Stay Seventeen

Escrito por Larissa Alves | Revisado por Natashia Kitamura

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“A vida consegue ser muito filha da puta às vezes. Ainda mais em se tratando de mim.”

  - O All Time Low não toca no meu desfile. De jeito nenhum.
  - Por que, ? Eles são o conceito da sua coleção em forma de banda de pop/punk. Seria perfeito!
  Por que empresários tem sempre que estar tão certos? Droga.
  - Não é possível que não exista nenhuma outra banda parecida, Dan. Tem que haver alguma que possa substituir.
  Eu estava impassível. A única banda que nunca tocaria em nenhum dos meus desfiles – ou em qualquer outro evento que eu organizasse – seria o All Time Low. Não enquanto continuasse sendo o .
  Não seria nada mal se ele morresse e colocassem outro cara em seu posto. Se isso acontecesse antes do meu desfile, certamente deixaria a banda tocar lá.
  Suspirei frustrada. Seria difícil que o morresse (e fosse substituído) nos próximos dois dias. Teria que conseguir outra banda.
  - Mostre-me as outras opções. – Falei para Dan, meu empresário e amigo. Ele revirou os olhos e fez o que pedi.
  - Certo, temos essa, a...
  - Pode passar. Olha o cabelo desse cara. – Apontei para a foto que Dan estava mostrando.
  - O que é que tem o cabelo dele?
  - Não sei explicar. Mas não combina nem um pouco com o que eu quero. – Dei de ombros.
  - Ok. – Dan jogou a foto pra trás me fazendo rir. Ele não era como os empresários normais, por isso era o meu. Não gosto de gente monótona e chata demais. – Então poderia ser essa. – Ele colocou uma banda pra tocar. Não era ruim, mas também não era o que eu queria. Precisava de uma coisa alegre, divertida, descompromissada. Músicas que traduzissem minha coleção de primavera/verão.
  - Próxima.
  Ficamos nessa mesma dinâmica (Dan me mostrava uma banda e eu pedia a próxima) até não termos mais opções. Depois de duas horas ouvindo diferentes estilos musicais, comecei a achar que seria impossível encontrar o que procurava.
  - Ok, . Essa vai ser a última. E para ser sincero, é a minha favorita. – Ele colocou o CD pra tocar e eu encostei na cadeira, fechando os olhos cansada. Não era possível que não existisse nenhuma banda do jeito que eu queria pro desfile.
  A música começou e eu abri os olhos rapidamente. Era aquilo. Era exatamente como eu pensei! Finalmente, uma banda boa o suficiente.
  - Dan? – Desencostei da cadeira, animada. – Como é o nome dessa banda? É perfeita! Temos que contratá-la.
  - Você gosta? Falei que era a minha favorita. Desde o início, aliás. – Ele levantou as sobrancelhas, como se falasse “Eu te disse!”.
  Automaticamente o sorriso que eu tinha aberto sumiu.
  - Você quer dizer que... Essa é... – Gaguejei.
