, porém masculina, dizer e na mesma hora olhei para . Ela tinha os olhos arregalados. - O chefe não está interessado nas suas desculpinhas, seu idiota, ele quer respostas já. E se até o fim da semana você não tiver certeza se o casal sensação é ou não é a dupla de agentes que está aqui para espioná-lo, teremos problemas sérios. Estendido? – A voz grossa do outro homem que era aparentemente o capacho do nosso procurado foi ficando mais alta, indicando que ele avançava na nossa direção. Estávamos precariamente escondidos então me virei para colocando um dedo no lábio de forma a pedir silêncio. Ela concordou e me deixou empurrá-la até o canto mais distante que podíamos. Vários casacos nos separavam dos dois que ainda discutiam, mas mesmo assim eu estava temeroso. Encostei na parede e meu corpo no dela. Quanto menos espaço ocupássemos, mais dificilmente seríamos detectados. No chão, o corpo do imbecil que quase tinha se aproveitado de estava bem ao nosso lado e eu rezava para que ele não acordasse agora. – E você por acaso tem pelo menos alguma pista ou nada ainda? Hein, seu inútil? – ainda estava um pouco fora dos eixos pelo ocorrido antes de eu chegar e suas pernas estavam meio fracas. Ela se apoiou em mim ao mesmo tempo em que eu a segurava com mais força. O que nós não precisávamos agora era o som dela desmoronando no chão.
   - M-mais ou menos... Eu reparei que eles são muito carinhosos um com o outro, mas... Para um casal recém-casado não têm muita paixão, fogo. Mas isso pode não significar nada... Eu ainda não sei, preciso de mais tempo! – O voluntário a bichinha do mês disse, me fazendo ficar puto. levantara os olhos para mim entendendo o que deveríamos fazer a partir de agora. Um holofote na nossa cabeça não nos ajudaria em nada se quiséssemos descobrir quem era o cara.
   Eu achava incrível nossa capacidade de nos entender sem sequer precisarmos de palavras para tanto. Era mais que claro que se saíssemos do esconderijo acabaríamos com os dois ali rapidamente já que tínhamos todo um treinamento, mas ambos sabíamos que ficar quietos e absorver o máximo de informação que pudéssemos seria melhor. Ela não admitiria nunca, mas nós funcionávamos bem como dupla.
   - Seu tempo está acabando, infeliz. Trate de tirar suas dúvidas logo, quero você 24 horas colado naquele playboy e naquela gostosa. – reprimiu maiores reações, mas seu olhar adquiriu um quê de divertido ao ouvir se referirem daquele jeito a mim. Mirei-a sarcástico, levantando uma sobrancelha. Os braços dela que estavam pousados em meus ombros fecharam-se em meu pescoço e ela esboçou com a boca a palavra ‘playboy’ bem perto da minha. Aquela garota adorava provocar. E ainda reclamava de mim! Eu podia ser mais direto, mas ela... Ah, ela era melhor nisso. Olha a situação que estávamos e ela vinha com joguinhos! Pois que se dane, não é como se eu fosse reclamar. Desci uma mão pela extensão de sua coxa esquerda e a puxei junto a minha cintura, pressionando-a mais contra a parede com o meu quadril enquanto sibilava a palavra ‘gostosa’ rente a sua boca. Ela demonstrou surpresa e agrado ao mesmo tempo. Tudo bem, retiro o que eu disse sobre poder ser TPM. Isso era definitivamente culpa do álcool.
   Os dois que antes discutiam perto de nós começaram a se retirar do lugar, mas eu já não ligava, estava em outro mundo. A mulher colada a mim mordia levemente o lábio inferior e me olhava com tesão explicito e diversão. Encarei sua boca um pouco e quando me aproximei mais com o intuito de beijá-la, sussurrou provocativamente roçando nossos lábios.
   - Acho melhor voltarmos pra festa, amor. - E me empurrou, saindo andando rebolando até a porta do quarto com um sorriso vitorioso. Parou e olhou pra trás com falsa inocência – Você não vem? – Abaixei a cabeça e sorri um pouco, logo me dirigindo a ela mexendo a cabeça de um lado pro outro. Aparentemente, ela se recuperara. Essa minha menina não prestava mesmo. E com isso, mais uma vez, ela se provava o molde perfeito para mim.
   Voltamos para a festa disfarçadamente, mas nada mais parecia tão interessante. Não conseguimos encontrar os caras que estavam no armário, afinal tudo o que sabíamos era a voz deles e isso pouco nos seria útil em uma festa repleta de todo o tipo de gente falando alto e escrachadamente. Despedimo-nos de todos que conhecemos naquela noite e fomos para nossa casa. Era hora de colocar a operação ‘somos um casal com fogo’ em prática.

Capítulo 7 - The after party

  por Ele

  - Essa está pra se tornar uma noite interessante. – Olhei para a garota que andava ao meu lado, sorrindo de lado, maroto.
   - Vamos ver do que você é capaz, . – Rebateu. - É bom convencer nosso espião direitinho... – disse baixo, andando de costas para ficar de frente a mim e passando o dedo indicador do meu pescoço até minha cintura, rindo em seguida.
   Chegamos em casa, destrancou a porta e esperou que eu entrasse. Assim que ela também entrou e fechou a porta novamente, a prendi contra a mesma ao postar meus braços um de cada lado de seu corpo esguio.
   - Hm, nos meus braços. Essa noite será longa... – Murmurei, inclinando-me para beijar seu pescoço. Mas não por muito tempo, ela foi mais rápida, fugindo por debaixo do meu braço estendido na porta e correndo para a sala rindo. Eu nunca vira tão descontraída e ela ficava ainda mais linda desse jeito.
   - Você quer? Vem pegar, ... Literalmente. – Ela estava parada no meio da sala, rindo como uma criança embora com malícia enquanto tirava seus sapatos. Dei um sorriso e me aproximei dela.
   - Quanto mais você foge, mais tempo nós perdemos, )... – A alcancei, coloquei minhas mãos em sua cintura e colei seu corpo ao meu. Ela mordeu o lábio inferior, alternando seu olhar entre meus olhos e minha boca.
   - Eu não quero mais perder tempo, . Eu quero você. – Disse. Ninguém pode realmente me culpar por tê-la beijado naquela hora. Quando uma mulher como diz que te quer, você obedece. Simples assim! Danem-se os joguinhos, certo?! Capturei seu lábio inferior logo forçando abertura para encaixar nossas bocas da forma mais certa possível. Ela colocou uma mão em minha nuca e com a outra arranhava de leve as minhas costas. A sensação das nossas línguas finalmente entrando em contato era única.
   Eu estava louco por desde que a conheci na Europa, quando eu ainda fazia parte do mundo do contrabando. Não pude tirá-la da minha cabeça desde então, só ficava imaginando como seria tê-la. Lógico que ela foi tão desprezível comigo quando entrei para a equipe de espionagem da CIA, que meu ódio cresceu rapidamente, mas sabe o que dizem: ódio e amor são dois lados da mesma moeda. No meu caso, não era amor, só desejo mesmo, mas ainda assim era forte. Muito forte.
   O beijo ia ficando cada vez mais rápido e mais intenso, minhas mãos já não encontravam barreiras naquele corpo perfeito. começara a puxar meus cabelos e o lado masoquista que eu tinha adorou. Separei nossas bocas quando percebi que não tínhamos mais fôlego de tão ofegantes e passei a beijar seu pescoço e colo. Os leves gemidos que ela soltava somados com a força cada vez maior com que me apertava e arranhava, estavam me tirando dos eixos. Invadi seu vestido com as minhas mãos, acariciando e dando apertões em sua cintura. começou a abrir os botões da minha camisa, mas não parecia muito paciente, de modo que no terceiro botão ela desistiu, agarrando os dois lados da camisa e puxando, fazendo os botões restantes estourarem e caírem pelo chão. Ela alcançou sua boca no meu peitoral e com as mãos empurrou a camisa pelos meus braços. Puxei sua face para cima e comecei mais um beijo ardente. Suas unhas perfuravam minhas costas, naquele momento sem o tecido, tornando muito mais excitante. Livrei-me de seu vestido e parei para admirá-la apenas de calcinha e sutiã. Ela era magnífica. pegou minha mão sorrindo safada e começou a me guiar para a escada. Antes de chegarmos no entanto, usei a mão que segurava a dela para trazê-la de volta, entranhando meus dedos nos cabelos de sua nuca e beijando-a mais uma vez. Deslizei minhas mãos por seu corpo e parei em suas coxas, fiz pressão e elas se levantaram, envolvendo minha cintura. Finalmente, voltei a escada, subindo-a rumo ao quarto com a minha mulher no meu colo. Continuávamos nos beijando e acariciando, no entanto, de modo que a subida foi muito mais difícil do que eu pretendia. Quando chegamos ao quarto, joguei-me na cama de costas.
   estava deitada em cima de mim, ainda me beijando. Apertei com força sua bunda e pressionei seu quadril de encontro ao meu para que ela sentisse minha excitação. Ela soltou um longo gemido sofrido, som capaz de me deixar duro noites a fio apenas com a lembrança, mas então as coisas desandaram. Ela parou de me beijar e sentou-se sobre mim, me olhando assustada. Eu estava atordoado e não sabia o que tinha acontecido, o porquê de ela ter parado.
   - Hm... Acho que ele acreditou, huh? – Ela me encarou estranho.
   - O quê? O que ta acontecendo, por que você parou? – Sim, eu estava bem confuso. Alguém pode me culpar por isso? Meu sangue não estava concentrado exatamente na minha cabeça nesse momento. Ou, pelo menos, não na de cima.
   - Já o convencemos, , o que acontece na cama ele não tem como ver. – explicou e eu deveria continuar com cara de quem caiu da mudança. – Hm, boa noite. – Desejou, ainda desconfortável. Dito isso ela saiu de cima de mim e entrou debaixo das cobertas. Deitou sua cabeça no travesseiro e permaneceu em silêncio, de costas para mim. Eu ri sozinho como um lunático, não acreditando que aquilo estava mesmo acontecendo. Resolvi então que ficar parado, sentindo pena de mim mesmo, não ia mudar nada. Tirei meus tênis, meias e calça e fiz o mesmo que ela, virando para o lado oposto, sem querer olhar nem pras suas costas e tentei, em vão, dormir.

Capítulo 8 - Jogging

  por Ela

  A sanidade resolveu voltar no último segundo possível, é verdade. Eu estava mesmo me entregando, estava enlouquecida demais de luxúria para perceber o que fazia. O sonho da noite anterior praticamente dançava na minha cabeça, me fazendo desejar sentir ao menos um décimo do que aquela alucinação fez. O álcool também não me ajudava. E o beijo dele... As mãos dele percorrendo meu corpo... Acho que nunca vou superar essa sensação. A minha imaginação não chegou nem perto de exemplificar quão maravilhoso aquilo tudo era. acabara de estragar qualquer outro homem para mim, ele era simplesmente delicioso. Claro, extremamente experiente como eu apostava que era, malhado, e ainda com o fator “eu na seca”, ficava difícil de acreditar que uma noite de sexo com ele seria ruim. No entanto, as expectativas foram excedidas sem sombra de dúvidas.
   Não consegui pregar os olhos a noite toda com medo de sonhar com o que poderia ter sido se eu não tivesse parado. bufava ao meu lado de 5 em 5 minutos, o que tornava óbvio que ele também não conseguia dormir. “Casal insônia” era como podíamos ser apelidados. Há-há.
   O meu maior problema é que eu estava constantemente me esquecendo que ele era o cara mal. Na minha cabeça, nas horas que ele me seduzia ou apenas falava comigo, ele passava a ser o bonzinho. Por um período curto de tempo, é verdade, mas mesmo quando eu me lembrava todo o perigo e audácia que manchavam a aura dele, isso acabava se tornando mais um estímulo pra minha libido descontrolada. Todo aquele papo de tudo que é proibido é mais gostoso. E isso estava errado, eu não podia me permitir pensar assim; ele não era qualquer bad boy, não se fazia de mal. Eu sabia como ele era na realidade: desprezível.
   Sabia? Bom, ele tinha entrado pra CIA afinal. Tinha se redimido. Não, não mesmo. Eu não sabia os motivos dele pra ter feito isso, mas boa coisa não havia de ser. Eu tinha que me policiar pra não esquecer disso.
   Finalmente amanheceu. Me levantei vagarosamente e fui para o banheiro fazer minha higiene pessoal. Quando abri a porta um sonolento jazia apoiado no batente esperando sua vez. Dei passagem sem se quer trocar olhares com ele de tão tenso que estava o clima. Peguei qualquer camisa de que estava jogada pelo quarto e a vesti, sem paciência para fazer mais do que isso. Desci as escadas para fazer café, mas fui interrompida pela campainha estridente que estourava meus tímpanos. Bufei irritada e fui atender a porta.
   Claro que era Elizabeth. Como se meu dia já não estivesse ruim o suficiente. Lembrei-me da última vez que ela veio em casa e eu tive aquela conversinha com na cozinha. As coisas estavam tão tranquilas, o clima entre nós dois era tão suave... E aí eu estraguei tudo. Mas espera um pouco também, era isso ou a minha consciência! Eu prefiro viver a vida sem arrependimentos, obrigada.
   - Liz! Hm, oi, o que faz aqui tão cedo? – Tentei parecer simpática, mas a minha cara deveria estar gritando ‘dê o fora daqui, vadia’. É a vida.
   - Ai amiga, eu vi tudo ontem à noite! Que safada você, hein! – Ela me olhou marota e deu uma risada escandalosa que fez a minha cabeça latejar. Ela apareceu não tinha nem dois minutos e já estava me dando enxaqueca, por Deus!
   - Ah, é... Com um homem desses, eu tenho que aproveitar, né?! – Mexi nos meus cabelos impaciente. Eu só queria que ela desaparecesse. Senti uma mão grande envolver a minha cintura e ao olhar por cima do ombro identifiquei um de cabelos desarrumados e boxer. Era tentativa de me matar ou só impressão?
   - Bom dia, Liz – ele disse, logo em seguida sussurrando na minha orelha alto o suficiente para que a vizinha escutasse – Bom dia, gostosa. – Ri um pouco sem graça e aproveitei para tirar a atenção da clara atuação forçada que estávamos fazendo. Não que de fato desse para perceber, mas eu estava longe de ter condições de fingir alguma coisa naquele momento. por outro lado sempre atuava melhor do que eu, mas tenho certeza que ele também estava se sentindo incomodado de ter que falar desse jeito comigo justo depois do que ocorrera na noite anterior.
   - Mas e aí Liz, pegou geral ontem, hein? – Sim, eu quis que ela se sentisse mal. Afinal, eu acabei dentro de um armário com um brutamontes imbecil por culpa dela.
   - Imagina, . Mesmo não dormindo sozinha, foi você quem se deu bem ontem. – Elizabeth olhou safada para que apenas sorriu amarelo.
   - É... – tossi para que a minha voz ficasse mais forte e tentei de novo – Enfim, Liz, o que veio fazer aqui? – Eu juro que não quis soar rude, mas foi um pouco inevitável. Conversávamos na porta de casa porque nem morta a convidaria para entrar novamente. deu um apertão em minha cintura em alerta para que eu fosse mais gentil.
   - Bem, eu estava pensando em dar uma corrida e queria saber se vocês querem me acompanhar. Na verdade, , você não tem cara de quem curte isso, já tem o corpo que toda mulher pediu a Deus... mas já você, , deve fazer alguma coisa para manter todos esses músculos... E então, o que me diz? – A piranha ruiva encarava com um brilho até malvado nos olhos. Eu estava me segurando muito para não pular no pescoço dela e arrancar fio por fio dos seus cabelos.
   - Err... Valeu, Liz, mas eu to mais a fim de passar a manhã com a minha esposa. Quem sabe à tarde? – disse coçando a cabeça. Ela pareceu ao mesmo tempo nervosa e feliz com a resposta dele. Eu por outro lado queria matá-lo. Ah, mas eu faria de TUDO para que ele não fosse passar a tarde com a biscate. Ele ainda não conhecia o meu lado determinado: quando eu quero uma coisa, consigo. E a putinha vai ficar a ver navios enquanto o meu homem fica na rédea curta.
   Nossa, acho que a esposa ciumenta que deve existir dentro de mim resolveu sair pra uma volta.
   - Ok então , à tarde eu passou aqui pra te chamar. Beijo, zinha. – Eu nem me dei ao trabalho de sorrir de tão louca de raiva eu estava. acenou e eu bati a porta.
   - Você não vai. – Disse no meu tom mais autoritário para , em seguida marchando até a cozinha. Ele me seguiu.
   - Aparentemente você quem decide o que acontece ou deixa de acontecer nessa casa, não é, ? Pois eu não sou pau mandado, amor. – Rebateu. O duplo sentido da frase me pegou desprevenida, de modo que eu perdi a deixa de respondê-lo.
   Tomamos café da manhã rapidamente e fomos para o escritório informar Leonard de como as coisas estavam indo. Passamos o relatório para Débora e recebemos a notícia de que as câmeras de segurança instaladas em torno da casa haviam pego um espião.
   - Vou lhes mandar a foto do invasor junto com mais informações sobre Elizabeth, Pâmela e Joseph. Assim que tiver qualquer novidade relacionada aos outros nomes que me passaram, os chamo. Qualquer contato com o caso me informem. Leonard está enlouquecido de não poder pessoalmente procurar o terrorista, então qualquer coisa que vocês mandarem o acalmará. – Débora sorriu cúmplice, sempre prestativa, e desligou a videoconferência. Em segundos todos os dados pessoais das três pessoas com as quais tivemos mais contato até então apareceram na tela. Nada alarmante, apenas o fato de que Joseph foi sargento militar durante 5 anos e foi afastado do cargo por exteriorizar segredos de estado.
   A foto do espião, no entanto, não nos ajudou muito. Ele estava encapuzado, mas parecia magrelo e baixo. Sua aparência física fazia jus à voz que escutamos na chapelaria, o rapaz que estava sendo ameaçado.
   Depois de tanto tempo em meio a investigações, já era hora do almoço e o estômago de resolveu nos lembrar dando um ruído alto. Eu ri tentando descontrair o clima que permanecia tenso e disse que ia cozinhar para nós. Ele apenas murmurou um ‘ok’ e continuou trabalhando em Joseph, procurando o que ele poderia ter divulgado para levá-lo a ser expulso do exército. Suspirei, desistindo de arrancar mais do que meia palavra dele e fui fazer um almoço caprichado.
   Comemos em silêncio, ainda mal me olhava na cara já que estávamos na parte coberta da casa e tudo que eu pensava era o que fazer para que ele não fosse correr com a vadiazinha. Pedir e usar chantagem nesse ponto não iam surtir efeito, então eu precisaria apelar. O pior era que parte de mim ficara absurdamente feliz de ter uma desculpa para fazer o que eu tanto queria, e isso era muito errado. Mas os fins sempre justificam os meios, certo?!
   Voltamos a sala e, da minha casa, eu era capaz de ver Elizabeth prendendo seus cabelos em um rabo de cavalo alto, provavelmente já se aprontando para sair com o meu homem. fora em direção as escadas com o intuito de se trocar imaginei eu, então fui logo atrás dele. No quarto, colocaria todo o poder de indução que eu tinha a prova.
   Entramos no quarto e abriu o armário separando uma regata, calça da adidas e meias. Eu tirei a camiseta dele que ainda usava e me joguei na cama, de calcinha e sutiã. Esperei que se virasse e me olhasse e que de alguma forma isso fosse o bastante, mas ele apenas engoliu em seco e trancou-se no banheiro para se trocar. Bufei irritada, arquitetando o próximo passo. Era clichê e surreal, mas talvez funcionasse. Eu não estava em condições de pensar em nada melhor, o tempo corria contra mim.
   saiu do banheiro e eu joguei a bomba:
   - , já que sua colega de esportes ainda não chegou, você podia ser um bom marido e me fazer uma massagem? Eu sei que você não deve estar muito a fim, mas é que eu estou com um nó absurdo que está me impedindo de dormir à noite... – eu o olhava com cara de pedinte e ele parecia bem perdido, como se subitamente todas aquelas palavras fossem demais para ele, já que estávamos trocando apenas murmúrios e meias-frases. Aproveitei sua falta de reação e agradeci como se ele tivesse concordado, me deitando de bruços e abrindo o fecho do sutiã para que ele tivesse acesso às costas todas, sem restrições.
   hesitou um pouco, e por fim se sentou ainda temeroso na cama e calmamente encostou as mãos em mim. Depois de uns três minutos pareceu se tocar e começou a se concentrar na massagem. Suas mãos percorriam toda a extensão de pele das minhas costas, apertando, dedilhando... E sempre que chegavam perto da curva do meu seio ou da linha da minha calcinha no quadril eu as sentia tremer levemente. O plano estava indo bem, eu ganhava uma deliciosa massagem e ainda o tinha focado em mim durante algum tempo. Eu apenas esperava que uma hora ou outra ele desistisse de tamanha castidade e tornasse os toques mais... sedentos, para que eu pudesse lhe dar uma desculpa boa o suficiente para impedi-lo de ir. E ele estava quase lá, passando a mão muito suavemente pelo tecido fino da minha calcinha com a provável intenção de massagear minha bunda. Mas aí a campainha tocou. Ele se levantou em um pulo, murmurando ‘deve ser Elizabeth’ e foi em direção a saída do quarto. Merda. Eu precisava agir. Corri atrás dele, prendendo o sutiã no caminho.
   - , espera! – gritei e ele parou para me olhar. Droga, eu não tinha nenhuma desculpa bolada. O jeito seria barganhar. – Não vai. Por favor, fica aqui comigo. A gente sai mais tarde se você quiser, eu até vou à academia com você se for isso que você tiver vontade de fazer, mas não vai com ela. – A sensação que eu tinha era horrível, era pena de mim mesma misturada com vontade de voltar no tempo... Com um estalo percebi que era arrependimento, remorso. Eu estava me sentindo mal de ter pulado fora na noite anterior e ter automaticamente instalado esse clima entre a gente.
   pareceu avaliar minha feição para ver se eu realmente estava implorando àquele ponto ou se estava tirando com a cara dele.
   - ... Eu marquei com ela, não vou furar. – Disse como um pai que explica a uma criança porque ela não pode comemorar seu aniversário todo dia. Ele deu de ombros e desceu as escadas. Fui atrás praticamente trocando os pés de nervoso. Entrei na frente dele um pouco antes da porta e coloquei uma mão em seu peitoral para que ele parasse de andar.
   - Por favor, eu faço o que você quiser. – Eu estava apelando mesmo, mas não podia deixá-lo com aquela puta! Ainda mais enquanto ele está com ódio de mim. Só o pensamento já revirava meu estômago. Papel de esposa eu faria, mas papel de corna já extrapolava meus limites.
   levantou uma sobrancelha, claramente chocado com meus esforços para que ele não fosse. Elizabeth deu um berro do outro lado da porta, apressando . Ele olhou para a porta e depois para mim, para a porta e para mim de novo, totalmente indeciso do que fazer. Fiquei na ponta dos pés e passei um braço por seu pescoço enquanto com uma mão segurava carinhosamente seu rosto.
   - Por favor – sussurrei próxima a sua boca. A troca de olhares entre nós foi intensa. Ele engoliu em seco mais uma vez, desviou-se de mim e abriu a porta.
   - Liz, foi mal, vou furar com você hoje... Mas divirta-se, ok? – Não escutei o resto da conversa ou sequer se houve resposta. Um instante depois a porta era fechada e virava-se para mim novamente.

Capítulo 9 - Mistaken

  Por Ela

  - Você sempre consegue tudo o que quer, não é? – Ele disse conformado, passando por mim direto como se falasse com as paredes. Não entendi nada. Eu achei que dispensara Elizabeth para ficar comigo, para me beijar... Mas ele nem sequer tentou.
   - , aonde você vai? – Questionei alarmada.
   - Pra longe das suas manipulações. – Respondeu duro. Aquilo doeu. Doeu, porque a verdade sempre doi.
   Eu não sei onde , de fato, se enfiou, mas eu passei o resto da tarde no quarto, refletindo sobre mim, sobre a vida. Abraçava meus joelhos, pensativa. Depois de umas três horas na mesma posição, ele entrou no quarto. Não levantei meu olhar, minhas unhas do pé estavam muito interessantes naquele momento.
   - Está esfriando, você deveria se vestir. – Seu tom de voz ainda era duro, mesmo que o que ele dissesse fosse para o meu bem. Assenti lentamente, suspirando em seguida. Ele mexia em algo na cômoda e eu achei melhor escutá-lo. Levantei-me e entrei no banheiro, não me importando mais de trancar a porta já que ele sabia que eu estava lá e não entraria.
   Tirei as poucas peças de roupa que usava e liguei a água fria, logo entrando de cabeça. Eu não conseguia tirar do pensamento os últimos acontecimentos. O que estava acontecendo comigo? Eu estava acostumada a brigar com ele. No prédio da CIA essa era uma cena comum: nós dois nos encontrávamos pelos corredores, nos alfinetávamos, ele fazendo alguma brincadeirinha, eu perdia a estribeira e falava mais do que devia. Eu sabia que estava puto da vida comigo, mas sempre que isso acontecia ele arranjava um jeito de me fazer ficar mais nervosa do que ele estava. Nunca ficávamos nessa de cabeças baixas. Nós dois somos pessoas explosivas, pessoas que correm atrás e não se conformam com o jeito que termina. E de repente estávamos preferindo ficar na nossa, não discutir, não tentar. Acho que inadvertidamente criamos um laço de cumplicidade. Isso podia ser bom para a missão, mas seria péssimo para meu estado espiritual.
   Sentia a água fria levar embora as sensações estranhas que me perturbavam, me dando um momento de paz. Minha mente parou de trabalhar e o corpo relaxou, curtindo o máximo que aquele banho poderia me promover. O silêncio foi alterado por um barulho desconhecido, mas eu não estava disposta a deduzir o que era ou sequer abrir meus olhos.
   - Ducha fria? Qual é, e eu pensando que tomar banho com você seria prazeroso. – ouvi a voz de de mais perto que o aconselhável, mais especificamente de trás de mim. Por um momento achei que só podia ser coisa da minha cabeça embriagada, me tornando ciente de que ele estava dentro do box comigo apenas no segundo seguinte. Dei um grito e escondi meu corpo o máximo que consegui, com os braços nos seios e as coxas apertando-se uma contra a outra fortemente, encarando-o assustada, de olhos arregalados.
   - O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI? FORA, AGORA! – apenas me olhava sorrindo debochado enquanto abria o registro de água quente. – EU NÃO ESTOU BRINCANDO, , VAZA!
   - Mas, amor, você disse que faria qualquer coisa para que eu não fosse correr... – O desprezível disse, me deixando encurralada. Então era assim que ele pretendia fazer para que as coisas voltassem ao normal? Abusar de mim como sempre, eu o estapearia como sempre e voltaríamos a nos odiar como sempre? Bem, talvez com isso eu pudesse lidar.
   - Foi modo de falar e de qualquer forma não achei que você fosse mesmo ter a cara de pau de cobrar, muito menos que entraria sem ser convidado no meio do meu banho! – riu mais uma vez, provavelmente sabendo que eu esperava sim que ele cobrasse e até mesmo desejava isso, e se aproximou de mim que ainda me cobria desesperadamente.
   - Fica tranquila, , seu corpo é lindo, não tem que se envergonhar. – Filho da puta! Ele adorava mudar de assunto. Eu só queria entender porque meu rosto estava esquentando a cada palavra que ele dizia. Era a água que agora estava quente, só pode. Ele tocou meus ombros sussurrando um ‘calma’ irônico.
   - Arg, , para com isso. Se você quer realmente me irritar, espera até eu sair do banho! – exclamei em uma última tentativa de tirá-lo de lá. Ele sorriu balançando a cabeça de um lado para o outro, negativamente. Revirei os olhos, aproveitando para olhar pela primeira vez para seu corpo constatando que ele pelo menos teve a decência de não entrar nu ali, embora estivesse apenas de boxer, o que já era muito para o auto-controle de qualquer mulher que tivesse essa visão. Ainda mais considerando que a mesma estava ficando cada vez mais transparente conforme a água que batia no meu corpo espirrava nele. Esquivei-me de seus braços, alcançando a toalha que eu deixara pendurada no vidro do box e me envolvendo com ela que logo ficou encharcada. Assim pelo menos eu me sentia confortável para enfrentá-lo.
   - Você sabe que com um puxão, eu arranco isso, , deixa de criancice. – ele revirou os olhos, logo me segurando entre seus músculos, digo, braços, novamente.
   - Criança é você que acha que pode entrar aqui e me pegar a força. – Disse indignada. Em resposta, me encostou na parede gelada e aproximou o rosto ao meu. Tremi.
   - Não é a força quando a outra pessoa também quer, . – Ok, eu realmente não tinha cara de pau de negar aquilo. Negação tem limite. Após horas almejando uma segunda chance de fazer as coisas direito eu não ia deixar a deixa passar. Pelo menos não no estado que eu estava de ansiedade para que ele finalmente diminuísse a distância entre nossas bocas.
   Percebendo minha falta de reação, ele deu-se por satisfeito e avançou. Uma de suas mãos agarrou meus cabelos molhados da nuca possessivamente, enquanto a outra mantinha nossos corpos grudados pela cintura. Seus lábios capturaram os meus em uma dança ardente e perigosa e eu já não tinha coragem de não correspondê-lo completamente. Nossa, beijá-lo era ainda melhor do que eu me lembrava e isso porque não fazia nem 24 horas! Minhas mãos, até então esquecidas ao lado do meu corpo, levantaram-se e abraçaram pelo pescoço, retribuindo o amasso com entusiasmo. desceu as duas mãos para o meu quadril, apertando com força contra ele. Comecei a arranhar suas costas, desesperada para senti-lo cada vez mais em mim. Era como se todo o contato com ele não fosse suficiente, eu queria sentir toda a sua pele na minha, eu tocava todos os lugares possíveis, braços, costas, peitoral, barriga, nuca... E ainda não era suficiente. Ele me apertava contra si com tanta força, quase desafiando as leis da física e ainda assim não estávamos em contato o suficiente. Arfei contra sua boca, não tendo mais condições de continuar aquele beijo, e o abracei com toda a força que tinha.
   Sim, eu o abracei.
   Eu queria senti-lo. É estranho explicar, mas era isso! Nosso distanciamento repentino durante o dia deve ter acarretado em uma vontade inconsciente de estar com ele. A verdade era que ali, naquela missão, só tínhamos um ao outro, e depois da nossa briga estúpida a sensação de solidão era muito forte. Aquela não era a minha casa, ou pelo menos não era assim que eu sentia. Eu não tinha amigos naquele condomínio, apenas suspeitos. A única parte da minha vida que me era familiar e que continuaria a ser pelo resto do ano era . Sem essa facção crucial eu estava sozinha. Daí surgiu a ânsia pela sua companhia. Ele, aparentemente, compartilhava da mesma necessidade, uma vez que agora me pressionava contra a parede tanto que quase gerava dor e distribuía pequenos beijos pelo meu pescoço incandescente.
   Aos poucos, essa necessidade por contato tornou-se luxúria. Voltamos a nos beijar e acariciar, mas agora a coisa era mais sensual. Minhas mãos faziam desenhos abstratos pelas madeixas escuras do meu parceiro, demonstrando meu apreço pelo contorno que sua língua fazia em minha clavícula. Nossas bocas passaram a se procurar, meu lábio superior tocando seu inferior e vice-versa, até que ele começou a suga-los e empurrou sua língua pela abertura da minha boca. Nosso beijo encaixava perfeitamente, e mesmo que eu o deixasse ditar o ritmo e a intensidade, era quase como se eu o fizesse, tamanha a sincronia com meus desejos e vontades. Aprisionei o canto do lábio de entre meus dentes, puxando provocativamente ao passo que ela ia escorregando. Ele soltou um suspiro, e logo chocou novamente nossas bocas, acelerando o passo no qual devorávamos o sabor um do outro. puxou minha coxa contra seu quadril do mesmo modo que fizera na chapelaria da festa, e pressionou-se contra mim. O fervor dentro de mim rugiu. A toalha estava quase escorregando do meu corpo, mas eu não me importava mais. Ele começou a lentamente se esfregar contra mim, em um movimento quase inconsciente, sua ereção massageando a parte de mim que mais implorava por ele. Não consegui conter um gemido desesperado e pareceu sair do controle com o som, pegando minha outra perna e também colocando em seu quadril. Ele agora se esfregava com mais força e vontade, em movimentos ritmados contra mim que não parava mais de gemer. Ele também grunhia e apertava meu seio que havia sido exposto pela toalha que escorregara, parando em minha cintura.
   Aquilo estava se tornando bom demais. Nossas mãos não tinham freios e as bocas encostavam e todos os lugares possíveis. Meu clitóris tão renegado por tanto tempo tinha inchado e agora era agraciado com a melhor das carícias, com a pressão que eu tanto almejei sentir. alternava esfregadas lentas e fortes com reboladas rápidas e superficiais, de modo que eu quase podia sentir meu orgasmo nascendo nas minhas entranhas, devagar e poderoso. Claro que pra ele se concretizar eu precisaria de um pouco mais. Talvez eu precisasse sentir dentro de mim, estocando como se sua vida dependesse disso. Eu estava convencida de que era isso que eu precisava, e que deixaria que isso acontecesse. Mas talvez de forma... Menos invasiva. Os dedos dele me pareciam suficiente. Eram grossos e longos e a julgar por toda a habilidade sexual que aquele homem exalava, não me decepcionariam. Isso, com isso eu podia lidar. Não era tão íntimo assim. Preliminares o meu subconsciente pode aceitar. Afinal, era uma necessidade a ser sanada, apenas isso. Independia do fato de ser ali.
   Eu me convencia disso arduamente, e estava obtendo um bom resultado. Até que resolveu abaixar sua boxer. Eu gelei.
   - , não... – Protestei em uma voz que mais parecia um gemido. Afinal, os movimentos do quadril dele ainda eram recentes e eu estava ardendo de tesão.
   - O que foi, , acha que não aguenta? – Ele perguntou safado no meu ouvido, revivendo a chama que pedia por ele. Puxei seu rosto e o beijei com fúria mais uma vez, deixando-o desorientado. Quando finalmente o soltei tentei de novo:
   - Sério, , podemos ficar só nisso? Eu não quero transar com você... – “aqui”, completei mentalmente, me punindo em seguida. Menti ainda tentando manter minha consciência limpa, pois se me entregasse na certa ia me sentir mal depois. Mas também não podia ser escrota e arriscar voltar ao estágio no qual nos encontrávamos antes do banho.
   - Não quer? Lógico, e está gemendo como uma vadia no cio por que então? – Rebateu sacana. Aquilo me surpreendeu. Estávamos em um momento de tanta conexão que eu não esperava que ele fosse ser idiota daquele jeito. Acho que em algum lugar no caminho me esqueci quem ele era. Me esqueci que ele era o cara malvado, o desgraçado que eu tinha que aturar na frente dos outros pro bem da missão e só. Ali, naquele banheiro, nada do que fazíamos podia ser visto por qualquer pessoa. E, no entanto eu estava lá, não fazendo a mínima questão de me afastar dele. Mas aquelas palavras, aquela rudeza, fizeram a compreensão me atingir. Eu estava me entregando a um cara que eu sabia que não se importava comigo, que não queria o meu bem. Aquilo estava muito errado. Eu precisava reagir.
   O encarei emputecida, descendo de seu colo e recuperando minha toalha. Não me importava que ele estivesse certo, ele não ia falar assim comigo. Eu não permitiria isso.
   - Bom, a vadia aqui acabou de sair do cio, que pena pra você. Quem sabe na próxima você não consegue se aproveitar um pouco mais de mim. – Sorri sarcástica e sai marchando do banheiro, deixando tudo molhado pelo caminho. Eu não me importava. estava logo atrás de mim.
   - Caramba, , não estou pedindo que você me ame nem nada do tipo, só o que eu quero é que você pare de negar algo que tem vontade e se entregue a emoção do momento! – Parei e me virei para ele.
   - Ainda bem que você não está me pedindo isso, porque eu não me apaixonaria por alguém como você nem sob ameaça de morte! – Eu vi em seus olhos que havia ido muito longe, tocado em um ponto fraco, mas estava tão nervosa que sequer me importei. – E pra sua informação, algumas pessoas têm valores, e um dos meus envolve estar com alguém que me mereça, que seja digno de mim. Alguém que eu admire. Coisa que você claramente nunca foi, é ou será.
   Peguei uma roupa qualquer no armário e desci para a hidromassagem, onde havia toalhas secas para que eu me enxugasse. Me troquei e sai rumo a sala de cinema com intuito de ficar longe do meu tão odioso parceiro.

Capítulo 10 - Spying on you

  Por Ele

  Dois meses e meio. 75 dias. 1800 horas desde a discussão. Até mesmo a estação havia mudado, o calor abafado do verão dando espaço a um outono melancólico. Assim como a folha que cai das árvores, seca e sem vida, estava nossa relação. Nós não nos falávamos mais. Eu a ignorava na medida mais extrema possível. Lógico que usava de artifícios como ficar em público para suprir minha necessidade de abraçá-la e beijá-la (ainda que superficialmente), mas dentro de casa era congelante. Ela havia se tornado um vício pra mim, o cheiro dela, o gosto... Portanto, aquela distância era um castigo para mim também. E para distrair minha mente pecaminosa e tentadora, eu me afundei em trabalho. Meus dias se resumiram estritamente à missão. Eu saia sempre que podia para conhecer gente nova e logo investigava suas vidas. Passava horas de olho nas câmeras de segurança para tentar identificar algum comportamento diferente. Às vezes até seguia uma pessoa ou outra na calada da noite a procura de qualquer informação.
   Além de um grupo de adolescentes comprando maconha e alguns casais pulando a cerca, eu não havia descoberto nada. Nada. O que só tornava cada dia mais frustrante.
   no começo tentava fingir que nada acontecera. Eu sabia que tinha falado merda, mas ela tinha ido muito mais além. E eu estava francamente cansado de tanta grosseria gratuita. Mas aquela vez foi a pior. Talvez por estarmos em um momento tão íntimo segundos antes, talvez apenas pelo teor de sua fala, mas a questão é que suas palavras quase puderam cortar o ar naquele momento, e acho que ela também sabia disso, pois não tentou se fazer de vítima. Mas quando percebeu que eu estava dedicado a não olhar na sua cara, desistiu de tentar um contato também. Agora vivia suspirando pelos cantos, sempre pensativa e observadora. Eu gostava de me iludir achando que ela estava sofrendo longe do meu toque, mas não era o tipo de mulher que lamenta qualquer coisa, ela passa por cima e continua a viver.
   Eu não. Eu tinha um gosto especial por remoer as coisas, um hábito infeliz de deixar minhas vontades me dominarem. E por isso realmente estava considerando obsessão. Mesmo distante eu era incapaz de tirar meus olhos dela. Estudara seu sono para saber em qual ponto se tornava pesado o suficiente para que não me sentisse tocá-la. Sentir a textura de sua pele me era tão vital quanto o bombeamento de sangue oxigenado. Guardava na memória cada mínimo encostar de lábios, o calor de sua mão, a finura de sua cintura. Atributos aos quais eu era agraciado com o acesso apenas em público, já que ignorá-la no restante do tempo era necessário. precisava dessa lição, e eu sabia que iria demorar a aprendê-la por completo. E por mais apegado que eu sabia que estava já havia engolido meu orgulho vezes demais para agarrá-la pelos cantos e sair sem qualquer tipo de alívio.
   Eu estava na sala de TV assistindo a qualquer programa que não prendia realmente a minha atenção quando senti o sofá se afundar ao meu lado. Não desviei meu olhar, como já era hábito. Ouvi minha esposa juntar ar, como que se preparando para dizer algo.
   - Vai continuar me ignorando por quanto tempo? – perguntou e eu podia jurar que ela não seria tão direta ao ponto, mas essa era a , sempre me surpreendendo...
   - Enquanto você continuar essa vadia sem coração, no mínimo. – Respondi ácido, ainda sem a encarar.
   - Arg, , desculpa ta? Eu fiquei nervosa e confusa e você ainda tinha que jogar aquilo na minha cara... – Bufou. – Eu perdi a razão quando falei aquelas coisas pra você. Eu sinto muito, não precisava ter te tratado daquele jeito. – Ela disse. Eu não acreditava que ela estava mesmo disposta a discutir o ocorrido e ainda tinha pedido desculpas! Isso era um avanço e tanto.
   - Confusa por quê? Sério, , o que você pensa que eu fiz de tão desprezível pra não aceitar que tem desejo por mim? – Ok, agora se ela queria conversar, iríamos conversar. Vamos ver até onde tinha refletido. Virei-me para ela, encarando-a. Ela parecia surpresa de ter finalmente prendido minha atenção.
   - Hm, você foi o chefe do contrabando de armas da Europa. Você é o cara mal, merda! – Gesticulava - Eu vi você ameaçar mais de uma pessoa para que te pagassem. Ameaçar vidas, famílias! Eu não posso ter desejo por alguém assim, é simples. – Ela explicou, dando de ombros. Isso era simplesmente ridículo, ela era cabeça dura demais, via tudo em preto e branco. Neguei com a cabeça. Ela não estava aproveitando o tempo para pensar. Passou todos esses dias apenas tentando engolir o orgulho para me pedir desculpas pelo que disse e apenas por aquilo. Não via a cena como um todo. O tratamento de choque não estava funcionando.
   Mudança de planos: Conquistaria a confiança dela aos poucos para que sozinha passasse a contestar aquilo que tinha como certezas. Suspirei. Nada com era simples. E não bastava ser esse o agravante de não podermos estar juntos, era também esse o motivo pelo qual eu não a tirava da cabeça.
   - Quer saber? Tá, foda-se. Pode continuar negando, eu sei que um dia você assume. – “E eu farei de tudo para que esse dia chegue logo” Acrescentei mentalmente. - Agora sejamos profissionais, não vou mais te ignorar e você para de ser tão respondona. Estamos nessa juntos e vamos pegar esse filho da puta. Certo? – Obvio que eu não desisti de fazê-la entender que seu lugar era comigo, mas eu entendi que discutir aquilo de forma racional não me levaria a lugar nenhum. é uma mulher impulsiva, se tem algo de que tenho certeza é disso. Eu sabia que para que ela sucumbisse ao desejo era necessário estarmos em um momento tentador, e uma ‘reconciliação’ não era exatamente algo que pudesse dar tesão. Pelo menos não aquela.
   - Certo. – É, ela ignorou a primeira parte da minha fala. O que eu disse? Não adiantava falar disso. - Agora o que acha de darmos uma volta à noite? Estou determinada a encontrar em alguma dessas casas o bostinha que nos espionou na primeira semana. – ofereceu com vingança líquida no olhar. De fato, tínhamos uma vaga ideia de como o cara deveria parecer e se espionássemos algumas casas seria ótimo. Estava muito a fim de um pouco de adrenalina, então topei na hora.

