The Nightclub Of Bad Choices
Escrito por Mel Lima e Yas Nascimento | Revisado por Mariana
O céu cinza daquela quarta feira refletia totalmente o meu interior. Sentado em minha cadeira de balanço na varanda da minha casa aconchegante, pingos de chuva começaram a cair e comecei a pensar na vida e em tudo o que fiz para chegar até ali. Meu nome é , e então, essa é a minha história.
Apenas digo para não fazer a mesma merda que eu fiz cinquenta anos atrás. Ela custou tudo o que eu amava.
Exatos cinquenta anos atrás. Hawaii - Estados Unidos.
Tinha acabado de sair de uma balada chamada Nightclub Case com uns amigos meus. Vida de adolescente nada fácil, sabe como é. De qualquer forma, estava voltando para casa. Ainda estava sóbrio, apesar dos drinks que bebi no bar, afinal, eu que iria dirigir. Minha cabeça rodava um pouco, mas era capaz de me mover normalmente e ter consciência de todos os meus atos. Mas isso não me impediu de esbarrar em uma garota na rua, fazendo-a perder o equilibrio e quase cair. Ela me olhou furiosa e eu ri da cara dela, o que deixou-a mais zangada ainda. Mas parece que minha risada acabou tranquilizando-a e no final de tudo começamos a conversar. Seu nome era . Tinha minha idade, também voltava de uma balada àquela hora da madrugada. Iria pegar um ônibus para sei lá onde para chegar sabe-se que horas em casa e, com certeza segundo ela, seus pais a matariam. Eles não sabiam que ela tinha saído escondido de casa para ir à balada com as amigas e beber um pouco. Por falar em amigas, ela estava sozinha. Perguntei onde elas estavam e ela me disse que ainda estavam na balada, todas bêbadas. A situação com os meus amigos não estava diferente, aliás, mas quando olhei para trás já não os encontrei. Inicialmente fiquei preocupado, mas olhei pro final da rua e os vi entrando em um táxi. Menos mal, bêbados responsáveis. Sorri para ela convidando-a para dar uma carona até sua casa e ela recusou. Insisti e ela ainda recusou. Mas meu poder de persuasão era maior do que a teimosia dela e a garota acabou aceitando. Entramos no meu carro e uns longos trinta minutos passaram até chegar na casa dela. Ao estacionar o carro, o céu ainda estava escuro e as luzes de sua casa também, o que indicaria que ela não estava encrencada. Pelo menos não por enquanto. Me agradeceu muito e me deu um beijo na bochecha antes de sair do carro.
Foi naquela noite que eu conheci a mulher da minha vida.
Never had much faith in love or miracles (Ooh!)
Never wanna put my heart on the line (Ooh!)
(Nunca botei muita fé no amor ou em milagres (Ooh!)
Nunca quis pôr meu coração em jogo (Ooh!)
Dois anos passaram-se nesse meio tempo eu já havia encontrado novamente. Encontrei-a poucas semanas depois, aliás. Peguei seu telefone, liguei, nos falamos, marcamos de nos encontrarmos em algum lugar perto da casa dela e assim aconteceu. Foi em uma sorveteria naquela tarde de verão que eu a beijei pela primeira vez.
E foi duas semanas depois que eu a pedi em namoro.
But swimming in your world is something spiritual (Ooh!)
I'm born again every time you spend the night (Ooh!)
(Mas nadar em seu mundo é algo espiritual (Ooh!)
Eu nasço de novo cada vez que você passa a noite (Ooh!))
Eu nunca amei tanto alguém como eu a amava. Estava claro, sabia disso. Qualquer um poderia ler nos meus olhos o tanto de amor que eu sentia por aquela garota. sentia o mesmo. Eu também conseguia ver tudo isso quando ela olhava para mim. Eu não poderia estar mais feliz.
Antes de esbarrar com ela naquela madrugada, eu era um playboy de balada. Bebia muito (mas me controlava quando precisava dirigir), não ligava para as horas nem para minhas notas na escola, não me importava com quem eu andava e beijava muitas garotas por noites. Típico menino galinha, eu sei, eu admito. Aliás, traía todas as minhas namoradas.
Mas mudou isso.
Mudou meu jeito de ver, de enxergar as pessoas ao meu redor. Percebi as más e as boas influências que tinha perto de mim e o quanto elas conseguiam me influenciar. Me distanciei de tudo que me fazia mal. Trouxe os bons para perto e levei os maus para longe. E deixei mais próxima do que nunca de mim.
Cause your sex takes me to paradise
Yeah your sex takes me to paradise
And it shows
Yeah, yeah, yeah
(Porque seu sexo me leva para ao paraíso
Sim, seu sexo me leva para o paraíso
E isso transparece
Yeah, yeah, yeah)
Nosso relacionamento não podia estar indo melhor. Tínhamos tudo. Tínhamos confiança, amor, sinceridade, paciência e tínhamos ciúmes. Ciúmes que às vezes me deixava louco de raiva. Louco porque muitos garotos davam em cima da minha , na minha frente. Muita cara de pau! Mas, quando esses caras jogavam uma cantada, ela ria escandalosamente e eu ria mais ainda. Ela sempre dizia com o seu tom de voz fino "Vocês não estão vendo? Esse é o meu namorado!" e voltava a rir enquanto os garotos saíram de perto com cara de tacho.