  - Sim. , apresento-lhe o All Time Low. – Dan falou com um sorriso presunçoso, como se eu nunca tivesse ouvido a banda. Até admito que não fazia isso há muito tempo, mas hey. Eu acompanhei aqueles caras no início de tudo. Só não reconheci porque o som tinha mudado um pouco. Estava mais pop agora. Mas não estava ruim.
  Infelizmente. Tudo seria mais fácil se estivesse.
  Inclinei minha cabeça pra traz e voltei a fechar os olhos. Será possível que de todas as bandas no mundo, justo a que o está incluído fosse a única que encaixa perfeitamente na minha coleção? Só pode ser piada.
  Mas eu sabia o por quê.
  A maioria das peças dessa estação foi inspirada em antigos desenhos meus. Ano passado meus pais se mudaram, e quando foram arrumar as coisas do sótão, encontraram esses croquis que eu fiz ainda no início da faculdade. Nem me lembrava mais deles, mas quando me mostraram, não pude pensar em mais nada pra me servir de inspiração. Continham algumas falhas, mas eram perfeitos desenhos de verão. Animados e coloridos.
  Esses desenhos, por sua vez, foram inspirados na minha vida quando tinha 17 anos. A qual se resumia a festas, amigos e, principalmente, meu namorado.
  E adivinha? Sim, ocupava esse posto. Em grande parte dos desenhos eu podia sentir sua presença. Fosse num traço mais ousado, numa estampa exageradamente colorida, nos tecidos fluidos e leves. Tudo tinha um toque . Ele opinava nos meus trabalhos, e eu me inspirava no seu jeito de levar a vida. Ele nunca se preocupava, estava sempre de bom humor. Era engraçado, divertido. Assim como meus croquis da época.
  Obviamente, quando traduzi essas ideias para a minha primavera/verão, esse mesmo “ar ” permaneceu. E é claro que sua banda ficava perfeita como trilha sonora. As músicas, apesar das pequenas mudanças, ainda possuíam o mesmo toque despreocupado. Não era surpresa.
  - . – Dan me tirou do transe em que tinha entrado. – Eu não consigo pensar em nenhuma outra banda. O All Time Low é perfeito. Tem que ser eles. E tem que ser logo. O desfile é em dois dias, e não sabemos se eles não terão outros compromissos. Precisamos acertar isso o mais rápido possível.
  - Você está certo. – Massageei minhas têmporas. Minha cabeça havia começado a doer quando estávamos na décima banda. Isso foi há mais ou menos uma hora atrás. – Eu vou pra casa, pensar um pouco. Mais tarde ligo para dizer a minha decisão. – Olhei para Dan, que assentia compreensivo, e não pude deixar de sorrir.
  - Faça o que você achar certo. – Ele disse simplesmente.
  - Obrigado por ser tão paciente comigo. Não sei o que seria de mim sem você. – Me levantei e lhe dei um abraço. Era só disso que eu precisava.
  - Bem, eu também não sei o que seria de você sem mim. – Riu, e eu estirei a língua pra ele.
  - Te vejo depois. – Sorri.
  Peguei minha bolsa e saí dali, deixando a sala onde ainda tocava a banda que eu menos queria ouvir, e ao mesmo tempo, a que mais precisava.
  A vida consegue ser muito filha da puta às vezes. Ainda mais em se tratando de mim.