Capítulo 11 - The message

  Por Ele

  12 casas. Este era o número exato que havíamos espionado naquela noite. E vocês perguntam: o que descobriram até agora? E eu respondo: nada. Na realidade, a única coisa que percebemos é que os casais de Westbridge têm a estranha mania de fazer amor em frente às janelas de vidro. E, normalmente, os que o fazem são velhos. O que não era nada excitante. Outra coisa inútil que constatamos é que por algum motivo, todas as discussões entre familiares são executadas em público. Resumindo: vimos muita gente brigando e muita gente transando. E nem sequer uma pessoa que se parecesse com a ideia que tínhamos do nosso espião.
   Bem, já era em torno das 4 da manhã. Estávamos esgotados, frustrados e os disfarces já nos incomodavam absurdamente, de forma que decidimos retornar ao nosso lar. Mas não sem antes espionar uma última casa.
   me encheu o saco dizendo que seu número da sorte era 13 e que ela sentia que íamos encontrar algo interessante ali. Como aprendi que não me adiantaria falar que não, a segui rumo ao último local da noite.
   Qual foi nossa surpresa ao encontrar a casa vazia? Em plena madrugada, onde poderiam estar os moradores daquela casa? Tudo estava escuro, não havia carros na garagem, mas vários indícios nos confirmavam que alguém morava ali. Dei uma olhada no tablet da CIA que continha arquivos mencionando um pouco sobre cada habitante do condomínio. Segundo dizia a pasta daquela casa, ali moravam Patrick Robensbau, de 27 anos, e sua mãe Margareth Robensbau, de 60. O pai/marido havia morrido há alguns anos, ataque cardíaco. Estavam ali há muito, desde que o garoto nascera.
   - Vamos invadir. – disse decidida enquanto saia de nosso esconderijo rumo à janela onde supostamente ficava a cozinha.
   - Mas por quê? Nem sabemos se esse cara que mora ai é de fato nosso espião. – Tentei argumentar e colocar alguma prudência na cabeça da minha parceira que agiu como se eu sequer houvesse me pronunciado, já escalando o patamar e forçando a trava da janela.
   - Vamos continuar sem saber se não entrarmos. E outra: eu quis espionar pela adrenalina e não para ver o que vimos até agora. – Ela explicou já passando uma perna para dentro da casa. – Anda, , larga de ser medroso, você é um agente da CIA!
   - Não estou com medo, senhorita aventureira. Anda logo que eu vou subir. –Tomei impulso e entrei no lugar aterrissando ao lado de , que já olhava ao redor procurando alguma pista. Calma e discretamente, fomos investigando tudo o que havia naquela casa: desde armários até papéis, tentando encontrar qualquer coisa que nos ajudasse na missão. Passado algum tempo, no entanto, resolvemos subir para o segundo andar, uma vez que nada importante havia no térreo. Entramos na suíte principal que aparentemente havia sido reformada, não havendo a típica parede de vidro fosco comum à todas as casas. A cama estava perfeitamente arrumada com apenas um notebook aberto e ligado sobre ela. Eu e trocamos olhares e fomos direto em direção ao notebook, nos empurrando como crianças no processo. Segurei pela cintura e a icei no ar, postando-a atrás de mim e correndo a sua frente, chegando antes ao computador. Para agentes da CIA até que éramos bastante imaturos. Em meio a risadas discretas, movi os dedos pela área do mouse, fazendo com que a tela se acendesse. Um e-mail estava aberto.

  De: Roger Bowman
   Para: Patrick Robensbau
   Assunto: Última chance

  O chefe te deu uma última chance de ter sua mãe de volta sã e salva: esteja na Rua Kimberly Schuats, 236 às 22 horas.
   PS: Ligue as câmeras ao sair.

  Ficamos chocados. Aquele e-mail poderia muito bem ter alguma relação com o homem que procurávamos. No entanto, a julgar pelo “chefe” citado, supus que Roger fosse apenas um capacho. Talvez até mesmo aquele que gritara no armário que servia de chapelaria há algum tempo, na festa.
   - Bem, 22 horas já foram faz tempo e o dono da casa ainda não retornou. Mas o que ele quis dizer com “ligue as câmeras”? – Eu disse e olhou para mim como se eu fosse tapado. Imediatamente após, olhou em volta alarmada, procurando desesperadamente por algo. O computador emitiu um som, chamando nossa atenção novamente para ele. O alerta de um novo e-mail recebido piscava na tela. Não resistindo, cliquei para abrir.

  De: e-mail não identificado
   Para: Patrick Robensbau
   Assunto: Belo disfarce, agentes

  Só de ler o cabeçalho já pude sentir a adrenalina correr por minhas veias. Eu começara a soar frio.

  Me parece que antes tarde do que nunca é um bom ditado para este momento. Estava quase suspeitando que o presidente não tivesse acatado meus desejos e mandado seus melhores agentes para meu pacato condomínio. Mas aí estão vocês.
   A questão que não quer calar é: até quando?

   fechou a janela com violência. Em seguida, inseriu o pendrive no compartimento USB e esperou cinco segundos até que este fizesse back-up.
   - Vamos sair daqui. – disse e essa foi a primeira vez que eu de fato a vi séria, centrada, trabalhando. Ela, sob todas as perspectivas, dava a ideia de uma mulher profissional e dedicada. Não obstante, eu, que passei tantos dias observando-a e a estudando, sabia que por trás de todo aquele ar fatal, ela encontrava-se com medo.
   Dei uma olhada rápida pelo quarto procurando a câmera que nos delatou. Nada. Fui para o corredor, encontrando a pequena semi-bola preta no topo da escada. Mirei minha arma 8mm com silenciador ali e atirei.
   Saímos da casa e resolvemos dar algumas voltas antes de ir para nossa, para o caso de estarmos sendo vigiados. Minha cabeça rodava tanto, avaliando tantas possibilidades, que eu mal era capaz de acompanhar o ritmo acelerado de . Ela permanecia calada, muito provavelmente tentando absorver aos poucos a explícita ameaça contida naquele e-mail. Assim que entramos pelos fundos, retirei o maldito gorro, o bigode falso e o queixo de silicone como se minha vida dependesse daquilo. Observei soltando os cabelos antes aprisionados na peruca negra e limpar a maquiagem do rosto pálido. Subimos para o quarto e deitamos na cama ainda sem pronunciar uma palavra.
   Agora, aquele silêncio sepulcral estava começando a me irritar. Virei-me de frente para minha parceira a tempo de acompanhar seu peito subindo e descendo rapidamente, em um suspiro profundo. Ela virou-se para mim, os cabelos espalhando pelo travesseiro, os olhos indecifráveis, a boca entreaberta. Naquele momento, com me encarando tão livre de malícia, raiva ou qualquer outra emoção, ela parecera quase quebradiça. Seu olhar alternava entre os meus olhos, e o sol que estava nascendo começava a iluminar timidamente seu lindo rosto. Tive a estranha vontade de apenas... abraçá-la. E nos deixar adormecer naquela posição. E por mais estranho que pudesse parecer em qualquer outro momento, eu apenas o fiz. E ela simplesmente deixou.
   Nos aconchegamos do melhor jeito possível, do modo mais certo, e a próxima coisa que me lembro foi de cair na inconsciência... e ser tirado dela com uma brutalidade surpreendente.

Capítulo 12 - Solving the problem

  por Ele

  Gritaria. Sirenes. Choro. Dor de cabeça. Isso resume basicamente tudo o que aconteceu naquela manhã. O dia que tinha tudo para ser bonito e ensolarado, começou se não com o pé esquerdo, com logo toda a metade errada do corpo. A minha cabeça parecia poder explodir a qualquer momento e as britadeiras que trabalhavam para consertar a parede de vidro fosco do quarto da minha nova casa não ajudavam em absolutamente nada.
   As vozes alarmadas provenientes da multidão que cobria todo o quarteirão, ansiosas por saber o que havia ocorrido, tampouco.
   Parece que alguém lá em cima estava a fim mesmo de tumultuar as coisas aqui em baixo. Qual é, meu filho, vai ver um vídeo pornô ou assistir um filme de terror se você está entediado, não precisa vir dar uma sacudida na minha vida!
   Enfim, como se já não bastasse uma bala ter atravessado a parede de cabeceira do quarto e ter passado perigosamente perto da minha pessoa, ainda precisava ter todo o condomínio e quiçá da cidade focando nas duas últimas pessoas que podiam chamar qualquer atenção no mundo: Eu e .
   Porque era exatamente isso que havia acontecido. Um assassinato na casa de trás da nossa, um tiro bem mirado para a direção do nosso dormitório e um monte de vidro estraçalhado em plenas seis e meia da madrugada. O pessoal desse condomínio não perde tempo mesmo. Nem pra esperar que eu dormisse um pouco mais e acordasse mais alerta pra não responder tanta cagada nas investigações policiais. já havia chamado minha atenção no mínimo 3 vezes por ter falado o que não devia. E por falar em ... Soa muito virgem falar que eu estava ansioso para ver como as coisas estariam no decorrer do dia?
   Fala sério, no dia anterior tivemos nosso primeiro momento não forçado e pela primeira vez não estávamos sem nos falar ou deixando claro o ódio mútuo. E algum marginalzinho resolvera acabar com qualquer expectativa ao matar a pobre senhora Shoppenhauer. Verdade seja dita, no mínimo aquela velha enxerida pegou um ladrãozinho qualquer bisbilhotando por aí e ele apenas se livrou dela.
   É, eu gostaria de acreditar nisso.
   Mas qual seria o sentido de ignorar o que estava óbvio? O assassino era, nada mais nada menos, que nosso tão ilustre espião. Pelo menos era o que eu suspeitava. Minha parceira não havia se manifestado para que eu soubesse se ela concordava ou não comigo, muito séria, concentrada e profissional para tratar disso agora quando estávamos tão em evidência. Mas era claro que a história contada para a polícia havia sido a primeira. Tudo devidamente anotado em um bloquinho intitulado “relato supositório das testemunhas”, um pequeno monte de folhas onde o detetive aficionado por rosquinhas – típico de seriados americanos – anotava as suposições das pessoas ao seu redor, justificando que “às vezes, um leigo, por ter uma imaginação não regida pelos parâmetros de nós policiais, pode ter ideias que nós desconsideramos pela experiência, mas que por fim podem estar certas”. Sei, isso na minha terra se chama preguiça. Mas enfim, quanto mais tonto o oficial melhor, menos trabalho para a CIA apagar nossos rastros.
   No entanto, mesmo sendo no mínimo desleixo, o policial não deixou passar algumas baboseiras que eu deixei passar durante o interrogatório. Eu estava com sono, atordoado e bastante descrente de que tudo aquilo estava mesmo acontecendo, e com isso não dei as respostas evasivas que tanto nos treinavam a dar. deve ter querido me matar diversas vezes, como quando teve que consertar minha gafe - eu mencionei que havíamos acabado de dormir quando se deu o acontecido -, dizendo para os vários repórteres que havíamos nos deitado tão tarde porque estávamos transando. Valeu a pena cometer esse deslize só pra ter visto a tão profissional agente ficar rosada nas bochechas. Mas isso não vem ao caso. O que convém é que estávamos em perigo. O tempo estava acabando, não necessariamente o prazo de um ano e sim porque cada vez o nosso procurado ficava mais próximo de nos desmascarar. Isso me deixava nervoso, inquieto e estranhamente triste. Ao mesmo tempo em que eu queria muito ser bem sucedido em mais uma missão, afinal eu gostava muito do meu trabalho, não queria me separar de .
   A minha vida fora deste condomínio não era exatamente excitante. Jogo, bebida, problemas. Mas nada disso se comparava a viver sob o mesmo teto da . Ela era tão enérgica que me impedia de ficar entediado, e tão dedicada que me fazia lembrar da minha motivação antes de toda a loucura que minha vida virou desde que entrei para o contrabando. Às vezes eu me pegava tendo que vestir a camisa do cara mal, que há algum tempo tinha sido enfiada no fundo na minha alma, para que ela não suspeitasse de nada. Para que não suspeitasse quem eu era. Não que eu pudesse enganá-la, mas eu bem que tentava.

- flashback on –

  Por essa eu não esperava. Eu sabia que a missão dessa vez seria difícil, mas tinha esperança de tudo dar certo no final, como geralmente acontecia. Eu era bastante capaz para acabar com toda aquela merda, mas cometi o erro de me envolver com a situação.
   Regra número 1 da MI-6: Nunca se envolva emocionalmente com os alvos.
   E, sim, eu tinha feito isso. Não da forma mais clichê – envolvimento amoroso -, mas piedosamente. Eu conheci diversos garotos – sim, garotos, de dezesseis anos em sua maioria – que trabalhavam com o contrabando por não terem outra alternativa. Eles tinham parentes doentes, pais ameaçados, namoradas na ponta de faca, e o único jeito de reverter essa situação era ganhar dinheiro e poder rápido. O contrabando parecia, portanto, uma boa alternativa. Eles não tinham estudo, por isso um cargo honesto que pagasse bem estava fora de cogitação. Também não tinham noção de mundo suficiente para se darem conta de que vender todas aquelas armas poderia salvar as pessoas que amavam, mas mataria alguém que outra pessoa amava.
   E, por ter conhecimento da ignorância não proposital desses rapazes, eu me dispus a ajudar.
   A agência tinha me mandado ali com uma ordem clara: ganhe prestígio lá dentro, nos alerte sobre todos os compradores e arranje uma maneira de acabar com o esquema de compra e venda. Eu tinha me dado bem de início, cresci fácil na hierarquia pela minha habilidade de desvendar as pessoas rapidamente, e por ser bastante sagaz. Mas quando me deparei com a história desses meninos não pude mais cumprir o que me foi pedido.
   Eu queria fazer a diferença na vida de alguém. Esse sempre foi o meu mantra, e foi justamente por ele que eu aceitei o convite da inteligência britânica ao me formar na faculdade. Já estava infiltrado a tempo suficiente para saber como e quando agir, e não perderia essa oportunidade.
   Em 18 meses eu era o encarregado do negócio. Um acidente fatal com o antigo chefe Jonathan Miles me fez assumir o cargo supremo, uma vez que eu já tinha crescido até ser seu braço direito e responsável pelo comando estratégico do negócio. Não esperava chegar ali em cima tão rápido, mas não desperdicei a chance.
   Comecei a comandar todo o esquema de produção e as vendas. Assumi uma máscara mais severa para que não questionassem minha autoridade, e funcionou. Com o respeito de todos os subordinados conquistado, colocar o plano em ação foi fácil.
   Primeiro eu passei a ordenar que todos ali tivessem alguma instrução. Disse que estava cansado de pessoas burras ali dentro, que ao menos sabiam calcular as finanças do negócio, que estavam me dando prejuízo, e ninguém me contestou. No dia seguinte estavam todos matriculados em algum supletivo. Primeiro passo correu conforme o planejado.
   A seguir comprei por debaixo dos panos algumas casas seguras no campo. Meu objetivo era mover as famílias em perigo da periferia de Londres para lá, de forma que elas ficassem menos visíveis e continuassem com o custo de vida baixo.
   Por fim, mandei saquearem algumas farmácias do estado. É, essa não foi a etapa mais honesta do meu plano, admito, mas era tão necessária quanto as outras. A desculpa era que havia uma encomenda de algumas pílulas letais que, apesar de não serem o nosso foco, nos trariam dinheiro e, portanto, valiam a pena naquele negócio exclusivamente. Eles acataram a ordem, claro, e eu me aproveitei dos montantes de antibióticos e analgésicos e fiz kits para dar para as famílias precisadas.
   Nem preciso dizer que nesse ponto a agência já havia rompido comigo pela demora – haviam se passado quase três anos desde que fui enviado ali -, e me tinham caçado em todos os países com recompensa e tudo. Eu não me importava. Estava de consciência limpa, fazendo o que achava certo. Eu salvaria aqueles meninos a aí sim acabaria com aquele ninho podre onde brincar de ser Deus era pré-requisito, já que eles se achavam no direito de decidir quem morria e quando morria.
   Tudo estava nos conformes, os garotos todos formados, com perspectivas de futuro imensuravelmente mais amplas do que quando eu os conheci e sem laços com o aterrorizante passado que tiveram. Eu já bolava uma nova estratégia de como fechar de uma vez por todas o negócio e o que fazer da minha vida quando isso acabasse, quando apareceu no meu caminho.

- end of flashback –

  Ela foi e é minha motivação, minha solução e meu incentivo desde então. E o resto é lembrança pra reviver outra hora.
   De qualquer forma, depois de algumas muitas horas de encheção de saco da polícia e vizinhos, minha paciência - já muito limitada - chegou ao fim. Eu queria que aquilo acabasse o quanto antes. Graças a qualquer força superior, meu pedido foi atendido. Eis que estávamos sentados na calçada entediadíssimos aguardando aquele mar de gente dar o fora de nosso quintal quando o tal tenente responsável pelo caso do assassinato de Ofélia Shoppenhouer veio até nós com uma fotografia em mãos.
   - Eu entendo que a imagem está péssima, mas realmente preciso da ajuda de vocês. Conhecem esta mulher? – A foto mostrava uma mulher magra, de estatura mediana e cabelos negros escorridos. Ela estava de costas para o fotógrafo, apoiada em uma parece. Em sua mão direita, a arma da qual provavelmente o tiro da noite anterior saíra. Eu tive a impressão de reconhecê-la de algum lugar, o corpo não me era estranho. No entanto, não gozei de nenhuma epifania significativa no momento e como a imagem realmente estava muito ruim, julguei ser coincidência.
   - Sinto muito, não sei dizer. Acredito que não. – respondeu por nós e o tenente agradeceu, após explicar que nossa ex-vizinha tinha tirado essa foto antes de falecer.
   Obrigado, tenente. Agora você nos deixou com mais um problema a somar na lista.
   Aparentemente, não foi nosso ilustre espião o assassino. Afinal, ele era sem sombra de dúvidas um homem a julgar pela voz no armário. Um homem franzino, é verdade, considerando a foto que a CIA nos mandou, mas um ser do sexo masculino, sim.
   Já a assassina era mulher. Dona Ofélia Shoppenhouer deve tê-la visto se esgueirar por entre nossas casas, provavelmente com o intuito de nos observar, e tirou uma foto com seu precário celular de séculos atrás. O “click” da câmera (ou qualquer outro som) deve tê-la denunciado, fazendo a mulher prestar atenção nela. O tiro deve ter sido para calar a mesma.
   O tiro na minha direção, no entanto, era um mistério.
   Cerca de quinze minutos depois, a vizinhança já quase voltava ao normal. Os policiais haviam se retirado, a mídia provavelmente achara coisa mais importante para cobrir e os vizinhos possivelmente recolhiam-se para comentar o ocorrido longe dos olhos julgadores uns dos outros. Era exatamente isso o que eu gostaria de estar fazendo também. Mas um ser irritante ruivo alegava estar com muito medo para dormir sozinha e infiltrou-se em nossa casa.
   Sim, Elizabeth, a própria.
   parecia gostar da presença dela ainda menos do que eu. O pior era que a vadia não esperava resposta, ela simplesmente se impunha. E falava tanto que mal conseguíamos manifestar alguma objeção.
   Estávamos na sala, escutando o monólogo inacabável sobre o quão frágil Liz era e sobre o quanto ela realmente precisava de alguma segurança em sua vida, de uma boa amiga e um bom namorado para poder não se sentir ameaçada como se sentia agora. Eu já havia bocejado no mínimo 20 vezes em cinco minutos, mas ela não parecia dar qualquer sinal de que acabaria tão cedo.
   Mirei com o canto dos olhos e ela devolveu o olhar. Após algum tempo de comunicação inaudível sobre o pé-no-saco a nossa frente, pareceu ter uma ideia. Seus olhos se arregalaram por um segundo, depois ficaram semi-cerrados e um sorrisinho aparecera no canto de seus lábios.

Capítulo 13 - Who’s that girl

  por Ele

  Arqueei uma sobrancelha, de forma a questionar o que faria para tirar Elizabeth do nosso pé. Ela apenas arrastou-se pelo sofá até ficar colada em mim e pousou uma mão em minha coxa esquerda. Eu estranhei a atitude, ainda um tanto perdido com seu plano. Liz continuava a tagarelar, mas meus pensamentos e indagações sobre o que faria a seguir eram tão altos na minha cabeça que eu sequer escutava uma única palavra que ela proferia.
   Quando aquela boca macia, urgente e carnuda da qual eu ainda me lembrava bem encostou-se no meu pescoço no entanto, eu compreendi. Compreendi não exatamente o plano e sim que eu estava certo de pensar sobre o assunto e não sobre o que Elizabeth falava. Se queria que eu correspondesse, deve ter ficado feliz, pois a reação foi imediata. Meus dedos encontraram sua cintura e a pressionaram forte, urgentemente.
   - Vamos deixá-la desconfortável. Marido e mulher precisam de momentos mais íntimos, não é mesmo? – sussurrou em meu ouvido, explicitando o plano. Agora fazia sentido. E que plano maravilhoso, tenho que dizer.
   A mão de , antes parada sob minha perna, começou um caminho perigoso para cima, apertando-me forte e sedentamente. Elizabeth pareceu finalmente se dar conta do que estava acontecendo bem a sua frente, mas isso ainda não fora o suficiente para que ela se retirasse, apenas falava mais devagar, como se para ter certeza de que a estávamos entendendo. continuava beijando meu pescoço, dando leves mordidas e assoprando. Eu começava a me animar com essa história. Minha mão encontrou seus cabelos e se embrenhou por eles, promovendo puxões na raiz. Ela esfregou o nariz contra o meu ponto de pulsação, provavelmente inalando meu perfume favorito, borrifado por ali. A senti gemendo fraco contra mim e aí não aguentei, isso foi demais.
   Levantei-me num pulo. Pedi licença e fui rumo à cozinha, estava na hora de tornar esse plano ainda mais tenso. Lancei apenas um olhar pra , que em seguida havia inventado qualquer desculpa de me ajudar na cozinha e também retirou-se da sala. Fechamos a porta da cozinha dando risadas abafas.
   - Quieto, , ela tem que pensar que estamos nos pegando aqui! – disse sorrindo ainda.
   - Então me ajuda – sussurrei de volta, provocante, e a encostei na porta, aproximando nossos rostos. Ela deu mais uma risada e em seguida me beijou. Sim, ela me beijou. O que a perda momentânea de lucidez não faz, não é mesmo? Nosso beijo era profundo e urgente. Era quase como se quiséssemos roubar o ar um do outro, roubar a essência, o pudor. Eu sentia seu gosto doce se espalhar pela minha boca, e se misturar com o meu. Sentia meus lábios ficando roxos, tamanha a pressão e força com que nos movimentávamos um contra o outro. Os dela não deviam estar diferentes. As minhas mãos alternavam entre sua nuca, cintura e quadril. Eu puxava seus cabelos de leve como havia descoberto que a agradava, sem nunca deixar de empurrar seu corpo esguio contra o meu, proporcionando o contato pelo qual meus poros clamavam. Ela arranhava minhas costas sobre a blusa, vez ou outra subindo para minha nuca, suspirando pesado ao sentir minha temperatura elevada por aquela área do meu corpo. Estávamos fora de si. Ela me deixava fora de mim. Quando a pressão estava se tornando já absurda demais, fiz menção de pegar pelas pernas e içá-la na porta. Ela permitiu, mas depois que a pressionei com meu quadril e ela arfou, interrompendo o beijo, disse:
   - ... – Eu entendi o recado na hora. Estava ótimo, mas ela não queria passar essa barreira pra manter a consciência tranquila. Pela primeira vez na nossa história, não fiquei puto com isso. Sequer protestei. Apenas a deixei descer do meu colo e continuei beijando-a de forma mais calma. Não muito após, ela partiu o beijo ofegante e piscou pra mim antecipando o que iria fazer. Então, ela gemeu. Alto. E se jogou contra a porta para que fizesse barulho. Eu ri muito com a cena e depois de um tapa merecido, entrei na brincadeira. Ficamos nisso de simular um sexo bem animal e dar gargalhadas contidas com a atuação um do outro por cerca de três minutos, até escutarmos o barulho da porta da frente batendo. Elizabeth havia desistido, finalmente.
   Naquela tarde nos divertimos como nunca antes juntos. Demos tantas gargalhadas que ficou quase impossível lembrar que não era sempre assim fácil entre nós.
   Decidi ir dar o relato do ocorrido a Leonard e liberar minha parceira para fazer o que quisesse e ficou combinado que passaria na casa de Liz no dia seguinte para se “desculpar” por nossa falta de modos. Como se sentíssemos muito, sei.

xx

  Por Ela

  Retomei a consciência aos poucos, respirando profundamente e tentando me lembrar onde eu estava. A última memória que eu tinha era de estar assistindo um filme qualquer de ação na sala de cinema. Acho que isso significa que eu peguei no sono. Abri um olho apenas, para me situar. A minha frente o que parecia ser um tecido cinza de algodão jazia bem perto. Estranhei, afinal a decoração da sala era em tons quentes de vinho e mostarda. Foi então que eu senti um movimentar calmo e ritmado pelo meu cabelo, que massageava levemente meu couro cabeludo e descia pela extensão dos fios. Abri por fim os dois olhos e busquei o rosto de . É, eu estava deitada no colo dele.
   - Hm, o que você está fazendo? – Questionei incerta. Não queria ser rude, afinal estávamos em um momento de paz e o toque firme e delicado dos seus dedos era aconchegante demais para que eu quisesse cessar.
   - Da onde eu venho isso se chama cafuné, . Costuma ser taxado como uma forma de carinho. – Respondeu, sem nunca se abater. podia ser carinhoso, mas nem por isso perdia seu jeito extremamente sarcástico. Era certo que às vezes sua segurança me irritava, mas era admirável que sua personalidade forte não se abalasse ao maior incentivo. Queria eu ser assim tão constante na minha inconstância. Revirei rapidamente os olhos com um sorrisinho de canto.
   - Não precisa esculachar. Só queria entender como eu vim parar nessa situação. – Desabafei, me referindo à conexão que nós dois tínhamos estabelecido. Ou melhor, ao carinho e à cumplicidade que estava aos poucos surgindo entre nós dois, independente das circunstâncias e das nossas questões mal resolvidas.
   - Bom, quando cheguei aqui na sala encontrei você um pouco torta no sofá. Não queria que acordasse com dores, então fui arrumar sua posição. Quando dei por mim você tinha se apoiado no meu peito e prendido minha camiseta entre os dedos. Parecia confortável e eu... Bem, eu não me importei. O cafuné foi quase involuntário. – Respondeu. Ele sabia do que eu estava falando, mas tanto quanto eu compreendia que responder aquela pergunta de forma mais momentânea era mais fácil. Não pude deter um suspiro e acompanhei o sorriso preguiçoso que ele abriu.
   - Quem tá na fogueira é pra se queimar. – Decretei, novamente me referindo a algo maior, ao nosso relacionamento deturpado como um todo, mas abrindo brecha à interpretação imediatista ao me arrumar no colo do meu parceiro com a cabeça apoiada no vão entre seu ombro e pescoço e voltando a assistir Lost em silêncio. Ele, que primeiro ficou sem reação, acabou por alargar o sorriso frouxo que trazia no rosto e retomar o carinho, agora com as unhas curtas, nas minhas costas.

xx

  Naquela manhã acordei leve depois de todo aquele clima de descontração da tarde anterior. Apesar da apreensão com relação à missão, que cada vez se complicava mais, a tranquilidade que envolvia minha relação com meu falso marido me proporcionava essa sensação de leveza.
   Resolvi me livrar logo da obrigação e ir falar logo com a puta da Elizabeth para depois eu e irmos para o treino de tênis. Coloquei uma regata branca e um short, nada especial, prendi os cabelos ema trança de raiz de lado e fui.
   Preparava-me para bater na porta quando escutei uma voz que não pertencia à Elizabeth. Era uma voz masculina que pedia paciência e calma ao interlocutor. Aquela voz me parecia ser muito familiar, mas não consegui uni-la a qualquer homem. Olhei na nossa rua e não havia sinal de qualquer carro que não fosse os habituais. Resolvi olhar pela parede de vidro antes de bater, mas não havia nem sinal de outra pessoa ali com Elizabeth. Preferi então chamar para que ele me ajudasse a descobrir de onde aquela voz era familiar.
   - , acho que tem um homem na casa de Elizabeth. Pode vir comigo ver se reconhece a voz? – disse assim que o avistei saindo no nosso jardim com um regador. Ele discretamente aproximou-se da porta e tentou escutar qualquer coisa, mas fora em vão. Pela parede transparente eu observara Elizabeth apertando o botão que encerrava a caixa postal do telefone sem fio. - Não consigo escutar nada. Já estamos meio atrasados pro tênis, depois vemos isso, ok? – ele disse, virando-se para mim. Concordei e deixei essa história para lá, se encontrasse com Elizabeth eventualmente me desculparia, mas não iria a sua casa para tanto.

xx

  Mais dois meses haviam se passado.
   Elizabeth tentou fingir que nada havia acontecido, mas claramente não gostava mais de nós. Não que isso nos importasse. O tal homem misterioso permaneceu um mistério, pois nunca mais captamos qualquer mensagem dele para nossa vizinha, mesmo após espalharmos escutas pelo local. As nossas câmeras instaladas no perímetro também não identificaram qualquer presença masculina regular por ali. Alguns homens apareciam, claramente bêbados, seguiam para o quarto de Elizabeth e de lá saiam pela manhã do dia seguinte, sem nunca mais voltar. Também vimos algumas vezes Liz chorar e quebrar alguns objetos ao atirá-los nas paredes. Estranhamos, mas continuava não nos dando qualquer pista do que podia estar acontecendo ali.
   Também sem sinal de volta do nosso pequeno espião ou da assassina.
   Em resumo, as coisas andavam bastante paradas.
   e eu tínhamos saído para espionar mais duas vezes, e novamente não encontramos nada de interessante. Uma ou outra família com problemas conjugais – vulgo o marido dormindo no sofá e/ou filhos chorando e se culpando; Mais uma casa vazia na qual, segundo a ficha da CIA, o dono encontrava-se no Havaí em férias estendidas ou qualquer coisa do gênero (dessa vez eu não insisti para que invadíssemos a casa, deu graças); E, por fim, mais gente transando ou brigando frente às paredes de vidro. Também tínhamos encontrado uma forma de treinar ao transformar nossa tão amada hidromassagem em um ringue de luta. Fabricamos nosso próprio saco de areia para não desconfiarem caso nos vissem entrando com um comprado dentro de casa, e apesar de não ter ficado a melhor coisa do mundo, ele dava pro gasto.
   O tatame foi mais fácil. Compramos aqueles quebra-cabeças grandes e coloridos que as pessoas colocam no chão quando têm crianças pela casa para que não se machuquem, e voilá. Um casal recém-casado comprando artigos infantis não levantava suspeitas, pois poderíamos muito bem estar tentado uma gravidez.
   Sobre nosso relacionamento: ia bem, obrigado. Não nos matávamos mais, mas também tinha, graças a Deus, parado de forçar a barra. Em resumo, éramos parceiros agora, como deveria ter sido desde o começo se eu não fosse tão teimosa e ele tão insistente. Ele parecia ter entendido que eu não ia transar com ele, que eu apesar de tudo não iria esquecer o passado negro dele de um dia pro outro, e eu tinha entendido que odiá-lo e tratá-lo mal não iria nos ajudar a fechar esse caso, além de nos proporcionar um ano difícil e tenso.
   Após mais um treino e de uma boa passeada pelo centro da cidade com Pâmela e Joseph, resolvi tomar banho e me arrumar para o jantar beneficente que teria no condomínio aquela noite. Eu e fomos convidados, e lógico que não podíamos perder essa oportunidade. A festa seria bem chique, black-tie e tudo mais. O meu vestido era tomara que caia vermelho sangue, maravilhoso por sinal, longo e com uma abertura na frente que mostrava uma das minhas pernas até a coxa. Enquanto me maquiava de roupão, entrou e tomou seu banho. Quando ele saiu, com uma toalha enrolada no quadril e outra nas mãos secando/bagunçando os cabelos, entrei no banheiro e me tranquei para secar o cabelo e fazer ondas largas que cairiam até minha cintura. Prendi a parte da frente do meu cabelo para trás e passei o meu fiel batom vermelho e meu perfume Carolina Herrera favorito. Saí do banheiro para colocar o vestido e os sapatos e não estava mais lá. Enfim pronta, desci as escadas sendo minuciosamente observada por um impecável de smoking preto, camisa social branca e gravata também preta e fina, dando um ar bem sexy.
   - Eu sinceramente espero que Elizabeth tente nos importunar hoje de novo para que eu possa me aproveitar de você. – Ele disse brincalhão, estendendo a mão para mim. Ri e balancei negativamente a cabeça, aceitando sua mão em seguida. Ele a beijou. – Você está linda. De verdade.
   - Muito obrigada, . E você está muito sexy. – Ele riu, mostrando aquele sorriso maravilhoso e me permitindo sentir seu hálito de menta. Muy bueno.
   E lá fomos nós para o jantar.

xx

  O local já estava lotado. Eu estava acompanhada do homem claramente mais bonito do condomínio, com o vestido dos meus sonhos e o espírito dançando macarena. Naquele momento, andando por entre as diversas pessoas elegantemente arrumadas ao som de música clássica, percebi o quanto estava feliz. É verdade que estávamos sendo ameaçados de morte, que eu precisava fingir ser esposa de um cara que eu teoricamente odiava, que eu não estava no meu lar, mas apesar dos pesares, eu adorava o meu trabalho. E , por mais incrível que parecesse, me divertia sem perceber. Lógico que eu nunca admitiria isso pra ele – algumas manias a gente nunca perde -, mas ficar próxima ao era simples, fácil. Fluía.
   O jantar seria servido mais tarde, de forma que as pessoas aguardavam com seus coquetéis espalhadas pelo salão de entrada. Eu e estávamos fazendo uma social, migrando entre os diversos grupos, cumprimentando todos que podíamos. Ele de fato havia conhecido muita gente nos treinos de futebol. Eu, em contrapartida, estava mais preocupada em descontar a frustração sexual correndo pelo condomínio. Pois é, depois do dia fatídico com Elizabeth, peguei mania de correr quando estava tensionada. E acredite, eu estava. Assim como sabia que estaria. Não era fácil ficar meses e meses sem qualquer tipo de alívio – não é como se masturbação fosse uma alternativa para qualquer um de nós, se estávamos sempre um colado no outro -, e os treinos de vôlei, que muito me ajudavam no início, haviam sido cancelados com a morte de dona Ofélia, uma vez que ela que coordenava o time.
   Sim, velha, mas ativa, um exemplo.
   De qualquer modo, não estava familiarizada com metade das pessoas que falavam animadas com meu ‘marido’, então fiquei feliz de ver um rosto conhecido. Era Cristine, uma moça simpática que eu conhecera no supermercado. Nunca a havia visto no condomínio, mas agora ficara claro que ou ela era uma moradora de Westbridge assim como eu, ou estava ali acompanhando alguém. Aproveitei que pedia licença para Roger e Theo - com quem conversava até então - e puxei-o em direção a ela. foi tranquilo, comentando algo que Theo havia dito no segundo anterior que eu não prestara atenção. No entanto, no momento em que parávamos em frente à Cristine, sua expressão mudou da água para o vinho. Ele tinha agora os olhos arregalados, a boca escancarada e apertava minha mão com força maior que a necessária.
   - C-cris? – disse, visivelmente pálido. Eu estava totalmente perdida. O que diabos estava acontecendo para que ele reagisse daquele modo? E de onde eles se conheciam?

Capítulo 14 - Distracted at spying

  por Ele

  Ok, tinha como as coisas ficarem piores? Justo agora que eu e estávamos, digamos, “estáveis” e que eu estava relativamente tranquilo no meu novo serviço, era com ela que eu encontrava. Justo ela e justo agora que eu estou exatamente AO LADO da minha parceira. Alguém lá em cima deve estar rindo muito da minha cara, não é possível. Bom, no mínimo eu deveria tirar essa expressão de imbecil da cara e fazer alguma coisa, afinal, as duas estavam me encarando visivelmente no aguardo da minha reação. Cristine detinha um sorriso sarcástico e os olhos um tanto em chama enquanto minha “esposa” parecia completamente perdida. Respirei fundo e me preparei para a maior atuação da minha existência:
   - Cris, você emagreceu, hein! – soltei um sorriso forçado. O tamanho da minha idiotice não podia ser medida. Tinha vontade de me dar um soco bem dado no estômago.
   - Vocês... Se conhecem de onde? – indagou franzindo cada segundo mais a testa.
   - Hm, nós... Nos conhecemos há algumas semanas... No caminho para o futebol. É isso. – Por Deus, não poderia ficar pior. Minha mentira estava tão deslavada que fiquei surpreso quando concordou com a cabeça levemente e pediu licença para falar com Pâmela, que acenava a alguns metros.
   - , ... Continua mentindo para as pessoas que se importam com você, não é mesmo? Parece que isso não foi exclusividade minha, afinal... – O olhar maligno no rosto rosado de Cristine me dava calafrios. Sempre deu. No entanto, havia muito mais em jogo ali e eu não podia deixar qualquer tipo de sentimento meu interferir no todo.
   - Pode ir cortando a conversa fiada, Cristine. Eu te conheço, e sei que se está aqui é porque tem um plano. Por isso desde já eu aviso que é bom que você não se meta mais no meu caminho. Se sequer sonhar sobre nosso histórico, eu acabo com a sua vida sem pensar duas vezes. – Falava apontando meu dedo em seu peito, em uma ameaça explícita para que ela não revelasse nosso passado à .
   - Fica tranquilo, amor. Que prazer eu teria em acabar com seu relacionamento? Afinal, faz muito tempo que você acabou com o nosso. – Seus olhos se apertaram e sua voz suave me dava calafrios por passar tanta intensidade.
   - Eu falo sério. Você sabe que sempre consigo o que quero e eu desejo muito o seu silêncio. – Encerrei, virando as costas, e caminhei em direção a Joseph, que estava no meio do caminho para encontrar nossas esposas. Não me virei para trás para ver a reação de Cristine. Preferia nem cogitar a possibilidade de ela expor o que sabia. Além de colocar em perigo a minha missão e a minha vida, poderia machucar , e eu, estranhamente, temia muito isso.
   O caso é que eu e Cristine éramos parceiros algum tempo atrás, quando meu mundo ainda era a MI-6. Naquela época, eu não ligava muito para ela, pensava estritamente em trabalho e quase sempre agia por conta própria. No entanto, em função das longas viagens que acabávamos sendo obrigados a fazer em função do ofício, acabamos nos envolvendo. Um acidente de percurso, como eu denominei na época. E embora aquele acidente não tenha significado nada pra mim, pareceu significar até demais para ela. Quando dei por mim a agência inteira acreditava que estávamos em um relacionamento sério, as mulheres foram ficando cada vez mais escassas na minha cama e cada vez mais homogenias: sempre ela. A regra era simples: eu ia pra campo, era bem sucedido, retornava à base, entrava em crise existencial por muitas vezes não concordar com o que me era designado ou por não poder fazer mais do que aquilo, enchia a cara no bar mais próximo e acordava no dia seguinte com ela do meu lado.
   Não me perguntem como nem porque, uma dessas noites nós acabamos por noivar.
   E uma semana depois eu fui enviado para o caso do contrabando.
   Não preciso nem dizer que a essa altura do campeonato já não éramos mais parceiros, a MI-6 nunca permitiria que uma dupla de agentes envolvidos amorosamente trabalhasse junto, e por isso eu fui e ela ficou. Não que eu lamentasse muito isso, como dei a entender eu estava com ela porque me era conveniente e não por realmente estar apaixonado ou qualquer babaquice do gênero.
   Enfim, eu acabei me desvirtuando na missão, rompendo com a MI-6, e ela foi enviada para me “recuperar”. Coisa que não conseguiu, afinal de contas ao passo que eu recebi sua visitinha estava total e completamente envolvido no contrabando, sendo fácil, portanto, de simplesmente mandar darem alguma droga para ela desmaiar e sumir antes que acordasse.
   Nesse momento me vi preocupado. Eu sempre ouvi muito no treinamento da MI-6 sobre não acreditar nas próprias mentiras. Ali eu vivia uma segunda vida, e pra viver daquele jeito eu precisava me convencer às vezes que o que eu estava fazendo era necessário, que, como dizem, os fins justificam os meios. E me vi temendo ter levado aquele mantra a sério demais e, com isso, ter me perdido.
   Um pouco depois disso eu conheci , quando ela foi representar a CIA no caso do contrabando a pedido da Interpol. Eu já a conhecia de nome, claro, quem não conhecia a famosa agente americana exemplar, que concluía todos os seus casos com maestria e ainda o fazia da forma que bem entendia, quebrando, muitas vezes, protocolos oficiais no processo?
   era basicamente tudo aquilo que eu não tive coragem de ser quando trabalhei na inteligência inglesa. Ela me lembrava da pessoa que eu deveria ser, da pessoa que eu tinha, quem sabe, deixado pra trás. Era destemida, perigosa, rebelde e ainda assim extremamente eficiente. Uma mulher e tanto, sem sobra de dúvidas.
   Mas eu ainda tinha uma pulga atrás da orelha.
   Não importava eu ter feito tudo que fiz se não levasse meus objetivos adiante. Os meus fins não tinham ainda justificado meus meios. Eu ainda tinha muita pretensão de fazer mais pelo mundo, e sabia que não havia lugar algum que fosse me permitir expandir meus horizontes. Eu já estava sendo caçado por terras e mares, e daquela forma ficaria realmente impossível de continuar. Por isso que eu vi tamanha inspiração quando coloquei meus olhos em .
   Além de absurdamente maravilhosa e instigante, ela me forneceu a luz. A CIA era o lugar perfeito. Um tanto corruptíveis, egocêntricos na medida certa, e já tinham uma experiência parecida com a que eu pretendia propor lidando com sua tão célebre agente. Meu plano principal começou a ser bolado a partir daí.
   Voltando um pouco à minha ex-noiva, quando soube pelas suas fontes que eu fazia agora parte de uma agência diferente e que estava pareado com outra mulher, Cristine entrou em estado de combustão espontânea. Chegou a vir atrás de mim mais uma vez, mas quase não escapou da segurança reforçada que meu chefe disponibilizou para garantir minha “imunidade diplomática”, ou qualquer termo parecido.
   Eventualmente, ela desistiu. E meu chefe também de tanto me proteger, visto que retirou a ordem.
   No entanto, encontrá-la agora, depois de tanto tempo, em uma missão importantíssima sem ter a certeza do que ela pode estar planejando dessa vez pode colocar tudo em risco. Afinal, Cristine sabe melhor do que ninguém meu passado na MI-6, e é esperta suficiente pra juntar dois mais dois e decodificar meus objetivos. E o pior é que, caso ela resolva abrir o bico para , eu estaria definitivamente fodido. Primeiro porque ela não sabe que eu já fui agente.
   E, segundo, porque ela nunca, jamais, me perdoaria por tê-la enganado por tanto tempo a respeito de tantas facetas da minha vida.