Então, no nosso quinto ano de namoro, foi quando tudo aconteceu.
Cause you make me feel like
I've been locked out of heaven
For too long, for too long
(Porque você me faz sentir como
Se eu estivesse impedido de entrar no céu
Por muito tempo, por muito tempo)
Estávamos passando por uma fase delicada no relacionamento. Todos passam, aliás. Mas nunca achei que iria passar com ao meu lado. Ela parecia perfeita. Ela era perfeita. Eu que nunca consegui enxergar a tempo suficiente.
Tínhamos brigado muito, muito feio por um motivo muito fútil: Ciúmes. Vi uns amigos delas em uma rede social e fiquei roxo de ciúmes, de raiva, de medo. Nunca tínhamos brigado daquele jeito, com gritos daquela altura, naquela entonação, naquele deboche, naquela ironia. sempre tivera um gênio forte, sempre argumentava, discutia e não gostava de sair por baixo em uma briga. Eu conhecia bem esse lado e nunca discutia por isso, mas naquele dia eu não aguentei. Tinha cansado de guardar tudo só para mim mesmo.
Então eu explodi. Mas não disse nem metade do que eu gostaria de falar.
(...)
You bring me to my knees
You make me testify (Ooh!)
You can make a sinner change his ways (Ooh!)
Open up your gates cause I can't wait to see the light (Ooh!)
And right there is where I wanna stay (Ooh!)
(Você me põe de joelhos
Você me faz testemunhar (Ooh!)
Você consegue fazer um pecador mudar seus hábitos (Ooh!)
Abra seus portões porque mal posso esperar para ver a luz (Ooh!)
E bem aí é onde eu quero ficar (Ooh!))
Era quase nove horas da noite quando eu decidi sair de casa batendo o pé, parecendo uma criança de dez anos com birra. Mas não pensei muito nisso na hora, apenas fui. Peguei minha jaqueta, minha carteira e meu celular, apenas. No carro, liguei para uns amigos e marquei uma balada. Não importava se eu tinha trabalho no dia seguinte, se eu tinha namorada ou hora para chegar em casa, dane-se tudo isso, eu iria relembrar meus tempos de adolescente e me sentir com dezessete anos de novo.
Não achei que isso poderia doer tanto.
Mas enfim. A balada abriu às onze horas. Encontrei os velhos amigos e ficamos conversando e bebendo um copo de uma bebida qualquer que tinha no menu daquele bar. Quando dei por mim, já passava do décimo copo e só queria saber de beber mais e mais. Minha visão já estava turva e minhas pernas, moles. Aposto que se pedissem para eu fazer o quatro com as pernas, não conseguiria e de brinde daria um belo tombo para todo mundo ver.
Uma música extremamente alta começara a tocar. Mais alta do que a anterior, ou talvez isso fosse efeito do tanto de bebida alcoólica que eu havia tomado. Comecei a dançar. Percebi que duas garotas haviam chegado mais próximas a mim e começaram a dançar comigo. De início eu não liguei. Depois, comecei a dançar junto com elas em movimentos, digamos, não muito puros. E tive um surto de realidade no meio da dança. Pedi desculpas as duas e fui embora de lá, afinal, apesar de bêbado, eu sabia quem amava, por quem daria a vida.
Quando saí do local, o vento da madrugada já batia no meu rosto e me senti extremamente mal por ter feito o que quase fiz. Eu amava, amo, a como se fosse minha própria vida.
Mas ainda estava muito bravo com ela.
Precisava dizer tudo o que pensava sobre essas coisas, sobre tudo que aguentei nesses cinco anos, precisava dizer tudo isso à ela para que pudessemos continuar juntos, para sempre, até a eternidade.
Não hesitei ao chamar um táxi e pedi para me levá-lo no endereço da minha casa. Quando eu cheguei, as luzes estavam apagadas, apenas uma. A do nosso quarto.
Ao sair do carro, olhei em direção àquela casa e a lembrança de quando a compramos. Do quanto os pais de ambos foram contra, pois éramos jovens demais para morarmos juntos. Fazia três anos e meio que estávamos namorando. Tempo, na época, suficiente para que juntássemos nossas escovas de dente.
(...)
Oh oh oh oh, yeah yeah yeah
Can I just stay here?
Spend the rest of my days here
Oh oh oh oh, yeah yeah yeah
Can I just stay here?
Spend the rest of my days here
(Oh oh oh oh, yeah yeah yeah)
Posso apenas ficar aqui?
Passar o resto dos meus dias aqui?
Oh oh oh oh, yeah yeah yeah
Posso apenas ficar aqui?
Passar o resto dos meus dias aqui?)
Entrei naquela casa a passos largos. Tudo estava escuro, como disse, exceto o quarto e foi para lá que eu fui. Quando entrei no local, vi que a televisão estava ligada e estava com a cabeça entre os joelhos. Seus ombros desciam e subiam, ouvia um barulho de soluço vindo dela.