  por Ela

  Eu tentei. Juro que tentei engolir a pior mentira do século, mas simplesmente não pude. Tornei-me introspectiva durante o resto do jantar, apenas dirigindo a palavra a quando era estritamente necessário. Minha cabeça pegava fogo, eu queria descobrir a verdade mais do que quis qualquer coisa na minha vida. Acho que aquela era o instinto de agente secreta falando por mim, afinal.
   Observei da minha mesa a tal Cristine (que eu acreditava ser muito simpática, mas que com certeza escondia algo) levantar-se para atender seu celular em um lugar mais calmo. Imediatamente fui atrás. Sem nem desculpas, levantei-me e a segui discretamente até o terraço, aguçando minha audição.
   - Não se preocupe, eu acho que sei como fazer. Não é como se a mentira pudesse durar para sempre, mesmo que dita pelo mestre . – meus olhos se arregalaram e a curiosidade começava a me fazer tremer. Era sempre assim, a adrenalina mexia com meu corpo de um modo que eu achava possível fazê-lo entrar em choque. Estiquei-me um pouco mais, tentando desesperadamente escutar o resto da conversa, quando uma mão grande tampou minha boca e outra me enlaçou pela cintura. Imediatamente lancei meu cotovelo para trás e atingi a pessoa na região do estômago. A lufada de ar que bateu diretamente em meu pescoço me permitiu identificar o perfume do estranho como sendo o de . Virei-me para tapar sua boca e pedir desculpas silenciosamente, no entanto a espiada já havia captado o som que emitimos.
   - Tem alguém aí? – Ela perguntou alto. – Só um segundo, acho que escutei algo. – Ela completou provavelmente para a pessoa com quem falava ao celular e começou a se aproximar de onde estávamos. conseguiu espremer nossos corpos entre uma grande escultura e a parede, nos ocultando. Cristine permaneceu rodeando o lugar, em busca de algo que ela nem sabia existir de fato. A pessoa ao telefone chamou sua atenção de volta e ela começou a falar novamente. Suspirei, mais tranquila, só então me dando conta do meu estado físico naquele momento. Eu começava a ficar sem ar com tão colado a mim e tanta adrenalina percorrendo minhas veias, e já não era capaz de prestar atenção à conversa da moça ao telefone.
   É verdade que o espaço era pequeno e se tínhamos alguma chance de não sermos descobertos era aquela. Mas será que ele realmente precisava ter parado justamente naquela posição? Minhas mãos estavam espalmadas contra seu peitoral duro, as dele apertavam involuntariamente meu quadril. Eu quase não sentia partes do meu corpo que não estivessem em contato com e a sua respiração forte batia em meu pescoço tornando ainda mais difícil qualquer raciocínio.
   Essa era provavelmente a pior hora do mundo para avaliar qualquer coisa, só que com um homem como ele espremido contra você não tem como evitar. Procurei desesperadamente algum modo de aliviar a pressão e por isso levei minhas mãos aos seus ombros e afastei um pouco as pernas, deixando-o entre elas. Agora meu pulmão podia não estar mais comprimido, mas em compensação eu sentia que estava muito mais em contato com ele, o que nesse momento era sufocante. Em alguma parte do meu cérebro, constatei que a mulher que antes eu espionava entrara em discussão sobre o que fazer a respeito de sabe-se Deus o que com o ser do outro lado da linha, mas eu não conseguia juntar direito as palavras que ela pronunciava. Me faltava informação, me faltava concentração, me faltava ar, me faltavam muitas coisas, o que não me faltava era vontade de agarrar ali e na mesma hora.

  por Ele

  Ela precisava usar aquele perfume? Aquele vestido? Ela tinha mesmo que espionar minha ex-noiva e ainda dar a brecha de deixá-la suspeitar de algo? Enfim, ela precisava mesmo ser tão deliciosa e cravar as unhas inocentemente nos meus ombros com o peito arfante subindo e descendo tão encostado ao meu? Eu não podia pensar em hora pior para estar excitado. Eu sei que é ridículo, mas ela era simplesmente inacreditável. Não precisava nem agir, suas meras reações já me deixavam louco de desejo. Eu sabia que Cristine estava tramando alguma e que obviamente era para cima de mim, mas naquele momento eu só conseguia pensar em uma coisa: aquele vestido vermelho no chão. Era completamente inevitável, na verdade.
   Enquanto a mulher desconfiada caminhava para cima e para baixo tagarelando no telefone, eu e minha parceira nos esforçávamos pra não fazer qualquer barulho comprometedor nem ocupar mais espaço que o necessário, ficando, quem sabe, a vista. Ela parecia que tinha entrado em um formigueiro, pois não parava quieta um segundo. Procurava por modos de ficar mais confortável, acredito, mas cada movimento seu me era mais torturante, ao passo que esbarrava com mais força em alguma parte do meu corpo que cada vez mais pedia pelo dela. Ou eram suas mãos me alisando sem querer, ou seus seios pressionando-se mais contra mim, ou sua respiração pesada batendo no meu pescoço.
   Eu procurava ficar imóvel, mas não podia deixar de reagir a algumas mudanças sutis de posição, por vezes apertando levemente sua cintura ou projetando meu quadril para frente. Eu era homem afinal, e não era dos mais santos.
   Quando conseguiu apoio necessário, , procurando livrar suas pernas da má circulação proveniente da pressão exercida nelas naquele momento, elevou um de seus joelhos através da fenda do vestido, posicionando-o encostado à lateral de uma das minhas pernas e deixado sua coxa linda e farta tão a mostra quando possível. Eu, quase como se seguindo um instinto, a segurei com vontade. O olhar que ela me lançou a seguir me fez mandar a discrição pro inferno e simplesmente tirar a casca que eu estava louco para tirar daquela situação.
   Deixei de ser bem comportando, e simplesmente escorreguei minha mão que estava em sua cintura até dar quase a volta inteira nela, fazendo com que as quase inexistentes partes dela que não me tocavam até então, me tocassem. A mão na sua coxa escorregou até o início do seu traseiro, aproveitando para elevá-la mais, praticamente a enganchando no meu quadril, apenas não o fazendo pela falta de espaço. Ela, sem contestar nada, apenas me abraçou com mais firmeza pelo pescoço e alcançou seu nariz e boca no meu ouvido, onde permaneceu respirando forte e sensualmente, me levando à loucura.
   Minha audição felizmente captou que o diabo se afastara da cruz (no caso, Cristine saíra do cômodo) me deixando finalmente livre para agarrar como se minha vida dependesse disso. Puxei sua mão bruscamente entrando com ela, que não ofereceu qualquer resistência ainda bem, no banheiro mais próximo. Enquanto eu trancava a porta, escutava respirar fundo e inspirar repetitivamente.
   Preferi nem indagar nada e fui ao seu encontro. Qual foi a minha surpresa quando ela desviou?
   - Parado aí! Eu quero respostas. Quem de verdade é essa mulher, ? – Ela me perguntou precariamente controlada com a mão estendida em sinal de pare, como se com esse ato pudesse me manter afastado.
   - Qual é, , eu te respondo até quais são os meus cromossomos depois, mas agora eu realmente preciso de você. – Voltei a alcançá-la pela cintura, apenas para no momento seguinte sentir ela se esquivar e correr para o outro lado do banheiro.
   - É sério, , ou você fala logo ou... Vamos os dois ficar nessa situação precária. – Ela levantou uma sobrancelha, ameaçadora.
   - Puta que me pariu! A qualquer momento eu vou explodir de tensão sexual por sua causa! – Bradei irritado.
   - Estou esperando. – Ela disse cruzando os braços.
   - Ta bem, ta bem! Antes de mais nada, foi você quem pediu pra saber e se interferir, e não me deixar cuidar disso sozinho. Aviso que eu tenho métodos de fazer toda a corporação pensar que você é lésbica. – Ela revirou os olhos, em seguida fazendo um gesto para que eu prosseguisse. – Bem... Cristine era minha companheira um pouco antes de eu entrar pro contrabando. Estávamos noivos quando eu decidi deixar tudo, vir para a CIA...
   - Ato que eu ainda gostaria de saber os motivos. – Ela interrompeu.
   - Posso continuar, espertinha? – Perguntei irônico, ela acenou emburrada. – Enfim, ela veio atrás de mim com a ideia maluca de me levar de volta e possivelmente sabe que sou um agente. – Seus olhos se arregalaram e a boca abriu levemente.
   - Como assim, ? Arg, , que inferno! A gente vai ter que dar um jeito nessa mulher, ela não pode ficar no caminho da missão.
   - Eu sei, vou cuidar disso. – concordei conformado.

Capítulo 15 - Questioning and Insanity

  por Ela

  Eu sabia que nada que eu fizesse poderia adiar mais aquele momento. Sabia que precisava tirar aqueles pensamentos do meu sistema se quisesse manter minha tão estimada sanidade. Eu fizera o possível para que aquilo só acontecesse em último caso, como medida final, mas o meu autocontrole tinha um limite. Mais cedo ou mais tarde eu precisaria extravasar toda aquela raiva. E todo aquele tesão.
   Talvez por isso não tenha me surpreendido quando, ao sair praticamente marchando daquele banheiro até nossa casa, meu intelecto ágil bolava mil planos para acabar com a raça de Cristine. Era bem simples, na verdade. E não tinha muito a ver com a nossa missão não. O caso é que ela o tocara sem culpa durante anos, enquanto eu me punia cada vez que me flagrava o encarando. Era como se algo gritasse na minha cabeça que aquela situação era injusta. Ela teve dias e mais dias com ele só pra ela, quando ele não tinha ainda um passado ou presente manchado pela participação no contrabando, satisfazendo seus desejos, passando horas apenas nessa missão... E eu lá, praticamente me chicoteando cada vez que minha memória traidora me lembrava dos amassos que eu culposamente cedia a , e mais ainda quando meus desejos irrefreáveis apontavam na direção de repeti-los e, por que não, dar continuidade a eles.
   Eu já nem sabia mais o que eu achava certo ou errado. Minhas convicções costumavam ser tão... convictas, mas aí essa peste entrou na minha vida e bagunçou meu mundinho maniqueísta. Quero dizer, ele era uma pessoa ruim, certo? Errado! Quando ele pagava sorvete pra uma criancinha no parque porque o dela caiu no chão, ou dava conselhos e ombro amigo aos seus colegas na CIA, ou encostava em mim, essa premissa se tornava falha.
   Como, me diz como, uma pessoa pode fazer essas coisas, ser assim, e ao mesmo tempo ter participado do contrabando de armas europeu? Ter torturado, chantageado e até mesmo matado gente inocente por aí?
   Eu sei, não faz o menor sentido.
   Por isso mesmo que eu me encontrava em tamanho dilema sempre que queria avançar o sinal com . E, voltando a Cristine, a desgraçada nunca teve que passar por nada daquilo, exceto, talvez, quando terminaram. Mas isso não me compadece, não mesmo. Ela ainda teve anos pra aproveitar daquele corpinho sarado, daquelas mãos másculas e voz pecaminosa sussurrada no pé do ouvido.
   E somando isso ao fato de ela ter me subestimado... Quer dizer, se ela sabia que era um agente da CIA, com certeza ela sabia quem eu era. E ainda me veio com um papinho todo amigável, para jogar na minha cara que ela não tinha medo de mim. Como se eu não fosse ameaça nenhuma.
   Ah, me poupe.
   Havia muitas coisas que eu tinha vontade de fazer naquele momento. Arrancar as tripas dela de modo bem lento e torturante encabeçava a lista, no entanto. Lógico que eu não me importaria de unir Elizabeth neste plano, lá estava mais uma que eu adoraria ver “em paz”.
   Mas calma, também não sou nenhuma sádica doente, não é como se eu matasse pessoas por diversão. Eu simplesmente não estava conseguindo conter tais pensamentos sombrios naquele momento. Um sentimento nunca sentido por mim antes tomava conta de todo o meu ser e eu sequer sabia nominá-lo.
   Quanto a , lógico que ficou todo putinho quando o deixei literalmente na mão naquele banheiro. Eu queria sim mais do que tudo agarrá-lo ali, mas um maldito pirralho de uns dez anos no máximo resolvera que precisava usar aquele vaso urgente, o que significa que fomos obrigados a sair dali. Ele me seguiu de volta a nossa casa – bufando de cinco em cinco segundos, diga-se de passagem – mas pareceu dar-se conta de que seu silêncio era o mais prudente no momento.
   Tanto bom senso aparentemente se extinguiu ao fecharmos a porta. O imbecil não resolvera apenas falar, ele resolvera me confrontar. O que é, em um nível astronômico, incrivelmente pior.
   - Eu já disse que vou cuidar disso, será muito esforço você desfazer essa cara de maníaca? – Perguntou. Soltei uma risadinha incrédula, encarando-o com as mãos na cintura.
   - Ainda não consegui decidir se você é muito corajoso ou muito estúpido. Ah, acabei de descobrir. A segunda opção. – Abri um sorriso de escárnio, minhas unhas perfeitamente pintadas praticamente perfurando as palmas das minhas mãos de tão forte que eu apertava os punhos.
   - Esse mecanismo de defesa já está irritando, sabia? É muito previsível, qualquer coisinha que te incomode já é motivo pra me atacar. – revirou os olhos, dando a entender o quanto ele me achava patética por tratá-lo daquele jeito.
   - Você sonha que é um modo de me defender, não é, ? Quando vai finalmente entender que eu o faço porque te odeio e gosto de te destratar? Me dá prazer te ver com essa cara de cão chutado. Cristine deveria te tratar muito bem pra que você não consiga aceitar que alguém não o faça. – disse ao levantar uma sobrancelha. Eu havia me aproximado de , de modo que as minhas palavras ardidas eram pronunciadas bem perto de seu rosto. Eu não queria que ele tivesse como fugir das verdades que eu julgava estar dizendo. Ele havia semicerrado os olhos, um sinal claro de que estava ficando nervoso, como tantas vezes já havia deixado-o.
   Começamos a travar uma luta silenciosa entre nossos olhares, era difícil dizer quem ali estava com a cara mais fechada. Ambos estávamos perto de atingir o limite da paciência e partir pra uma agressão mais significativa. não demorou muito para soltar a próxima facada, algo tão absurdo que eu tive que pedir que repetisse.
   - Então é isso, ? Ciúmes? Achei que você se garantisse. – até a palavra era ridícula. “Ciúmes”. Humpf, como se eu precisasse disso.
   - O quê? Ih, acho melhor ligar pra Leonard agora e pedir outro parceiro, você acabou de beirar a insanidade. – aproximou-se mais, lentamente se esgueirando até uma mão agarrar meus cabelos pela raiz na nuca e o hálito quente roçar provocantemente a pele do meu rosto.
   - Insanidade? Ok, vamos chamar assim. A verdade às vezes é insana mesmo.
   Eu não tive tempo de retrucar. No segundo seguinte, aqueles lábios, tão pecaminosos e surpreendentemente sedentos, se apoderavam da minha boca, meu colo e principalmente da minha mente. No segundo seguinte, eu nem mais sabia o porquê de não haver provado daquilo antes naquela noite. O porquê de ter esperado tanto para estar entre aqueles braços ridiculamente deliciosos.

  Narrativa em terceira pessoa

  Das sombras, ela o espionava. Havia encontrado um jeito de não ser vista pelas várias câmeras que a CIA instalara no perímetro. Todos aqueles anos com ele haviam lhe ensinado muitas coisas. Como, por exemplo, quando não estava sozinha.
   Ela notou a presença de mais alguém por ali. Alguém alto, forte. Alguém a quem pudesse seduzir para obter explicações. Aproximou-se do homem discretamente e notou que este sussurrava no celular. Teve vontade de ouvir e, para isso, aproximou-se ainda mais.
   - Eu não confio mais nela, senhor. Parece que está mais ocupada preocupada em ser uma vadia do que em investigar os novos moradores. – Ela nada compreendeu da conversa do misterioso rapaz, mesmo assim preferiu continuar ouvindo. Precisava de um elemento de chantagem para conseguir qualquer informação que ele pudesse ter. – Sim, se houverem equipamentos e estes não forem destruídos até o final da semana, eu mesmo o farei. Pode contar comigo, chefe, não pretendo estragar tudo novamente. – Com isso, o telefone desligara-se. Era sua hora de agir.

Capítulo 16 - Expectations and resolutions

  por Ele

  Então era aquilo. Aquilo que eu estava perdendo todo esse tempo, aquilo pelo que sonhei durante tantos anos. Ah, mas eu estava muito certo em entrar pra CIA. Mais do que isso, eu não podia ter tomado decisão melhor. era inacreditável. Ela era única, deliciosa, inebriante. Eu poderia fazer aquilo todos os dias da minha vida e ainda iria querer mais. Tudo que eu esperava, todas as minhas mais altas expectativas, ela não apenas as satisfez como ainda me mostrou o quão burro eu fui por imaginar tão pouco. não merecia tão ordinárias palavras. De fato, qualquer coisa que eu tenha a dizer sobre a noite passada não chegará aos pés do que realmente foi.

  flashback on

  Era ciúmes. Puro, simples, flamejante. Se ao menos eu soubesse antes que o combustível de toda essa raiva era apenas inveja de pensar em outra mulher me tocando... Quando confirmei essa minha hipótese, antes tão ridícula quando minha mente embriagada a formulou, tive certeza de que os próximos minutos seriam os melhores e os piores da minha vida. Eu tomaria mais uma vez o primeiro passo, eu faria se entregar. Mas o medo de ela recuar mais uma vez... Eu não conseguiria lidar com isso novamente. Aquela mulher me tirava vergonhosamente dos eixos, e me segurar toda vez que ela me barrava nunca seria tarefa fácil. De qualquer jeito, eu precisava apostar. Tanto tempo a estudando (e levando foras, admito) me ensinou o que eu precisaria fazer. Eu precisava arrastá-la para um ambiente de perda de razão, envolvê-la em um desejo inconsciente, algo que ela não pudesse lutar contra. Eu me esforçaria como nunca para enlouquecê-la até que ela pedisse que eu lhe desse tudo e não apenas as amostras dos últimos meses.
   - Insanidade? Ok, vamos chamar assim. A verdade às vezes é insana mesmo.
   Aproximei-me mais de , devorando-a com os olhos e as mãos coçando de vontade de tocá-la. Ela me encarava com o olhar nublado, a respiração entrecortada, talvez pela nossa recente acalorada discussão. Alcancei uma mão na raiz de seus volumosos cabelos, puxando suavemente, como se este ato pudesse me acalmar para concentrar-me no que eu estava fazendo. Respirei alto em seu ouvido, movendo a outra mão firme e decidida da lateral de seu quadril até a base de suas costas, violentamente puxando-a de encontro ao meu corpo. Pude escutar soltar um suspiro sôfrego com o encostar de nossos troncos, ambos com temperaturas extremamente elevadas.
   Desci minha boca de encontro a seu pescoço, a pele macia e levemente aromatizada me chamando, como um sedento no deserto. Cravei meus dentes nela e pude sentir que ela se arrepiara. Iniciei alguns beijos molhados por toda a extensão de pele exposta, incentivado pelos suspiros de ficando cada vez mais frequentes. Puxei o lóbulo de sua orelha entre os meus dentes, saboreei cada momento em que meus lábios estavam em contato com aquela fragrância inacreditável que ela emanava e, por fim, subi os beijos por seu rosto.
   Pude perceber que quase tremia de expectativa, o que significava que ela estava no ponto que eu queria. Fui alternando selinhos curtos e demorados desde sua orelha até o canto de seus lábios. Rocei então delicadamente nossas bocas entreabertas, misturando as respirações rápidas e desejosas por alguns segundos.
   Pude sentir suas mãos pequenas e desesperadas tomarem vida e subirem rapidamente pelo meu abdômen, agarrando por fim o colarinho da camisa que eu usava e me impulsionando em direção a ela. Quem era eu para negar tamanho pedido, afinal? Se este era o modo dela dizer que me queria, teria seu desejo atendido.
   Inclinei-me de uma vez, unindo finalmente nossos rostos em um beijo alucinante. Emitimos gemidos aliviados idênticos assim que nossas línguas se encontraram, travando uma espécie de batalha, uma dança impulsionada por toda a excitação que aquela demora toda havia acumulado. Era fogo e gelo, fazia arder e tremer, queimava cada nervo e congelava cada sentido.
   O sabor dela era algo que eu não podia tentar descrever nem se quisesse. E eu me deliciava nele a cada novo beijo entusiasmado que começávamos, sentindo o encaixe perfeito das nossas bocas, do nosso ritmo, a sincronia em nossas vontades, nos sons que emitíamos, no movimentar das nossas línguas. Era tão bom ter ela em meus braços, tão certo e estimulador, que eu não me surpreendi ao perceber que já estava animado. E, aparentemente, também. Eu sabia uma coisa ou outra de linguagem corporal, e a maneira com que ela esfregava seu busto contra meu peitoral não mentia. Os bicos dos seios dela deviam estar túrgidos, e ela procurava alívio para aquela sensação.
   As mãos de , tão determinadas em me manter perto, quase como se tivessem medo que eu me afastasse, moveram-se lentamente para o meu pescoço, uma agarrando sem piedade meu cabelo e a outra arranhando e apertando meus ombros e costas. Minhas mãos não permaneceram quietas, no entanto. Partiram quase que inconscientemente para as coxas fartas de , aplicando a pressão necessária para tirá-la do chão. Ela então envolveu meu quadril, encaixando nossas pélvis do jeito mais maravilhosamente certo possível.
   Eu, de algum modo, fui capaz de me mover alguns passos, podendo pressioná-la contra alguma porta ou parede antes que eu perdesse o controle sob minha força.
   Agora com o apoio, a pressão entre nossos corpos ficara tão intensa que eu precisei reprimir a vontade de simplesmente gritar de prazer. , por outro lado, nada reprimiu. Um gemido incrivelmente sensual saiu de sua garganta, o que me fez obrigatoriamente mover meu quadril contra ela, roçando com mais significância nosso ponto de contato e controlando o simples impulso de apenas derrubá-la no chão e devorá-la naquele mesmo instante. Eu precisava ser paciente. A melhor noite da minha vida merecia um pouco de paciência.
   Assisti morder fortemente os lábios e apertar os olhos, as unhas quase perfurando o tecido das roupas que eu vestia. Ela então focou o olhar em mim, tão sedenta e fora de si como eu jamais a havia visto.
   - Se você pretende viver pra terminar essa missão acho bom que continue fazendo isso. – O tom rouco e erótico de sua voz, camuflada pelo prazer que eu acabara de fazê-la sentir, só me deixou mais excitado.
   - O quê, isso? – Pressionei mais uma vez, de modo ainda mais forte, nossos quadris, sem nunca tirar meus olhos dos dela, deliciando-me com outro gemido rouco que ela deixou escapar. – Fique tranquila. Temos uma noite inteira desses movimentos pela frente. – Rebati. abriu um sorriso ladino, apoiando-se em meus ombros e ela própria impulsionando-se de modo a massagear minha ereção pulsante.
   - Pode apostar que temos. – Não pude evitar gemer em seu pescoço, extasiado pelas sensações que só aquela garota me causava. Aquilo era sujo, perigoso e sensual na medida simplesmente ideal. Até mesmo a posição em que estávamos me era favorável. Eu sonhava em tomar contra qualquer parede há meses. E mesmo em meus mais profundos sonhos, eu nunca podia esperar que ela reagisse de forma tão sexy como vinha reagindo.
   De repente, todo o contato, por mais magnífico que fosse, não era suficiente. Começamos a nos movimentar desesperadamente, ao mesmo tempo em que arrancávamos as roupas um do outro. Minha camisa teve como chão seu destino, assim como a gravata e cinto. , graças a Deus, estava um zíper atrás apenas. Joguei seu belo vestido em algum canto desconhecido da sala, podendo agora admirá-la em um conjunto de lingerie preto rendado que deixava seus seios ainda mais atrativos.
   Subi minhas mãos por suas coxas até começar a dedilhar sua virilha. se contorcia em cima de mim, enquanto minhas investidas superficiais continuavam, os suspiros ininterruptos e gemidos mal contidos. Eu mantinha meu rosto enterrado em seu sedutor pescoço, apenas sentindo o perfume natural daquela garota insanamente maravilhosa. Ela descontava a tensão em meu couro cabeludo, as pernas fechadas com força em volta de mim, os seios volumosos subindo e descendo com a respiração acelerada esfregando meu peitoral, uma alça do sutiã tombada sob seu braço. A definição da cena era boa demais pra ser verdade. Eu não suportava mais, esperar estava me deixando louco. Eu precisava tê-la naquele instante. Meu racional já tinha se perdido por completo junto com a mordida desejosa que ela depositou no meu lábio inferior. Não havia mais como frear ou atrasar o que estava para acontecer.
   - Quarto. Agora. – Ela olhou pra mim, ainda parcialmente cega de prazer, mas concordou veemente com a cabeça no segundo seguinte. Desceu do meu colo e me puxou, pelo cós da calça, que precariamente ainda estava no meu corpo, em direção às escadas. Subimos em meio a beijos e carícias quentes e nosso quarto nunca pareceu tão distante.
   Eu precisava estar nela o quanto antes, precisava que urrasse meu nome, precisava extravasar todo o ódio e tesão que sentia por ela no sexo mais intenso que já existiu. Deixei que ela me guiasse até que estivéssemos dentro do quarto. No momento que isso aconteceu, eu peguei pela cintura e a joguei na cama, me esgueirando sobre ela como um animal faminto. Arranquei o sutiã que me impedia de tocar a pele sensível de seus seios como eu desejava, podendo então apertá-los e beijá-los com toda a boa vontade que eu possuía, a trilha sonora sendo os soluços curtos de prazer que ela soltava na medida que eu sugava e/ou mordia seus mamilos rosados. Eles eram perfeitos, como tudo nela. Fartos, porém do tamanho ideal para minhas palmas, redondos e eriçados, desses que praticamente imploram por um bom tratamento. Eu cedi, é claro. Fui obrigado a deixar um pouco a pressa de lado para dar a devida atenção àquela parte peculiar do corpo da minha parceira. O que ela não pareceu achar ruim, uma vez que praticamente me ajudava a abusar de si, pressionando-se contra a minha cabeça e colocando as mãos por cima das minhas, me fazendo apertar os montículos mais forte. Eu sempre soube que não prestava, mas tamanha sedução era demais pra mim, me deixava quase desnorteado.
   Segui meus beijos lânguidos por sua barriga, divertindo-me com o fato de que arqueava as costas e pressionava os lençóis sob suas mãos cada milímetro mais baixo que eu me movia. Contornei calmamente seu umbigo com a ponta da língua, sentindo o quão quente aquela área do seu corpo se encontrava.
   Enlacei meus dedos nas laterais de sua calcinha e a puxei lentamente para baixo, apressando-me em cobrir de beijos curtos e roçadas de barba todo pedaço de pele que era exposto. esticou as mãos trêmulas e suadas para a gaveta do criado mudo, imediatamente tirando um pacotinho prateado de dentro – a camisinha.
   Assim que passei o pedaço pequeno de pano por seus pés, fui empurrado para o outro lado da cama, tendo sentada sobre mim assim que aterrissei. Ela não parecia possuir nem uma fração da paciência que me abençoara nas últimas horas, de modo que em um segundo eu não possuía mais boxers sob meu corpo e o alumínio quadrado já estava vazio e jogado rasgado em qualquer canto. Mas eu não deixaria que tudo fosse tão fácil assim, eu merecia poder apreciar daquele doce exótico pelo tempo que me competisse e do jeito que bem entendesse. Movi meu corpo contra o dela, novamente ficando por cima entre suas pernas.
   - Diga o que quer, . Em alto e bom som. – Rosnei perto de sua boca, o controle precário agora que meu pênis roçava vigorosamente sua entrada.
   - ... Oh... Agora não é hora para joguinhos. – Sua voz quase não saía de tanta tensão. Suas mãos e pernas tentavam a todo custo me empurrar em sua direção, mas eu me mantinha firme.
   - Diga de uma vez e eu faço essa noite memorável para nós dois. – Era um pedido simples, e eu tenho que admitir que só insistia nele por dois motivos: orgulho, já que eu nunca faria sexo com ela sem antes ela admitir que queria, e porque ver com raiva me deixava ainda mais excitado, e esse pedido com certeza a deixaria com raiva.
   - Eu quero... você... seu imbecil. – Ela bufou ao final da frase, ato que fez um risinho mais orgulhoso escapar da minha boca.
   - Eu vou ignorar o xingamento e dar o que você quer. – E então, olhando no fundo de seus olhos, eu a penetrei de uma vez, com toda a força que eu tinha, saboreando cada fração de segundo do ato, cada centímetro apertado invadido. Um grunhido alto foi emitido, e eu nunca saberei ao certo se foi meu, dela ou dos dois. Puta que pariu, como ela era boa. E o calor. Ah, o calor estava por todos os lados. estava quente e molhada, no ponto exato para fazer daquela experiência ainda mais ideal. Aliás, molhada não, encharcada. A filha da puta estava tão excitada quanto eu, o que só tornava tudo melhor.
   Eu não parei, então. Comecei um ritmo ridiculamente perfeito, uma dose de prazer quase insuportável, a garota abaixo de mim quase desfalecendo de tupor. Nossos corpos se encaixavam maravilhosamente bem, como se fossem feitos um para o outro. Ela sabia exatamente onde tocar para que eu saísse ainda mais de mim, se é que isso era possível.
   Eu a invadia com cada vez mais violência, sem poder conter esse impulso que ela causava em mim. Sentia nossos corpos escorregarem um contra o outro, alertando cada poro sensível da presença mútua. Em algum momento do processo eu levantara uma das pernas dela até enlaçá-la no meu quadril, de modo a ter mais acesso aquela cavidade divina. Ela se aproveitou disso, usando o pé e o joelho para me trazer contra ela com mais vivacidade. Eu mordia por vezes um dos seus seios para conter um gemido mais alto, mas ela não parecia deter esse tipo de controle sobre si. Sua boca escancarada emitia ruídos cada vez mais altos e eróticos, me fazendo perder os sentidos. Levei dois dedos entre seus lábios, procurando calá-la um momento para que a festa não acabasse tão cedo. Ela prontamente os sugou, umedecendo-os com sua língua e mordendo os nós vez ou outra. Foi obviamente inevitável imaginar o que aqueles movimentos poderiam fazer em outra parte do meu corpo. E, por isso, eu tive que tirar meus dedos de onde estavam e ocupar aquela boca pecaminosa com outra coisa. Tomei seus lábios em um beijo desesperado, como se pelo ato pudesse retomar um pouco da força que me tinha esvaído, logo levando meus dedos umedecidos até o ponto onde nos chocávamos e massageei de modo meio desajeitado seu ponto de prazer, sentindo ela praticamente falhar em dar continuidade ao beijo.
   Céus, como era difícil me segurar. Se for pra ser honesto, eu sentia vontade de gozar desde que tivera contra a parede da sala. Depois de tantas vezes sendo impedido de fazer o que eu queria, acumulou-se uma vontade absurda de simplesmente me entregar ao momento. Mas eu não deixaria aquilo acabar tão cedo. Ah, não, eu prolongaria o prazer dela até seu ponto máximo, este era o único modo de fazê-la me procurar novamente. Com isso em mente, eu apenas aumentei o ritmo das investidas, ignorei o agrado sádico que o estrago que as unhas dela estavam fazendo nas minhas costas estava me dando, e aproveitei o som harmonioso dos nossos gemidos.
   Quando ela apertou suas pernas ao meu redor e gritou meu nome aos sete ventos, em êxtase, infelizmente, não pude mais me conter. Eu acabara de ver Marquese ter um orgasmo por minha causa e ainda urrar “” em seu auge; era simplesmente demais pra aguentar. Eu me permiti diminuir o ritmo e curtir os espasmos que o ápice de prazer trazia. Meu corpo inteiro formigava, meu peito não conseguia encher de ar da maneira com que eu precisava, e a nebulosidade que envolvia minha mente me cegava temporariamente. Caralho, eu nunca mais ia deixar ela em paz.
   Caído ao seu lado, completamente esgotado, pude praticamente ouvir a cabeça de entrar no estado de alerta e começar a trabalhar, e em segundos eu já havia me livrado da camisinha e subido em cima dela novamente. Eu não deixaria ela se arrepender disso, não hoje, pelo menos. E eu estava muito longe de terminar aquilo. Independente de estar cansado, eu tinha muito que descobrir ainda naquele corpo maravilhoso, e não podia deixar isso para outra hora.
   Ela apenas continuava ali, deitada com um sorriso leve no rosto surgindo aos poucos, a face serena e os cabelos bagunçados. Linda.
   Aproximei-me dela cuidadosamente, dando apenas um beijo em seus lábios. Eu queria testar o quão alerta os segundos de trabalho mental haviam deixado-a. Mas acho que a subestimei, afinal. me empurrou para o lado com brutalidade, escalando-me a seguir como uma fera insaciada, procurando por mais, muito mais.

  flashback off

  E aquela seria apenas mais uma dentre as várias vezes que aquilo se repetiu naquela noite.

Capítulo 17 - First Step

  por Ela

  Olhei para o criado mudo, constatando que já passava de meio-dia. Não que isso fosse surpreendente, uma vez que só fomos dormir lá pelas sete horas da manhã, muito ocupados para sequer notar que já estava amanhecendo. Bom, agora que já havíamos perdido o treino de tênis, que mal faria passar o resto do dia fazendo nada? Olhei para o ser do meu lado, como se por um milagre dos céus ele fosse concordar com a pergunta silenciosa que eu acabara de formular, mas não contava que apenas olhá-lo pudesse me remeter a tantas sensações. Todas as memórias relacionadas à madrugada anterior me atingiram em cheio enquanto meus olhos descansavam sob aquela figura tão máscula, viril e deliciosa. Suspirei.
   Ele era quente, fervoroso, insaciável. Nós pegamos fogo naquela cama, o contato pele com pele, os olhares que trocávamos, as mãos passeando sem pudor algum... Uau.
   Lógico que a culpa estava presente.
   Eu estava aprendendo a controlá-la melhor, é verdade, mas não é como se de uma hora pra outra eu simplesmente fosse me esquecer daqueles fatos malditos que sempre rodavam minha mente toda vez que eu sequer esbarrava nele. “Ele não presta”, “Ele nunca vai ser o homem que você precisa”, dentre outros pensamentos chatos e tão certos.
   No entanto, além de estar tendo o privilégio de conhecer um lado de antes oculto, quando ele finalmente me penetrou sob os lençóis amarrotados todos os meus pensamentos se calaram. Eu poderia morrer naquele momento, porque havia experimentado a felicidade mais completa e suprema. Soa meio fantasioso demais falar assim, mas juro que a sensação era a essa altura de plenitude.
   Experimenta ter séries inacabáveis de orgasmos poderosos antes de me questionar.
   Meu medo era que eu viciasse. Foi bom demais, esse era o problema. Eu sabia que iria querer mais e todo o tempo. Mas eu não poderia ficar usando por aí, fazendo sexo com ele e não envolver sentimentos na história... Poderia?
   estava adormecido, o peito nu subindo e descendo lentamente acompanhado do sorriso tranquilo que ele carregava nos lábios carnudos vermelhos e inchados pelos meus incansáveis beijos. Ele fazia com que eu quisesse esfregar minhas pernas uma contra a outra com a simples lembrança da noite passada. Como se não tivesse sido o suficiente para tirá-lo do meu sistema, simplesmente passara a exercer influência ainda mais intensa sobre minha cabeça e corpo. Ótimo, tudo que eu não queria.
   Resolvi levantar, convencida de que ficar naquela cama revivendo tudo aquilo não me ajudaria em nada. Cacei uma camisa qualquer de e me vesti, ainda muito sonolenta pra procurar uma peça de roupa mais elaborada e fui para a cozinha. Tomei um copo bem grande de suco de laranja e resolvi ver se havia alguma mensagem de Débora e Leonard no escritório. Fazia algum tempo que não reportávamos o andamento da missão e agora havia uma certa magrela falsa para se investigar.
   Abri a porta, sentei-me em uma das cadeiras em frente à grande escrivaninha e pressionei o botão de ligar do moderno computador da CIA. Nada. Nenhum som, nenhuma luz, nem sinal de vida. Peguei o telefone sem fio projetado para contato direto com a base e... Sem linha. Respirei fundo, contando até dez antes de simplesmente surtar.
   Abaixei-me de modo a olhar onde os fios deveriam estar conectados à tomada, rezando para que tivesse desligado-os por algum motivo qualquer. A realidade na verdade era bem diferente. Os fios estavam sim todos conectados à tomada, e abaixo deles jazia uma grande poça de água. E não, não era vazamento e nem cano estourado. Alguém molhara os fios propositalmente, sabendo que aquilo daria curto circuito em todo o sistema integrado, o que nos deixaria completamente desamparados de auxílio da base.
   Levantei-me, procurando alarmada por meu celular e o de . Encontrei ambos sobre a estante ao lado da escrivaninha igualmente molhados. A bateria reserva do notebook idem. Alguém queria nos deixar sem comunicação com a CIA, e havia conseguido até segunda ordem. O procurado sabia sobre nós.

xx

  Narrativa em terceira pessoa – continuação da noite anterior.

  - Então, quer me explicar como entrou pra essa vida? – A moça aproximou-se lentamente, deixando o lugar onde antes se escondia.
   - Quem é você? O que está fazendo aqui? – Ele estava alarmado, não esperava companhia alguma durante sua espionagem, menos ainda de uma mulher tão atraente.
   - Isso não importa. O que interessa é que eu posso te ajudar. Isto é, se você me ajudar também. – Ela sorriu perspicaz, levantando uma sobrancelha e apoiando as mãos na cintura.
   - Quem disse que eu preciso de ajuda? Olha, moça, acho que você devia ir pra sua casa, dormir e esquecer qualquer coisa que tenha visto ou ouvido aqui. – Ele estava visivelmente nervoso, o brilho molhado em sua testa e a inquietude de seus pés demonstrava isso.
   - E perder a chance de te ajudar a foder com esses dois? Acho que não. E se não precisasse de ajuda, não estaria aqui implorando para que o seu chefinho tenha paciência com você. – Ele se surpreendeu com o rancor líquido em seu olhar e sobre o quanto ela sabia. Talvez ele devesse tomar mais cuidado, se fizesse algo errado dessa vez de certo não teria outra chance.
   - O que te leva a acreditar que logo você poderia me ajudar em algo?
   - Talvez o fato de que eu conheço como ninguém. – Rebateu, confiante. Ele parou e pensou por um instante.
   - Prove que você é útil e eu não te mato agora. – O homem levantou uma arma em sua direção, mas ela não pareceu se abalar.
   - Se você ao menos soubesse parte da história... – Ela riu descontraída, em seguida encaminhando-se para a lateral da casa. Retirou um canivete do decote e forçou delicadamente a fechadura da janela da cozinha, que logo cedeu. Minutos depois ela saía da casa como se não houvesse entrado em momento nenhum e dirigia-se ao homem que a aguardava temeroso. – Não precisa mais esperar que o outro capacho se mova. Os equipamentos estão inutilizáveis agora. Já me provei útil ou vai continuar com essa 38 apontada pra minha cintura? – Ele permaneceu estático. - Sabe, se quer mesmo me matar está precisando de umas aulas porque um tiro de raspão não é a melhor maneira de fazê-lo. – Desdenhou. Ele semicerrou os olhos, odiando e ao mesmo tempo ficando encantado com tanta petulância.
   - Tudo bem, você foi de bom uso. – ele disse guardando novamente a arma. – Agora me diga, como você espera que eu te ajude?
   - Na verdade, já ajudou.
   - Como assim?
   - Eu queria a confirmação de que e estavam aqui pra uma missão e não por serem um casal feliz ou algo do gênero. – ela pausou a fala para rolar dramaticamente os olhos. - Ao me deparar com os equipamentos da CIA tornou-se óbvio que eu estava certa. Agora qualquer que seja o seu plano ou do seu chefe, eu quero participar.
   - Acho justo. Pode começar me falando se há algo digno de se mencionar sobre o que encontrou dentro da casa. Algum ponto fraco?
   - A julgar pelos gemidos vindos do andar de cima, creio que a maior fraqueza deles seja ficarem separados. É um bom modo de começar o ataque.
   - Bem, espero que seja adepta da madrugada. Precisaremos de muito café se vamos ficar acordados a noite inteira descobrindo aonde e como agir para acabar com essa história toda. – ela abriu um sorriso vitorioso, seguindo o homem que passou a se mover em direção a uma outra casa, não muito longe dali.

Capítulo 18 - Unpleasent Visit

  por Ela

  - ACORDA, INFELIZ!
   - Meu Deus, , bom dia pra você também. – bufei e virei meus olhos, achando a coisa mais ridícula do mundo ele vir fazer gracinhas em um momento crítico como esse.
   coçou os olhos, lentamente sentando-se na cama. Eu fingi por um momento que não tinha reparado nos músculos da barriga dele maravilhosamente expostos trabalhando pra que ele ficasse sentado, voltado minha atenção novamente ao meu surto psicótico.
   - Não venha se fazer de engraçadinho. A culpa é toda sua, SUA, ta me ouvindo? - Ou, ou, calma. Foi só sexo e não a terceira guerra mundial! – ele esticou as mãos em defesa e franziu as sobrancelhas, obviamente convicto que eu estava fazendo uma tempestade no copo d’água.
   - É, querido, acontece que enquanto estávamos aqui, contra todos os meus princípios, diga-se de passagem, alguém estava lá em baixo, cortando toda e qualquer comunicação que tínhamos com a CIA.
   - Ok... O QUÊ? – Ele levantou-se no mesmo instante, chocado demais com a notícia pra se quer ter a decência de se lembrar que estava nu. Eu com certeza corei na mesma hora, senti todo o meu rosto ficar quente e arregalei os olhos, imediatamente virando-me de costas.
   - ! – Exclamei atônita. - Seu porco, vista-se pelo menos, eu não sou obrigada a me deparar com essa cena horrorosa logo cedo. – Desdenhei. Eu menti sim, mas dane-se. Admitir que aquela cena acabara de melhorar meu dia em uns 200% estava fora de questão. E o assunto era sério, ele não podia ficar me distraindo desse jeito.
   - Ah tá, como se você não estivesse secretamente desejando que a noite passada se repetisse. Você não pareceu me achar um porco ou achar meu corpo horroroso dentre estes lençóis, . – disse logo me arrastando para o mesmo clima de sedução da noite anterior. Não era tão complicado de entender que estávamos constituindo um padrão ali. Ele me provocava, eu cedia, tinha uma crise de negação, o atacava, e ele respondia com mais provocação. Basicamente eu era bipolar e ele um tarado. Ou ao menos era nisso que o nosso relacionamento parecia se basear.
   O que mais me preocupava, na verdade, era eu estar chamando aquilo de relacionamento.
   Antes que eu desviasse a linha de pensamento para retrucá-lo em uma tentativa bizarramente fraca de não cair na tentação e focar no problema recém-detectado, a campainha da casa soou estridente e insistente, me fazendo bufar pela milésima vez naquela manhã.
   Percebendo que a pessoa não desistiria, resolvi ir atender a porta, não sem antes jogar a boxer que estava ali na minha frente para , pra que ele achasse que eu o queria vestido.
   Desci as escadas rapidamente, a adrenalina ainda impulsionando meu sangue rápido pelas veias, movida de raiva pelo acontecido, irritação pela pessoa que continuava a soar a campainha e frustração pelo desejo insaciado que ainda corria em mim, apesar de toda a atividade recente que ainda fazia meu corpo latejar em partes estratégicas.
   Abri a porta de uma vez, sem me preocupar de olhar primeiro no olho mágico.
   - Que é?
   - . – Um homem de terno caro e aparência bem cuidada jazia escorado no meu batente portando um infeliz sorriso prepotente e os olhos em fendas astutas. O ar de superior que ele carregava me inflamou na mesma hora, de modo que eu juro que teria sido grossa se não fosse o fato de que ele agora encarava nada discretamente minhas pernas expostas já que a camisa de não ficava suficientemente cumprida.
   - S-sim? – Questionei, dando abertura para que ele dissesse a que veio. Eu estava claramente nervosa e até mesmo arrisco dizer fora dos eixos, o que me diminuía perto da visita, estando ele calmo e arrumado e eu... Bem, o contrário.
   - Sou Mark Von Guielsen, enviado da CIA para auxiliá-la no caso. – seu sorriso se alargou, como se ele estivesse se divertindo às custas dos meus olhos arregalados com o fato de me considerarem uma incompetente na missão a ponto de terem que enviar reforço.
   - Von Guielsen como em Leonard Von Guielsen? – Ele acenou com a cabeça brevemente, trancando o maxilar por algum motivo que não convinha à minha mente turbulenta de avaliar, confirmando que meu chefe simplesmente mandara o irmão, parente ou eu sei lá, pra ser meu babá. Ótimo. – Bem, eu já tenho um parceiro, portanto você não será necessário.
   - Se eu fosse você, não desdenharia minha ajuda, . Soube que sua aparelhagem de contato com a base foi danificada.
   Que ó-d-i-o. Eu mal acabara de descobrir a desgraça e já tinha um infeliz esfregando na minha cara. Para isso a CIA é eficiente, agora mandar equipamento novo que é bom, nada.
   - Isso não é da sua conta. A missão vai bem, obrigado, já pode voltar pra de onde você veio. – Eu ia fechando a porta na sua cara (sou muito educada) quando ele me impediu, colocando o braço para pará-la.
   - Eu vou estar na casa 34 quando quiser admitir que precisa de mim. Ah, e mais uma coisinha, todas as descobertas agora tem que ser reportadas à minha pessoa, eu mencionei isso?
   - Não, fofo, acho que você esqueceu. – fiz a cara irônica mais descarada possível. Aproveitei que o imbecil ria da minha indelicadeza e finalmente bati a porta com tudo.
   - Do que se tratava? – Um cheiroso e pingando, com uma toalha enrolada baixo em seu quadril, me perguntou assim que eu subi as escadas de volta à suíte principal.
   - Temos um babá agora. O palhaço se acha o fim da picada e a agência aparentemente nos taxou de incompetentes. Ele está morando aqui no condomínio, só esperando que rastejemos pedindo ajuda. Patético. – Desabafei me jogando na cama desarrumada em busca de colocar a inundação de pensamentos desordenados em linha lógica.
   - Você não parece ser muito fã do cara. Já dormiu com ele, por acaso? – perguntou como quem não quer nada, ao passo que escolhia uma roupa para usar.
   - Há, há, há, como você é engraçado, . – disse irônica - Eu nunca ouvi falar dele na vida, até onde eu sabia Leonard sequer tinha família. – acabei adquirindo um ar pensativo, mas fui interrompida em meus devaneios.
   - Ele é parente do nosso chefe? – Questionou ao que eu acenei afirmativamente. - Agora a porra ficou séria. – disse alarmado.
   - Agora? Sério que precisou esse cara surgir pra você perceber a gravidade da missão? Quantos anos vocês tem, doze? – Explodi. Respirei fundo, louca de vontade de dar uns gritos pra desestressar. Merda. Eu estava perdendo a cabeça e dessa vez sabia que sequer era culpado. Hora de me refazer. – Desculpe, ok? Eu descontei em você as descobertas dessa manhã. Não que você não mereça, você sempre merece, mas acho melhor restringir meus esporros e grosseria pra quando você de fato tiver culpa. – dei de ombros.
   - Espera, então você não acha que o fato de invadirem nossa casa e destruírem nossos equipamentos porque estávamos distraídos aqui em cima é minha responsabilidade? – ele parecia descrente da minha aparente inesperada mostra de educação.
   - Na verdade, acho. – Bondade tem limite. - Mas sei que tenho parte nisso também. Afinal, eu permiti. Você obviamente não precisava ficar o tempo todo tentando abusar de mim, mas...
   - Opa, espera ai. Abusar de você uma vírgula, o que fizemos foi de comum acordo, , e pelo que eu me lembro você adorou e implorou pro lobo mau aqui continuar. – ele colocou as mãos no quadril.
   - Mas que inferno, , será que você não pode ser decente um segundo e me deixar em paz com a minha mente? Nós dois sabemos que eu gosto de fingir que não acatei a esses desejos carnais que me consomem e mesmo assim você faz questão de esfregar isso na minha cara a cada chance que acha.
   - É meu dever, amor. – ele sorriu de lado e debochado, imediatamente me fazendo lembrar da nossa visita desagradável.
   - Não, , seu dever é resolver essa missão e estamos longe de conseguir cumprir isso. – Decretei voltando o foco do assunto para o profissional. Incrível a facilidade que tínhamos para deixar isso de lado e falar de nós. Isso está muito errado. Tanto a constatação do fato como eu acabar de admitir existir um “nós” - E agora com esse cara aqui e mais a tal da Cristine... – Parei um segundo de discutir e massageei minhas têmporas, eu estava visivelmente de saco cheio de pensar no assunto.
   - , olha pra mim. – Seu tom era sério, quase uma ordem. Eu o fiz. – Nós vamos dar um jeito. Nós sempre damos. Eu vou falar com esse cara, vou descobrir qual é a dele, e quando entardecer vamos ao parque passear com nosso vizinhos, fazer um social. À noite vamos espionar mais algumas casas e dessa vez seremos mais cuidadosos. O que precisamos fazer é não deixar isso nos abalar, usar os acontecimentos de motivação pra avançar nossas descobertas. – Disse. Ele estava certo. Eu não podia perder a cabeça agora.
   - Tá bem. – dei de ombros de novo, isso estava se tornando um hábito. - Toma cuidado com esse cara, ele é de irritar qualquer um e você às vezes consegue ser ainda mais pavio curto do que eu. – Alertei, ele apenas continuou me olhando, sem disposição para argumentar. - Eu vou ligar pra Pamela, ver se ela encontra com a gente no parque. Eu estava pensando em colocar umas escutas por aí, o que me diz?
   - Essa é a CDF que eu conheço! – ele riu e veio apertar minhas bochechas, à qual eu dei um tapinha em sua mão atrevida. Mão de gostoso não deve me tocar tão cedo, é perigoso. - Acho ótimo, , você prepara tudo enquanto eu vou lá. Nome e casa que o cara tá?
   - Mark, casa 34. Tchau, . – Ele acenou positivamente e ia saindo quando... – E obrigada. – Isso saiu da minha boca? Lógico que saiu, acho que eu estou criando múltiplas personalidades, não é possível. Mas verdade seja dita que até fora de bom uso essa manhã. Ou vai ver que eu estou aprendendo a lidar melhor com ele. Não sei, as coisas estavam diferentes. Mas quem diria, hun? Eu jurava que o que aconteceria após uma noite de sexo com meu quase pior inimigo seriam uma vergonha e nojo absurdos de mim mesma. E acabou que a realidade não foi nem remotamente tão terrível. Vai ver estava certo e eu fazia mesmo uma tempestade no copo d’água às vezes. Enfim, enquanto os milhares de pensamentos continuavam a rondar minha cabeça, ele apenas foi falar com nosso mais novo baby-sitter. E eu ficaria aqui, me mordendo pra saber o que estava acontecendo lá na casa 34, que, na verdade, era bem perto da nossa.

Capítulo 19 - Do you feel something?

  Algumas casas depois...

  Narrativa em terceira pessoa

  - Isso não faz o menor sentido! Com todo o respeito senhor, mas agora que eu dei a confirmação que vocês queriam, por que continuar com teatrinhos?
   - Isso não é uma discussão, querida. Você, assim como qualquer outro capanga, trabalha pra mim agora e deve acatar minhas decisões. – A mulher rolou os olhos e bufou; sempre teve problemas quando as coisas não saiam como ela planejava. O homem parado ao seu lado deu um passo à frente, tomando coragem de expor sua opinião.
   - Chefe, me desculpe a intromissão, mas... talvez ela esteja certa. – Era difícil pra ele contrariar aquele poderoso terrorista, ainda mais depois de tudo que este fez por ele. - O plano já está bolado e você tinha dito que queria acabar com eles assim que suas suspeitas fossem confirmadas, então eu não estou entendendo...
   - Calado. – Interrompera o procurado – As coisas serão do meu jeito. Qual a graça de acabar com a brincadeira antes de ela começar? Sim, agora eu tenho minhas suspeitas confirmadas e sei quem está atrás de mim, mas os dois patetas não tem a mesma vantagem. O que me custa aproveitar disso e aumentar a diversão? Esse era o propósito de tê-los me procurando para começo de conversa. – Explicou com um brilho diabólico nos olhos escuros. - Eu já dei início ao meu novo joguinho de gato e rato, e se vocês quiserem se juntar ao time vencedor devem parar de me questionar. Agora, caso queiram escolher outro caminho devo avisar que as consequências não são nada boas...
   - Não senhor, perdão, estamos com você. – Respondeu prontamente o rapaz.
   - Ótimo. Agora saiam daqui que meu jogo deve ter continuidade. – O homem mirava as câmeras recentemente instaladas ao redor do seu quarteirão, ao passo que um sorriso maligno o acompanhava.
   Os dois subordinados se retiravam – ela, frustrada, ele, conformado e temeroso. Mais uma vez ficariam no aguardo dos próximos passos daquele homem tão sádico e perigoso.

xx

  Por Ele

  Toquei a campainha da casa 34 ainda incerto sobre o que falar com o tal Mark. dissera que o fato de ele estar aqui significava que estávamos sendo vistos como incompetentes, e eu precisava mostrar pra esse cara que nós podíamos lidar com aquela situação sem precisar de babá. Mas verdade seja dita, cada vez estávamos mais longe de encontrar o procurado. E ele mais perto de nos encontrar.
   - . Imaginei que o mandaria aqui. Vamos, entre! – O tal Mark deu espaço para que eu passasse, e só de cara eu já podia ver porque estava incomodada com a presença dele. O cara tinha postura, intimidava bastando um olhar. Tudo nele gritava a presença de um ego gigantesco, uma prepotência ilimitada.
   - Quer um café? Uma cerveja? Ora, sente-se, por favor, fique à vontade. – Escolhi o sofá mais próximo e me sentei na beirada, deixando claro minha pouca vontade de permanecer ali. Eu ainda não havia pronunciado uma palavra sequer e todo aquele teatro de bom anfitrião, com direito a sorrisos exagerados e cordialidades, estava me deixando tonto. Resolvi que o melhor seria cortar logo qualquer início de assunto que ele fosse puxar e ir direto ao ponto.
   - Mark, certo? – Cerrei os olhos para ele, trazendo o tom demandado de seriedade ao assunto. - Pode me dizer o que está realmente fazendo aqui em Westbridge? – Uni minhas mãos e apoiei os antebraços nos joelhos, me inclinando suavemente em sua direção para intimidá-lo. Ele permaneceu quieto, mas pude ver um lampejo de irritação transpassar por seus olhos. Ah, sim, as janelas da alma. Se havia algo nessa vida que eu sabia fazer era decifrar pessoas, por vezes através do mais simplório detalhe, como aquela análise em particular. Mark não estava satisfeito com a minha atitude, e o porquê disso eu só podia supor. Talvez ele pensasse que eu fosse mais facilmente driblável do que minha parceira, e acataria suas ordens; Talvez ele não estivesse acostumado com pessoas “crescendo” para cima dele. – E então?
   - Como assim o que estou fazendo aqui? , meu caro, a comunicação em casa anda precária? Eu disse à que fui enviado para tomar conta de vocês, uma vez que seus equipamentos foram danificados e vocês parecem estar tendo certa... dificuldade em encerrar o caso. – Ele abriu um sorriso cínico, como se o fato de estarmos nos fudendo na missão o agradasse. Sempre soube que a competição dentro da agência era acirrada, mas ele passava um pouco do limite, o que me levava a crer que alguma peça estava me faltando. Não nos mandariam um supervisor sem um motivo sólido e não supositório para tanto. Ele cruzou as pernas e descansou seus braços no encosto do sofá, possivelmente tranquilo de ter invertido posições, assumido novamente sua vantagem.
   - Não, não. Se fosse realmente este o motivo apenas teria trazido novos equipamentos para que Leonard em pessoa pudesse gritar conosco e dado o fora. Há algo que a CIA sabe que potencialmente nos atrapalhará na missão e por isso te enviaram, para deter essa interferência. O que é? – Semi-cerrei os olhos, finalmente entendendo o jogo dele, o seu objetivo nisso tudo. Mark ficou sério, porém no instante seguinte um sorriso brincava no canto de seus lábios.
   - Diga-me, sinceramente, . Não suspeita que motivos tenham me trazido aqui? O que você e estão supostamente escondendo que seria motivo suficiente para a CIA mandar um superior tomar conta de vocês? – Indagou sugestivamente. Ok, então eles provavelmente sabem de Cristine. Ou então talvez suspeitem que algo esteja rolando entre mim e . Legal, somos realmente MUITO burros de achar que a CIA não tinha seus informantes mesmo aqui na vizinhança. Levantei-me em um pulo, precisava falar com minha parceira.
   - Escuta aqui, Mark – apontei um dedo em sua direção. – Vamos lidar com isso da forma como bem entendermos. Fomos treinados e a CIA não tem sequer um motivo para duvidar da nossa capacidade de solucionar um caso - Já provamos que somos competentes mais do que qualquer outro agente. Portanto não se meta. Estamos entendidos? – Ele abriu mais um sorriso, parecendo satisfeito com a minha reação.
   - Claro, , como quiser. – O tom de ironia pingava na frase. Eu apenas bufei e sai de sua casa batendo porta. Mark explodiu em risadas dois segundos após eu ter pisado na calçada. Preferi ignorar e fui em direção ao parque, colocar a par da frustrada conversa.

  xx No parque...

  Por Ela

  Mal havia se passado uma hora desde que vira pela última vez e eu já estava surtando. Minha curiosidade estava inflamada de pensar no que poderia estar acontecendo na casa 34. Eu marcara com Pamela de nos encontrarmos no parque do condomínio, como havia dito para , mas neste ponto ela já deveria estar farta de mim. Estávamos teoricamente conversando, no entanto eu em nada contribuía na conversa. Ela apenas falava, e falava mais um pouco, e eu emitia sons monossilábicos. Ainda bem que pelo que eu a conhecia, ela não se irritaria comigo por pouco. Apenas aguentaria, quem sabe julgaria que eu estava em um dia ruim, e deixaria passar minha falta de modos.
   Pude parar de me preocupar em fingir prestar atenção quando avistei se aproximando de onde estávamos. Um suspiro de alívio saiu por entre meus lábios, minha ansiedade poderia enfim parar de me corroer. Pamela pareceu perceber minha reação um tanto exagerada que seguiu a simples aproximação de meu marido e acabou murmurando um “o amor é lindo”, encantada.
   - E então, como foi? – perguntei afobada. Por sorte eu havia me dado ao trabalho de inventar à Pamela que tinha ido a uma reunião com seu chefe, acobertando, portanto, o porquê de tanta aflição e espera por sua volta. Ela, assim como todos os vizinhos que conhecemos, achava que trabalhava em casa, gerenciando as ações de uma empresa grande de Manhattan e ganhava razoavelmente bem. A história era que ele era formado em economia pela Columbia, e eu em Direito pela Yale, mas que eu não exercia a profissão no momento, até porque o trabalho de já nos garantia uma vida bastante confortável.
   Claro, a perfeita família americana. O disfarce centenário da CIA que sempre funcionava.
   - Foi tudo bem, amor. Acho que consegui me posicionar direito. – Ele disse, olhando diretamente em meus olhos, enquanto chegava mais perto de nós. – Bom dia, Pamela. – Cumprimentou nossa vizinha com dois beijos, sendo igualmente cumprimentado e logo em seguida virando-se para mim. – , pode respirar fundo, vai dar tudo certo. Eu prometo. – postou uma mão em meu rosto, me passando toda a confiança que podia através de sua palma áspera e quente e de seu sorriso de canto. Acenei fracamente com a cabeça, não conseguindo desviar meus olhos daquelas orbes hipnotizantes. Era como se a nossa conexão depois da noite anterior tivesse se elevado, fazendo com que precisássemos do contato visual ao menos 90% do nosso tempo. Isso sem contar a ânsia independente de nossas mãos que almejavam a todo custo encontrar qualquer pedaço de pele do outro.
   No fim das contas, era algo que eu já esperava. Eu sabia que aquele era um caminho sem volta, sabia que ter não se comparava com querer , sabia que eu me viciaria em sua essência como uma alcoólatra que desistiu da rehab e encontra-se frente a frente com uma garrafa de seu destilado favorito.
   “Sem arrependimentos” era o meu mantra mais que desnecessário, que eu continuamente mentalizava para enganar a mim mesma de estar na iminência daquilo. Eu não estava arrependida. Não estava nem remotamente decepcionada comigo mesma, pelo contrário, eu tinha vontade de me parabenizar por ter ido para a cama com tentação tamanha e ter aproveitado cada maldito segundo disso. Estava se tornando simplesmente fácil demais calar a voz na minha cabeça que sussurrava quem ele era e o que ele fazia e substituí-la por outra dez vezes mais empolgada que gritava como uma adolescente o quanto ele era lindo e delicioso. A culpa de horas atrás escondida nos confins do meu ser, encabulada demais para lutar contra as forças tão mais fortes que insistiam que aquilo, estar com ele, era uma boa ideia.
   - , acho que sua esposa merece um beijo para se acalmar de vez, huh? – Pamela disse. Essa era a Pamela, uma romântica incurável, que se dizia fã de carteirinha de qualquer casal apaixonado que passasse pelas ruas. E aparentemente, ela nos escolhera como seu próximo filme romantiquinho água com açúcar. Bem, aquilo era mais que previsível tendo em vista o papel que costumávamos interpretar, somado ao fato de nossos olhares penetrantes não terem se desgrudado um instante desde que ele se postara ao nosso lado, em uma comunicação muda e tão necessária que praticamente me impedia de piscar.
   riu fraco, possivelmente pensando o mesmo que eu sobre a personalidade de Pamela. Seus olhos não desviavam dos meus, e me davam a sensação de tudo estar em câmera lenta. Eu já era capaz de escutar meu coração acelerando aos poucos ao assimilar a frase completa de minha amiga e o que provavelmente a seguiria, a brisa daquela tarde ensolarada chicoteando meus cabelos. acenou uma vez concordando com o que nossa vizinha disse e ao mesmo tempo me alertando de seu próximo passo.
   Eu não conseguiria me preparar para aquilo, no entanto. A confirmação de que nos beijaríamos em nada me acalmava, apenas me alarmava mais. Mas não de um modo ruim. Minha ansiedade parecia ter retornado, mas diferente das outras vezes em que nos beijamos em público, dessa vez eu não queria sair correndo, não queria virar o rosto e tampouco queria ter outra alternativa. E por isso eu esperei.
   Esperei que o filme em câmera lenta tivesse continuidade, esperei incomensuráveis momentos para que ele se inclinasse. E ele o fez. Deu um passo à frente, ficando mais perto de mim. Sua mão continuava apoiando meu rosto, seu polegar acariciando desde minha maçã até o canto da minha boca. encostou suavemente nossas testas, nossas respirações se misturaram. Eu me sentia descendo a serra do mar, surda e leve, não conseguia ouvir mais nada que pudesse estar acontecendo ao meu redor: era apenas eu e ele. Nossos lábios se roçaram sutilmente e então ele finalmente pressionou de uma maneira maravilhosa nossas bocas. Minhas pálpebras caíram naquele instante e eu posso dizer que se ele não tivesse deslizado a outra mão para a minha cintura, era capaz que eu não ter permanecido em pé.
   fez alguma pressão e eu parti meus lábios, dando passagem para que o beijo fosse aprofundado. Sua língua era igualmente quente e áspera, como sua mão, e tocava lentamente a minha. Ele sugava meus lábios sem muita força, e já era o suficiente para que eu desejasse permanecer naquele beijo o resto da vida. Aos poucos, senti meu corpo relaxar, ficando então livre de toda a tensão que me consumia enquanto esperava que ele retornasse. Aquele beijo era tão diferente dos outros que já demos, e ao mesmo tempo tão bom, que fiquei com medo de nunca conseguir interrompê-lo. E mais uma vez, esse medo também fora arrancado de mim durante o movimentar incansável de nossas bocas, que entraram em um mudo acordo de não se separarem, em um consenso de que ar era desnecessário frente à grandiosidade daqueles toques e sabores.
   Comecei a perceber os suspiros intermináveis de Pam ao nosso lado, e aparentemente também, e com isso fez menção de nos separar. Não pude evitar soltar um muxoxo entristecido quando já não sentia a textura de sua pele em mim.
   - Ai, vocês são tão lindos! – ela disse. Abaixei minha cabeça ruborizada, com vergonha de estar fazendo biquinho, como uma criança de quem tiraram o doce antes de acabar. abriu um sorriso falsamente envergonhado, passando então um braço pelas minhas costas e dando um beijinho no topo da minha cabeça, que apenas me aconcheguei mais no abraço, achando difícil lidar sozinha com o vento frio que bateu tendo o calor do corpo perfumado do meu marido à disposição.
   - E ai, sua bicha! – gritou Téo do outro lado da rua ao avistar-nos. Fiquei meio atônita de ser trazida para a realidade tão abruptamente depois de longos segundo naquela dimensão paralela.
   - Fala, seu filho da puta! – gritou de volta , em seguida falando baixinho para mim – já volto, amor. – e dando uma piscadela muito sexy e mais um beijo estalado em minha bochecha rosada. Ri sozinha dos pensamentos que estava tendo e recebi um olhar curioso de Pamela.
   - Sabe, , eu sempre digo pro Joseph que nós deveríamos ser um pouco mais como vocês, carinhosos e companheiros. – Ela começou, embora dessa vez eu prestasse atenção por não ter mais preocupações inundando a mente. - Ele até me disse que vocês agiam assim por obrigação, porque é isso que as pessoas esperam de recém-casados, mas agora, vendo como um olha pro outro, eu sei que ele não podia estar mais errado. Vocês estão muito apaixonados. Fora que o desejo e o tesão que rola no ar é quase palpável. – Pamela riu – Me conta, o sexo deve ser de tremer as paredes, não é?
   - Ah... você não faz ideia. – ri de volta, propositalmente tímida. Meus sentidos estavam mais alertas do que nunca agora, meu “switch” voltando à posição “agente” e captando elementos da frase da mulher a minha frente que poderiam passar despercebidos a alguém menos treinado. Procurei sondá-la. - Então, o Joseph disse isso mesmo? Ele acha que nós parecemos atores de algum modo?
   - Ai , eu tenho certeza que ele não falou por mal sabe, vai ver ele só disse pra me despistar, pra que eu não pudesse cobrar dele ser mais carinhoso. – Ela deu de ombros um pouco chateada.
   - Ele continua ausente, minha amiga? – O fato de Joseph trabalhar normalmente durante a noite e pouco dar as caras em casa a incomodava, eu bem sabia. Muito trabalho, pouca atenção à esposa carente. Mas apesar disso eu precisava saber se seu comentário levemente maldoso sobre nós era fruto de certa infelicidade em seu casamento – algo que de modo algum me interessaria e por isso eu apenas deixaria para lá – ou se potencialmente fazia parte de algo maior, um conhecimento que ele não deveria ter se não estivesse linkado à missão.
   - Ele anda trabalhando demais, . A cada dia que passa está mais ocupado, pegando mais turnos, saindo às pressas para resolver alguma emergência. Além de todo o mistério, é claro. Ele não divide nada comigo, nenhuma de suas preocupações e problemas, e isso me deixa louca! Você sabe como sou, o quanto eu preciso dele...
   - Sei. Mas não se preocupe Pam, eu aposto que ele faz o possível pra te proteger e cuidar bem de você. – Minha atuação podia estar funcionando, mas por dentro as palavras que Joseph supostamente proferiu instigavam minha curiosidade. – Mais cedo ou mais tarde essa situação se resolve.
   - Sem dúvidas, mas porque está dizendo isso, ? – Pamela questionou, confusa.
   - Só preocupada com você, querida. – dei de ombros - Olha, Pam, eu vou atrás do ; apesar de mais calma ainda quero saber os detalhes da temida reunião, entende? – Sem esperar sua resposta apertei levemente suas mãos em despedida e fui atrás do meu suposto marido pelas ruas do condomínio. Ele precisava ser informado que hoje à noite não espionaríamos qualquer casa, e sim uma em específico.

Capítulo 20 - Cine Drive In

  Por Ela

  - ! Até que enfim te achei. – gritei quando o avistei próximo à área esportiva do condomínio, ainda com Téo. Dei uma corridinha, me aproximando dos dois – Minha mãe ligou, ela e meu pai estão nos esperando para o jantar. – Inventei a primeira desculpa que encontrei para tirá-lo de perto do amigo para que enfim pudéssemos conversar.
   - Puta que pariu, é hoje? Tinha esquecido completamente. – passou a mão nos cabelos, em sinal de frustração. Ele era um ótimo ator, isso era indiscutível. Ele era tão natural dizendo mentiras que me causava um pouco de inveja. Veja bem, meu lado mais forte como agente era a perspicácia e, quando devidamente armada, a ação. O teatro não, nisso eu era medíocre. – Está bem, vamos. – disse soltando um suspiro infeliz. – Que pena cara, fica pra próxima. – deu de ombros.
   - Boa sorte com seus sogros – Téo disse, tirando uma com ao dar tapinhas em suas costas. Ambos riram. – Tchau, .
   Sorri para Téo e me virei puxando pela mão. Ele ainda fez mais uma gracinha, arrastando os pés como se estivesse sendo levado para a forca. Depois de um tempo, no entanto, com Téo fora do nosso campo de vista, ele resolveu me encher o saco. Apressou os passos para chegar até onde eu estava (já que eu ainda o arrastava pela mão), me manuseou como se eu fosse uma boneca de pano e me pendurou em seu ombro. Eu me senti um saco de batatas. Comecei a estapeá-lo nas costas, rindo da cara das pessoas por quem passávamos de espanto.
   - Me coloca no chãããão, ! – Eu falava tentando ser séria, mas rindo no meio da frase.
   - Não estou a fim, . – ele respondia, teimoso, e ria um pouco mais.
   Chegamos em casa e ele teve que me descer já que eu estava com as chaves. Para tanto, esfregou nossos corpos até que eu estivesse em pé em sua frente e colada a ele. Malditos hormônios.
   - Ar, eu preciso de ar! – berrei tirando uma com sua cara, as mãos espalmadas em seu peito o empurrando levemente, ele sorriu dando mais uma risada gostosa e balançou a cabeça negativamente. Tentei não sorrir de volta, mas foi inevitável.
   Me virei e abri a porta, ainda com ele colado nas minhas costas e rindo. Agora ele se limitava a soprar minha orelha para fazer com que eu me encolhesse com cócegas. Estávamos em um clima tão bom que eu havia até esquecido por um momento o que tinha que falar com ele. Infelizmente, o assunto não podia esperar. Entramos e eu disse:
   - É uma pena ter que cortar o clima descontraído, mas temos que falar sobre a missão, . – ele deu um sorriso conformado e concordou, sentando-se no grande sofá da sala. Fui até ele e me sentei na mesa de centro, ficando de frente à meu parceiro.
   - Acho que temos um tempinho ai sem Mark nos enchendo o saco, mas é certeza que ele vai vir atrás da gente novamente. – ele disse, dando de ombros. – Ele tem alguma vantagem sobre nós e não é do tipo que larga o osso fácil.
   - Já é alguma coisa. – eu disse, confortando-o – Vamos precisar de muito jogo de cintura pra lidar com esse babaca, e o único jeito de expulsá-lo do condomínio de vez vai ser nos dedicando à missão mais do que nunca e fazendo algum avanço nas descobertas.
   - De fato, se nos provarmos competentes com as rédeas da situação, ele não será mais necessário.
   - Exato. E por falar em descobertas, deixa eu te contar, logo depois que você foi falar com o Téo, a Pamela me disse algo que eu considerei muito suspeito. – ele franziu as sobrancelhas, provavelmente pensando o mesmo que eu “Pamela culpada? Difícil” – Algo sobre o Joseph nos achar forçados.
   - Me conta isso melhor. – ele disse, ficando subitamente super interessado, inclinando-se na minha direção.
   - Ela disse que nós somos muito fofinhos e blá blá e que certa vez foi cobrar Joseph por não ser assim com ela e ele disse alguma coisa como “eles são assim porque é o que as pessoas esperam de recém-casados”. Como se não acreditasse que estamos perdidamente apaixonados, entende? – depois de soltar uma risadinha da minha imitação da voz de Joseph, ele disse:
   - Hm, isso é bem suspeito. Eu até acho que deveríamos considerar o fato de Pamela ter dito isso para despistar qualquer culpa que ela possa ter e ao mesmo tempo nos sondar, mas cara, é a Pamela, sabe? Não consigo ver essa mulher fazendo mal a uma folha. – concordei com a cabeça – No entanto Joseph eu já consigo imaginar com certa culpa no cartório.
   - Afinal, ele não é exatamente a pessoa mais correta do mundo, lembra de Débora nos dizendo que ele havia sido expulso da marinha por externar segredos de Estado?
   - Lembro. É, acho que temos nosso primeiro suspeito concreto.
   - Hoje à noite vamos colocar escutas na casa deles. E em lugares públicos, pro caso de acontecerem conversas como aquela do armário por aí, nunca se sabe.
   - Ainda bem que o que destruíram era apenas aparato de comunicação com a base, deixaram nosso equipamento de espionagem e armamento intactos.
   - Verdade. – Concordei. Dos males o menor. Tudo bem que o equipamento de espionagem e o armamento eram mantidos no nosso quarto em uma parede falsa depois das roupas, portanto conosco em casa era praticamente impossível que fizessem algo a respeito, mas de fato ainda estarmos munidos de alguns artifícios era crucial. - Por que você não vai tomar um banho e se vestir para irmos “jantar com meus pais” – fiz aspas com as mãos – enquanto eu preparo tudo que vamos precisar para nossa ronda noturna?
   - Tudo bem então, esposinha. Certeza que não quer tomar banho comigo? – ele disse rindo no final, já sabendo que eu faria cara de poucos amigos e o estapearia – Ok, ok! Um dia eu ainda consigo que você diga sim! – disse rindo já das escadas.

(...)

  Fiquei pensativa enquanto esperava Evans ficar pronto. O material de espionagem já estava pronto e separado, dentro de uma mochila preta qualquer. Eu havia apenas pego uma muda de roupa mais “elástica” por assim dizer, toda preta, obviamente, e pretendia colocá-la antes de partirmos para a ação. Mas isso ainda demoraria a acontecer. Eram apenas sete horas da noite e e eu sabíamos que não poderíamos nos dar ao luxo de ir tão cedo. Enrolaríamos indo a algum lugar “x” jantar com a minha “família” e esperaríamos o momento ideal – lá pela madrugada – para agirmos.
   - Vamos? – perguntou, aparecendo na sala e me tirando de meus devaneios. Ele usava uma camisa social azul clara – o que realçava terrivelmente seus lindos olhos - dobrada até seus cotovelos, uma calça jeans e tênis brancos. Simples, lindo. Eu continuava com um vestido cinza chumbo e sapatilhas amarelas, da mesma forma como havia passado a tarde. Entreguei a mochila a ele e peguei as chaves do carro na mesinha de centro.
   - Não, senhora, eu não vivi o suficiente pra te deixar dirigir. Me dá as chaves, . – ele disse em tom de brincadeira estendendo as mãos. Rolei os olhos com um sorriso no rosto e arremessei as chaves em sua direção, as quais ele prontamente agarrou.
   - Sorte sua que eu estou com preguiça de dirigir, . – disse e sai andando para a nossa BMW. Esperei que ele acionasse o alarme para abrir a porta do passageiro, mas fez questão de vir até meu lado e abrir a porta para mim. Ele fez uma mesura exagerada à qual me fez rir, sentando-me no banco. Deu a volta e sentou-se no banco do motorista.
   - Para onde, mi lady? – me perguntou enquanto já colocava o carro em movimento em direção à saída do condomínio.
   - Bom, não podemos ser vistos em qualquer lugar, então o que acha de passarmos no drive-thru de um McDonalds da vida e pararmos naquele Cine Drive-in a três quarteirões? Pelo menos assim o tempo passa mais rápido. – Dei de ombros.
   - Acho muito romântico, esposinha. – riu da cara que eu fiz, mas concordou em irmos no segundo seguinte.
   - Dois de seus maiores lanches, com muita batata-frita e coca-cola. – pediu ao atendente. Este riu, dizendo o preço em seguida. pagou e minutos depois recebeu duas sacolas pardas gigantes e o porta copos com dois baldes de refrigerante.
   - Não acha que é muito? – perguntei divertida. Ele negou – Se você acha que não aguenta pode deixar que eu como, princesa. – Disse roubando uma batata do saco no meu colo. Dei um tapa em sua mão – Você não me conhece, .
   - Uuuui! – ele disse fazendo uma voz afetada, o que nos fez cair na gargalhada. O clima estava tão descontraído, tão agradável que eu nem me permitia pensar em coisas ruins. Era como eu havia concluído mais cedo: minha consciência parecia estar de férias, e de férias ela ficaria enquanto eu me sentisse bem assim.
   - Sabe, , é muito bom estar nesse momento de “trégua” com você. – Ele comentou.
   - Eu não ia dizer nada, mas também estava pensando nisso. Até que você não é tão ruim quando não está determinado a me encher o saco. – Disse divertida.
   - Você também, quando não está tendo acessos de psicose pra cima de mim. – me olhava forçando os lábios para conter uma risada.
   - Ei! Eu não tenho acessos de psicose!
   - Você que pensa, tá sempre gritando comigo e negando coisas que fez segundos antes. – Eu o bati e ele ria da minha cara – E me batendo, esqueci de mencionar isso.
   - Idiota. – Disse, mas ria. – É, eu não sou lá muito normal. Mas você bem que merece de vez em quando, .
   - Não nego. – ele deu de ombros – Mas como eu dizia, é bom estarmos nesse clima descontraído. Acho importante pra missão que tenhamos certa cumplicidade.
   - É, acho que inadvertidamente eu passei a te aturar. – dei de ombros também. soltou uma risada alta. – Que foi, maluco?
   - Foi só dormirmos juntos e aquele tal de Mark aparecer que você está sendo legal comigo. Se eu soubesse que tudo que precisava pra isso acontecer era te livrar de tanta tensão sexual e arrumar alguém que você odiasse mais do que eu, teria dado um jeito nisso antes. – Fiquei boquiaberta com tanta sinceridade. O pior era saber que tudo aquilo era absolutamente verdade. Acabei me juntando a em suas gargalhada; eu era muito estúpida mesmo. – Tanta raiva nesse coração, , menina má.
   - Cala a boca e dirige, , o filme começa às 21h.
   - Birrenta.
   - Chato.
   - Infantil.
   - Insuportável.
   - Linda.
   - Imbec... Do que você me chamou?
   - Nada, , ali o filme começando ó.
   Eu ri. Ri porque eu nunca nem sonharia de estar tendo um momento parecido com aquela peste. Nós nos xingávamos, mas tudo com bom humor, apenas por implicância, por ser divertido. Uau, desde quando eu me divertia com ?
   O filme estava realmente começando, estacionou em uma vaga muito boa, que nos dava visão completa do telão e ao mesmo tempo nos dava privacidade, por ser longe das fileiras mais cheias de carros. Era um filme qualquer meio tosco de ação; comemos toda aquela comida em questão de minutos e isso porque eu nem estava com tanta fome.
   - Arg, que filme mais chato! – disse e eu ri do desespero dele puxando os cabelos.
   - Depois eu que sou uma menina má birrenta, para de reclamar, .
   - Ah, não mesmo, tem coisas melhores pra fazermos do que assistir o Jackie Chan dar uma de garanhão.
   - Ah, é? E o que, por exemplo? – Perguntei, me virando até ficar de frente pra ele.
   - Isso, por exemplo. – disse e me puxou imediatamente chocando nossos lábios e iniciando um beijo empolgado. Ofereci resistência a princípio, por pura surpresa, afinal eu não esperava aquilo, mas depois de um tempo eu me deixei levar. Não é como se o filme estivesse interessante mesmo, e beijava maravilhosamente bem.
   Sua língua invadiu minha boca me reclamando para si como se há anos não o fizesse. Ela acariciava a minha sensualmente enquanto me segurava pelos cabelos, massageando o local vez ou outra. Sua outra mão estava pousada em minha coxa descoberta, onde ele começara a dar apertões nada sutis enquanto arrastava os dentes por meu lábio inferior. Se tinha uma coisa que aquele homem sabia fazer e muito bem era me tirar dos eixos, de modo que não sei como, mas em alguns instantes ele me puxava para seu colo e eu ia sem hesitar. Ele me sentou com uma perna de cada lado de seu quadril e isso sem nunca interromper aquele beijo alucinante. dirigiu suas mãos para a minha cintura, a qual apertava sem dó nem piedade, o que me deixava ainda mais excitada. Enlacei uma mão por entre seus cabelos sedosos e os puxei bem na raiz até arrancar um gemido sôfrego de . Com a outra mão eu me divertia arranhando seus ombros, costas e peitoral, que mesmo por cima da camisa pareciam tão apetitosos. Dessa vez eu fiz questão de interromper o beijo puxando aquele lábio carnudo e inchado e passei a morder e beijar seu pescoço macio que pedia por mim. Encostei minha boca em todo pedaço de pele exposta e abri quase inconscientemente os botões da camisa dele enquanto me deliciava com a boca colada em meio àquele perfume masculino que eu tanto gostava. Ele apertava minha cintura e minhas coxas, indeciso de onde pousar de vez suas mãos, fazendo o caminho de vai e volta sempre passando extremamente perto de minha virilha. Segurei pelo colarinho da camisa já aberta, não aguentando a provocação, e uni nossos lábios novamente, iniciando mais um beijo rápido e desejoso. Era impressão minha ou estava ficando muito quente ali?
   nos separou novamente após mais uns minutos, agora se dirigindo ao meu colo descoberto, explorado o decote do vestido com vontade. Ele puxou o tecido para o lado, tendo então visão parcial de meu sutiã, o qual ele praticamente ignorou ao iniciar beijos molhados pela região. apertava, apalpava e dedilhava o quanto podia meu seio esquerdo mesmo por cima da roupa e ao afastar meu sutiã sua boca envolveu o direito e sugava com força, por vezes dando algumas mordidas no mamilo. Eu estava ensandecida, queria mais, muito mais daquelas sensações que só ele exercia sobre mim. Me encostei no volante com a respiração entrecortada, segurando os cabelos de enquanto ele fazia maravilhas comigo. Não aguentei muito longe de sua boca, de forma que tive que interromper aquelas carícias provocantes para colar meus lábios aos dele, sentindo-o explorar todos os cantos da minha boca e fazendo o mesmo com ele. Eu já era capaz de sentir a animação evidente de pressionando sua calça e não pude resistir ao levar minhas mãos naquela direção. Arranhei as entradas perfeitamente delineadas do meu parceiro, arrancando um suspiro pesado do próprio que em seguida subiu meu vestido o suficiente para que pudesse pousar as mãos diretamente na minha bunda. passou a dedilhar e apertar o local, seus dedos por vezes adentrando o tecido fino da minha calcinha. Agradeci a qualquer força superior pelo insufilme escuro o suficiente do carro para que eu pudesse não me preocupar com nada à nossa volta, apenas com os dedos grossos e ásperos que me provocavam agora perpassando minha entrada e sutilmente massageando meu clitóris, como se sequer imaginassem que eu ansiava por muito mais do que apenas aquele carinho. Minha umidade já estava no ponto para receber , mas ele não parecia ter pressa alguma. Continuou brincando com a minha sanidade com seus beijos molhados e sensuais em meu pescoço, as mordidas deliciosas no lóbulo da minha orelha, as mãos que brincavam com o elástico da minha lingerie devagar e, lógico, com aquela coisa encostada em mim se mostrando sempre tão imponente. Não conseguia mais aguentar meu próprio tesão e me vi obrigada a fazer as coisas andarem mais depressa. Para isso, passei a forçar a massagear meu clitóris dando leves reboladas em seu colo, assim proporcionando a fricção pela qual meu corpo ansiava. O tecido do jeans contra o fundo úmido da minha calcinha dava uma sensação inexplicável de êxtase, mas ainda era incomparável com o toque real de nossos corpos unidos, como eu bem me lembrava. pareceu se divertir com a minha pressa ao me mostrar um sorriso lindo e extremamente malicioso. Ele agarrou os lados do meu quadril e me direcionou para frente e para trás em seu colo, nos esfregando do modo certo para que acalmasse meus ânimos, por enquanto.
   Aquilo estava muito bom. Me vi agarrando com todas as minhas forças os ombros largos de e cravando minhas unhas ali, atitude que ele pareceu apreciar. Ele continuava comandando nossos movimentos de vai e vem e parecia se controlar bem apesar de uma gota de suor teimosa ter escorrido por seu rosto. Acho que afinal estava tão na tensão quanto eu, mas parecia infinitamente mais paciente para que aquele momento durasse o máximo.
   - Para de se controlar, eu quero você fora de si assim como eu. – murmurei em seu ouvido, a minha voz rouca de excitação.
   - Quero aproveitar que esse momento não está acontecendo no susto como nossa primeira vez e prolongá-lo. Fora que eu adoro te ver louca de tesão implorando por mim. – Ele respondeu, mostrando aquele maldito sorrisinho sexy de canto que eu adorava.
   Balancei a cabeça negativamente como se desaprovasse a maldade que ele insistia em fazer comigo, o que só aumentou o sorriso dele. Não aguentei e tive que capturar aqueles lábios já extremamente vermelhos e inchados, iniciando um beijo intenso, rápido, selvagem. Foi então que resolveu invadir de vez minha calcinha e me penetrar com um dedo. Meu gemido surpreso foi abafado pelo beijo, o qual eu não conseguia mais acompanhar. Ele não parou de investir em minha entrada e tampouco me deixava separar o beijo para respirar, segurando com a mão livre minha cabeça perto da sua. queria me enlouquecer, só podia. Eu sentia um prazer inexplicável, era maravilhoso sentir seus dedos em meu interior e ao mesmo tempo não era suficiente. Meu corpo parecia pedir pelo dele e qualquer outro consolo se tornava apenas isso: um consolo. Era ótimo e não era o bastante. Resolvi mostrar pra que eu não estava de brincadeira, que eu queria ele em mim, que eu já estava cheia de suas preliminares torturantes. Movi rapidamente minhas mãos trêmulas para o botão da calça que ele usava, o qual eu abri imediatamente e baixei o zíper. Afinal, dois podem jogar esse jogo. Baixei sua boxer branca apenas o suficiente para que eu pudesse segurar todo seu membro em minha mão e não perdi tempo, começando a massageá-lo lentamente, o que fez fechar os olhos com força e morder meu lábio inferior. Não era tão fácil se segurar quando era ele o provocado, não é mesmo?
   - Ok, você ganhou, . – disse ele com a voz extremamente grossa e baixa. No instante seguinte ele tirava minha mão de seu membro, se levantava um pouco ainda comigo no colo para alcançar a carteira no bolso traseiro da calça e tirava uma camisinha lá de dentro. Soltei uma exclamação de alivio/alegria ao ver que ele finalmente concretizaria nosso ato sexual, e o ajudei com o pacotinho quadrado. Depois de devidamente protegido, afastou minha calcinha e me penetrou sem aviso prévio. Não pude conter o grito de prazer que avançou em minhas cordas vocais e me imitou, grunhindo qualquer elogio que não escutei. Ele iniciou um ritmo lento e intenso, no qual me puxava com força em direção a si, me forçava a dar uma rebolada e me fazia subir novamente, tirando-o quase totalmente de dentro de mim. Não satisfeito em me proporcionar tanto prazer de uma só vez, ele conseguiu um jeito de agarrar um dos meus seios e massagear o mamilo entre seus dedos. Ficamos nesse ritmo algum tempo e eu já quase chorava de tão fora de órbita que me encontrava, gritava aos céus que não deixassem aquele momento terminar. Foi daí que resolveu me deitar sobre o volante. A nova posição o permitiu mudar o ângulo das investidas. E o ritmo. Ele só podia estar querendo me matar.
   O novo ângulo atingia um ponto dentro de mim talvez nunca explorado antes. Era surreal o que aquilo estava me fazendo sentir. Tão bom. Nunca antes havia sido tão bom com alguém. passou a manter um ritmo rápido, o qual eu não conseguia acompanhar por estar totalmente em outro planeta. Ele me ajudou então, me segurando pelo quadril há alguma distância de si e ele próprio vindo de encontro a mim rapidamente. Estava bom demais. Eu comecei a sentir um orgasmo poderoso se aproximar, de forma que tudo que eu podia fazer enquanto aguardava era gemer lascivamente no ouvido de , que em momento algum hesitava na velocidade das investidas. Ele era um deus do sexo, só podia.
   - Droga, ! Esse perfume, sua voz gemendo gostoso meu nome, a temperatura sempre elevada da sua pele... Você me deixa louco, amor. Como consegue ser tão deliciosa? – Grunhiu em meio a sua loucura e, bem, aí eu não aguentei. Ouvir essas palavras pronunciadas pela boca do cara que mais me alucinava em um momento tão íntimo e com o bônus da minha consciência não estar lutando loucamente contra isso foi demais pra mim. Os fogos de artifício dominaram meu corpo em êxtase enquanto eu relaxava todo e qualquer músculo do mesmo em um orgasmo tão intenso que eu duvidava já ter sentido qualquer coisa remotamente parecida. não pareceu suportar a idéia de não me seguir, chegando ele próprio no ápice algumas estocadas depois.
   Caímos então os dois exaustos no banco do motorista, aproveitando calados os últimos espasmos de prazer que se espalhavam por nossos corpos satisfeitos. Por ora.