Não acreditei no que estava vendo.
Minha menina estava chorando.
Em situações normais eu iria abraçá-la. E abracei. Mas ela me repeliu assim que sentiu meu toque. Me xingou. Disse que ficou sabendo para onde tinha ido e sabia muito bem o que eu fazia quando ia àquele tipo de lugar. Me xingou mais um pouco (ou muito) e ali eu comecei a ficar bravo. Me acusar de fazer coisas que eu não fiz me tira do sério muito facilmente. Não foi diferente dessa vez.
Não sei como comecei a falar. Só sei que quando percebi já estava gritando, berrando, e falando coisas para que são imensuráveis de tão horrendas e magoáveis. Ela ficou muito chateada, eu tinha certeza. Mas naquele momento eu não percebi o quanto.
Ela me expulsou de casa e eu fui. Não fiz malas nem nada, fui apenas com a roupa que eu tinha no corpo e com o resto do dinheiro que tinha me sobrado. Ainda era três horas da manhã. Decidi que isso não iria estragar minha noite e voltei para a balada, procurei aquelas garotas e quando finalmente as achei, comecei a dançar com elas. Minha intenção não era passar daquilo, juro.
Mas então elas me deram alguma bebida colorida e eu fiquei fascinado. Bebi tudo em dois goles enormes e fiquei tonto com o teor alcoólico que aquilo continha. Senti minhas pernas fraquejarem e perdi o equilíbrio. Então as duas garotas, Joanne e Sheila, me pegaram cada uma por um braço e me levaram para um táxi.
Sem saber direito o que estava fazendo, dei meu antigo endereço para o taxista e ele nos levou para lá. Assim que ele parou o carro, tentei me levantar, mas estava fraco demais e quando percebi, apaguei.
Cause you make me feel like
I've been locked out of heaven
For too long, for too long
(Porque você me faz sentir como
Se eu estivesse impedido de entrar no céu
Por muito tempo, por muito tempo
Acordei no dia seguinte na minha antiga sala de estar. Meus pais haviam se mudado para outra casa após eu também me mudar com , então a casa onde eu me encontrava estava vazia. Vazia exceto por duas pessoas além de mim: Joanne e Sheila. Foi quando percebi que ambas só estavam de roupa íntima e eu também.
Comecei a repensar a noite passada, mas não me lembrava de absolutamente nada. Lembro-me apenas do tal drink colorido e depois tudo virava um borrão.
Olhei no relógio da sala e constatei que eram duas da tarde. Depois ouvi o barulho da campainha e percebi que acordei por esse barulho. Não pensei muito antes de dar alguns passos e abrir a porta sem nem olhar no olho mágico para ver quem era.
Girei a maçaneta.
A pessoa que vi ali era a única que não gostaria de ver estando naquelas situações. E com aquelas pessoas.
Ela me olhou da cabeça aos pés. Estranhou. Ia começar a falar quando viu os corpos desacordados de duas mulheres no sofá. Calou-se. Só lembro dela ter me dito o quanto fora tola por ter voltado lá para pedir desculpas. Sim, porque ela iria pedir. Achou que tinha exagerado e que tudo seria apenas uma fase. Ela voltou a chorar e colocou as mãos no rosto para escondê-lo e eu tentei abraçá-la, mas ela recusou. E eu ainda tentei jogar aquela velha frase de "Não é o que você está pensando", mas na verdade nem eu sabia se era ou não o que ela estava pensando. Eu não sabia o que tinha acontecido no final da madrugada e no começo da manhã. A palavra seguinte dela foi a que mais me magoou em toda vida.
— Acabou.
saiu de lá chorando. Eu tentei segui-la, mas antes precisara me trocar e até lá ela já teria ido embora. A vi passar por entre os jardins da casa e desaparecer de vista. Não aguentei. Também chorei.
E foi a última vez que a vi.
Yeah you make me feel like
I've been locked out of heaven
For too long, for too long
(Sim, você me faz sentir como
Se eu estivesse impedido de entrar no céu
Por muito tempo, por muito tempo)
Assim que Sheila e Joanne acordaram naquele dia, as expulsei da forma mais bruta que podia. Elas estranharam, mas tinham conseguido o que queriam, afinal.
Bati a porta quando pisaram para fora e sentei no sofá com o rosto nas mãos. Voltei a chorar.
Tinha perdido a minha .
Poucos dias depois, soube que ela havia mudado de Estado. Tinha, finalmente, conseguido um estágio dos seus sonhos e ia cursá-lo no Estado vizinho. Fiquei feliz por ela. Mas ela fora embora sem se despedir. Nem ao menos um tchau, um adeus, uma mensagem, um email...
Anos depois, por amigos em comum, soube que ela estava noiva de um cara da cidade local. Tentei sorrir como se estivesse feliz por ela, mas não estava.
A vida prega peças em nós, peças que, às vezes, são certeiras. Temos que saber contornar a situação para sairmos ilesos delas.
foi uma peça.
E eu fui pego.
Oh yeah yeah, Oh yeah yeah yeah yeah
Ooh!
FIM