Capítulo 21 - Flashbacks parte 1

  Músicas do capítulo: One More Night – Maroon 5 e Demons – Imagine Dragons

  (n/a: Alguns termos e nomes utilizados aqui podem não ser familiares para todas as leitoras, mas garanto não ser nada impossível de se entender pelo contexto ou mesmo passível de ignorar. Se preferirem também dá pra jogar no Google. Ah, e esse texto (htpp://http://pt.wikipedia.org/wiki/Tr%C3%A1fico_de_drogas_pela_CIA) também ajuda a compreender uma coisinha no final do capítulo.)

  Por Ela

  Estávamos há uns bons minutos na mesma posição: eu sentada no colo de no banco do motorista, meus braços em volta de seu pescoço, minha cabeça apoiada em seu ombro e ele descansava as mãos na minha cintura. Podia até dizer que eu estava exausta e não tinha forças pra voltar pro meu lugar, mas essa não era exatamente a verdade. A realidade é que estava incrivelmente confortável estar tão enroscada no meu parceiro e eu me aproveitava do fato do filme ainda não ter acabado e dele não ter reclamado para continuar ali. Usei esses momentos pra avaliar meu estado de espírito depois dos... err... últimos acontecimentos. E devo dizer que a voz irritante da minha consciência não deu as caras. Eu tinha uma noção distante de que por algum motivo eu não deveria estar fazendo sexo com , mas parecia um motivo tão bobo e tão irreal que eu realmente não quis dar ouvidos. E nem meu velho e chato subconsciente mandão. acariciava timidamente minhas costas e meus cabelos, provavelmente tendo uma noção de que aquilo deveria ser estranho. Mas, pelo contrário, parecia tão certo...
   O escutei pigarrear e me afastei para olhar em seus olhos.
   - , o filme acabou. – Me virei para a tela e, como confirmação, assisti os créditos subindo – São 23h, acho que ainda é muito cedo para partirmos para a ação. O que fazemos agora?
   - Bom, podemos ficar aqui até 1h, que é quando o Cine Drive In fecha. Esse sim parece um bom horário pra irmos, então tudo que precisamos fazer é, sei lá, enrolar até lá. – Dei de ombros, como se não fosse nada de mais. Era engraçado porque conversávamos ainda naquela posição sem qualquer um dos dois fazer questão de se mover. De qualquer jeito resolvi tomar a iniciativa de sair de seu colo antes que suas pernas ficassem dormentes, pulando para o banco do passageiro. acabou ligando o rádio, e eu aprovei a atitude, sendo a música uma boa distração para as próximas duas horas.
   Tocava uma música do Maroon 5, que na verdade acabava de começar. De começo ficamos os dois quietos, apenas absorvendo a letra.

  You and I go hard at each other like we're going to war
   (Você e eu pegamos pesado um com o outro como se fôssemos para a guerra)
   You and I go rough, we keep throwing things and slammin' the doors
   (Você e eu somos rudes, continuamente jogamos coisas e batemos portas)
   You and I get so damn dysfunctional, we stopped keepin' store
   (Você e eu ficamos tão disfuncionais que paramos de contar o placar)
   You and I get sick, yeah, I know that we can't do this no more
   (Você e eu ficamos doentes, e eu sei que não podemos mais fazer isso)

  But, baby, there you go again, there you go again making me love you, uh
   (Mas, querido, lá vai você de novo, lá vai você de novo me fazendo te amar, uh)
   Yeah, I stopped using my head, using my head let it all go, uh
   (É, eu parei de usar minha cabeça, usar minha cabeça, deixei tudo pra lá, uh)
   Now you're stuck on my body, on my body like a tattoo, uh
   (Agora você está preso ao meu corpo como uma tatuagem, uh)
   And now I'm feelin' stupid, feelin' stupid crawling back to you, uh
   (E agora eu estou me sentindo estúpido, rastejando novamente pra você, uh)

  So I crossed my heart, and I hope to die
   (Então eu juro de pés juntos, por tudo que é mais sagrado)
   That I'll only stay with you one more night
   (Que só ficarei com você mais uma noite)
   And I know I said it a million times
   (E eu sei que já disse isso um milhão de vezes)
   But I'll only stay with you one more night
   (Mas eu só vou ficar com você mais uma noite)

  Depois de um tempo, no entanto, o gelo foi se quebrando, e eu comecei a rir um pouco da improbabilidade de justo a música que estava tocando em uma rádio qualquer ter algo a ver com as nossas vidas. Com o que eu sentia.

  Try to tell you no, but my body keeps on telling you yes
   (Tento te dizer não, mas meu corpo continua lhe dizendo sim)
   Try to tell you stop, but your lipstick got me so out of breath
   (Tento te dizer “pare”, mas seu batom me deixou sem fôlego)
   I'll be waking up in the morning, probably hating myself
   (Eu vou acordar pela manhã provavelmente me odiando)
   I'll be waking up feeling satisfied but guilty as hell
   (Eu vou acordar me sentindo satisfeito, mas culpado como o inferno)

   começou a fazer palhaçadas, fingindo ser o lutador do clipe e cantando com a voz forçadamente mais aguda, como a de Adam Levine, olhando pra mim, que aumentei o volume das risadas.

  But, baby, there you go again, there you go again making me love you, uh
   (Mas, querido, lá vai você de novo, lá vai você de novo, me fazendo te amar, uh)
   Yeah, I stopped using my head, using my head, let it all go, uh (É, eu parei de usar minha cabeça, usar minha cabeça, deixei tudo pra lá, uh)
   Now you're stuck on my body, on my body like a tattoo, uh
   (Agora você está preso ao meu corpo, ao meu corpo, como uma tatuagem, uh)
   And now I'm feelin' stupid, feelin' stupid crawling back to you, uh
   (E agora eu me sinto estúpido, me sinto estúpido, rastejando novamente para você, uh)

  So I crossed my heart, and I hope to die
   (Então eu juro de pés juntos, por tudo que é mais sagrado)
   That I'll only stay with you one more night
   (Que só ficarei com você mais uma noite)
   And I know I said it a million times
   (E eu sei que já disse isso um milhão de vezes)
   But I'll only stay with you one more night
   (Mas eu só vou ficar com você mais uma noite)

  Yeah, baby, give me one more night
   (É, querido, me dê mais uma noite)

  A música continuava, mas fez questão de abaixar o volume do rádio para que eu pudesse ouvir com propriedade o que ele ia dizer.
   - Eu adoro sua risada. – Ele disse com um sorriso lindo no rosto.
   - Que bom, porque eu adoro rir. – Repliquei e o assisti jogar a cabeça para trás, dando uma gargalhada digna de uma criança de cinco anos, na qual ele deixava a mostra duas perfeitas fileiras de dentes brancos.
   - Entramos em um consenso, então. – Disse estendendo a mão para que eu apertasse. Eu balancei sua mão como se selássemos um contrato e então ele me puxou e me roubou um selinho.
   - ! – Reclamei completamente ruborizada. O que aquele homem estava fazendo comigo?
   - Desculpa, foi inevitável. – Ele respondeu fazendo pouco caso da minha reclamação e tornando a aumentar o volume do rádio que agora tocava outra música. Talvez ele tenha percebido que eu não estava realmente brava pelo beijo inesperado.

(...)

  Já estávamos a cerca de uma hora naquela de ouvir músicas e fazer palhaçadas como se estivéssemos bêbados. A música que tocava agora era do Imagine Dragons, uma música bastante intensa e com a qual eu me identificava imensamente, o que me deixava envergonhada e levemente introspectiva. O clima dentro da BMW mudou suavemente, eu e meu parceiro de repente imersos em reflexões. Demons tinha era tão calma e envolvente que eu fui escorregando no banco, até estar praticamente deitada. Fechei meus olhos e fiquei em silêncio um pouco, apenas escutando a melodia e balançando calmamente minha cabeça no ritmo.

  When you feel my heat
   (Quando sentir meu calor)
   Look into my eyes
   (Olhe nos meus olhos)
   It's where my demons hide
   (É onde meus demônios se escondem)
   It's where my demons hide
   (É onde meus demônios se escondem)
   Don't get too close
   (Não chegue muito perto)
   It's dark inside
   (É escuro dentro)
   It's where my demons hide
   (É onde meus demônios se escondem)
   It's where my demons hide
   (É onde meus demônios se escondem)

  Nesse momento, o rádio foi interrompido abruptamente, uma frequência alta emitida, seguida de um chiado ensurdecedor. Abri os olhos assustada, olhando pra que franzia a testa estranhando o comportamento do aparelho. Uma voz substituiu a barulheira:
   - , , é o Leonard. Estou surtando sem notícias, o que...? – o chiado voltou, mais alto dessa vez e em seguida a voz que falava era totalmente diferente – Ahn, oi, é a Débora agora. Leonard pediu que vocês colaborem com Mark. Ele... – A voz foi cortada novamente e um som semelhante à microfonia foi emitido, realmente muito alto, a ponto de um funcionário do cinema vir bater na janela de perguntando se estava tudo bem. Eu consegui parar o barulho, desconectando o rádio da base, e respirou aliviado.
   - Tudo sim, amigo, desculpe o distúrbio. – Ele disse pro funcionário, que em seguida se afastou murmurando qualquer coisa.
   - Meu Deus, o que foi isso? – perguntei pro meu parceiro que parecia tão atordoado quanto eu.
   - Não faço ideia, foi muito estranho mesmo. Primeiro as interrupções no meio da mensagem e segundo a voz de Débora que parecia tão diferente...
   - Verdade. E ela ainda nos disse pra falar com o Mark sobre a missão. - Parei esboçando uma careta. - Desculpe, mas preciso dizer que é a primeira vez que vou desacatar ordens da CIA. Não vou nem um pouco com a cara dele.
   - Ela parecia meio constipada... Será que pegou a virose? – Deu de ombros – Bom, não precisamos do Mark, estamos indo bem sozinhos, ainda mais agora com nosso primeiro suspeito.
   - O que me lembra que eu não aguento mais esperar. Ainda é muito cedo para irmos colocar as escutas? – Perguntei à .
   - Meia noite e meia. Ah, que se dane, vamos. – Disse, logo em seguida ligando o carro e dirigindo para alguma rua próxima à do condomínio, na qual pudéssemos estacionar, pular o muro de segurança e fazer o que tinha de ser feito.

(...)

  Narração em terceira pessoa

   estava sentada na escrivaninha do escritório equalizando as freqüências das escutas estrategicamente colocadas na noite anterior. Era cedo, sete horas da manhã talvez, e não estava em casa, pois havia ido correr pelo condomínio com Téo. Ela havia basicamente caído da cama após o sonho que teve, e essa era a explicação para já estar trabalhando. Se fechasse os olhos pensaria no sonho de novo, sabia disso. E evitava a todo custo aquele assunto, especialmente depois do dia anterior. Não queria por nada relembrar os motivos que a mantiveram longe de à princípio, e alguma força superior parecia interferir justo no sagrado momento de seu sono para que ela parasse de ignorar a realidade.
   O fato de terem ido dormir apenas algumas horas mais cedo afetava sua força de vontade de permanecer desperta. mal sabia o que estava fazendo nesse ponto de tão sonolenta que estava. Não entendia como tinha essa disposição toda de “madrugar" e ir exercitar-se, mas, bem, um corpo daqueles devia dar trabalho mesmo. Foi pensando nisso que se viu revivendo passagens do dia anterior no carro. Ela se sentia bem, leve, extremamente satisfeita e, até arriscaria dizer, feliz. Sim, depois de muito tempo de negativas e culpa, ela finalmente havia aprendido a colocar essas coisas pra trás e pensar apenas no presente. Afinal, quem ligava se seu parceiro havia sido o chefe do contrabando europeu, se ele havia tido uma noiva que segundo boatos tinha mais chifres do que uma tourada inteira, se ele era alguém desprezível... O que importava era que ele parecia redimido, viera trabalhar na CIA para fazer o bem e compensar suas maldades. Certo? Errado. ainda possuía a pulga da desconfiança. Era inevitável não pensar em um motivo mais significativo para que ele estivesse ali. E foi pensando nesse assunto novamente que ela se viu involuntariamente fechando os olhos...

  Estava frio. Extremamente frio naquela porção de terra congelada na costa do Mar do Norte. Em uma cidadezinha próxima à Aberdeen, e seus comparsas haviam marcado de se encontrar com seus clientes; essa era a informação que havia obtido na Interpol, após terem pedido reforços da inteligência americana.
   Seu trabalho consistia em impedir que a compra fosse efetuada e as armas entregues. Mas sabia que isso não seria fácil. Mesmo não estando encarregada de controlar todo o contrabando, haviam colocado-a para “contracenar" com o chefe dele e ela não se achava boa o suficiente pra enganá-lo. Bom, verdade seja dita que até então não havia sido tão difícil, mas havia apenas trocado algumas palavras com pessoas abaixo de , no máximo com Birmingham, seu braço direito, sempre disfarçada, mas nunca sequer cruzara os olhares com o próprio. E havia chegado a hora.
   As negociações estavam marcadas pra dali a dois dias, mas a gangue de estava adiantada. Eles passariam a noite em uma pousada meio sombria, meio abandonada, à 200 metros do local do encontro. havia conseguido uma casinha abandonada realmente próxima da pousada para passar a noite. Naquela noite apenas os espionaria, deixando a ação necessária apenas para a manhã seguinte, quando fingiria estar interessada em comprar as armas de ; ofereceria um valor estupidamente alto, o qual ele não pudesse recusar e então ele ficaria sem mercadoria para vender ao IRA, sendo obrigado a retornar à seu galpão e quem sabe fabricar mais armas. Que é quando a polícia internacional assumirá o caso e prenderá todo mundo. Quanto ao IRA não teve acesso ao planode ação e francamente duvidava que houvesse um, mas isso não era da sua conta.
   Uma vez preparada, ela partiu para a pousada, se esgueirando em meio a cantos escuros e grandes arbustos, podendo assim chegar realmente perto do quarto onde o líder,, estava. Escondeu-se atrás de um carrinho de roupas sujas parado no corredor bem embaixo da janela do dito quarto. Escutou passos próximos e pôde identificar Birmingham vindo a seu encontro pelo outro lado do corredor. Pelo menos deste modo não a veria. sabia que estava se arriscando demais ao estar ali, tão próxima, mas não podia evitar, queria saber mais sobre o tão temido chefe e principalmente colher informações que pudessem facilitar seu trabalho na noite seguinte.
   - , sou eu. Abre essa merda. – Birmingham murmurou de encontro à porta do quarto, dando alguns tapas na mesma. Alguns segundos se passaram até abri-la. Os dois entraram no quarto, mas para a felicidade de a janela permaneceu aberta de modo que ela pôde escutar toda a conversa.
   - Que porra aconteceu agora? Se você me disser que ainda não deram um jeito naquele policial de merda, eu juro que enfio uma bala na sua testa agora, Birmingham. – se assustou com a agressividade exaltada proferida por uma voz tão calma e rouca. Era quase como se aquela voz não combinasse com tamanha maldade.
   - E-ele... Disse que tem um recado pra você. E que somente você pode ouvir o que tem a dizer. Vim informá-lo. A não ser, é claro, que não se importe; nesse caso eu mesmo vou lá agora acabar com a vida do infeliz. – O rapaz respondeu um tanto hesitante frente à ameaça de morte.
   - Puta que pariu, viu... Esses merdas aparecem aqui tentando me prender estando absolutamente sozinhos, só por causa de uma porra de recompensa na minha cabeça e ainda se acham no direito de me dar recadinho? Pelo amor de deus! – se lembrou de Leonard ter mencionado que policiais e ex-agentes de todo o mundo passaram a se envolver por conta própria no caso devido à quantia exorbitante de libras esterlinas atribuídas à prisão de . Esse pobre coitado sobre quem discutiam agora devia se enquadrar no caso. O que não tornava a crueldade desmedida das palavras de mais aceitável. Uma pessoa que faz tão pouco caso da vida de outra deve ser taxado de monstro no mínimo.
   - Já entendi, vou acabar com a vida do desgraçado. Desculpe te incomodar. – Birmingham retrucou.
   - Não! Não, espere... Estou entediado. - Disse como quem se explica. - Vamos ouvir o que o filho da puta tem a dizer. – Dito isso, ouviu passos direcionando-se a porta. Ficou em estado de alerta, mas nada fez contando com o fato de eles seguirem o mesmo caminho pelo qual Birmingham havia vindo, podendo manter assim seu esconderijo. No entanto...
   - Ele está com Ulrik e Sergei no estacionamento. – Disse. “Merda", pensou, “O estacionamento é para este lado do corredor". Rapidamente olhou em volta, não encontrando nenhum lugar para onde pudesse correr. O pânico começou a adentrar suas células. Ela ouviu a maçaneta do quarto girar como se tudo estivesse em câmera lenta. Imediatamente deu um impulso, pulando dentro do carrinho de roupa suja e cobrindo-se de qualquer jeito com um edredom ali presente.
   Os dois homens passaram por ali sem notar nada estranho. pôde respirar fundo e limpar uma gota de suor que se formara em sua testa. Havia se arriscado demais, mas precisava ver o rosto de para que no dia seguinte não fosse enganada. Por isso, levantou-se sorrateiramente e olhou os dois homens se afastando, um, que ela reconheceu como Birmingham, com um moicano preto bem rente à cabeça e outro, que só podia ser , de costas largas, andar despreocupado e uma 38 enfiada na calça jeans. Como se soubesse estar sendo observado, ele virou a cabeça levemente pra trás, a tempo apenas de observar dois hipnotizantes orbes azuis faiscando antes de retornar a seu esconderijo. Aquilo havia sido suficiente. Ela já poderia voltar para seu aposento e preparar as coisas para o confronto do dia seguinte. Sentia pena do pobre policial que possivelmente teria sua vida encerrada naquela mesma noite, mas sabia não poder fazer nada. Era colocar o plano todo por água abaixo e sabia que a melhor vingança que poderia dar a ele era executar tudo com astúcia e perfeição, de modo que no fim de tudo aquilo e seus comparsas fossem presos.

(...)

  Então era isso. Ficaria cara a cara com pela primeira vez. Ela ainda pôde vê-lo de relance na noite anterior, mas agora era diferente. Agora estaria colocando o plano em ação, estaria ali para negociar sob um arsenal de armas capaz de abastecer uma terceira guerra mundial. E não poderia fraquejar. O mínimo deslize e tudo iria por água abaixo. não podia em hipótese alguma suspeitar de suas intenções. E, a julgar por tudo que vira e ouvira nesses poucos meses trabalhando nessa missão, ele não era facilmente enganado. Era muito astuto e não deixava o mais leviano detalhe passar. Por isso, talvez, havia assumido tão importante posição no mundo ilegal tão jovem.
   Ela já estava com tudo pronto. A mentira na ponta da língua, ensaiada inclusive algumas vezes frente ao espelho, a roupa impecável, devidamente armada e munida de dinheiro. Muito dinheiro. Hora de agir. Caminhou até onde sabia que quem lhe interessava estaria, sendo recepcionada como esperado.
   - Cavalheiros, abaixem as armas, fazendo o favor. Não sou inimiga de vocês e tampouco me importo com a ilegalidade que está rolando solta aqui. Muito pelo contrário. Quero fazer uma compra. – Dito isso, jogou a maleta que trazia em mãos no chão, o que fez com que a mesma abrisse e revelasse uma grande quantia de dólares organizados em bolos de 100.000. Aquilo era como seu passe para ser ao menos ouvida. Os capangas de começaram a timidamente guardar seus revólveres e metralhadoras, não por isso deixando de encarar com curiosidade.
   - O que deseja? – questionou Birmingham dando alguns passos em sua direção, os homens antes no seu caminho dispersando.
   - Fui enviada por Ghalib Hanif, chefe do contrabando de ópio afegão. Digamos apenas que essa história de apreenderem nossas mercadorias na Rússia já está perdendo a graça. – Sorriu irônica esquadrinhando o rosto de Birmingham a procura de sinais de desconfiança, os quais não encontrou. Agradeceu mentalmente ao desvio de caráter durante a guerra fria da agência para qual trabalhava por isso proporcionar um bom álibi agora à ela. Não que concordasse com suas atitudes, mas não podia negar que tal aproximação da CIA com o Afeganistão viera bem a calhar agora. Por mais que houvessem sido proibidos de intervir novamente, para bem ou para o mal, no tráfico de drogas de lá pela ONU, não significava que não podiam cobrar o “favor" que deviam usando assim o nome de Ghalib para ter alguma credibilidade nessa missão. Se isso caísse em seus ouvidos nada faria considerando-se ser a CIA ali agindo.
   - Pois bem, e porque mandar a princesinha aqui e não um bando de brutamontes para fazer a compra?
   - Primeiramente, era necessário alguém que falasse sua língua, coisa rara no mundo árabe. Segundo que eu sei me cuidar. E terceiro que quem te garante não terem centenas de “brutamontes" aguardando qualquer sinal não civilizado da sua gangue para agir? – Ok, pensei rápido. Ele pareceu ponderar minhas palavras.
   - Tudo bem, querida, de quanto estamos falando aqui? – Disse, cruzando os braços na altura do peitoral.
   - Estamos falando, querido, de financiar uma guerra. – Disse ainda sorrindo sarcástica –Tenho interesse em todo o arsenal que tiver em sua posse neste momento. E posso afirmar que dinheiro não é um problema.
   - Desculpe, mas só posso ordenar uma encomenda. Você já deve saber que o armamento contido nesse galpão já possui dono.
   - Ah, sim, o IRA. Por favor - Riu em escárnio -, quantas vezes terei que repetir que estou falando em nome do cabeça do ópio? O dinheiro que tenho a oferecer não passa remotamente perto do quanto um grupinho revoltado irlandês pode bancar.
   - Terei que ver com o chefe. Não estou autorizado a negociar essa mercadoria. – Disse um pouco atordoado. Odiava se sentir impotente, mas sabia que não podia tomar as decisões por si só ou lhe cortaria a cabeça em questão de segundos. Saiu em direção à sala onde ele agora se encontrava.
   - , tem uma... – Iniciou sendo logo interrompido.
   - Mande-a entrar. – Ainda mais confuso, fez o que lhe foi ordenado. respirou fundo e tocou instintivamente a arma carregada em sua cintura, conforme se aproximava das mesmas costas que observara algumas horas antes.
   - Qual seu nome?
   - .
   - E o que quer aqui, ?
   - Vim em nome de...
   - Ah, sim, eu já escutei a historinha. Quero saber porque eu deveria correr o risco de ter um grupo terrorista desarmado e bastante irritado apenas porque você resolveu aparecer aqui sem ser convidada. – disse, virando-se lentamente para a garota enquanto lustrava o cano de uma arma imponente em ouro maciço.
   - Porque posso pagar até três vezes o valor que haviam acordado. E porque não sou idiota e sei que em alguns dias já terá produzido a mesma quantidade de armas para renegociar a venda com eles. Eu tenho pressa, eles já esperaram pra retomar suas atividades desde 2005, podem esperar mais um pouco. – finalmente resolveu olhar para , pois havia ficado impressionado com a firmeza de suas palavras. Preferia não ter feito isso, no entanto. Aquela mulher era o pecado puro. Nada do que ele esperava. Tinha certeza que seria uma mulher de burca, quem sabe, feia, nariguda e não era nada disso que estava ali à sua frente. Se tinha um ponto fraco que reconhecia sobre si mesmo, era a vulnerabilidade frente à mulheres bonitas. E não era apenas isso, era maravilhosa, irresistível. Ali naquele simples olhar ele já sabia que concordaria e fecharia negócios com ela.
   Foi então que se lembrou do recado dado pelo policial inútil na madrugada daquele dia. Sorriu cruel e mandou trazerem o homem para a sala.
   - , este é Eric Mc-qualquer coisa, ele veio tentar nos prender ontem e, tadinho, foi capturado. – Disse enquanto ela observava dois mal-encarados entrarem arrastando pelos braços um homem cheio de hematomas. Fez as sinapses logo entendendo que aquele era o homem sobre o qual ouvira e Birmingham falarem.
   - Meu querido, faça o favor de repetir o que me disse ontem para essa bela dama. – disse assim que o homem havia sido largado em uma cadeira, tendo seus braços imediatamente amarrados para trás.
   - N-não... Eu já disse, ... O recado era para você. – explodiu em risadas, achando muita graça a petulância de seu prisioneiro.
   - Acho que você não entendeu, Eric. – Fez sinal para que os capangas deixassem a sala. – Eu mandei repetir. – Disse com voz baixa, agarrando com força os cabelos do homem sentado.
   - Me solte ou me mate, o que eu tinha pra dizer já foi dito. – não sabia se estava admirada com a petulância do rapaz ou desacreditada de sua burrice. Era óbvio que o mataria, ele repetindo o recado ou não, mas só o fato de ter aparecido ali por conta própria já a fazia suspeitar que ele não podia ter o juízo perfeito.
   ficou irritado, nunca gozara de grande paciência.
   - DIGA! – Gritou, cuspindo no rosto do outro que apenas fechou os olhos e manteve seu silêncio. Foi demais para que, sem se importar com o que pensaria, virou um soco tão forte no policial que acabou desacordando-o. – Inútil – murmurou a seguir.
   queria sair dali. Sabia que o cara era um ogro e que era uma missão bastante perigosa, mas nunca teve estômago para ver cenas de violência gratuita sem esboçar reação. Não podia, no entanto. Apenas fechou os olhos por alguns segundos e voltou a olhar que passava freneticamente as mãos por seus cabelos.
   - Merda, merda, merda. - murmurou, dando tapinhas na face do desacordado como quem se certifica se o outro está vivo. O homem tossiu um pouco de sangue, voltando a inconsciência logo em seguida, mas claramente ainda respirava. suspirou e esfregou as mãos tensas e calejadas nos cabelos ralos. Depois piscou algumas vezes e virou-se mal humorado para a garota como se nada tivesse ocorrido ali. - A questão é, esse imbecil veio me dizer que a CIA estava auxiliando a Interpol para que todos nós fôssemos presos. Você por um acaso não saberia nada sobre isso, não é, ? – A garota precisou engolir em seco para que sua voz não falhasse e saísse convincente.
   - Estou pouco me fudendo se existem planinhos pra detê-los, quero saber do meu negócio. Vamos fechar a compra ou o quê? – Qualquer um acreditaria na veracidade das palavras emitidas por ela. Mas não . Não quando ele pode notar um leve dilatar das pupilas da garota ao mencionar a CIA. Um sorriso quis aparecer no canto de seus lábios.
   - Fechado, . – Estendeu a mão para que ela a apertasse. E assim concluíram uma imensa compra de armas que logo seriam destruídas para abastecer uma guerra que nunca chegou a acontecer.

(...)

   esperava do lado de fora do escritório de seu chefe, Leonard, ansiosa para saber o desfecho da missão do contrabando. Ela sabia que o plano era emboscar todos os envolvidos na fábrica quando retornassem a ela para comandar uma nova leva de armamentos. Esperava ter dado tudo certo.
   A porta estava fechada, Débora havia informado que Leonard a atenderia em questão de minutos, assim que encerrasse qualquer assunto que debatia lá dentro com outra pessoa. Ela estava impaciente, balançava as pernas sem parar. A porta finalmente se abriu e ela voou para lá. No entanto, a cena que menos esperava ver era protagonizada no batente. apertava a mão de Leonard Von Guielsen. ficou estática apenas observando – de boca aberta, é necessário acrescentar – passar por ela com um sorrisinho sacana.
   - Que. Porra. Está. Acontecendo. Aqui? – Disse pausadamente para evitar que os gritos acumulados em sua garganta saíssem. Leonard deu espaço para que a garota entrasse, fechando a porta em seguida e direcionando-se para sua mesa.
   - agora trabalha para a CIA. Ele é agente, assim como você.
   - O QUÊ? Leonard, você só pode estar brincando comigo. Aquele cara era o chefe do contrabando de armas na Europa. Lembra? – dizia, alarmada.
   - Lembro, e você disse bem: ele ERA. Agora trabalha conosco. – Deu de ombros. Percebendo que passara a questionar sua sanidade mental, resolveu explicar-se – ele sabe de coisas desse mundo que não sabemos, . Ele viveu esta realidade. E se ele quer vir para o lado bom da força, quem sou eu pra impedi-lo? Aliás, todos foram presos. A missão foi um sucesso, mais uma vez, como todas as suas sempre são. Parabéns, .
   - Todos foram presos com exceção do mais importante deles, né? Leonard, não me venha de papinho. Aquele cara perambulando pelo seus corredores é cruel. Ele é um porco imundo e você o está abrigando aqui ao invés de trancá-lo em uma cadeia de segurança máxima. O que há de errado com você? – disse, começando a se exaltar, de pé com as mãos gesticulando apressadas e os ombros tensos.
   - Eu sei o que é melhor para essa equipe, . Isso não te diz respeito. Agora vamos voltar ao trabalho, tenho mais uma missão para você...

  Um barulho alto tirou de seus devaneios. Em um estalo percebeu que o estrondo que a acordara viera do som relativo às escutas colocadas por ela e seu parceiro na noite anterior, mais especificamente da casa de Pamela. Era uma porta batendo, “alguém chegou em casa", pensou. Aumentou o volume, já agradecendo a distração.
   - De novo? De novo chegando ao amanhecer? – Era a voz de Pamela, trêmula. Aparentemente aquela cena já havia se repetido diversas vezes. Mas o que possivelmente Joseph fazia durante toda a madrugada para chegar àquela hora da manhã? – Eu não sei se consigo mais, Joe. Você não me avisa que horas chegará, é vago sobre aonde vai e ainda sempre está com aquelazinha dos cabelos pretos. Se você está me traindo, se eu não sou mais o suficiente, me diga! Mas, por favor, pare de me torturar. Se aquela mulher aparecer aqui mais uma vez pra esfregar na minha cara o quanto é magra, o quanto seus cabelos são lisos e como ela passa o dobro do tempo que eu passo com você, eu não respondo por mim! – Pamela agora falava alto, exaltada e havia indícios de choro em sua voz. ficou atenta à descrição da pessoa causadora da crise de ciúmes. Parecia bastante com Cristine...
   - Que bobagem, Pam. Eu não estou tendo um caso, estou trabalhando. Você sabe que eu quero sempre o melhor para a nossa família e nunca faria algo que te machucasse.
   - Não quer me machucar? Você está me machucando! Eu prefiro passar fome contigo em baixo da ponte pro caso de você nunca mais conseguir um emprego descente do que viver esta loucura! – Agora os soluços de Pamela eram desesperados.
   - Você não entende. É a única chance que eu vou ter. Ninguém nessa cidade vai me dar um emprego que exija verificação de antecedentes. Eu preciso fazer isso, por nós. – Depois disso, silêncio. Algum tempo depois uma outra porta bateu longe dali em outro aposento. A discussão tinha sido encerrada.

Capítulo 22 - Flashbacks Parte 2

  Narrativa em terceira pessoa

   massageava pacientemente seu pescoço em busca de algum alívio para toda a tensão que a estava dominando. Sabia que, se continuasse assim, logo teria sua gastrite nervosa de volta. Não teve um minuto sequer de sossego desde que reviveu as malditas lembranças. Seria esse o modo que sua consciência encontrou de abrir seus olhos? Não sabia responder, mas se fosse aquele o caso, havia funcionado.
   Levantou-se da cadeira do escritório decidida de que um banho e cama seriam o mais prudente de se fazer naquele momento. Seu parceiro ainda não havia retornado, de modo que ela estava sozinha em casa. Mas não por muito tempo. tinha noção que a qualquer momento estaria de volta e seu cérebro, embora estando a mil, ainda não havia resolvido qual seria a melhor maneira de tratá-lo. Poderia ela fingir novamente que nada havia acontecido? Que aquele não era o homem mais cruel que já tivera o desprazer de conhecer? Ela duvidava.
   Antigamente, pensar em e sentir raiva era o natural para ela. Agora, a coisa mudou drasticamente. Quanto mais se lembrava dos sorrisos de escárnio do ex-chefe do contrabando e de suas atitudes sempre completamente desprovidas de preocupação com a vida dos outros, mais seu estômago revirava. Seu organismo repudiava qualquer sentimento ruim que tivesse relação a ele. Como isso aconteceu? Onde, no meio do percurso, sua integridade se perdeu? Ó, sim, era assim que ela pensava. Não podia ser normal para alguém do bem, como ela julgava ser, não odiar .
   Tomado seu banho extremamente demorado, uma vez incitado de tantas indagações sobre o mesmo assunto, engoliu a seco um comprimido para dor de cabeça e foi se deitar. Se dali a minutos teria que lidar com , melhor que sua cabeça não estivesse explodindo para assim pensar claramente. Com o rosto enterrado no travesseiro cheiroso – embebedado na essência maldita de seu infeliz marido – ela começou a avaliar seus sentimentos por , preocupada se teria perpassado o físico. Chegou a várias conclusões, algumas das quais a assustaram. A primeira era que, fosse como fosse, eles deveriam conversar. Colocar as cartas na mesa, como ela gostava de falar. Suposições e deduções acabariam por matá-la e ninguém melhor do que ele pra esclarecer tudo que a afligia. A segunda, e mais cruel e passível de se acrescentar, é que... Ela não conseguiria se manter longe. O corpo dele, o toque, os lábios... Não havia mulher no mundo que se negaria àquilo, por mais errado que fosse. Essa barreira ela não conseguiria reconstruir nem com muito esforço. Uma vez atracados sob aqueles mesmos lençóis onde pairava, era humanamente impossível não desejar a repetição por quantas vezes fosse possível se contar. A terceira e última era que não importava o que ela sentia: não prestava, nunca prestaria e seu coração permaneceria intocado e trancado em seu peito como sempre esteve.
   Suspirando aliviadamente após ter, enfim, chegado a algum lugar com todo aquele emaranhado de pensamentos, não tinha sentido, até então, um peso afundando a cama imediatamente ao seu lado. Mãos grossas e ásperas percorreram a linha de sua coluna, chegando aos seus ombros novamente enrijecidos e pressionando calmamente, em uma massagem que teria tudo para ser relaxante, não fosse a onisciência da garota com relação ao nome e sobrenome do dono daquelas mãos que tanto idolatrava. Seus pelos imediatamente eriçaram, incapazes de se comportar diferentemente, uma vez que sua pele estava em contato com a dele mais uma vez.
   - Acredito que alguém esteja precisando aliviar as tensões. – disse. A voz não passava de um murmúrio transbordando rouquidão e malícia. A pressão gostosa nos nós encavalados dos músculos de continuava. – E eu preciso de um banho depois da corrida. – Ele se inclinou de forma que suas palavras fossem projetadas em lufadas quentes de ar, diretamente no ouvido da garota, e seu nariz acariciasse superficialmente a pele imediatamente abaixo de sua orelha. - Que tal unirmos o útil ao agradável? - estava atônita novamente. Se via entre a vontade insana de unir seus corpos hiper-aquecidos novamente ou recusar o convite tentador em prol de permanecer em relativa paz com seu subconsciente alarmado.
   - Eu... Vou dar uma volta. – Foi tudo o que pôde dizer, o tom de voz um pouco trêmulo, fruto de todas as contradições que seu ser enfrentava, e levantou em um ímpeto, saindo em disparada para longe do pecado ambulante sem sequer olhar nos poços azuis hipnotizantes, incapaz de enfrentar o mar de dúvidas que ela teria vontade de responder. Ora, se ele não dava as respostas que ela vinha implorando desde sempre, por que deveria se dar ao trabalho de explicar sua atitude, aparentemente, sem sentido?
   Não deveria. Sim, e esse seria seu mantra enquanto caminhava pelas ruas nem tão movimentadas, nem tão calmas do condomínio, enquanto lutava contra a vontade de correr de volta à sua casa provisória e enfiar-se sob uma ducha quente, em um banheiro lotado de vapor, junto com o único homem capaz de tirá-la vergonhosamente dos eixos.
   não suportava sentir-se daquela maneira. Ela era confiança pura, orgulho, ego, teimosia. Mas isso talvez fosse porque sempre tivera plena convicção do que queria e lutava até as coisas saírem do seu jeito. Aquilo era definitivamente novo pra ela. Como lutar se ela não sabia quem era o inimigo? Ir atrás do que, se ela sequer sabia pra que lado ir? Uma coisa era certa: precisaria decidir com que cara olharia pra de agora em diante. Era como se ela tivesse acordado de uma realidade paralela, onde tudo o que aconteceu fugiu de seu controle especialmente rápido. Os beijos roubados, os amassos proibidos, até mesmo as vezes que transaram pareciam distantes, como se ela fosse agora uma mera expectadora. Não que não se lembrasse claramente das sensações - isso ela seria incapaz de esquecer -, mas ela estava deliberadamente se colocando para fora de seu corpo para tentar analisar o caso friamente. Não obtinha muito sucesso, uma vez que tudo relacionado ao seu parceiro era fervura e ebulição, era escaldante e ardente.
   Pegou-se, então, avaliando a personalidade de seu suposto marido. era oposto a ela em muitos aspectos e em outros era surpreendentemente semelhante. Sua racionalidade era algo admirável para ela, que sempre fora extremamente impulsiva. Ele não era calculista e programado, dava a impressão de estar sempre um passo à frente do resto do mundo. Exceto, é claro, quando a garota o provocava. Aí não respondia por si e se passava por um momento de o ser mais impaciente da Terra; queria velocidade, intensidade. Um ponto em comum era o ar de superioridade. O sorriso de deboche dele e o olhar de desprezo dela poderiam, se combinados, reduzir uma pessoa a pó. Verdade seja dita que as pessoas que recebiam esse tratamento normalmente mereciam, sendo, de fato, inferiores aos dois. Em outros casos, como quando trocados, eram só mais um artifício para irritar um ao outro.
   Também havia diferenças no modo de agir naturalmente, quando despreocupados. Enquanto era sempre mais centrada, mais séria e atenta a tudo e a todos mesmo em um momento de descanso, era espalhafatoso e brincalhão, engraçado como ninguém, palhaço de tudo. Em poucos meses de convivência, essas características sofreram mudanças, no entanto. Enquanto , apesar de não perder momentos para fazer piadinhas infames, passou a explorar da sua seriedade; ela ganhara uma boa dose de bom humor. Nesse aspecto realmente não havia o que questionar: um melhorava o outro.
   Ainda tinham as características que um usava contra o outro, fosse por autopreservação ou por tática. Ela sempre fechada em um casulo de emoções trancafiadas a todo custo, que quando transbordava por qualquer motivo era para sair de perto. A garota virava um bicho e ai de quem estivesse em seu caminho durante a passagem do furacão . Levava tudo consigo, não deixava nada intacto, mudava pensamentos, ações e até mesmo os sentimentos das pessoas que por acaso encontrassem com ela. Sempre incrivelmente impactante e chamando atenção por sua maestria de consertar os males do mundo com muita diplomacia e alguma dose de pancadaria. Era exatamente por essa particularidade dela que a CIA a designava para casos estressantes emocionalmente e de difícil conclusão. Ela trabalhava sob pressão melhor do que com calma. E também por esse atributo que se encantara com ela, não fosse justamente pelo mesmo motivo que bateram de frente logo a princípio. A marca dele era outra. Era a da percepção aguçada dos sentimentos das pessoas. podia ser desligado com relação ao que quer que estivesse acontecendo apenas a alguns metros de si quando despreocupado, mas quando se tratava de pessoas, o que elas pensavam e queriam, ele as desvendava como ninguém. Esse era, na realidade, o grande trunfo que o permitira se tornar o rei do contrabando tão novo. Uma conversa de cinco minutos com alguém era mais do que o necessário para que ele fosse capaz de captar desde sinais que a pessoa exibia ao mentir até quais eram seus maiores medos e temores. Com relação à sua parceira, no entanto, parecia que seu dote insistia em falhar. Sim, ele se vangloriava de conhecê-la como ninguém, mas sabia que mesmo assim havia muito que ainda não sabia sobre ela. E lá estava, novamente, o motivo de completarem tão bem um ao outro. Qualquer vantagem ou desvantagem que um parecia ter contra o outro era imediatamente revogada ou anulada por uma incapacidade ou proveito que o outro lado tinha.
   Ridiculamente sincronizados, era isso que eram. Na cama, então, era passível de se chorar. até chegou a questionar se o problema havia sido seus parceiros sexuais anteriores, mas chegou à conclusão de que eles não tinham culpa de não terem nascido como . Soltou uma risada seca, percebendo o rumo que seus pensamentos tomaram. Será possível que ela precisava endeusar o cara mesmo quando seu objetivo é detoná-lo? Muito bem, então. Se sua cabeça, assim como seu corpo, era fã número 1 do ser demoníaco, não restavam opções a ela. Precisaria calar a voz infernal do passado, sussurrando em seus tímpanos de um jeito ou de outro. Ficar longe de não era uma alternativa.
   andava tão distraída e com a cabeça tão a mil que não pareceu perceber uma pessoa vindo a seu encontro. Quando notou, já era tarde. A mulher magra de cabelos pretos e olhos escuros como a noite já sorria desafiadoramente para ela, em um convite mudo para que entrasse em qualquer provocação que ela estivesse planejando. só teve tempo de suspirar profundamente antes de encarar Cristine cara a cara, pronta para o que quer que ela pudesse dizer. Não era como se qualquer coisa ali fosse de fato prender sua atenção 100%, já que a mente dela parecia muito ocupada comparando a si própria com a ex-noiva esbelta e estonteante de seu falso marido.
   - Ora, ora, se não é a mais nova vítima de ? – Cristine disse lentamente, esgueirando-se para mais perto da outra. imediatamente comparou-a com uma cobra, em todos os sentidos possíveis.
   - O que quer, Cristine? Não estou com saco de aturar a ex-noiva chutada deliberadamente tentando me assustar. – Respondeu com tom de voz pingando impaciência. De fato, não havia momento mais inoportuno para aquela mulher aparecer.
   - Nossa, mas a gatinha é arisca, não? – Cristine levantou os braços na altura dos ombros como quem se rende. – Pois bem, vou logo ao ponto. – Deu mais um passo, de modo que sua voz agora era pronunciada bem próxima à , podendo manter o tom baixo e provocante. - Querida, deixe-me te falar uma coisinha: Você não o conhece. está te usando. É isso que ele sempre faz com as mulheres, as usa. No momento que ele se cansar de você, vai acabar com o que vocês chamam de casamento e basta ele estar livre para pegar quem quer que seja que você já era. E tem mais: de bonzinho ele não tem nada. Seja qual for o motivo pelo qual estão juntos, pode ter certeza que você não sabe metade da missa e que no momento que ele conseguir o que deseja, será apenas um borrão na sua vida, nunca mais o verá. Ele é um monstro, só pensa em si e tem interesses espalhados por todos os cantos, faz o que tiver que fazer para alcançar seus objetivos. Eu sei que não sou a pessoa mais confiável para te dar conselhos, mas me sinto na obrigação de abrir seus olhos, . Acredite no que quiser, apenas não acredite nele. – E dando de ombros, Cristine saiu andando, deixando com a cabeça fervendo para trás. O motivo? Não, ela não havia caído nas provocações baratas de Cristine, por mais sensível que estivesse naquele momento, não era tonta a ponto de se deixar ficar paranoica. Mas uma coisa específica que a mulher disse fez tomar uma decisão. De fato, já era em tempo de ela descobrir a verdade. Se antes ela já queria desesperadamente saber, agora era questão de honra. Se Cristine a considerava desinformada, estava certa. E isso estava prestes a mudar.

(...)

  Entrou na casa parecendo um furacão. Mais do que nunca, queria respostas e agora estava decidida a tê-las, nem que para isso fosse necessário dar um incentivo na base de balas e canivetes.
   - . – Gritou, logo batendo a porta atrás de si. Apenas dois segundos depois, observou-o aparecer no segundo andar, completamente confuso. Ele desceu as escadas temerosamente, sem desviar o olhar da garota, que parecia estar em fúria.- Quão imbecil você acha que eu sou? – Ela perguntou num tom de voz perigoso, toda a feição e postura avisavam-no para correr. Mas ele não tinha medo.
   - Tudo bem, eu vou entrar no jogo. Do que está falando, ?
   - Estou falando do quanto vem me enrolando. Estamos nessa missão juntos há quase seis meses e eu ainda não tive as respostas que pedi logo quando você entrou para a CIA, quase três anos atrás. E sabe de uma coisa? Eu to cansada. Cansada de ser manipulada, cansada de ter o assunto desviado e, principalmente, cansada do fato de que todo mundo parece saber mais do que eu. – ela deu uma pausa no discurso para que pudesse recuperar o ar. A feição de era impassível, não saberia dizer o que se passava dentro dele, mas, fosse como fosse, o exterior nada mostrava.
   - Por que isso agora, ? Você está indiscutivelmente brava e eu já entendi que o alvo da ira sou eu, mas por quê? A gente estava em um clima tão bom, mesmo no carro... O que aconteceu pra você mudar da água pro vinho comigo?
   - Fala sério, aquilo foi só sexo. Você não achava que eu ia realmente esquecer tudo que você já aprontou na vida, né? , acorda, você e eu nunca vamos dar certo, você é o cara mais errado que existe pra mim.
   - Engraçado, não foi isso que pareceu ontem à noite. Você está dizendo isso agora só porque está brava com alguma coisa e eu sequer sei o que é.
   - Eu estou falando isso porque é a verdade. Eu não posso deixar esse desejo me cegar.
   - Chamar o que sentimos um pelo outro de desejo é quase insultante.
   - Chame do que quiser, desde que estejamos de acordo que é algo apenas físico.
   - Não, , não estamos de acordo. Já foi assim, é verdade, mas você não pode parar no tempo. As coisas têm mudado entre a gente e você precisa parar de fugir disso!
   - Merda, ! Para com isso, para de mexer com a minha cabeça!
   - Não! Não até você admitir que está sendo infantil desviando do assunto principal, que é o que te deixou assim.
   - Tudo bem, você quer mesmo saber? Eu vou falar. Lembra-se da Cristine? A noivinha linda que você abandonou pra vir pra cá? Então, encontrei com ela agora na rua. E sabe o quê? Ela me fez pensar. Eu exijo respostas, . Você já me enrolou tempo demais. – Ela respirou fundo e, vendo que não a interromperia, continuou, colocando as cartas na mesa de uma vez por todas. - Por que raios você veio pra CIA? Por que deixou tudo pra trás e veio dar uma de bom moço? Você não me engana, a última coisa que deve ter se passado na sua cabeça quando tomou essa decisão foi de se redimir.
   Ele fechou os olhos com força, mordeu o lábio inferior e evitou olhar a garota à sua frente. Havia sido esse o problema desde o início. Contar para nunca fora uma opção, mas talvez agora fosse necessário. Ela não acreditaria de qualquer jeito e, mesmo se o fizesse, era capaz de ficar assustada e se afastar no fim das contas. Não havia como vencer ali. sabia que, de um jeito ou de outro, corria sérios riscos de perdê-la – e esse pensamento apenas o deixou inesperadamente atônito. Inspirou todo o ar do cômodo e resolveu respondê-la, seu tom de voz baixo e resignado, ainda sem a encarar. – Por você.
   - Eu tenho cara de otária? Não vou cair nessa, . – semicerrou os olhos, encarando o homem, que agora se sentava no sofá da sala, parecendo frustrado. Ele continuou a falar como se ela não o tivesse interrompido.
   - Você tem sido minha sina desde aquela noite nublada na Inglaterra. Minha luz, salvação, e o que mais quiser chamar. Fiquei obcecado por você. Eu não sei o que fazer, não tenho no que mais pensar, achei que transando com você isso passaria e eu poderia voltar a seguir a minha vida, mas só piorou. – Ele bufou, abaixando a cabeça entre as mãos, seus braços apoiados nas pernas. estranhou o comportamento do parceiro. era sempre cheio de si e naquele momento ele parecia quase... Frágil. Exposto.
   - ... – começou em tom de aviso.
   - Não, , agora você vai escutar. - se levantou, o rosto vermelho de tanto passar as mãos por ali, pegou-a pelo braço e jogou-a no sofá em que estava sentado anteriormente. - Quer a verdade, não é? Pois aqui está. – Ele respirou fundo e passou a caminhar de um lado para o outro na frente da garota. Os olhos nublados, cheios de lembranças. - Eu trabalhava para a MI-6. Era um agente condecorado cuja especialidade era infiltração. Eu era mandado para missões para me passar por pessoas aleatórias de forma a conseguir informações suficientes sobre o esquema e passar tudo para a agência. - Fez uma pausa observando o choque óbvio estampado na face da mais nova. Continuou. - Sempre me dei bem pela minha facilidade de interpretar as pessoas, e por ter carisma. Então me mandaram me infiltrar no contrabando de armas.
   "No começo, foi difícil. Eu precisava fazer todo tipo de trabalho sujo para adquirir a confiança dos manda-chuvas. Mesmo naquela época eu já odiava o que fazia. Não concordava com como as coisas eram, e não me refiro ao contrabando. Digo isso porque meus chefes reais estavam sempre me mandando fazer apenas o suficiente. Aquilo nunca bastou pra mim, sempre fui reativo demais. Eu queria resolver problemas, merda, eu queria salvar o mundo, por mais fantasioso que isso soe. Eu não admitia falhar. Então talvez seja compreensível que eu não tenha me contentado em simplesmente pegar algumas informações e dar o fora. Eu continuei por lá, espreitando, conhecendo. Os dizia para acreditarem no meu trabalho. Fui subindo de cargo pouco a pouco, conquistando mais e mais pessoas. Eles ficaram impacientes. Meu prazo tinha sido esgotado e eu não dava sinais de que abandonaria aquela missão nem tão cedo. Enviaram Cristine para me recuperar - ela trabalhava na MI-6 também. Não deu certo, eu já estava enfiado naquilo até a cabeça e via milhares de possibilidades a minha frente de realmente fazer a diferença. Passei a agir sozinho, a levar aquele trabalho a sério demais. Conheci pessoas lá dentro que precisavam de mim, pessoas a quem eu podia ajudar. A Inteligência Britânica rompeu comigo pela demora e passou a me caçar em todos os cantos do planeta. Mas eu tinha meus objetivos e não podia ligar menos para isso."
   "Com o passar do tempo eu me deixei envolver, admito. Todo o poder, todas as mentiras, o dinheiro. Fui corrompido dos meus ideais sem sequer perceber. Estava ocupado demais pensando no presente e pouco de fodendo para o futuro, comprado dentro das minhas próprias falácias. Mas minha vontade de mudar a vida como ela era continuava a espreita, apenas tinha sido cegada momentaneamente. Então eu conclui minha principal meta ali dentro que era tirar alguns garotos inocentes de perigo... - Ele abanou o ar nervosamente - Isso é história para outra hora - Prosseguiu - E me vi sem saber que passo dar a seguir. E então... Você apareceu."
   "Eu te vi pela primeira vez quando estava uma pilha de nervos. Sabia que tinha gente atrás de mim, cachorro grande. Estava nervoso, atirando pra todos os lados e, principalmente, ansioso pra porra dos caras da IRA chegarem logo, pegarem as armas e vazarem, pra que eu pudesse ir pra minha casa e respirar aliviado e longe da cadeia. Mas daí você entrou na cabana. Eu olhei pra você. E, merda, isso foi suficiente pra que todos os sentimentos ruins e dúvidas que me inundavam há dias sumissem. Foi como colocar os olhos em um oásis. Você provavelmente nem deve ter notado qualquer mudança no meu rosto, estava mais nervosa que sei lá o quê. Mas o fato é que você fez o antigo dar as caras. Uma garota aparentemente indefesa, com os nervos à flor da pele, em uma missão perigosa demais pra terem enviado-a sozinha e, no entanto, você era um poço de determinação e força, era tudo que eu não tinha mais coragem de ser, e tudo que eu precisava. Pra largar tudo, pra encerrar aquela palhaçada que há tempos eu devia dar um basta. De repente, eu tinha perspectiva novamente, comecei a bolar planos loucos na minha cabeça e, porra, executei-os. Você tem noção de como aquilo era novo pra mim? Eu simplesmente não pensei duas vezes pra fazer merda nenhuma! Eu soquei o maldito policial, eu enviei minha equipe inteira pra fábrica, eu desafiei o IRA! Mais do que isso, eu larguei minha vida e entrei pra Inteligência Americana! , eu, calculista do jeito que sempre fui, nunca, em circunstância alguma, faria isso em sã consciência. Você me proporcionou essas coisas. Então, sim, você é a porra do motivo pelo qual eu estou aqui. E a porra do motivo pelo qual eu me mantenho nisso todo dia, mendigando migalhas da sua atenção pra ver se eu consigo continuar me sentindo do mesmo jeito que me senti naquele dia: em paz comigo mesmo, com propósito e até meio maníaco-obsessivo, confesso. Até mesmo bicha, se assim quiser chamar. E você, mesmo me desprezando 90% do tempo, ainda consegue o mesmo efeito em mim. A questão é apenas essa e agora você já sabe. – Ele finalizou, jogando-se em uma poltrona como se tivesse colocado para fora todos os seus demônios. Ficaram os dois em silêncio alguns instantes, ele ofegante como se tivesse corrido uma maratona e ela com a respiração presa como se não houvesse oxigênio suficiente no ambiente.
   - Você quer mesmo que eu acredite em toda essa história? – Ela perguntou, sua voz saindo muito mais serena do que o pretendido. A desconfiança não era tão latente em sua fala quanto esperado.
   - Acredite no que quiser, . Eu estou cansado disso já. Fiz minha parte, respondi suas perguntas. Com sua mania de negação, você que lide. - Deu de ombros. - Vou me deitar. – E foi o que ele fez. deixou uma extremamente confusa na sala e seguiu para o quarto, logo tirando a camisa pelo caminho e deitando-se na grande cama de casal. Aquela conversa havia sido muito estressante e ele não sabia o que esperar dali pra frente. Só Deus sabia como reagiria após processar o que ele disse. E, pensando nisso, pegou no sono...

   discou os números, ainda um pouco apreensivo, mas sabia que estava fazendo o que precisava fazer. O que seu corpo e alma imploravam para que fizesse.
   - Centro de Inteligência Americana, recepção, bom dia?
   - Hm, bom dia. Eu gostaria de falar com Leonard Von Guielsen.
   - O senhor Von Guielsen é muito ocupado, senhor, tem hora marcada?
   - Diga a ele que é na linha. – fez-se o silêncio do outro lado. Poucos minutos depois, a voz fina e melodiosa era substituída por uma mais máscula e dura.
   - . Não está usando número restrito, então suponho que essa conversa não tenha teor ameaçador. Em que posso ajudar?
   - Toda a minha equipe está nesse instante a caminho da fábrica em que seus homens aguardam para prendê-los. Não há sequer um homem que trabalhe para mim que não tenha sido mandado para o abatedouro. - Não era de todo verdade, seus garotos sairiam ilesos, mas aquilo era uma conversa e não um confessionário. - Sei da emboscada e não apenas me fiz de desentendido como os ajudei na execução. Quero algo em troca.
   - Pois bem... Mas, , se quer dinheiro ou algo do tipo, sabe que não há nada que eu possa fazer, você continuará procurado pelo mundo todo e...
   - Cala a boca. Eu não preciso do seu dinheiro, tenho o suficiente para toda uma geração. O que eu busco é... Redenção. Quero trabalhar para a CIA. – aquela frase era quase engraçada de se ouvir, não fosse o tom sério que ele utilizava. Queria sim trabalhar para a CIA, pois sabia que a adrenalina era algo que precisava correndo nas suas veias e não aguentaria ficar longe dela, mas, mais do que isso, buscava ficar perto da mulher encantadora que conhecera há não mais que duas noites. era tudo em que pensava desde então. O feitiço da moça já estava lançado, ele quase não se reconhecia mais e não havia nada a fazer sobre isso. Apenas, talvez, aproveitar. Nunca antes tinha se sentido tão bem. Mas não era apenas sobre si que suas reflexões sobre ela o levavam. Ah, não. O corpo sinuoso e os olhos de ouro líquido da agente também não haviam abandonado seus pensamentos desde então. Não sabia o que estava acontecendo, mas sabia que alguma providência ele tinha que tomar. Comer e dar o fora, apenas para que pudesse parar de vislumbrar as curvas perfeitas em seus sonhos, talvez. E, quem sabe, aproveitar mais um pouco da sensação de plenitude que ela havia alvoroçado em seu interior.
   - Eu devo estar com problemas nos ouvidos. – Leonard voltou a dizer. - Você quer o quê?
   - Não se faça de tolo, escutou muito bem. Quero ser um agente, vou prender e matar tantos procurados que não terão escolha a não ser me absolver. Estou mudando de lado aqui, Leonard. Que eu saiba, todos merecem uma segunda chance. E eu conheço os filhos da puta que vocês almejam encontrar como ninguém. – blá blá blá sua mente traduzia. O velho podia concordar logo e poupá-lo de proferir tantas calúnias. Ele ia sim se destacar como agente, tinha experiência suficiente nesse mundo para isso, mas não deveria ter que convencê-lo. Era simples, a CIA ganhava um ótimo parceiro e ele ganhava a chance de ter em sua cama. Qual a dificuldade de apenas concordar?
   - Muito bem... Conversaremos a respeito, então. Venha para cá, mandarei que te escoltem por todo o percurso. E, ?
   - Sim?
   - Não tente nenhuma gracinha. Se quer se redimir mesmo, pois bem, ajuda de alguém de dentro do esquema do crime é muito bem-vinda. Mas qualquer passo em falso e pode ter certeza que o decapitado será você.
   - Meu vôo sai às 11h. Até mais tarde, Leonard.

Ele apertou os olhos fortemente sentindo a consciência voltar a si. Sonhara com o telefonema que definiu sua vida nos últimos tempos. Naquele dia ainda não tinha noção da proporção que tudo ia tomar. Dividir uma casa com a dona de suas fantasias, transar com ela e ainda assim apenas querer mais dela. suspirou, virou para o outro lado da cama e tornou a fechar os olhos. Um único pensamento em mente: precisava acreditar nele.

Capítulo 23 - Trouble In Paradise

  n/a: recomendo que leiam a letra - e escutem a música porque é muito boa - de Stutter do Maroon 5 por ser simplesmente a definição da primeira parte desse capítulo.

   acordou assustado. estava – acredite se quiser – sentada em cima dele, na altura de seus quadris, e enterrava as unhas no peitoral exposto do mesmo.
   - ? O que...?
   - Psss. – Ela o interrompeu. Não que ele fosse formular qualquer frase, não estava em condições, afinal, tinha acabado de acordar e com a mulher com quem sonhava em cima dele. parecia ofegante e não o havia encarado ainda. Ela pressionou mais uma vez as unhas na pele de seu torço. gemeu baixo. O som pareceu fazer a garota voltar à órbita e com isso seus olhos se encontraram.
   Foi então que viu. O desespero, a angústia estampada em seu olhar era cristalina. o olhava com necessidade, com súplica. Ele imediatamente elevou seu corpo com ajuda dos antebraços, chegando mais perto dela.
   - , o que foi? – Ele perguntou, alcançando uma mão nos cabelos sedosos da menina. – Você está bem?
   - Eu... – Ela tentou, a voz baixa e rouca. – Eu preciso... – Continuou. Ele não entendeu, uniu as sobrancelhas e crispou os lábios.
   - Do que você precisa, meu amor? – Ele tentou de novo. Ela, que havia baixado seu olhar, tornou a encará-lo. Passou dois dedos delicadamente na ruga que se formava na testa de seu parceiro, desfazendo-a.
   - Eu preciso... Que você me mostre. – Ela disse, por fim, suspirando. – Me mostre que é verdade, que eu posso acreditar em você, que posso confiar que não está mentindo pra mim. – A compreensão foi espalhando-se pelo belo rosto do homem que agora acariciava com ternura a face da esposa. – Mas mais do que isso... Preciso sentir que eu não sou idiota de estar me deixando envolver por você.
   suspirou. Um teimoso sorriso de alívio ameaçava aparecer em seu rosto. Ela também se sentia balançada. Ele não era o único imbecil que entrava nessa enrascada. Seus corações empedrados pareciam estar lentamente procurando-se em meio àquela confusão. Ele não achava que estavam apaixonados. Bem, ainda não. Mas já se permitiam sentir alguma coisa um pelo outro. Luxúria, cumplicidade, amizade. Carinho, talvez. Só o que sabia era que era bom se sentir daquela maneira.
   - ... Eu sou seu escravo. – Ele disse, com um sorriso sapeca. Ela arqueou uma sobrancelha e pressionou os lábios, tentando conter o sorriso. Em seguida, passou os braços pelo pescoço dele e uniu suas bocas em um selinho demorado. enlaçou-a pela cintura, correspondendo ao agrado.
   Um segundo depois, não sabia dizer como, ele pairava sobre ela na cama, ajeitando-se entre suas pernas e puxando uma com a mão até descansar o joelho em seu quadril. o segurava pelos ombros, sem protestar, enquanto ele passava a distribuir pequenos beijos e mordidas em seu pescoço.
   A respiração de foi ficando pesada até que ele a subisse para o ouvido dela e murmurasse:
   – Eu sei uma coisa que eu posso fazer na qual sou muito bom e pode te convencer a acreditar em mim... – E o efeito dessas meras palavras fez os músculos do baixo ventre da garota se contraírem violentamente, tornando essencial que ela o puxasse pelos cabelos em sua direção e o beijasse intensamente.
   respondeu ao beijo com prazer, unindo suas línguas em uma dança lenta e profunda que parecia não ter pretensão de acabar. O gosto dele era cítrico, com um toque de canela, o cheiro uma mistura de almíscar e madeira. Ela, por sua vez, possuía o perfume de uma tarde de verão e rosas, seu gosto misturava champanhe e hortelã. Ela puxou o lábio dele devagar, sentindo-o escorregar por entre seus dentes. A essência de um já completamente misturado com a do outro.
   apertou sua cintura com força, demonstrando que o ato o havia agradado e encarando-a muito de perto, testa colada com testa. esboçou um sorriso e levantou seus braços, um convite mudo para que ele retirasse seu vestido. deu uma risada curta, estava adorando ver a menina assim, tão entregue, tão sua como jamais havia sido. Desejava imensamente que fosse assim para sempre, mas não queria se apressar.
   Negou levemente com a cabeça, fazendo a menina perguntar-se o que ele estava tramando.
   Ele se levantou calmamente, deslizando o corpo até estar na beira da cama. pegou um dos pés de nas mãos e, sem nunca desviar do olhar dela, depositou um beijo estalado na ponta de seu dedão. apenas o observava, os olhos como fendas e os cantos dos lábios eternamente curvados para cima. Ele desceu um pouco mais e beliscou com os dentes a sola do pé dela. Isso a fez rir, sentia cócegas nos pés. , ao ouvir o riso de sua esposa, se permitiu sorrir junto, uma promessa entalada na garganta de provocar aquele som maravilhoso enquanto vivesse.
   Subiu aos poucos os lábios pela panturrilha dela, apenas roçando-os. ficou imediatamente séria, o desejo batendo à porta novamente. foi subindo e subindo cada vez mais. Passou a língua quente lentamente na dobra do joelho dela e postou um beijo molhado no interior de sua coxa. remexeu-se desconfortável já com sua umidade. Ele enganchou os dedos longos nas laterais da calcinha da mulher e, conforme a descia pelas pernas longilíneas, fazia o caminho oposto com sua boca, cada vez mais a aproximando da intimidade dela.
   apertou os lençóis sobre seus dedos quando deu uma mordida em sua virilha. Ele não precisava nem estimulá-la lá que já a deixava a beira da loucura.
   Como se quisesse provar que ainda podia ser melhor, lançou à ela um último olhar cheio de malícia antes de lamber toda a extensão de sua intimidade. arqueou as costas soltou um suspiro sôfrego. Ele soprou a carne molhada para que o toque frio no quente a deixasse ainda mais ansiosa por ele. E então não parou. passou a alternar sugadas fortes sobre seu clitóris e acariciar suas paredes internas com a língua. Ela não continha mais os gemidos, que aumentavam o volume conforme ele aplicava mais pressão em seu botão de prazer.
   deixou então de acariciar uma das coxas da garota com sua mão para levar dois dedos à sua entrada, onde inseriu-os lentamente, muito mais devagar do que a garota desejava. Ela choramingou baixinho quando ele se negou a aumentar a velocidade das penetrações.
   levou uma mão aos cabelos do rapaz e tentativamente acariciou seus fios enquanto tentava controlar a respiração e resistir ao impulso de empurrá-lo ainda mais a seu encontro. pareceu recompensar o ato carinhoso da menina, inserindo mais um dedo em seu interior. Ela saiu do controle. Passou a movimentar seu quadril desesperada por mais fricção, para que os dedos de a atingissem mais fundo, exigindo mais dele, muito mais. Ele, percebendo que ela estava a ponto de ter um orgasmo, deu uma última mordida onde sua língua acariciava antes e retirou os dedos dela. abriu os olhos imediatamente, sabendo que, apesar da interrupção, o que viria a seguir era tão bom, se não melhor, do que estava vivenciando até agora.
   O som característico do zíper de se abrindo apenas serviu para empurrá-la mais fundo em seu estado de tupor, ao passo que ela se viu subindo o próprio vestido pelo corpo hiperaquecido, em busca de propiciar mais contato corporal com aquele que tanto a tirava dos eixos. Ele a entregou um pacotinho prateado e dirigiu-se ao fecho de ser sutiã, libertando seus seios com facilidade. Ela o protegeu devidamente e antes de alcançar o garoto para puxá-lo contra si, ele se afastou um pouco, de modo a observar o corpo dela sem a menor discrição.
   - Linda... Você é linda, . E toda minha. – Os olhos azuis queimavam ainda mais a pele dela e antes que ela pudesse se deter, um gemido profundo escapou por seus lábios. Não, não fora nada que ele tivesse feito. Havia sido algo que ele tinha dito. Ele não estava nem a tocando, suas meras palavras e seus olhares causavam isso à garota. – Você precisa acreditar em mim ou não sei o que faço... Preciso te ter desesperadamente. Preciso poder te chamar de minha. Você está entendendo, ? Eu preciso... – Ela pousou um dedo nos lábios do rapaz, o interrompendo.
   - Me prove. Me mostra que o que você disse é verdade, me mostra o quanto você me quer... Me faça sua, .
   E com esse pedido inegável, ele finalmente penetrou-a com toda a força e toda a paixão que pode, fundo e forte. Ela deixou escapar um grito, que foi seguido por diversos outros, acompanhados de lamúrias, suspiros, grunhidos e o que mais se fizesse necessário para acompanhar a dose de prazer incansável que os quadris de chocando-se aos seus proporcionava. Ele investia duro, mas com muita habilidade, do jeito que a menina pedia. Mais forte, mais rápido, enchia-a por inteiro.
   Alcançando um seio da garota, beliscou o mamilo entre seus dedos, arrancando dessa vez seu próprio nome dos lábios já inchados dela. Ele acelerou o quanto pode os movimentos, e sem deixar de aprisionar o seio dela entre seus dedos, inclinou-se para mais um beijo intenso, desejoso. Ela apressou-se a descontar a sobrecarga de sensações nas costas do rapaz, suas unhas cumpridas marcando a pele clara, deixando rastros vermelhos e ardidos. apertou seu dedão na cintura da menina, onde se apoiava, de forma que ali, no dia seguinte, poderia destacar-se uma pequena mancha roxa. Ela não ligava. Ele tampouco. Estavam tão absorvidos, tão mergulhados na essência um do outro, na complexidade daquele relacionamento distorcido, no desejo insano e no turbilhão de emoções daquele dia, que só o que podiam fazer era tentar prolongar o momento da forma como pudessem.
   Uma gota de suor teimosa escorreu pela nuca dele e tomou impulso para rolar seus corpos na cama, parando com montada sobre si. Ela apoiou-se no peitoral do parceiro e, com a ajuda de suas mãos firmes em seus quadris, começou movimentos de vai e vem, intercalados com leves reboladas.
   O orgasmo interrompido voltou a querer se fazer presente pela queimação no ventre da garota. não suportou a distância de seus corpos, ficando sentado cara a cara com a mulher de seus sonhos e continuando a guiar as investidas. Ela agora se apoiava nos ombros largos dele, os gemidos ininterruptos sendo proferidos a milímetros de sua boca, as respirações se misturando...
   O gozo dela veio, finalmente, as paredes internas da garota fechando-se em espasmos contínuos, o rosto enterrado no pescoço perfumado de , que, algumas estocadas a seguir, apertou-a em seus braços encontrando a própria liberação.
   Os dois ficaram naquela posição alguns minutos, recuperando-se do furacão de sentimentos e normalizando as respirações. Ele caiu deitado na cama novamente, levando-a consigo. Saiu delicadamente da intimidade sensível da menina, retirou o preservativo, jogando-o no chão ao lado da cama – depois daria um jeito naquilo – e ajeitou em seus braços, a cabeça em seu peito, as pernas entrelaçadas. Puxou os lençóis até suas cinturas e ficou ali, acariciando levemente os cabelos brilhantes dela até que ambos caíssem no sono.

(...)

   sentiu a menina se mover ainda aninhada sobre si, apenas quarenta minutos depois de toda a atividade. Levou sua mão das costas dela para seus cabelos, fazendo um cafuné carinhoso. abriu preguiçosamente os lindos olhos e mirou o rapaz com o que apenas poderia ser definido como afeição. Ele não ficou atrás, esticando-se um pouco até encostar seus lábios na testa dela calmamente.
   - Vou pegar um suco pra gente. O que acha, linda? – Ele perguntou. concordou brevemente com a cabeça ao sentir a garganta seca. Ela rolou para o lado, dando espaço para ele se levantar e ficou admirando à bunda branca do rapaz até ele vestir a boxer e deixar o quarto.
   Ela rolou mais uma vez, enterrando o rosto no travesseiro que usava até então. Seus neurônios começaram a trabalhar, mas ela sabia que o arrependimento não daria as caras. Loucura era a palavra que melhor definia as últimas horas do casal.
   Depois de ouvir vomitar verdades – segundo ele – na sala, ficou elucubrando um tempo, tentando se convencer de que tudo que ele falava era mentira. Não obteve sucesso. A realidade era que ela estava desesperada para acreditar em cada palavra que ele lhe proferia. Estava particularmente cansada de toda essa perseguição de gato e rato, de negar a ele e a si mesma algo que em seu íntimo desejava e estava, mais do que nunca, preocupada com a missão. Oh sim, estava ultrajada com sua falta de profissionalismo. Estava deixando sua vida pessoal interferir em seu objetivo e isso era algo que nunca havia ocorrido antes. Ora, se ela não fosse sempre tão concentrada nunca teria ganho os diversos prêmios e nem sequer estaria ali, resolvendo um caso especialmente perigoso, segundo a própria agência. E, no entanto, sua maior dificuldade na missão até então tinha sido afastar seu próprio parceiro. Aquilo não estava certo. Encontrar alguém que muito possivelmente sabia que eles eram agentes nas ruas do condomínio e não fazer nada a respeito tampouco. Ela precisava dar um jeito em Cristine. Outra coisa que a estava incomodando há um tempo era o tal do Mark. Quem raios a CIA achava que ela era pra precisar de um babá? Aquilo era arriscado, estúpido e francamente ultrajante. Queria aquele homem longe do condomínio o mais rápido possível. Algo sobre ele simplesmente não lhe cheirava bem.
   Decidida, tinha tomado a primeira atitude de tirar a sujeira há mais ou menos uma hora e meia atrás. As coisas com estavam resolvidas, ela iria lhe dar o benefício da dúvida e entraria de cabeça em seja lá o quê que eles tinham. Sem mais mania de negação, sem mais tensão sexual, sem mais distrações pra lá e pra cá.
   O segundo tópico da lista de afazeres era treinar. Suas visitas ao saco de areia estavam escassas pra alguém acostumada a algum exercício todos os dias. Tinha habilidade suficiente para não ter perdido a prática, mas se chegasse ao ponto de haver um confronto com o tal procurado e seus capangas, era essencial estar em sua melhor forma física. Daria um jeito naquilo muito em breve, criando uma rotina a ser seguida ou convidando o marido para combates amistosos.
   E, por fim, mas não menos importante, viraria todas as suas atenções para o mais novo suspeito: Joseph Waterloo. Faria o necessário, desde interrogar Pamela, até seguir o dito cujo, e não descansaria até saber se ele tinha ou não culpa no cartório.
   Perdida em sua própria cabeça repassando tudo que tinha que fazer, o tempo passou e retornou com dois copos de whisky com gelo. estranhou, onde estavam os sucos?
   - Não faça essa cara. Você vai querer álcool depois de ler isso. – deu na mão da garota um papel cartão retangular, onde podia-se ler em uma grafia cuidadosa:
   Problemas no paraíso? Os vizinhos estão vendo.
   - M.

   revirou os olhos e tomou um dos copos da mão de , virando em um gole o conteúdo.
   – Inacreditável! Esse Mark tem mais é que ir pra PUTA QUE O PARIU!
   - Sim, e tudo isso por uma discussão na sala. Qual é, casais de verdade também brigam! Que idiota. – sentou-se na beirada da cama, ao lado da esposa, movendo a cabeça de um lado pro outro em desaprovação. – Eu vou falar com ele, . Já chega dessa palhaçada, vou falar pra ele que temos um suspeito pra ver se ele para de pegar no nosso pé. Isso está ficando honestamente ridículo.
   - . – A menina chamou, pegando na mão do rapaz para chamar sua atenção. – Você vai dizer pra ele que temos um suspeito sim, mas vai também dizer que se ele não for embora daqui desistimos da missão. Está entendendo? – Ele arregalou um pouco os olhos.
   - Podemos fazer isso?
   - Teoricamente, sim. Na prática não acredito que possamos. Não que a CIA vá nos impedir e nos manter aqui em cativeiro, mas é bem provável que passemos o resto das nossas vidas coletando análises de laboratório se o fizermos, e com o tamanho do orgulho e patriotismo de todos os agentes, acho difícil qualquer um dar um caso como encerrado sem ter efetivamente resolvido ele, e isso se aplica a mim e a você. Mas ele pode não saber dessa parte. Pode acreditar e vazar daqui. E nos dar espaço pra trabalharmos propriamente. – Ela concluiu, dando um pequeno sorriso resignado.
   - Tá bem. Eu vou lá então. E a senhorita, vai passar o resto do dia nessa cama? - Perguntou com o semblante tendendo à malícia e uma das mãos simulando pés caminhando sobre o braço da garota como se dissesse "meu bem, quando eu voltar teremos nosso segundo round". riu e segurou a mão atrevida, levando-a aos lábios para depositar uma mordida na palma cheinha.
   - Não. Vou dar uma passada na casa da Pamela de surpresa, alegando que tivemos um briga por qualquer motivo tosco que eu encontrar e que preciso conversar com uma amiga, blá blá, e aos poucos começo o interrogatório. – Disse já se levantando, deixando uma piscadinha para o parceiro.
   - Essa é a minha garota! – disse e deu um tapa na bunda de , que começava a se vestir, e foi pra fora do quarto rindo, tendo que desviar de uma almofada voadora no caminho.

(...)

  Casa número 34

   bateu apressado na porta imponente da casa. Lembrava-se da última vez que esteve ali e não gostava da ideia de ter que estar novamente, mas parecia que o tal Mark simplesmente não entendia o recado e por isso sua visita se tornava necessária.
   - , meu caro, parece que recebeu meu bilhete amigável. – Mark abriu a porta, com o mesmo sorriso cínico do qual se lembrava. Seu sangue ferveu.
   - Quem você pensa que é pra ficar mandando recadinhos, hein? Eu achei que tivesse deixado claro da última vez que estive aqui que não quero você se metendo nessa missão. – disse, após irromper para dentro do hall do supervisor sem qualquer convite.
   - Meu trabalho é me meter nessa missão, . Não é minha culpa se você e parecem estar tendo... hm... dificuldades. – Respondeu o mais velho, ainda suportando a mesma feição arrogante de antes.
   - Pra sua informação, estamos indo muito bem no caso, fizemos progressos e temos até um suspeito. Mas ter um escroto como você nos espionando enquanto o fazemos é inadmissível. – Decretou , cruzando os braços na altura do peito, irredutível.
   - Bem, eu não teria que espioná-los se me reportassem o que andam fazendo, não é mesmo? – Mark replicou, passando um dos longos braços pelos ombros de , como se falasse com um adolescente. – Diga-me, está estressado por conta da briguinha que você e protagonizaram em frente às paredes de vidro ou tem algum outro motivo como o fato de estar mentindo sobre ter um suspeito?
   Mark estava pedindo. O punho de já coçava para dar um bom trato nos dentes do outro a ponto de ele nunca mais poder sorrir do modo prepotente como fazia o tempo inteiro. Mas não aprovaria o espancamento de seu superior, por mais merecido que fosse. E, afinal de contas, ele estava tentando ser um homem melhor para ela. Mas uma informação importante tinha conseguido extrair do blá blá blá de Mark: A informação que a CIA tinha que “potencialmente complicaria a missão”, como havia descoberto em sua última visita àquela casa, era o envolvimento dele com sua parceira. A expressão do supervisor deixou bem claro que brigar com era de fato algo que mexeria com ele a ponto de deixá-lo estressado. Bem, a companhia não estava errada, os dois realmente estavam se envolvendo e realmente tinham se dispersado da missão, mas agora recuperariam o tempo perdido – em todos os sentidos –, então para o raio que o parta com aquela informação. Ainda era melhor saberem que seus agentes transavam ocasionalmente do que saberem de Cristine.
   - Mark – chamou, ignorando seus impulsos violentos que o mandavam arrancar a cabeça dele naquele instante. – Vamos fazer um acordo. – Disse, tirando com alguma rudeza o braço do outro de seus ombros. - Eu te dou um patamar das coisas que eu e descobrimos e você vaza daqui. O que me diz? Você terá o que reportar à base e nós ficamos livres da babá que botaram na nossa cola. Ambos ganhamos.
   - Oh, ... – Por um segundo achou que Mark recusaria a proposta, mas então algo perpassou seus olhos que se fecharam em fendas e ele voltou a olhar o agente com outra face. – Na verdade, acho justo. Não sei se me deixarão retornar à NYC antes do caso estar acabado, mesmo tendo informações, mas tentarei. Quero férias, se é que me entende. – Mark abriu mais um sorriso cínico, algo mais misturado em seus olhos cor de mel, como observou. Foi difícil acreditar na pose de inocente que o mais velho vestiu, mas era pegar ou largar. agarrava-se a chance de o outro realmente ir embora, ou, no pior dos casos, se ele ficasse, que eles comprovassem logo a culpa de Joseph e nunca mais tivessem que ver o maldito. Só para adicionar uma dose mais de confiança, pegou Mark pelo colarinho da camisa jeans e o ergueu levemente pra cima de modo que o mais velho ficasse na ponta dos pés.
   - É bom você não dar uma de espertinho, está me entendendo? Mais uma brincadeirinha sem graça da sua parte e eu e damos o fora daqui e deixamos você pra lidar com os tubarões. – Mark assentiu, sem deixar-se abalar pela ameaça do garoto. o observou mais algum tempo com os olhos semicerrados, enfatizando a veracidade de sua fala. Por fim, deu-se por satisfeito por hora, e o colocou de volta no chão. – Bem. – Limpou as mãos na calça, como se encostar em Mark fosse algo asqueroso. E talvez para o rapaz realmente fosse. - Suspeitamos que Joseph Waterloo esteja envolvido. Não temos como saber com certeza se ele apenas é um capanga ou se é o procurado mesmo. Ele tem histórico de revelar segredos de Estado e por isso não tem conseguido emprego, mas mesmo assim retorna à sua casa tarde da madrugada e está cheio de segredos com a própria esposa. Alguma culpa no cartório ele tem. E sabe o que dizem de capachos... Eles são necessários, mas dificilmente fecham a boca quando postos na parede. Esperamos que, se ele não for o próprio terrorista, esse ditado se aplique e ele nos dê as diretrizes necessárias para encerrar a missão. Ou melhor, esperamos de uma forma ou de outra que ele seja nossa resposta para o paradeiro e identidade do procurado.
   O sorriso de Mark deu uma sutil vacilada, não que tenha passado despercebido aos olhos de , que estranhou. No entanto, não via motivo para aquilo. Vai ver, morando no condomínio, Mark tinha feito amizade com Joseph e não esperava aquilo ou algo do gênero. Era a explicação mais plausível.
   - Faz algum sentido realmente. Bem, boa sorte. Eu vou ligar assim que começar a semana para Leonard e veremos se eu consigo sair daqui. Sempre um prazer, . – Mark abriu a porta para o outro, que ainda o encarava desconfiado. Será que Mark realmente faria o possível para parar de supervisioná-los? Conforme fosse, sua parte do trato estava feita e a informação deveria ao menos tirar Mark da cola dele e de sua parceira um pouco, e isso significava sem espiões e sem recadinhos bizarros debaixo da porta.
   Saiu da casa 34 e retornou para a sua, não sem antes dar uma olhada na casa de Pamela disfarçadamente, onde viu sua esposa no sofá de frente para ele. Ela chorava. estava se mostrando cada vez melhor no que fazia, pensou.

  Na casa de Pamela

  - ? Que cara é essa, está tudo bem? – Pamela perguntou assim que atendeu a porta, dando de cara com uma para baixo, cabisbaixa e com olhar perdido.
   - Ai, Pam... Desculpa aparecer aqui do nada, eu sei que é extremamente indelicado, mas eu e tivemos uma briga e...
   - Você bem que podia usar o colo de uma amiga? – Pamela interrompeu, completando a frase de , que acenou em concordância. – Não diga mais nada. Vamos, entre. Vou pegar chá para a gente.
   sentou-se no sofá creme da sala de estar da suposta amiga e começou a forçar seus olhos a ficarem irritados, para ver se com sorte algumas lágrimas caíam. A outra retornou com uma bandeja, um bule e duas xícaras sobre ela. Serviu o chá de camomila para as duas e sentou em frente à , mas de modo que pudesse alcançar suas mãos para confortá-la.
   - Vamos, o que houve? O que fez pra te deixar assim, amiga? – Perguntou, acariciando calmamente a mão fria de , que limpava uma lágrima solitária de sua face.
   - Você deve conhecer minha vizinha, Elizabeth Müller. – Pamela concordou e deu uma leve revirada nos olhos, deixando claro não ser sua maior fã. – Bem, ela... Se mostrou muito interessada em meu marido desde que nos mudamos para cá. E... apesar de me incomodar, eu nunca dei muita atenção, pois o próprio não parecia dar liberdade à ela. Mas então... – fez uma pausa, deixando escapar um soluço e mais algumas lágrimas propositalmente. – Eu descobri que eles já haviam se exercitado juntos, e sequer me contou... Muito pelo contrário, disse estar com o Teo. Ele nunca mentiu pra mim, Pam. Por que agora? – Ela encarou a amiga, buscando amparo. Pamela já tinha a expressão de pena estampada no rosto, mas, além disso, havia entendimento em seus olhos. Como se soubesse exatamente pelo que estava passando. – E se ele mentiu sobre isso... Sobre o que mais ele pode ter mentido? Ah, estou tão confusa, amiga.
   - , você e são o casal perfeito. E tão jovens. Acalme-se, as coisas vão se resolver. – Disse, passando um pires para a outra e acariciando suas mãos em sinal de conforto. – E sabe, eu entendo exatamente pelo que está passando. Joseph também anda, em uma palavra, distante. Ele não tem mentido para mim, mas tampouco tem me contado qualquer coisa. – deu um gole no chá, subitamente mais atenta a conversa. – E o que eu faço para lidar com isso é me agarrar a ideia de que ele me ama e sempre fará o melhor para nós dois. Pense assim sobre o também. Às vezes ele não te contou, porque não queria te preocupar... Você mesma disse que ele nunca demonstrou corresponder às investidas da Vadiabeth. - Pamela arqueou as sobrancelhas, comprovando seu ponto. deu uma risada seca do apelido.
   - Como você pode ser tão segura de si, Pam? Eu não sei se consigo apostar todas as minhas fichas em confiança no desse modo. Como consegue confiar tanto em Joseph, confiar que ele sempre fará o melhor pra você?
   - Eu apenas... sei. Sabe, , eu nunca te contei isso... Mas Joseph foi afastado da marinha há dois anos. Ele cometeu alguns erros irreparáveis e eu tive que nos sustentar com as economias da minha família, pois ninguém mais queria contratá-lo. Joseph sabe que deve muito a mim e tem uma admiração enorme por mim por eu não ter desistido dele. Mas eu o fiz tendo certeza de que ele faria o mesmo se a situação fosse invertida. – Pamela deu de ombros. – Eu o amo, , sei que ele me ama, e mesmo agora que ele arrumou o que fazer e pode voltar a nos sustentar, as coisas entre nós não mudaram. Eu sei que ele não gosta do que faz agora e por isso está distante, difícil de lidar... Mas ele permanece no emprego e sei que é por mim. Por ele querer me dar o melhor e nada menos do que isso. – escutava tudo com atenção e demonstrava todo o interesse que de fato possuía no assunto. – Ele não precisa me dizer essas coisas que estou te falando. As atitudes dele me mostram. E embora por vezes seja complicado aguentar, no fim do dia eu fecho os olhos e apenas deposito minha confiança total e absoluta no homem que eu amo. Afinal, se não ele, ninguém mais seria digno de recebê-la.
   - Entendo... É, talvez eu devesse dar mais crédito ao . Obrigada, Pam, você me ajudou muito. – levantou e as duas se abraçaram longamente. Logo estava a caminho de sua casa, uma única linha de pensamento em mente: Joseph não era o procurado. Joseph era apenas um capanga. E Joseph seria a peça chave para concluírem aquele caso de uma vez por todas.

Capítulo 24 - Dead Dot

  - E ai, como foi? – perguntou ao observar sua esposa adentrar a casa e em seguida dirigir-se ao sofá no qual ele estava, jogando-se ao seu lado.
   - Péssimas notícias: Voltamos à estaca zero. Joseph não passa de um capanga. E agora... Não temos mais suspeitos. – disse, desacreditada.
   - Mentira, cara, que merda! – disse entredentes, as mãos fechando-se em seus cabelos, puxando-os para descontar a frustração. Bufou. – Ok, vamos pensar. Não perdemos tudo ainda, . – deu de ombros - Temos uma pista a seguir agora, vamos extrair a informação de Joseph. – ponderou suas palavras. Estava certo, claro, mas por um momento a garota tinha se iludido que tudo aquilo poderia ter um fim rápido e indolor. Como se algum dia pudesse dar tamanha sorte. A decepção tomou conta de seu ser por alguns momentos sem permissão. Aquilo, no entanto, não a levaria a lugar algum.
   - Você está certo. Me desculpe, é que eu nunca soube lidar muito bem com o fato de as coisas não saírem do jeito que eu quero. – Sorriu de lado, conformada com sua atitude infantil momentânea. – Vou preparar o equipamento e hoje vamos seguir o infeliz, ta bem? – Indagou elevando suas sobrancelhas.
   - Sem problemas. – deu um sorriso fechado em resposta. – E, , caso queira saber... O imbecil do Ma-
   - Ah, sim, o Mark! – Disse em um sobressalto interrompendo-o. - Esqueci que você foi falar com ele. Deu tudo certo? Ele vai nos deixar em paz?
   deu um sorriso irônico com a reação da mulher.
   - Primeiramente, nunca mais me interrompa. Odeio que façam isso. – Disse dando um selinho duro em como se para calá-la. – E em resposta, mais ou menos. Ele disse que vai tentar voltar pra NYC com a informação do novo suspeito, mas que não sabia se conseguiria porque seu trabalho era cuidar para que tudo estivesse nos conformes até a missão ser finalizada e blá blá blá. Eu poderia ter sido mais incisivo, poderia ter ameaçado desistir da missão como você disse, mas contava com Joseph realmente ser o culpado e não ter mais que me preocupar com aquele idiota. Se ele voltar a incomodar, dou um jeito. – disse, dando de ombros.
   - Você quem sabe. Com alguma boa vontade do cara lá de cima, em breve descobriremos algo significativo e Mark se tornará a menor das minhas preocupações. – disse, optando por não esboçar qualquer reação (boa muito mais do que ruim) frente ao breve-porém-rude tocar de seus lábios. Levantou-se para preparar as coisas que utilizariam à noite, parando no início da escada apenas para uma última pergunta: - , você por um acaso não quer nem saber como cheguei à conclusão de que Joseph não era o procurado?
   O homem, que apenas virou levemente a cabeça em direção a sua voz, deu um riso um tanto seco.
   - Isso pode parecer surpreendente, , mas eu na verdade tenho muita confiança no seu poder de persuasão. No seu trabalho como um todo, na verdade. Então não, não vou me dar o trabalho de perguntar detalhes, a não ser que você queira muito compartilhá-los. – sobressaltou-se com a resposta. Conheciam-se tão pouco, conviveram sem ódio embebendo-os por menos tempo ainda, e o rapaz simplesmente confiava nela? Sorriu. era um cara muito autêntico. sentiu uma onda de admiração envolvê-la. Tudo que mais queria era poder fechar os olhos e entregar-se desse jeito para alguém, para qualquer pessoa que fosse, sem medo da decepção. Talvez houvesse algo que ela pudesse aprender com seu marido, afinal de contas. Além de como foder bem. Mas isso eram outros quinhentos.

(...)

   entrou no quarto e encontrou com terminando de se vestir. A mala com os equipamentos que poderiam utilizar – desde armas até artigos de espionagem como binóculos e luvas para recolhimento de evidências – estava aberta em cima da cama. constantemente alcançava algo ali dentro para esconder sobre a roupa em coldres, bolsos especiais ou sob as botas de cano alto. Por fim, para disfarçar a roupa toda preta e colada ideal para ação, a garota pegou um lenço branco e preto e um sobretudo verde. a essa altura estava jogado na cama, apenas observando-a e brincando com um discreto acendedor nas mãos.
   - Vai ficar só babando ou pretende se arrumar qualquer dia? – questionou, o tom de humor presente em cada palavra.
   - Você não perde a chance de tirar uma comigo, não é? – rebateu, ao que balançava a cabeça em negação, um pequeno sorriso arqueando o canto dos lábios.
   - Nope. Estou sempre às ordens, . – disse, as mãos na cintura e os olhos faiscando na direção do parceiro enquanto o reverenciava comicamente. Este, que agora se levantava e arrancava a camiseta fina que usava no intuito de vestir algo mais apropriado, se aproximou dela.
   - Engraçadinha. Para sua informação, eu só não tinha começado a me trocar ainda porque estava muito melhor te observar toda sexy nessa roupa colada. – Murmurou a centímetros dos lábios da esposa, que formaram um sorriso malicioso.
   - Pra quê observar quando você pode... Tocar? – disse, agarrando as mãos de e pressionando-as com intensidade sobre sua barriga e cintura por sob o tecido que a moldava perfeitamente. mordeu o próprio lábio inferior, enlouquecido pelo tratamento que passara a destinar a ele.
   Em um impulso um tanto quanto rude, desvencilhou-se das mãos dela, passando as suas pelas costas de e puxando-a em sua direção até colidirem bocas e corpos. Ela imediatamente alcançou uma mão aos cabelos sedosos do marido e a outra em seus ombros largos, perdendo-se em um mundo de saliva, línguas, mordidas e suspiros, na dose mais certa possível.
   Passaram-se uns 20 minutos em meio a longos beijos e leves amassos no meio do quarto. foi o primeiro a tomar a iniciativa de se separar dela, prevendo que se aquilo continuasse seu amigo iria ficar animado demais e aí ele só permitiria que o arrastasse para a espionagem depois de estarem os dois extremamente suados e satisfeitos dentre os lençóis claros de algodão. E aquilo não podia acontecer, afinal ficaria muito tarde e Joseph provavelmente já teria saído de casa para “trabalhar”. Respirou fundo, a testa contra a da esposa, criando coragem de se aprontar.
   - Vai, lindo. Se troca. – disse em voz baixa, totalmente mansa, o incentivando, e deixou o quarto indo em direção ao escritório para ficar ligada nas escutas e ter certeza de que Joseph ainda estava em casa. começou a se preparar do mesmo modo que ela fazia, guardando as coisas que poderia precisar no meio da roupa até que a pequena mala ficasse quase vazia.
   Assim que ficou pronto, ouviu chamá-lo alarmada do andar térreo da casa. Saiu apressado em sua direção.
   - O que foi?
   - Ele está saindo. Merda. Recebeu uma mensagem e dois minutos depois bateu a porta da casa sem sequer se despedir de Pamela. Temos que correr. – informou, já puxando em direção à porta sem perder tempo.
   - Mas que estranho, ele só tem o hábito de sair daqui a uma hora! – disse, estranhando a mudança repentina de rotina, extremamente atípica para o padrão que o ex-suspeito vinha mantendo. Deu de ombros, impossibilitado de pensar mais no assunto se quisesse pegá-lo a tempo. - Bem, vamos lá.
   Os dois seguiram o mais rápido e discretamente possível em direção à casa de Pamela. Chegando próximo ao local, o casal se olhou questionando que direção seguir, se para a direita ou para a esquerda da fachada da casa. Optaram pela esquerda, uma vez que sua própria casa ficava na direção oposta e era mais provável que Joseph não tivesse ido por ali ou o teriam visto. liderou os movimentos rasteiros e apressados dos dois, contornando uma ou duas casa com o intuito de ser menos óbvia no caminho. Quando foram aproximando-se do parquinho, uma área mais aberta, de difícil camuflagem, segurou a mão de , induzindo-a a se abaixar no último canto escuro dali, e tirou uma espécie de binóculo de dentro da jaqueta, apontando o por toda a extensão da área de lazer.
   Pode detectar com o sensor de movimento do aparelho, uma pessoa no início do grande bosque que começava ao fim do parque, com árvores altas e espaçadas que se transformavam em densa vegetação conforme o terreno era percorrido. e tinham duas opções: Ou arriscavam serem desmascarados ao passar pelo parquinho correndo e nesse caso conseguiriam chegar mais perto de Joseph que a esta altura tomava distância, ou arriscavam uma pequena encenação e depois teriam que se virar para encontrar o suspeito na mata.
   Como o disfarce era elemento crucial na missão, optaram pela segunda alternativa.
   pegou na mão de mais uma vez, dessa vez tentando andar calmamente até sair para a luz dos postes que clareavam as ruas do condomínio. Ele tentaria passar a imagem de um casal apaixonado curtindo uma noite estrelada no bosque. passou um braço pelos ombros da esposa e depositou um beijo em seus cabelos. Ela logo entrou no personagem também batendo os cílios e abrindo um sorriso tímido. Ao mesmo tempo, colocava casualmente uma mão no bolso da calça jeans preta do marido, onde sabia que ele tinha guardado um localizador e pressionou o botão que o ligaria. Foram assim fingidos românticos até um pouco depois da entrada do bosque.
   olhou por sobre o ombro, verificando se ainda era possível alguém enxergá-los e, ao constatar que não, virou-se para e entregou o localizador em suas mãos, o qual já marcava um ponto vermelho em um raio de 650 metros. Aquele era, provavelmente, o celular de Joseph. Eles tiraram rapidamente os disfarces, ficando apenas com as roupas pretas ideais para ação e começaram a correr na direção do ponto sem hesitar. Estavam longe e não podiam se dar ao luxo de ficar ainda mais já que o localizador portátil tinha alcance de apenas 800 metros. Diminuída a distância deles e Joseph em 150 metros, deu um tapinha nas costas de que olhou o painel indicando um novo ponto adentrando a zona de alcance. A nova presença movia-se rápido, provavelmente estava mais habituada ao ambiente que Joseph ou o casal. Mais 100 metros de proximidade. O novo ponto cessou qualquer movimento. Joseph andou mais prováveis 30 metros na direção do outro ponto, agora a 100 metros do mesmo, 400 metros da dupla de agentes. E então, e ouviram.
   Um som inconfundível, ainda mais para o rapaz que tanto conhecimento tinha do assunto. Dois disparos. Um rifle de alcance a longa distância. Um urro de dor percorreu rapidamente a densa vegetação. agarrou o pulso de e ambos saíram em disparada na direção que vinham seguindo. A garota vislumbrou o painel e verificou que o segundo ponto se movia ainda mais rápido que os dois para longe do local. tirou seu revólver do coldre em sua coxa. alcançou sua pistola na cintura.
   Ainda desviando rapidamente de raízes e galhos que atrapalhavam a movimentação do casal, ainda mais sendo um caminho que não conheciam, acabaram por fim chegando ao local onde o primeiro ponto estava e, conseqüentemente, o local de onde ouviram o grito. Era uma pequena clareira em meio à floresta e um corpo jazia em seu centro. foi cautelosamente em direção a ele, a arma empunhada, não sabendo ainda se estava muito machucado ou já sem vida. continuou o caminho atrás do segundo ponto que já beirava o alcance máximo do sinalizador e em breve se perderia. Os dois parceiros haviam se separado, sem que para tanto fosse necessário comunicar-se.
   , ao perceber que não haviam movimentos no peito baleado, tomou liberdade de virá-lo com a ponta do sapato, para que pudesse identificar com certeza o que já suspeitava. Joseph estava morto.
   corria com toda a potência que seus pés a permitiam e nem assim conseguia manter o mesmo ritmo da outra pessoa. Seu corpo estava sempre chocando-se com alguma muda ou pedra e/ou deslizando em algum pequeno barranco, já que nunca havia adentrado aquela parte do condomínio. Ao julgar pela velocidade do desconhecido, podia afirmar com certeza que essa não era sua situação. A pessoa parecia conhecer a floresta como a palma de sua mão, e contava com muita agilidade também. Um minuto depois, o ponto se perdeu e a garota desistiu. Nunca o alcançaria, e agora sem orientação muito menos. Resolveu fazer o caminho de volta de encontro a seu parceiro.
   encontrou a esposa no meio do caminho, então puxando-a pela mão novamente para fora do grande bosque. Ela soltou uma exclamação baixa de dor, o que o fez parar e a olhar interrogativamente. Havia alguns cortes em sua pele e pequenos rasgos nas roupas em locais onde um galho inesperado deveria tê-la atingido durante a perseguição falha. alcançou o sobretudo dela e colocou sobre os ombros da mulher, logo depois arrumando seus cabelos para esconder todos os machucados visíveis e não chamarem atenção.

(...)

  Não haviam trocado uma palavra ainda sobre os últimos acontecimentos. Sentados no chão frio o banheiro de sua suíte, cuidava dos pequenos machucados de com uma atenção ímpar. A maioria era bem superficial, apenas um na altura das costelas exigiu alguns pontos. Nada com que a agente não estivesse acostumada.
   Fosse como fosse, eles evitavam o assunto do fracasso. Seu único suspeito encontrava-se morto e eles sequer conseguiram pegar o assassino. Era uma sensação péssima para os dois, que não estavam acostumados com a derrota. Imersa em pensamentos, lembrou-se de um pensamento que teve ainda na floresta. O assassino de Joseph era rápido demais e por isso provavelmente conhecia o padrão daquelas árvores como a palma de sua mão. Para tanto ou a pessoa era frequentadora assídua do local ou mais do que isso, morava ali. Lembrou-se dos estudos sobre os outros moradores do condomínio. Nenhum tinha histórico de freqüentar aquela área. Estranho. A menos que... Cristine. Ela não era moradora do condomínio. Não havia um estudo sobre sua pessoa. E, no entanto, ela estava sempre por ali. Seria possível que a megera tivesse erguido um forte no meio do mato?
   - . – Chamou.
   - Hm? – O rapaz respondeu, ainda concentrado em finalizar o curativo na cintura da garota.
   - Acho que o assassino tem brincado de Mogli.
   - Desculpe, o quê? – levantou a cabeça para mirá-la nos olhos, sem entender.
   - Eu acho que a pessoa que eu corri atrás hoje tem estabelecido uma moradia no meio da floresta. Acho que essa pessoa pode ser Cristine. E acho que ela matou Joseph.
   - Tudo bem... – disse, balançando um pouco a cabeça para os lados como que para clareá-la. - , eu sei que você a odeia, mas de onde veio essa conclusão?
   - O ponto que eu estava perseguindo... Movia-se rápido demais. Quase como se percorrer aquele caminho fosse natural. Deduzi que a pessoa deve ser familiarizada com o padrão das folhagens. No histórico da CIA sobre os moradores de Westbridge não havia nada sobre algum frequentador do bosque. E isso não é algo que a CIA ignoraria, sendo um local afastado, desabitado... Logo, não deve ser um morador do condomínio. E bem, Cristine vive por aqui. Como isso seria possível sem ninguém autorizar sua entrada?
   - Ela sempre consegue o que quer, . No mínimo deve ter seduzido algum porteiro imbecil.
   - Tudo bem, é uma possibilidade. – concordou com a cabeça, mas sua expressão ainda era desconfiada. - Mas todos os dias? Não acha que ela pode, não sei, ter entrado aqui pela floresta? E mais do que isso... Ter ficado por lá? Pra te vigiar de perto, nada melhor do que estar sempre por aqui. Quem sabe uma cabana no meio do nada ajude. – Deu de ombros.
   - Já entendi. Você quer voltar pra lá e vasculhar o lugar. Mas, , o corpo de Joseph está lá no meio. Não podemos dar essa brecha.
   - Você tem razão. É só que... – Ele a interrompeu.
   - Eu entendo, de verdade. Você quer resolver esse caso pra ontem. E, apesar de eu não ter opinião formada sobre ser ou deixar de ser Cristine, a noção de que seja quem for deve ter no mínimo deixado alguma pista pela floresta faz todo o sentido. E não ser do condomínio também. Mas simplesmente não podemos voltar lá. Se Joseph era mesmo um capanga e se livraram dele, a essa altura já podem até saber quem somos. Podem ter nos visto entrar na floresta. E se ainda não sabem... Se voltarmos terão certeza.
   - Tá, você ta certo. Mas é frustrante, sabe? A nossa única pista... Já era!
   - A não ser que... Nada, deixa.
   - Fala, .
   - Você não acha estranho terem matado ele agora? Quer dizer, ele parecia tão dedicado aos serviços designados a ele pelo modo como enfrentou a esposa e tudo mais, porque se livrar de um subordinado desses?
   - Talvez o procurado tenha descoberto que nós estávamos na cola de Joseph. Talvez tenha se livrado dele pra prevenir que o interrogássemos ou algo do tipo.
   - E como ele teria descoberto? Quer dizer, ele pode ter encontrado nossas escutas, mas até aí temos outras pelo condomínio, então não seria um sinal tão enfático de que suspeitávamos dele.
   - Talvez ele tenha suas próprias escutas. Por exemplo pela casa do Mark. Você não disse que ele ia avisar a CIA que tínhamos um suspeito?
   - Sim, mas, , mesmo assim essa história não faz sentido. Em todas as opções, o procurado só pode saber quem somos. E deve fazer tempo. Por mais que acreditemos que Cristine quem destruiu nossos equipamentos, e que ela quem pode ter acabado com nosso único suspeito... É coincidência demais. E se estivermos errados, e nada disso teve a ver com Cristine: Por que o procurado ainda não veio efetivamente atrás de nós então? Ele foi bem claro na carta pra CIA dizendo que se nos descobrisse acabaria com a nossa raça.
   - Mudança de planos. – a garota deu de ombros - Quem sabe ele ache mais interessante brincar de gato e rato conosco. Não estamos perto de descobrir quem ele é, então por que não se divertir no meio tempo?
   - Se esse for o caso - cogitou -, então por que não deu um jeito em Mark também? Quero dizer, ele está imune por enquanto. Tem os equipamentos de contato e é mais óbvio que a gente, pois seu disfarce é pior. Se ele sabe quem somos, deve saber quem ele é igualmente.
   - É, seria o natural. – parou um pouco para pensar. Mark não tinha sido exatamente discreto desde que chegara. As provocações, risinhos, comportamento suspeito, sem muito contato com os outros moradores, o bilhete... Aquele homem era muito estranho. E totalmente aleatório. Desde quando Leonard tinha um irmão, afinal? O cara nunca deu as caras na agência e de repente vem ser seu supervisor? Logo deles, em quem a CIA deveria confiar de olhos fechados?
   Foi então que uma ideia completamente insana tomou a cabeça de .

Capítulo 25 - Plans Change

  Como não tinha pensado nisso antes? Havia duas coisas para fazer antes de afirmar qualquer coisa. E ela não podia esperar para colocá-las em prática.
   Levantou-se em um pulo, ignorando a leve sensação anestésica que ainda tomava conta da lateral do seu tronco. Saiu do banheiro sem sequer esperar para saber se a seguia. Trocou rapidamente de roupa, colocando algo mais fechado que não deixasse transparecer os pequenos machucados e desceu as escadas. , ela notou enfim, estava ao seu lado durante todo o percurso. Eles saíram às ruas abafadas do condomínio, onde o sol já iluminava boa parte do céu azulado, e apesar de eles terem passado a noite em claro, a vizinhança já parecia bem acordada e disposta. Iam em direção a casa número 1: Casa de dona Anastácia Potter, a síndica do condomínio. soou a campainha e dois minutos de espera depois, a senhora abriu a porta.
   - , querida, chegou na hora certa! Acabo de preparar um chá com biscoitos de dar água na boca! - Disse simpática com seu cabelo sempre muito arrumado e roupas pastéis.
   - Muito obrigada, Dona Anastácia, vamos aceitar sim. – a garota sorriu, sentindo sair do estado contemplativo em que havia entrado para acompanhar a insanidade momentânea da esposa e abraçá-la pela cintura.
   Uma vez sentados nos confortáveis sofás goiaba da casa da senhora e com as xícaras em mãos, resolveu dizer a que veio.
   - Dona Anastácia, desculpe-nos aparecer assim sem avisar, acontece que nós temos um amigo que gostaria muito de vir morar aqui no condomínio, mas não sabemos se ainda tem alguma casa disponível e ele precisaria o mais rápido possível. A senhora saberia nos dizer?
   - Ó querida, não é incomodo algum. E, na realidade, até temos uma casa para aluguel, mas vocês teriam que tratar com o irmão do proprietário, que tem passado um tempo lá.
   - Como assim?
   - Veja bem, querida, pouco antes de vocês dois se mudaram para cá, tínhamos a casa de vocês e a de número 34 para aluguel. No entanto, esse mocinho simpático, Mark é o nome dele, me disse ser irmão do proprietário, e que passaria algum tempo na casa, sem compromisso.
   - A senhora confirmou com o proprietário isso?
   - Ora, e como poderia se Stuart está morando na Rússia, minha querida? Eu apenas verifiquei rapidamente sua identidade e entreguei-lhe as chaves. – e imediatamente trocaram olhares significativos. – Mas vejam bem, ele me pareceu muito bonzinho, tenho certeza que não verá problema algum em passar as informações de preço da casa e dar-lhes um tour pela mesma.
   - Claro. – sorriu para a senhora – Acho que já conversamos algumas vezes com ele, inclusive. Mas não tem muito tempo que ele veio para cá, tem?
   - Ah, meu anjo, eu não sou muito boa com datas, mas se bem me lembro foi mais ou menos na época em que vocês chegaram. Um pouco antes, quem sabe. - Antes. A palavra piscou por alguns minutos na cabeça de .
   sorriu mais uma vez, agradecendo mentalmente pela pequena senhorinha ceder todas as informações que queria de bom grado. Tratou de emendar mais alguns assuntos banais com dona Anastácia, antes de dar a visita por encerrada. - Bem, nós já vamos então, não é, amor?
   confirmou, e ambos se despediram da senhora, que os levou até a porta, pedindo que voltassem mais vezes para lhe fazer companhia.
   - Acho que entendi aonde você quer chegar, . Identidades falsas estão longe de ser complicado de qualquer um fazer.
   piscou para o marido, sabendo que ele já tinha captado sua nova suspeita e seguiu em direção à casa de número 34. Tocou a campainha, as mãos agora suando em bicas.
   - , , que surpresa! Não foi hoje mesmo que nos falamos? – disse dirigindo-se a - Acho que você está ficando com saudades rápido demais. – disse o mais velho rindo ao abrir a porta e dar passagem ao casal. negou, não queria entrar na casa.
   - O papo é rápido, na verdade. Só queremos saber se você já falou com a CIA. Você vai embora afinal, sim ou não? – a garota tomou as rédeas da situação, indo direto ao ponto.
   - Ó minha bela , ainda não pude contatá-los. Mas o farei em breve. Vocês tiveram mais alguma informação sobre o tal Joseph? – pôde notar um brilho de diversão nos olhos do homem e sem pensar colocou-se protetoramente um pouco a frente de .
   - Nada além do que você já sabe. Fale logo com eles, sim? – respondeu.
   - Nossa, mas que parceiro mais ciumento que foram te arranjar, minha querida. – disse para a menina. - Pode deixar, , vocês serão os primeiros a saber quando eu falar com a base. – Mark abriu um de seus famosos sorrisos cínicos, ao passo que apenas concordou com a cabeça e arrastou a mulher da frente da casa o mais depressa possível. Percebeu que o ar lhe faltava.
   - ... é ele. – disse a garota, trêmula com a descoberta - Esse tempo todo, bem debaixo dos nossos narizes, como nós não...?
   - Calma, . Respira fundo. Não havia como sabermos. - Tranquilizou ao que ela o mirava com os olhos bem abertos. - Na carta mandada para a CIA o procurado disse que morava aqui no condomínio e Mark sequer um morador é. Além de ter dito explicitamente que se descobrisse quem são os agentes, os mataria. Ele não seguiu nenhuma das instruções que nos passaram, era impossível que nós soubéssemos. – disse, segurando a esposa pelos ombros, estabilizando-a.
   - Bom, tudo faz sentido agora. Nossos equipamentos são destruídos e no dia seguinte aparece um homem em nossa porta, o qual não poderíamos confirmar ser da CIA ou não por não termos mais contato com a base, e que dizia saber que éramos agentes.
   - Fora o fingimento de ter vindo para cá só então, sendo que ele está aqui desde que mandou a carta pra CIA, provavelmente. Deve ter previsto que nos dariam uma análise de cada morador e por isso se garantiu de não ser um, enganando a pobre senhora Anastácia.
   - E também teve a interrupção na comunicação com Leonard no rádio do carro, nos dizendo para confiar nele sendo que sequer parecia a voz de Débora.
   - E ainda eu disse para ele quem era nosso suspeito e algumas horas depois Joseph é morto.
   - Nossa... Ele é bom.
   - Bastante. – concordou. - Agora nós precisamos ser muito cuidadosos, . Não podemos prendê-lo sem antes termos nas mãos seus capangas, caso contrário os bastardos apenas fugirão, por mais que consigamos que ele os entregue. E, mais do que nunca, precisamos arranjar um modo de contatar a CIA.
   - E onde você planeja conseguir um celular irrastreável nessas áreas, ? O imbecil deve ter colocado alguém atrás de nós, não é como se pudéssemos fingir ser um casal feliz e cheio de amor pra dar que vai em um beco escuro com cheiro de crack e sai de lá com um aparelho em mãos sem mais nem menos.
   - Os detalhes a gente resolve em casa. O mais importante é que nós já descobrimos, . Mark é o procurado.

  Eles caminhavam lado a lado, o silêncio confortável permitindo que absorvessem a nova informação. Eles sabiam quem era o procurado, bolariam um plano sem falhas e prenderiam todos os envolvidos. E então, a missão estaria cumprida. Done. Finito.
   Eles deveriam estar felizes, certo? Poderiam voltar para suas casas, seriam aclamados com mais medalhas na agência, quem sabe um agradecimento do próprio presidente dos Estados Unidos. Então por que sentiam-se tão desolados? Vazios, como se algo incomodasse seus peitos, uma sensação de perda irreparável, angústia, lástima... Saudade. Seria possível?
   Quase dez meses submersos em pura adrenalina, emoção e êxtase, chegando ao fim agora. O condomínio ficaria para trás. Sua casa imponente de vidro também. Seu casamento igualmente. Eles estavam livres para seguir com suas vidas. E por que suas gargantas secavam só de pensar nisso?
   - Sabe... Acho que vou sentir falta disso tudo. – admitiu, repuxando o lábio para um dos lados em uma expressão de lamento.
   - Do quê, exatamente? – perguntou, olhando-a de lado conforme entravam na casa que até então habitavam.
   - Ah, você sabe. – Deu de ombros. Continuou ao encontrar o olhar curioso dele sobre si. - Da Pamela, das brigas com a Elizabeth, das senhorinhas no parque achando tudo que fazemos a coisa mais linda do mundo, dessa casa maravilhosa... De você. – Disse por fim em voz mais baixa. – Me importunando. – Acrescentou com um sorriso sapeca.
   - Então você acha... – disse, dando alguns passos até a esposa, passando os braços por sua cintura e tirando-a do chão. – Que eu vou te deixar em paz assim tão fácil? – Perguntou levantando as sobrancelhas. ainda sustentava o mesmo sorriso, embora agora mordesse o próprio lábio inferior. Ela enlaçou o pescoço do rapaz com seus braços e deu mais uma vez de ombros como se não soubesse. – Pois você está muito enganada. – juntou seus lábios em um selinho. contornou a cintura do parceiro com as pernas e ele sentou-se em uma poltrona com ela no colo. Separaram as bocas. – Agora que eu te tenho, , vai ser difícil você se livrar de mim.
   - Ah, é? Mas eu achei que você já tinha me tirado da cabeça. Saciado sua curiosidade da época que trabalhei no contrabando. Ainda quer mais, ? – Ela disse, uma expressão fingida de inocência no rosto e uma mão acariciando de leve os cabelos rebeldes da nuca de .
   - Me chama pelo sobrenome de novo que eu te mostro o quanto não-saciado eu estou de te ter, . – Ele rebateu, as íris escurecendo levemente de desejo.
   - Easy, Cowboy*. – disse, rindo. só conseguia pensar em como ela ficava linda daquela maneira. – Não temos tempo pra isso agora. Mas quando sairmos desse condomínio vou te apresentar um lugar maravilhoso, onde tudo é possível.
   - É mesmo? – Ele disse, arqueando uma sobrancelha e apertando mais a cintura da garota, aconchegando-os em um abraço forte e confortável. - E que lugar mágico seria esse?
   - A minha cama. – abriu um sorriso, percebendo o quanto aquilo na verdade significava para a garota. Levá-lo em sua casa em Nova Iorque, confiar nele para passar a noite consigo em seu paraíso particular. Ela estava sendo sutil, mas mostrando exatamente quanta afeição havia começado a nutrir por ele. estava extasiado. Era a garota dos seus sonhos, a única que o fizera sentir tantas coisas em tão pouco tempo, com tão pouco estímulo – um olhar, um sorriso – finalmente se entregando de corpo, alma e, por que não, coração para ele.
   - Eu vou adorar, . Assim como adoro tudo que venha de você. – Disse segurando a nuca da parceira, que olhou-o com admiração e carinho, logo juntando seus lábios em um beijo que poderia ser descrito apenas como apaixonado.

(...)

  Pamela tinha recebido uma visita bastante indesejada em sua casa naquele final de tarde. Um policial foi lhe dar a notícia de que seu marido tinha sofrido um acidente enquanto praticava "esportes radicais", e que seu corpo estava em um estado bastante deplorável, de modo que eles haviam cremado mesmo sem o consentimento dela. A história era bastante plausível, não fosse o casal de agentes saber a verdade. tirou fotos do dito policial e sua viatura, antes que ele fosse embora, para mais tarde a CIA poder investigá-lo também. Em contrapartida, Pamela chorou por horas a fio e convocou no condomínio uma cerimônia de adeus para o marido morto na manhã seguinte.

(...)

  - Então ta, repassando uma última vez. Nós armamos um jeito de atrair Mark para o funeral de Joseph, onde deixamos ele com a senhora Potter, que com todo o horror a tecnologia que tem não deixará ele checar o celular, deixando o caminho livre para entrarmos e vasculharmos a floresta sem que nenhum capanga alerte ele. – disse, enumerando nos dedos os passos a serem seguidos.
   - Exato. Podemos alegar que se ele não for ao velório as pessoas vão começar a falar sobre ele e isso é ruim para a missão, pois não podemos atrair atenção para que o “procurado” não desconfie de nada. – fez aspas com as mãos, enquanto caminhava contornando a cama.
   - Perfeito. Passamos na capela de manhã, damos nossos sentimentos à Pamela e aí vamos para a casa do Mark dizer que não o vimos lá e que ele tem que ir. Senhora Potter, religiosa do jeito que é, ficará até o fim e por isso não teremos o problema da distração ir embora. – deu de ombros, em seguida abrindo a roupa de cama para que o garoto se deitasse ao seu lado.
   - Sim, e só por garantia aproveitamos para instalar um interceptor atrás da capela, para deixar o celular dele sem sinal. Isso nos dará cerca de duas horas para encontrar pistas na floresta e quem sabe Cristine também. – Ele disse, fazendo o que era esperado, deitando-se em suas vestes de dormir (que consistiam em apenas uma calça de moletom surrada) e cruzando um braço por detrás da cabeça.
   - É o suficiente. A floresta não é tão grande assim. – encerrou o assunto, esticando-se para alcançar o interruptor atrás do criado mudo, desligando as luzes do cômodo e deixando apenas a do abajur acesa.
   Quando tornou a endireitar-se na cama, encontrou o olhar do marido. Se viu presa ao contato visual encantador na medida que seu cérebro travava uma batalha querendo olhar pro peitoral definido exposto, mas não querendo sair da imensidão azul que eram os olhos do rapaz. Ele abriu um sorriso, como se pudesse ler os pensamentos da garota. E talvez pudesse mesmo. Ele a conhecia como ninguém, a havia estudado por o que pareceram séculos enquanto fingia esbarrões não-intencionais pelos corredores da inteligência americana. só queria entender como uma mulher poderia ser tão forte e encantadora. Ela simplesmente não perdia a graça! Quanto mais cavava fundo a sua personalidade, mais queria mergulhar no poço de incertezas e determinação que era . Contraditório? Oh, sim, e muito, mas assim também não era o desejo? A paixão? Assim não era... O amor?
   Foi então que a verdade o arrebatou. E se...? E se fosse, para ele, muito mais do que uma simples missão? Tudo bem, a esse ponto isso já estava mais que claro, mas ainda assim, qual seria a dimensão do sentimento do rapaz? Seria ele capaz de amá-la? Seria ela a mulher com quem ele escolheria passar o resto da sua vida?
   retribuiu o sorriso fraco, ao ver o dele diminuir. Ela aproximou-se cautelosamente, e ao acomodar-se próxima a ele esticou o indicador da mão direita e passou a desenhar o contorno do tórax do garoto suavemente, primeiro pelo centro do peitoral, depois contornando cada gomo de seu abdômen, até por fim chegar à barra da calça de moletom. Os olhos deles não se desconectaram durante o percurso. alargou o sorriso e prendeu a língua nos dentes, como uma criança que fez arte, e calmamente desamarrou o cordão que prendia a peça de roupa no devido lugar.
   - Upsi – Ela exclamou, como se tivesse feito sem querer, caindo na gargalhada sozinha. Aquilo bastara para . Vê-la daquele jeito, rindo alegremente, permitindo-se ser uma boba infantil ao lado dele, quando ao lado de todo o resto do mundo ela precisava manter a feição de mulher séria, lhe deu a resposta que faltava. não só seria capaz de amá-la; ele já o era.
   E com esse pensamento arrebatador em mente, ele a puxou para um abraço apertado, rolando-os na cama até que ele pairasse sobre a garota. Ele segurou o rosto dela nas mãos ásperas, apoiando-se nos antebraços e disse, com toda a veneração que podia:
   - Você é perfeita, . Tudo em você me encanta, absolutamente tudo. Todos os seus gestos, todas as suas caretas, todos os seus sorrisos. Eu sou louco por você. Sempre fui. E acho que sempre serei... – Ele encostou seus lábios breve, mas intensamente. Tinha medo de como ela reagiria se dissesse a temida frase de sete letras. Então optou por passar a mensagem mais sutilmente. Aquilo já bastara para deixá-lo aterrorizado. Não tinha conhecimento de um sentimento de igual proporção. Não sabia como reagiria, se sentia igualmente hipnotizada por ele. Não saberia lidar com a perda agora que tinha finalmente a encontrado.
   - ? , olha pra mim. Eu não vou correr. – Ouviu a menina dizer após ter enterrado o rosto no pescoço perfumado dela, a fim de fugir de seus olhos confusos. Ele levantou, ainda temeroso, o olhar para ela. – Eu to cansada de fugir de você. Me recuso a continuar fazendo isso. Eu não consigo. Não só porque você é teimoso demais pra permitir - Soltou um riso cúmplice, logo ficando séria novamente -, mas também porque eu não quero. Meu corpo não quer. Eu... preciso de você. Por mais que odeie admitir isso. – Ela passou as mãos delicadamente pelos cabelos revoltos do parceiro. – Você é diferente do homem que eu conheci naquela noite fria na Inglaterra. Aquele homem parecia não ter escrúpulos, era cruel sem motivo e me dá repulsa. Foi aquele homem que eu tentei afastar de mim todo esse tempo, tanto na CIA como nessa missão em particular. Mas ele não existe, não é mesmo? – tinha os olhos cravados no que a mulher dizia, uma sensação de vergonha pelo seu passado e um calor aquecendo seu peito o tomando aos poucos. - O cara pra quem eu estou olhando, que atura velhinhas alisando-o, crianças pulando em suas costas, e uma esposa em constante TPM, jamais poderia ser aquele monstro. Eu ainda não sei bem no que acreditar, , mas desse cara eu não vou fugir. Não tenho por que. - Deu de ombros, selando seus lábios demoradamente. – Eu só não posso te garantir nada. Estou longe de ser perfeita como você disse, tenho muitas lacunas sentimentais difíceis de superar e não posso afirmar com nenhuma certeza o que sinto por ti, mas acredite que é suficiente pra me manter ao seu lado, por quanto tempo aí me quiser. – Finalizou, com pesar. Queria poder dar mais para ele. Sua companhia lhe parecia tão pouco... merecia ser amado, agora ela entendia. “Talvez um dia”, pensou, “Talvez ele possa vencer meus medos, mudar minhas perspectivas. Não seria a primeira vez...”. E com essa esperança confortando seu coração que já se debatia querendo bater pelo dono de olhos tão incríveis, ela se acalmou. “Eu vou te amar, . Espere e verá” pensou consigo mesma.
   E aquele discurso já era tão mais do que esperava que ele não conteve que um sorriso da mais pura serenidade lhe tomasse o rosto. Abraçaram-se longamente então, e assim permaneceram por minutos a fio, apenas sentindo a presença um do outro, o calor que cada corpo emanava.
   brincava com algumas mexas do cabelo do garoto, que retribuía o carinho em sua cintura. A respiração dele batia no vão entre o pescoço e a clavícula da menina, arrepiando-a levemente. Ela resolveu distribuir beijos estalados pelo ombro do parceiro, que ria baixinho; não por ser engraçado e sim por estar experimentando tamanha felicidade. Os beijos deram lugar ao roçar entre seu nariz arrebitado e a nuca exposta do garoto. observou os poros do garoto se dilatarem, e assoprou o lugar assistindo seus pelinhos levantarem-se. Ela soltou uma risada abafada, maravilhada com as reações do corpo de aos seus menores estímulos. Ele, por sua vez, levantou o rosto, não querendo perder o espetáculo particular que era ver sorrindo.
   Ela levantou brevemente a cabeça do travesseiro fofo para alcançar a boca do rapaz, que prontamente capturou os lábios dela em sua já conhecida dança sensual. Línguas se encontraram, massageando uma à outra sem pressa de se separar. Um beijo de reconhecimento de gostos, afinidades e certezas. Quando o ar lhes faltou, enterrou novamente o rosto no pescoço da esposa, passando a distribuir beijos molhados na região.
   sentiu a já conhecida chama acendendo-se em seu interior devido as carícias, e por isso desceu a mão espalmada pelas costas pintadas de pequenas sardas do rapaz, até alcançar, por dentro da calça, a bunda definida que apertou sem pudor algum. fez questão de olhá-la sorrindo maroto e balançar a cabeça em falsa reprovação, para em seguida puxar as duas pernas de até estarem enlaçadas em seu quadril. Ela pôde sentir a animação dele que crescia gradualmente conforme davam continuidade ao beijo intenso que haviam começado. mergulhou as mãos dentro da camisola de seda azul marinho e puxou-a gentilmente para cima, acariciando com as palmas das mãos quentes os pedaços de pele que lhe eram expostos. Interrompeu o beijo para alcançar a boca na barriga reta da garota, por onde deixou alguns rastros molhados. soltava algumas lamúrias baixas de aprovação ao passo que puxava os fios castanhos de entre os dedos.
   Quando a camisola tomou um rumo desconhecido, tornou a deitar sobre a esposa, ambos suspirando ao sentir o toque de seus troncos nus em contato. Ele foi brincar com a língua e os dentes no lóbulo da orelha de , arrancando mais suspiros enquanto a garota tentava se concentrar na tarefa árdua de empurrar o moletom dele com os pés. Missão cumprida, capturou os lábios da garota em mais um beijo impetuoso e apaixonado, aos poucos enganchando os indicadores na peça íntima que separava seus toques da carne quente e úmida dela e trazendo pelas pernas delineadas até não se ter mais notícia do pedaço de pano. Ela enlaçou o quadril do garoto novamente, mostrando a ele, ainda que pelo tecido da boxer, que estava pronta para tê-lo em si.
   O beijo foi enfim quebrado, ambos já completamente ofegantes pela falta de ar. se desfez do último empecilho para que se tornassem um, mas antes que a penetrasse, lenta e profundamente como sabia que ela gostava, tomaram um momento para trocar um olhar cálido que transbordava afeto. ainda beijou carinhosamente a testa e ambas as maçãs do rosto dela, observando-a se derreter em um suspiro sôfrego de plenitude. Eles encostaram as testas e sentiram os narizes deslizando um contra o outro conforme , enfim, forçava o encontro de suas intimidades pulsantes.
   E aquela foi a primeira vez que e fizeram amor não mais disfarçado de sexo casual.

  * “Easy, Cowboy” é uma expressão engraçadinha usada em vários filmes e seriados que significa algo como “Calma, gato.”

Capítulo 26 - The Hut

  n/a: Um resuminho geral sobre o que se sabe até agora:
   1) Sobre o passado de : Ele era agente da MI6, e parceiro de Cristine. Estava irritado com a agência britânica por sempre mandá-lo fazer apenas o suficiente, por não terem força e ganância de fazer todo o necessário e mudar o mundo.
   Ele foi mandado para infiltrar-se no contrabando de armas europeu. Viu ali uma chance de fazer a diferença ajudando a mudar a vida de alguns garotos perdidos e sem alternativas que trabalhavam para ele. Acabou envolvendo-se demais, e a MI6 rompeu com ele.
   Conheceu , e ela o lembrou da vontade que tinha de ser maior e melhor para a humanidade. Arquitetou uma forma de ajudar a CIA a acabar com o contrabando, e em troca, negociou sua entrada para a inteligência americana.
   2) Sobre Mark: Chegou no condomínio, segundo Dona Anastácia Potter (a síndica) antes mesmo do casal de agentes, mas só se apresentou a eles como supervisor da CIA depois que eles tiveram seus equipamentos destruídos e ficaram sem comunicação. Não estava na pasta de moradores que a inteligência os arrumou, até mesmo porque tinha um arranjo diferente com relação a casa em que estava.
   Joseph foi morto quase que imediatamente após Mark ficar sabendo da suspeita dos agentes com relação a ele poder ser o procurado.
   Têm certeza que o procurado sabe sobre suas identidades, mas que resolveu brincar um pouco com eles antes de matá-los. O que é bem próximo do que Mark tem feito a cada nova provocação sobre sua incompetência que os tire do sério.

  O dia amanheceu nublado como raramente acontecia naquela porção de Miami. e mal esperaram o despertador soar e já estavam banhados e vestidos, tomando café da manhã enquanto esperavam dar o horário de irem para a capela pôr todo o plano em prática.
   - , deu dez horas, vamos? – A garota concordou e eles foram calmamente, caminhando lado a lado, as mãos entrelaçadas em direção a pequena, porém simpática, capela do condomínio. Havia algumas pessoas em pequenos grupos no jardim que antecedia a entrada. O casal acenou com a cabeça para alguns e foi em direção a pessoa mais desolada dali: Pamela.
   Ela estava pálida, grandes olheiras contornavam seus anteriormente lindos olhos mel, a roupa toda negra em sinal de luto e as mãos nervosas repuxando fios do lenço amassado que trazia consigo. Ao seu lado, senhora Potter estava rezando fervorosa o terço de família que nunca deixava em casa. sentou respeitoso ao lado da mais velha enquanto segurava as mãos da amiga e a puxava para um abraço confortante. Pamela se permitiu chorar baixinho no ombro da outra, embora tivesse prometido a si mesma que não o faria em público.
   - Por que, ? Por quê? – Balbuciou ao passo que acariciava seus cabelos opacos.
   Senhora Potter terminou seu terço e imediatamente voltou-se a , passando o relatório do que já havia acontecido no velório até aquele momento. ouviu tudo pacientemente, até que a própria desse a deixa necessária:
   - E é bom que todos os moradores venham. Seria uma falta de respeito imensurável não vir dar os pêsames à Pamela. Sabe, quando meu marido faleceu, que Deus o tenha, não houve sequer uma alma que não tenha dado as caras por aqui. Eu fiz questão de me assegurar disso pessoalmente. Além do que, acho que o mínimo é ficar algum tempo, rezando pelo espírito do morto e dando sentimentos à esposa.
   - Eu concordo plenamente com a senhora. Inclusive, aqui parece bastante lotado já, há alguém que ainda não tenha vindo? – Senhora Potter olhou em volta de si como uma águia, gravando cada rosto complacente que lhe mirava de volta.
   - Bem, Dona Camélia e seu marido não estão mais aqui, porém vieram mais cedo. Aparentemente a prima dela de New Hampshire vai ter nenê e eles precisaram ir logo ao hospital. Mas antes de deixá-la ir me certifiquei de que dizia a verdade, então ela tem desculpa. Deixe me ver quem mais... ah, sim, George Cowell também não chegou ainda, mas já me disseram que ele está a caminho. Você sabe, plantão médico durante a madrugada. E, claro, tem aquele mocinho sobre quem falei com vocês outro dia, o Mark, do qual não tenho notícias. Mas é bom que apareça logo e que permaneça até o final, pois onde se viu chegar tão tarde em uma cerimônia tão importante para todos nós?
   - Sabe de uma coisa? Acho que vou chamá-lo. É um absurdo que ele ainda não tenha aparecido por aqui. Depois, infelizmente, tenho que trabalhar. Gostaria de ficar aqui até o fim pela Pamela, mas a senhora sabe como as coisas são. É preciso pagar as contas. – disse com pesar dando de ombros.
   - Claro, querido, claro. – Senhora Potter acariciou sua cabeça como se fosse um animal domesticado. - Mas faça isso sim. Chame-o antes resolver suas coisas. Terei o cuidado de colocar naquela cabecinha avoada que não se pode faltar em um evento como esse.
   - Estamos combinados então. Até mais, Dona Anastácia. – O rapaz beijou a mão enrugada da síndica e levantou-se satisfeito em busca de . – Amor, vamos? Já é tarde, preciso trabalhar. – , que até então consolava a amiga com palavras calmas murmuradas e as mãos secando suas lágrimas, concordou com a cabeça, em seguida dando um beijo cálido na face da outra e sussurrando um “fique bem” em seu ouvido. Estendeu a mão ao marido e seguiram rumo à casa de número 34.

(...)

  Mark estava prepotente como sempre. Provavelmente achava que o motivo da visita do casal era comunicar que seu suspeito havia misteriosamente morrido e que eles estavam sem novas pistas. Se ao menos soubesse como se enganou...
   - Tenho certeza que sabe por que viemos. – começou, procurando manter-se calmo. A mera presença do homem perto de sua já o irritava. Ele era perigoso, mas tudo que sua mente ciumenta lhe permitia notar eram as orbes negras percorrendo as pernas descobertas de sua esposa. Ah, a cobiça.
   - Tenha certeza que sim, meu caro. Acho que agora não podem mais me considerar tão desnecessário, estou certo? Seu prazo está acabando e seu único suspeito acaba de bater as botas...
   - Ok, Mark, poupe-nos da ladainha. Já sabemos que estamos em maus lençóis. E não estamos aqui pra ouvir o que já sabemos, então cale sua boca e escute. – Mark sobressaltou-se com a atitude da garota. era impetuosa e impaciente. Adoraria a chance de calá-la. Fosse com uma arma apontada em sua cabeça ou com seu membro dentro de sua garganta – Caso não saiba, esse condomínio tem olhos e ouvidos em todos os lugares. Estivemos no velório e as pessoas estão se perguntando onde você está. É o único que não apareceu ainda. Você não pode deixar de ir ou começarão a estranhar.
   - Mas eu nã –
   - Mark, é sério. Estamos em uma missão, você não pode se dar ao luxo de chamar tanta atenção para si. – decretou, finalmente.
   - Tá. Mas que caralho, tá bem. Eu vou.
   - Não se esqueça de dar um oi para a Dona Anastácia. Ela, por algum motivo, gosta muito de você e não sossegará até te ver lá. – se fez de desentendida e viu Mark acenar. Ele, obviamente já sabia que os dois tinham ido a casa da velha senhora. Quis com sua fala assegurá-lo de que nada sabiam. O mais velho acreditou.

(...)

   estacionava a BMW em uma rua escura e deserta próxima a floresta. Eles entrariam na mesma por outro lado que não por dentro do próprio condomínio para diminuírem as chances de serem delatados por algum capanga. O carro também era seu álibi, afinal disseram no funeral que iriam trabalhar e, mesmo que todos soubessem que teoricamente trabalhavam em casa, sair com o carro era ainda mais seguro do que serem vistos caminhando por Westbridge. Poderiam estar indo a uma reunião ou algo do tipo.
   Antes de tirar o carro da garagem, fez a checagem rotineira para ter certeza que não havia rastreadores ou detonadores presos à lataria. Enquanto isso, preparava a mala com os equipamentos e roupas que iriam utilizar. Agora, ambos estavam se armando entre esbarrões dentro da BMW para em seguida adentrar de vez a densa floresta semi-tropical.
   Eles andavam há uns bons 40 minutos sem nem ideia de quanto da floresta já haviam percorrido, nervosos por não saber se Mark ainda estava sendo enrolado no funeral e impacientes por ainda não terem encontrado qualquer pista. puxou a mão de que andava a sua frente e fez sinal de que queria dar uma parada. A garota acomodou-se nas raízes de uma grande árvore e enterrou a cabeça em mãos, frustrada. havia alcançado algum graveto pelo caminho e fazia desenhos abstratos no chão barroso.
   foi levantar a cabeça para dizer a que aquilo era inútil, que eles tinham que dar um jeito de entrar na floresta por dentro do condomínio, já que não sabiam a extensão daquele mato todo quando seus olhos focalizaram um padrão de madeiras digamos, correto demais para ser natural. Ela se levantou cautelosa, caminhando na direção do que avistara e chamando a atenção do parceiro. Mais alguns passos e folhas arrastadas e puderam encarar uma cabana um tanto quanto improvisada, mas na qual uma pessoa poderia perfeitamente morar. “Bingo”, pensaram. não conteve a felicidade, abraçando a esposa e a tirando do chão em um rodopio. “Você conseguiu”, sibilou para ela, já que não poderiam fazer barulho.
   Primeiramente, os dois rodearam a pequena estrutura, a fim de checar se havia alguém pelos arredores. Nada. Então, devagar e silenciosamente, empurraram a porta de madeira, armas em punho, prontos para qualquer surpresa. Novamente, nada. A cabana estava vazia, exceto por uma grande mala de viagem, um colchão com roupa de cama desarrumada e uma cadeira improvisada de madeira. Havia uma passagem para um segundo cômodo, onde um pequeno banheiro improvisado estava. deu a entender que daria cobertura à parceira e se posicionou ao lado da porta – a única forma de entrada na cabana – enquanto ela colocava luvas descartáveis e abria a mala de viagem. Algumas roupas femininas, uma Glock de cerâmica e o que parecia ser um álbum de fotos todo desgastado, a capa tinha marcas de arranhões, uma mancha escura de algum líquido derramado e o princípio de um rasgo. o abriu rapidamente, curiosa, e se deparou com nada mais, nada menos, que centenas de fotos de . A grande maioria dele dormindo ou despreparado para o flash. chamou-o com a mão, ele precisava ver aquilo. Quanto mais páginas ela virava, mas horrorizada ficava. olhou por cima do ombro da garota e quando a imagem foi processada em seu cérebro, suas mãos se fecharam em punhos e ele murmurou “Cristine” no ouvido da esposa. Ela o olhou sobressaltada, embora já esperasse aquilo, e em uma última virada de folhas lá estava a prova final. Uma foto da dona do álbum sorridente com seu anel de noivado e um carrancudo ao fundo. Ela possuía um braço esticado ao lado da imagem, de modo que ficava claro que a própria tinha batido a foto.
   - Sabia. Essa vadia tinha que estar envolvida nisso tudo. – sussurrou quase que para si mesma.
   - Muito bem, precisamos de um plano de ação. Ela deve voltar pra cá a qualquer minuto, o que faremos? – indagou ignorando as cócegas que o tom obviamente ciumento da parceira fazia em seu coração.
   - Simples. Eu me escondo na cortina do box do banheiro e você a espera aqui. Ela claramente ainda é apaixonada por você, então com um pouco de jeito você deve amolecê-la até que ela baixe a guarda. Daí eu a surpreendo, a imobilizamos e tiramos toda a informação que pudermos dela.
   - Não. Eu conheço a peça, ela pode tentar nos enganar desse jeito. Eu tenho uma ideia melhor. Fique escondida o quanto puder, eu vou tentar arrancar as informações dela de outro jeito. - ao menos teve tempo de concordar com o plano, já que no segundo seguinte o barulho de um passo quebrando galhos atingiu seus ouvidos. – Rápido, esconda-se! - Eles trocaram um olhar e foi se posicionar. – E, – ele chamou – não acredite em nada que eu disser pra ela. – Alertou, deixando a garota um tanto quanto confusa.
   Mal pegou o álbum em mãos, Cristine irrompeu pela porta do local, carrancuda. No entanto, assim que percebeu não estar sozinha, Cristine sacou uma pistola semi-automática da cintura e a apontou para . Ele não se assustou, já esperava por aquilo. Apenas indicou indiferente uma foto qualquer e disse:
   - Você se lembra desse dia? Eu havia acabado de fechar uma compra importante e decidi que deveríamos ir esquiar em Aspen. Aquele chalezinho deve cheirar a sexo até hoje. – Cristine não fazia ideia de como reagir. Não esperava que encontrasse esse lugar e muito menos que fizesse menção a um dos dias mais felizes da sua vida.
   - O... O quê? – Gaguejou. subiu o olhar para o dela calmamente.
   - Eu disse que o chalé que alugamos deve chei –
   - Não, eu entendi o que disse. – Cortou ela. – O que quero saber é o que faz aqui. Como descobriu esse lugar, ? – Indagou ela, em seguida olhando em volta como se procurasse por algo ou alguém.
   - Você pode estar brava comigo, mas eu continuo sendo a pessoa que mais te conhece nesse mundo, Cristine.
   - Isso não responde minha pergunta.
   - Simples. Eu sabia que você não ia deixar passar em branco o meu sumiço. Sabia que você viria atrás de mim. Quanto te vi naquela festa no condomínio tinha certeza que você não sumiria tão cedo. E então foi brincadeira de criança. Você não era moradora de nenhuma casa de Westbridge, mas vivia por aqui. Essa frequência toda tinha que ter explicação, então depois de algumas câmeras minhas instaladas captarem seu entra e sai da floresta foi questão de minutos até achar esse lugar.
   - E o que merda você queria aqui comigo? – Ela já começava a se alterar com o tom calmo do ex-noivo. soltou um suspiro longo, como se criasse coragem de fazer o que precisava.
   - É escroto um cara desse tamanho dizer isso, e eu odeio admitir, mas eu senti sua falta, garota. – Disse em tom derrotado. Cristine demorou a esboçar reação. Primeiro, foi surpresa. Então um breve sorriso de felicidade e depois, desconfiança.
   - Cansou daquele brinquedinho insosso que é a , é? – Ela disse, a arma, pra infelicidade da dupla de agentes, ainda em punhos, e em poucos passos aproximando-se do garoto.
   - Bem, ela deu pro gasto nos últimos meses, mas digamos que eu estou com necessidade de uma mulher de verdade. – estava colocando todas as suas habilidades teatrais em ação. Até direito a piscadinha e sorriso de lado aquele papel tinha. Ele sabia que Cristine era muito astuta, mas que se tinha um ponto fraco, esse era o próprio ex-noivo. E sabia se aproveitar disso como ninguém.
   - Não que eu não esperasse já por isso... Mas você não arriscaria sua “preciosa” posição na CIA vindo até aqui. No máximo me procuraria quando essa missão tivesse acabado. Então por que agora?
   - Continua sagaz como sempre, Cris.
   - A gente aprende uma coisa ou outra no trabalho, você sabe como é.
   - Bem... Já que é assim, abrirei o jogo. – decretou, encostando na parede mais próxima e dobrando uma das pernas, de modo a passar a imagem mais relaxada possível.
   - É o que eu espero que faça, meu amor. – Completou a mulher enquanto se sentava em frente ao mesmo, na cadeira de madeira improvisada.
   - Cris, pensa comigo. Por qual motivo o líder do contrabando de armas europeu largaria tudo, mudaria de lado e passaria a trabalhar para sua pior inimiga até então, a inteligência americana?
   - Alguns dizem que por uma mulher. Outros dizem que ele buscava redenção. Mas eu lembro de você na MI6, . Sempre querendo fazer mais, ser mais. E, mesmo quando me enviaram para tentar te recuperar na missão do contrabando, eu lembro o brilho nos seus olhos de enfim ter a força pra tomar suas próprias decisões e impactar o mundo de algum jeito. Pra mim, se você resolveu mudar de lado, o motivo tem que ter algo a ver com essa sua sede de grandeza. Por isso eu não acredito em nenhuma dessas teorias conspiratórias. – Ela respondeu sucinta, dando de ombros.
   - Você lembra de como eu estava vendido para o contrabando. Como estava confortável imerso naquele novo universo. E quando você foi me buscar... Cara, eu posso não ter deixado transparecer, mas eu percebi a cagada que estava fazendo. Cheguei a pesar tudo na balança e cogitar voltar pra MI-6, pra você, para o meu antigo eu. E ai... Eu descobri que a MI-6 na verdade não queria me recuperar, como disseram a você. Eles queriam me matar.
   - Matar?! - Ela perguntou, alarmada. Como assim sua agência queria assassinar seu amor?
   - Sim. Eles achavam que eu não tinha mais solução, e que eu sabia demais. Eles te usaram pra baixar a minha guarda. E quando eu fiquei sabendo disso, sabia que não tinha mais volta. Que eu jamais poderia retornar. Mas eu ainda assim não tinha tirado da cabeça que meu lugar não era mais o contrabando e que eu precisava voltar a fazer o bem e correr atrás dos meus objetivos. A foi a minha porta de entrada, é verdade, e é por isso que muitas pessoas se confundem achando que temos algum vínculo romântico. - Gesticulou, fazendo pouco caso. - Eu movi alguns pauzinhos para que a CIA passasse a considerar a minha proposta de me tornar agente deles. Depois disso foi fácil. Eu tenho contatos e experiências dentro do mundo do crime que a maioria dos missionários de lá sequer sonha. Crescer ali dentro foi brincadeira de criança. Ganhar respeito das pessoas, missões mais difíceis, mais reconhecimento. Estou muito perto de ser convidado a assumir o cargo do meu próprio chefe. - Riu com as conquistas impensáveis que tinha atingido. - Eu consegui a possibilidade de fazer a diferença que tanto queria, meu amor. Muito diferente da MI-6, das oportunidades que não me deram, das missões medíocres e superficiais que me designavam. - aproximou-se da ex-noiva e tomou as mãos dela entre as suas. - Você me entende agora? Pode acreditar em mim?

Capítulo 27 - The End Is Near

  Cristine se surpreendeu com o relato do ex. Aquela história fazia tanto sentido na sua cabeça que era praticamente impossível questioná-la. Não era do feitio da MI-6 deixar pontas soltas como julgava ter sido o caso de . E igualmente não era característico dele ter se deixado desvirtuar de sua índole de forma tão permanente. Parecia condizente com o que sabia dele que tentasse voltar a fazer a diferença, e se não na agência britânica, em outro lugar, preferencialmente mais influente.
   tinha contatos na Mossad, na KGB, na ABIN*. Mas não na CIA, e era sempre a última com que vivia fantasiando. Justamente porque ele não conseguira encontrar ninguém que lhe dissesse "sim", se a inteligência americana rosnasse um "não". Incontáveis vezes se teve notícia de algum colega se aventurando em grandes missões e dependendo do auxílio da CIA para completá-lo, pois sua base não dava o apoio necessário. E mais vezes ainda soube das dificuldades inerentes à entrada na equipe seleta deles, pois se havia algo que os americanos levavam a sério era a palavra "traição". O mundo inteiro parecia temê-la e respeitá-la, e, portanto aquele era o lugar ideal para ele colocar em prática seus grandes planos. Para ele não dar de cara com muros e barreiras, para ele poder, de fato, fazer a diferença. Mas não havia porta de entrada fácil. Então pareceu construir uma de dentro do lado inimigo, do coração da Europa, rodeado de armas, dinheiro, informação e poder, arquitetado através de uma negociação inegável. Ele havia dado um jeito de conseguir seu passaporte para dentro da CIA e sua passagem só de ida para a realização de suas ambições.
   * Mossad, MI6 e KGB são as agências de inteligência secreta de Israel, Inglaterra e Rússia, respectivamente.
  
- Isso na verdade soa muito mais como o que eu estou acostumada.
   - Sei que sim. Tudo que eu sempre quis foi fazer a diferença, você sabe disso.
   - E então essa história de ter se apaixonado pela sua parceira sem sal é mentira, certo?
   - Pura e simples. Eu sou apaixonado desde sempre pelas minhas ambições, e só. - Ele garantiu, vendo-a relaxar os ombros tensos. - E, bem... Por uma certa morena que conheci há muitos anos.
   - Por mim? - Confirmou, esperançosa.
   - Você não esperava que eu fosse te deixar de lado nos meus planos, não é? Assim que eu conseguisse me estabelecer ali dentro direito acharia um jeito de te levar comigo. Te libertar das amarras daquela agência limitada na Inglaterra. E esse é na verdade o outro motivo que me trouxe até aqui. Eu sei que sabe de algo Cris, e preciso da sua ajuda. Se eu não concluir essa missão, nenhum dos meus planos futuros dará certo, eu voltarei a estaca zero, pois não assumirei o cargo que preciso para ter estabilidade dentro da grande organização.
   - Tá bem. – Declarou, derrotada. O que aquele homem não lhe pedia que ela não fazia sorrindo? – Do que precisa? – Perguntou largando-se na cadeira, a arma agora de volta ao coldre em sua cintura. Totalmente rendida.
   - Principalmente nome dos capangas e que os atraia até aqui. Inclusive Mark. – Respondeu com um sorriso. não conteve seu próprio ao ver que o plano de funcionara que eles obteriam as respostas que precisavam.
   - Na verdade, Mark tem uma política um tanto quanto dura com seus subordinados. Ele envolve o mínimo de pessoas possível e, assim que deixam de ser úteis ou se tornam uma ameaça, ele os matava. Foi assim com os primeiros três que trabalharam para ele, e agora mais recentemente com o tal Joseph. Eu diria que desde então ele só tem a mim. E uma outra louca que foi isolada da porra toda no primeiro mês por fazer tudo errado.
   - Então isso será mais fácil do que eu imaginava. Você manda uma mensagem para ele dizendo que teve alguma emergência para que ele te encontre aqui, nós o prendemos, e dizemos que você ajudou; desse modo você sai ilesa. A outra mulher prendemos depois porque já que ela não está mais envolvida não tem como ser avisada para fugir, e fica tudo certo. - explicou, observando Cristine tirar o celular do bolso para já efetuar o que ele havia indicado.
   - “Temos um problema. Me encontre na cabana em uma hora. C.” Mensagem enviada. – Ela sorriu para o mais velho após ler em voz alta a mensagem que acabara que enviar.
   - Uma hora, huh? – Questionou o homem franzindo a testa. Não sabia se tinham tanto tempo.
   - Poderia ser menos, mas é que eu acho que mereço alguns minutos para matar a saudade, só isso... – Ela disse com voz inocente, algo que nunca havia sido, e viu elevar as sobrancelhas em compreensão. Ele aproximou-se esforçando-se para colocar os olhos em fendas, como ela bem lembrava que ele ficava antes de agarrá-la.
   Cristine se deu por vencedora quando o rapaz alcançou as mãos grandes e calejadas que ela tanto amava uma nos cabelos pretos de sua nuca e a outra em seu sinuoso quadril. Chutou a cadeira longe e pendurou-se no pescoço do mesmo, aproveitando para relembrar a textura de sua pele e o gosto de sua língua. Ela tomou impulso para envolver a cintura de com as pernas, ao passo que devorava seus lábios carnudos com a boca sedenta.
   bem sabia que aquele era o momento de deixar seu esconderijo e render a louca magricela no colo de seu marido. Empurrou a cortina de plástico devagar apesar da impaciência, e caminhou passos curtos e silenciosos até o ponto da cabana onde o ex-casal encontrava-se entrelaçado. Tentou, sem sucesso, não usar a raiva dos xingamentos que ouvira dirigidos a si quando agarrou os antebraços de Cristine e os empunhou para trás de seu corpo, de modo que ela não pudesse movê-los.
   , ao perceber que a parceira já havia tomado a primeira atitude, desvencilhou-se das pernas dela que abraçavam seu quadril e afundou os nós dos dedos em um soco calculado na altura de suas costelas, fazendo com que Cristine perdesse o ar por alguns segundos, tornando mais fácil seu manuseio até a cadeira de madeira da cabana, novamente.
   Ele rapidamente dispôs da corda que carregava presa ao cinto e passou a amarrar as pernas da garota aos pés velhos que rangiam, enquanto apertava uma mão no pescoço da outra e tentava conter as sacudidas que esta dava tentando se soltar.
   Uma vez completamente atada ao pedaço de mobília, encarou a garota com as mãos na cintura, uma expressão de ódio que não combinava com seu rosto de traços fortes. Sem aviso, entre um suspiro resignado e outro, a palma de sua mão se chocou dolorida contra a face da mulher. Uma e outra vez. Aquele não era o tipo de golpe que mais machucava, mas era com certeza o mais humilhante. Cristine parecia saber disso, já que rugiu um “vadia” alto e descontrolado e cuspiu na direção de . Ela não se importou, apenas tirou o rolo de fita isolante que trazia como tornozeleira e velou a boca da outra com nojo.
   - Estou sendo boazinha. Você merecia muito mais. – Decretou, então, virando-se para , a face interrogativa.
   - Já sei que te devo explicações. Calma. – Ele disse sem se abater e caminhou até sentar-se na cama, dando um tapinha ao lado para que fizesse o mesmo. - Sim, já tinha passado pela minha cabeça largar o contrabando antes de você aparecer. Eu tinha acabado de organizar algumas coisas com os meninos que eu estava ajudando lá dentro, e queria voltar ao meu antigo emprego ou algo semelhante. Mas eu sabia que não ia ser bem-vindo de volta na MI-6 e precisava de um plano B. Daí você apareceu, e eu já tinha ouvido histórias sobre todos os casos grandiosos de que tinha participado e todo o prestígio que tinha conseguido com isso através da CIA. Me pareceu um bom lugar pra fazer a minha vida. - Deu de ombros, simplesmente. - Foi me inspirando em você que eu mudei o rumo que minha vida estava tomando.
   - Mas a MI-6 realmente tentou te matar? – Ela perguntou ainda relutante.
   - Não. Não chegaram a tanto. Mas eu soube de vários contatos que ainda tinha dentro e fora da agência que aquela era a intenção. Eu entendo, na verdade. Eu era um bom exemplo de vira-casaca e eles não podiam perder a oportunidade de me fazer de modelo para os outros agentes. Eu achei que parariam de me perseguir quando negociei minha entrada na CIA com Leonard, mas a imunidade diplomática momentânea foi a única coisa que os manteve longe. E por isso... Conseguir essa estabilidade dentro da CIA é tão importante pra mim. É uma forma de mostrar a eles que a história não vai se repetir ou algo assim. - Ele se interrompeu por um segundo, levantando e indo em direção de Cristine, arrancando a arma que lembrou que ela tinha guardado do coldre e voltando para a cama com a munição em uma mão e o revólver descarregado em outra. Deu um suspiro derrotado. – Acredita em mim, por favor. Eu não teria motivos pra inventar mais essa agora.
   - Eu acredito. – disse, após tapar a boca do outro com o indicador, em seguida unindo seus lábios em um selinho carinhoso. Estava cansada de questionar a tudo e a todos. Se fosse fuder com tudo mais pra frente, ela não ligava, se entregaria a essa paixão. Afinal, quebrar a cara faz parte, era o que diziam. E de alguma forma havia sentido no que ele dizia.
   - Obrigado. – Ele respondeu um tanto impressionado, acariciando o rosto dela com o polegar. Ela deu de ombros.
   - Agora temos que nos preparar. Como será quando Mark chegar? - Ela bateu as mãos, chamando a atenção ao trabalho novamente. - Ainda precisamos descobrir quem é a outra envolvida, você esqueceu de perguntar o nome, lindo.
   - Isso é o de menos. – Rebateu, abanando o ar. - Tenho certeza que na pior das hipóteses um deles nos revela com um pouco de interrogatório.
   - Tem razão. Então, que tal se... – Mas e nunca chegaram a bolar o plano de ataque. Primeiramente porque ele não funcionaria, visto que o homem a ser emboscado dali à uma hora acabara de irromper pela porta de madeira da cabana sem mais do que o barulho da mesma batendo, tornando improvável que a dupla de agentes previsse sua presença. E, segundo, porque contavam com o fato de ele ser rendido e não o contrário.
   Depois de ser arrastado por horas a fio no funeral do cara que mandara matar por aquela senhora chata que simplesmente não ficava quieta e nem o deixava checar suas mensagens, Mark ficou preocupado com o que poderia ter acontecido com seus preciosos agentes idiotas em sua “ausência”, de modo que assim que recebeu a mensagem de sua cúmplice número um, não pôde esperar a dita hora e encaminhou-se para a cabana o mais rápido possível.
   Assim que percebeu que Cristine não estava sozinha na cabana como haveria de estar devido às vozes, baixas, porém audíveis, de duas pessoas bastante conhecidas, Mark não hesitou em sacar a arma e empunhá-la ao entrar no local. , treinada desde pequena a ter bons reflexos, imitou-o apontando-lhe a própria Glock apenas um segundo depois. perdeu tempo já que tinha ainda as partes do revólver da ex em mãos, então o máximo que pôde fazer no susto foi levantar-se. Mark e trocaram olhares nervosos enquanto miravam um ao outro ameaçadoramente em silêncio.
   Mas Mark esteve durante muito tempo a frente deles, conhecia os dois como a palma de suas mãos, sabia seus fracos e seus pontos fortes. Não havia de ser surpreendido ali. Enquanto e tinham apenas acabado de perder a única chance de inverter os lados que tiveram em muitos meses de missão.
   Um sorriso zombeteiro tomou ligeiramente o rosto do mais velho, que em um lapso de inteligência mudou o alvo de mira para .
   - Largue a arma, querida, ou o galã ali morre. - Ameaçou, certeiro.
   - Você vai junto, seu filho da puta! - retrucou, a voz oitavas mais alta do que o necessário, tentando permanecer centrada e calma durante a situação.
   - Ó, estou certo que sim. A diferença é que nós dois estaremos longe daqui enquanto você agoniza vivinha da silva por ter perdido seu grande amor. Quem você acha que vai sofrer mais, ?
   parecia contrariada. Não era de ceder, mas arriscar a vida de desse jeito não lhe parecia a melhor maneira de sair vitoriosa dali. Optou por baixar a arma, o desgosto estampado na face, e pousá-la no chão. Chutou-a na direção do terrorista em seguida, como normalmente se fazia em um cenário de rendição.
   - Boa menina. - Mark disse, parabenizando a atitude sensata. - Sabe, , eu tenho que lhe agradecer. Essa brincadeira ficou 100% mais divertida depois que você passou a desconcentrar a queridinha da CIA. – não respondeu, mas sua expressão demonstrava o desprezo que exalava pelo outro: narinas infladas, maxilar travado e olhos em fendas. – Na verdade, quando contatei o amado chefinho de vocês com esse desafio, estava certo que ele mandaria , mas também a si próprio. Não achei que ele confiaria uma missão de tal porte a outra pessoa, muito menos ao tesouro bruto dele. Digo, você é bom, e todo mundo sabe, mas daí a colocar nas suas mãos algo desse porte, eu não achei que ele tomaria o risco de forma alguma. Fiquei um tanto quanto decepcionado, é preciso acrescentar, afinal o objetivo de tudo isso era humilhar o maldito bastardo frente a sua preciosa agência enquanto o filho legítimo aqui se sobressaía em alguma coisa pela primeira vez.
   - Espera, então você realmente é irmão do Leonard? – perguntou, sem controlar a curiosidade.
   - Irmão é uma palavra muito forte, meu anjo. Mas digamos que dividimos os mesmos pais durante alguns anos, sim. Isto é, até eu matá-los a sangue frio, é claro. - Mark explicou ainda portando orgulhosamente um sorriso sádico nos lábios.
   - Matou seus próprios pais? - Ela disse, ainda chocada e mantendo o procurado distraído enquanto pensava em uma alternativa para saírem daquela situação. - Que tipo de monstro faz isso?
   - O tipo que foi rejeitado a vida inteira e colocado em segundo plano frente a um merda que sequer partilhava o mesmo sangue que eles! O tipo que viu os pais adotarem um maldito menino de rua sendo que já tinham um filho perfeitamente capaz de lhes dar alegria e orgulho. O tipo do qual todos duvidavam da capacidade, mas que se tornou o maior terrorista do mundo por mérito próprio! – Exclamou, um tanto alterado.
   - Essa história está tão insuportavelmente clichê que eu, sinceramente, estou entediado. – Disse , chamando as atenções a si novamente. – Esperava mais do motivo da sua ladainha, Mark.
   - Ora, seu moleque... – Rosnou o mais velho, dando passos impulsivos em direção ao outro, que permanecia com o rosto impassível. tinha técnica, mas tinha experiência. Ele estava mais que acostumado a lidar com idiotas de ego ferido no contrabando, e sabia que se tinha algo que os fazia baixarem a guarda suficientemente para que ele tomasse vantagem, era provocar. Quando mais “pisava no calo”, mas irracionais os marginais ficavam, e com isso menos precisos e não-letais eram os ataques. – Eu vou explodir seus miolos e terei o prazer de ver o horror se espalhar pelo lindo rosto da sua parceira ao ver cada entranha enrugada de sua cabeça oca.
   - E o que está esperando? - Atiçou. - Ah, tá. Talvez você só seja capaz de matar membros da família. Talvez ver o sangue do seu sangue espalhado no chão seja o preciso pra criar coragem. – Deu continuidade, provocante.
   - ... – chamou, alarmada com a cena do terrorista praticamente espumando, olhos em brasa, narinas infladas. Ele não deu atenção, certo que estava fazendo o certo, e continuou o monólogo de palavras afiadas.
   - Eu me pergunto se o Leonard se quer se incomoda com você. - Alfinetava em tom contemplativo. - É só que ele é tão superior, bem sucedido, pra que se preocupar com um maldito mimado revoltado que... - Mark chegou ao seu limite. Partiu pra cima de usando o revólver não como uma arma de médio alcance como de fato era, e sim como apenas um objeto que nada dispara, dando uma coronhada entusiástica na têmpora do mais novo. perdeu os sentidos por um segundo, e mesmo sabendo que aquilo aconteceria, contou com para reagir ao avanço. E assim sucedeu. A garota alcançou a pequena faca que levava consigo e jogou-a na perna do adversário que, ao se abaixar instintivamente pela dor em direção ao machucado, recebeu uma joelhada no nariz do agente.
   Tonto, Mark deu alguns passos em falso para trás em busca do equilíbrio perdido. Bastou para que se recuperasse da dor aguda que o corte aberto na lateral da testa causava, e esbofeteasse a face do outro pelo maxilar. tomou a frente novamente, como se estivessem sincronizados, e chutou a mão que ainda segurava o revólver dele, fazendo com que voasse longe.
   Teriam continuado a luta até que pelo menos um deles estivesse desacordado, se o som de um disparo não tivesse sido ouvido. Os quatro presentes na cabana direcionaram o olhar para a porta, a qual possuía um buraco de bala no centro. Depois se entreolharam, procurando o que poderia ter causado aquilo. sentiu o ombro arder e constatou pela cara de agonia do marido que o tiro a acertara ali de raspão. Um tanto de sangue quente e vermelho manchou de escuro a região, mas apesar de extremamente incômodo, aquele ferimento não era o bastante para detê-la da vida. Após todos constatarem o mesmo, seus olhos voltaram-se novamente à porta que agora com o impacto, ameaçava deixar o batente e cair no chão. Dois segundos depois, foi o que aconteceu. E uma figura nada esperada encontrava-se do outro lado da mesma.
   Elizabeth. Sim, ela mesma. A megera vizinha oferecida da qual ninguém mais lembrava estava claramente em fúria, arma em punhos e cabelos ruivos desgrenhados.
   arqueou as sobrancelhas em surpresa; torceu os lábios em desgosto; Cristine rolou as íris pretas e Mark se limitou a gritar. É, gritar.
   - Que porra você está fazendo aqui, mulher? - Ele disse estupefato ao livrar-se de vez da pequena faca que levava cravada no tornozelo.
   - Que porra eu estou fazendo aqui? Que porra eu estou fazendo aqui... Bem, vejamos. EU era pra ser a imbecil amordaçada no canto dessa merda de cabana! EU era pra estar a par de todo o plano e ter sido inclusive avisada de que cagada Joseph fez pra ter sido apagado. EU era teu braço direito, e fui rejeitada em um piscar de olhos assim que aquela magrela filha da puta entrou em cena! – Berrou de volta apontando para Cristine.
   - Meu amor, meu anjo, calma... - Mark tentou, devagar, as mãos projetadas para frente e ainda sentindo dores diversas se espalhando pelo corpo.
   - AGORA VOCÊ VEM COM “MEU AMOR”? Seu cretino desgraçado! – E então, Elizabeth estava em prantos. Chorava forte com as mãos cobrindo o rosto, uma delas descansando a arma na bochecha. Mark, embora claramente contrariado, abriu os braços para ela como se desculpasse e a convidasse para um abraço. e estavam tão surpresos com a cena que só o que podiam fazer era aproximar-se um do outro aos poucos, para formar uma melhor frente de defesa à qualquer que fosse a loucura que pudesse ter lugar em breve.
   Embora tendo primeiramente aberto um sorriso sentido, a ruiva não comprou o ato de lamento do mais velho. – Sabe o que eu deveria fazer? Deveria matar essa vadia pra te mostrar o quanto você precisa de mim! – Berrou mais uma vez, apontando a arma para a morena amordaçada, que até então não conseguia parar de se remexer e bufar, o desprezo pela outra explícito ainda que ela não pudesse se mover com propriedade. Mark achou por bem levá-la na conversa, com explicações, já que a falsidade não havia surtido efeito.
   - Entenda, Lizzie, você estava muito distraída da missão, não conseguia conquistar o playboyzinho ali - Apontou para brevemente - e ainda ficava exigindo minha atenção constantemente... Então Cristine chegou com informações valiosas e uma voracidade incrível de acabar com a raça do casal do ano, e eu... Eu fiz o que tinha de ser feito.
   - Mas você é muito cara de pau mesmo... Me dá um pé na bunda sem nenhuma explicação e ainda tenta fazer parecer culpa minha? Pra mim CHEGA! EU NÃO NASCI PRA ISSO, VAN GUIELSEN. QUERO VER VOCÊ PREFERIR ELA A MIM SE SÓ PUDER TÊ-LA NO INFERNO! – E dito (gritado) isso, Elizabeth não hesitou ao apertar impulsivamente mais uma vez o gatilho, e então outra, atingindo duas vezes o abdômen esquálido de Cristine.
   A cadeira tombou e fez-se em pedaços. Cristine tinha os olhos arregalados e vermelhos mirando o monte de sangue que encharcava o tecido de sua blusa e manchava aos poucos o piso improvisado. Não por muito tempo. As íris negras fora perdendo o brilho rapidamente, a palidez pelo sangue perdido a abatendo em cheio. Não havia nada que qualquer um ali sequer pensasse em fazer. Ou pudesse. Cristine estava morta.
   não esperou para ver a reação de ao ocorrido. Sem pensar duas vezes, jogou seu corpo sobre o de Elizabeth, que com as fortes emoções dos últimos momentos, caiu sem oferecer resistência. Com isso, pôde imobilizá-la, sentado-se sobre seu estômago, abraçando suas pernas com as próprias e aprisionando seus braços. A arma já estava fora de alcance. sabia que se a ruiva fora capaz de matar Cristine em um impulso, sem remorso, poderia fazê-lo também com qualquer outra pessoa da cabana, e não se daria ao luxo de arriscar que a próxima vítima fosse ela ou seu parceiro.
   Mark não conseguia se situar. De comandante de toda a situação para surpreendido, ele não aceitava que tudo tivesse virado de ponta cabeças daquela maneira e em tão pouco tempo.
   Já não sabia o que sentir, o que fazer. A mulher que dividiu momentos preciosos consigo estava morta há apenas alguns metros de distância. Seu dito inimigo número um estava estático e vulnerável, isca perfeita para que ele avançasse, e sua parceira, atracada no chão com uma louca assassina, precisava do seu apoio para concluir aquela missão. O que fazer? O que sentir?
   Sentir... sentia algo forte por . Amor, cumplicidade, desejo, paixão. Sentia repulsa por Mark. Nojo, raiva, ódio. Sentia pena por Elizabeth. Dó por uma pessoa tão desestabilizada emocionalmente, usada, descartada. E por Cristine... Nada. Não sentia nada. As memórias boas que tinha da mulher não passavam de memórias. Ela não influía em seu presente e não faria parte de seu futuro. Estar morta ou não apenas... Não fazia diferença. E foi então que decidiu o que fazer.
   avançou na direção de Mark, girando habilmente o corpo robusto e acertando um chute em suas costelas. Ele saiu do estado de torpor no qual se encontrava e com um rugido de dor devolveu um cruzado na altura da cabeça de , que esquivou dando as costas e enlaçando o pescoço do mais velho em uma chave de braços, sendo aquele o melhor golpe que podia aplicar considerando que seu tamanho e força ainda não eram páreos para os do mais velho, e que portanto o confronto físico havia de ser complicado. Mark se remexeu energicamente ao sentir a glote fechando e tentou acertar algumas cotoveladas no agente. Algumas bem sucedidas, mas que só davam mais raiva a , o que fazia com que o aperto de seus braços aumentasse. Mais alguns segundos na mesma posição e o grandalhão amoleceu com a falta de oxigênio, sendo então abandonado no chão, desmaiado, inerte e inofensivo.
   recuperou o equilíbrio alterado pela ação, respirou fundo, e foi ajudar colocando fitas isolantes nos pés e braços de Elizabeth, de modo que ela não pudesse mais continuar a tentar arranhar sua parceira de todas as formas possíveis. se levantou, tirou os cabelos do rosto ofegante e foi em direção do iPhone de Cristine, que em algum momento tinha caído no chão, ainda próximo ao corpo estirado, deixando para lidar com a fúria agora melancólica da ruiva assassina.
   - Meu nome é e eu sou agente da CIA. Tenho dois presos e um morto em uma cabana no meio da floresta do condomínio Westbridge. Solicito reforços. – Disse ainda com o fôlego curto ao discar o famoso 911. Em resposta, a atendente pediu que não desligasse, pois rastreariam as coordenadas. Ela afastou o aparelho do ouvido e finalmente mirou os olhos do parceiro que encontrava-se no mesmo estado de cansaço e alívio.
   - Conseguimos. Nós conseguimos, . - Constatou, incrédulo.
   - Missão cumprida. – Ela decretou, correspondendo ao sorriso do marido. e adiantaram-se um ao encontro do outro e trocaram um abraço caloroso de satisfação e comoção, esbanjando intimidade e companheirismo como há muito acontecia entre eles, embora dessa vez houvesse um toque especial a mais.
   Soltaram as cordas de Cristine, e as usaram no corpo pesado do terrorista para o caso de ele acordar, checaram sua pulsação mesmo que pudessem adivinhá-la, e certificaram-se de desarmar completamente a maluca da ex-vizinha, que assistia sua vitória ainda em um choro doído.
   Logo o barulho de sirenes pôde ser ouvido. E então tudo tinha chegado, finalmente e irrevogavelmente, ao fim.

Epílogo

   estava vendado. O pedaço de pano preto estava apertado em seu rosto, de modo que sequer sombras ele conseguia ver. Duas mãos, uma em cada lado de seus ombros o guiavam pelo caminho desconhecido que percorria. Às vezes, ele tropeçava em algo no trajeto, o que fazia uma voz familiar rir baixo ao pé de seu ouvido. Ele estava nervoso, as mãos suavam e a respiração estava entrecortada. Queria voltar a ver logo, mas isso não era escolha dele.
   De repente, um puxão o parou no lugar. Sentiu as mãos saírem de suas costas para em seguida pararem em seu peito largo. Ambas adquiriram forma de garras e o arranharam todo o caminho pelo seu abdômen até a barra da boxer azul marinho que vestia. Mais uma risada baixa. Ele engoliu em seco. Sentiu uma respiração calma aproximar-se de seu rosto. Uma mordida foi depositada no canto de seu lábio inferior. Ele não aguentava mais. Qual diabos era o motivo da demora?
   As mãos moveram-se de novo, sumiram por dois segundos e reapareceram massageando suavemente os músculos tensos de seus ombros. Havia um corpo macio e quente encostado às suas costas. Ele sentiu a mesma respiração aproximar-se de seu ouvido e então ela se pronunciou, a boca macia roçando o lóbulo de sua orelha:
   - Pronto? – A voz dela estava baixa e arrastada, embebida de luxúria. Ele apenas murmurou impaciente em concordância e pôde sentir, aos poucos, o nó que segurava a venda afrouxar. Seus olhos demoraram a se acostumar, mesmo a luz do cômodo estando baixa. – Tcharam! – Ele ouviu a mesma voz exclamar e não conseguiu conter uma risada ao entender o que tudo aquilo queria dizer. estava em pé na entrada de um quarto. Uma grande cama de casal com lençóis de seda creme e uma bonita colcha vermelha estava bem ao centro do cômodo. Em cima dela havia uma bandeja com um vinho tinto qualquer e duas taças de cristal. Ele deu as costas à visão, virando-se de frente à sua sequestradora.
   - Então quer dizer que estamos no paraíso onde tudo é possível? – Ele indagou, parafraseando algo que ela uma vez havia dito há exatamente um mês atrás.
   - Sim, senhor. – Ela disse imitando o sorriso ladinho que cresceu no rosto do garoto e em seguida aprisionando a língua entre os dentes, as sobrancelhas erguidas em curiosidade e provocação. – Gostou?
   - Só posso responder isso depois de testar. – Ele respondeu como quem não quer nada, dando de ombros. Ela negou com um sorriso como se dissesse “você é impossível” e o envolveu no pescoço com os braços. Ele imediatamente e, talvez, até mesmo por impulso, envolveu a cintura fina da garota, puxando-a mais para perto de si. – Eu te amo, . - Confessou, enfim, sendo interrompido ao final por dois bipes idênticos soando pelo cômodo. Mensagens de Leonard para o casal de agentes, sem dúvidas. Por sorte, de alguma forma, eles haviam aprendido muito bem a ignorar o chamado do trabalho quando em momentos como aquele, em que estavam imersos um no outro e nada no mundo podia atrapalhar. A concentração dele era inteiramente nela, e vice-versa.
   - E eu sou completamente apaixonada por você, .
   Eles tinham os lábios grudados, e um gosto único na boca. Não havia preocupação alguma que o mundo externo pudesse apresentar para que se desligassem das sensações e vontades sendo realizadas naquele quarto, naquela noite.
   Ou, pelo menos, eles achavam que não.
   Uma pequena luz vermelha espreitava no canto da janela. Silenciosa e rasteira, ela apagou-se conforme a movimentação no quarto tornou-se mais intensa. O pedaço de cortina que a escondia foi solto, e logo não havia sinais do pequeno e segredado delito.
   A não ser, é claro, na mente da pessoa que o praticava.

FIM



Comentários da autora


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- 10 Aulas de Sedução
- Aquela do Melhor Amigo
- Aquela do Médico
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- Aquela do Jogador de Futebol
Aquela do Vizinho
- Fireside
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