  Fui pra casa o mais rápido que pude. Só precisava de um banho e meus travesseiros para conseguir raciocinar direito.
  - ? Já chegou, que estranho.
  - Hey, ! Sim, tenho alguns problemas no meu desfile. Preciso pensar. – Respondi.
   era minha melhor amiga. Provavelmente a única que sabia toda a história envolvendo o   , já que me conhece há anos. Nós moramos juntas desde que terminamos a faculdade, e ela sempre me puxa de volta à realidade quando as coisas saem do meu controle.
  O que estava acontecendo exatamente agora.
  - O que houve? – Ela perguntou preocupada.
  Me deixei cair no sofá, já sem sapatos. Suspirei e contei toda a história do All Time Low no meu desfile.
  - Achei que você já tinha superado toda essa história com o .
  - Eu também achei. Mas com esses croquis antigos parece que tudo veio à tona de novo. É como se eu voltasse a sentir tudo o que eu senti naquela época. O amor, a felicidade, os sonhos. A decepção.
   me olhou por um tempo, me esperando continuar. Apenas desviei o olhar e encarei um ponto qualquer, enquanto um despejo de lembranças retornava à minha memória.

  ~FLASHBACK: 5 anos atrás~

  - Que bom humor é esse, dona ? – me perguntou com um sorriso malicioso.
  - Aposto que você sabe. – Gargalhei inclinando a cabeça pra trás. Estava excepcionalmente feliz naquele dia.
  - Você e o ... – Ela começou e eu assenti mordendo o lábio inferior.
  De todas as minhas amigas, eu era a mais “certinha”. Não no sentido de festas, eu estava sempre presente nelas. Mas quem não me conhecia bem nunca imaginaria que eu era a única virgem do grupo.
  Como sempre fui muito romântica e sonhadora, acreditava na história de “esperar o cara certo”. Bem, eu esperei. E quando apareceu, admito que nunca imaginei que ele seria o tal cara. Mas com aquele jeito meio idiota de ser, ele me conquistou.
  Nosso namoro nunca foi complicado, nós dois éramos bem diretos. Rapidamente oficializamos tudo e todos sabiam do mais novo casal. Éramos tão felizes quanto dois jovens podiam ser. Pelo menos era assim que eu imaginava nossa relação.
  Então, depois de dois meses, tinha certeza de que nele eu podia confiar. E agora, eu era como a maioria das garotas na faculdade.
  - Conta, conta! Como foi? Aonde foi? Foi ruim?
  - Ai, ! Para, assim eu fico com vergonha. A única coisa que você precisa saber é que foi lindo, perfeito, e que eu estou muito feliz. – Abri um sorriso largo.
  - Percebi essa sua felicidade. – Ela riu, e me acompanhou para as aulas.
  Como sempre, demorou uma eternidade para chegar a hora do almoço. Mesmo estudando Moda, coisa que eu amo, faculdade consegue ser ainda mais cansativo que escola. Fui direto para o lugar onde sempre me encontrava com , que, apesar de não fazer nenhum curso, sempre ia até o campus me encontrar. Dessa vez, estava ainda mais ansiosa que o normal. Agora nossa relação, definitivamente, tinha chegado a um patamar mais especial. Poderia tranquilamente dizer que ele era tão importante pra mim quanto alguém da minha família, e não estaria mentindo.
  Eu simplesmente o amava. E era a primeira vez que me sentia assim de verdade.
  - Oi, amor. – Cheguei sorrindo, e lhe dei um beijo rápido.
  - . Precisamos conversar. – Ele estava sério, e não sustentava o olhar no meu por mais de 30 segundos. Me afastei e tomei uma postura parecida com a sua.
  - Aconteceu alguma coisa?
  - Na verdade... não. Mas... – Hesitou. – Eu acho que a gente devia terminar. – Falou rapidamente.
  Demorei um minuto pra conseguir assimilar o que ele acabara de dizer. Não tive muito sucesso.
  - O que você quer dizer exatamente? – O encarava com intensidade. Ele só desviava.
  - As coisas tomaram um rumo estranho. Eu não quero nada muito sério agora e...
  - Que rumo você quer dizer? – Dessa vez ele me encarou. Foi como se alguma coisa dentro de mim se partisse tamanha a frieza em seu olhar.
  - Acho que eu me tornei uma pessoa especial demais pra você. Ainda mais...
  - Ainda mais... – O incentivei. Não sabia como ainda não tinha começado a chorar ali mesmo.
  - Ainda mais depois de ontem. – Ele desviou novamente os olhos.
  Foi então que minha cabeça começou a processar a informação.
  - Eu acho que você deu uma importância grande demais pra tudo o que aconteceu. Uma importância desnecessária. – Ele continuou, voltando a me encarar. Parecia que não se decidia se devia ou não olhar em meus olhos, e isso estava me incomodando ainda mais. – É melhor pararmos com isso antes que tome proporções maiores. Ainda tenho 18 anos. A vida está lá fora só me esperando. A banda está cada vez melhor. Eu não vou jogar isso fora.
  O encarei incrédula, e pude ver em seus olhos o quão pouco ele se importava. Não estava fazendo grande coisa, afinal. Pelo menos é isso que eu imaginava que ele estivesse pensando.
  Passados alguns segundos, ele apenas se virou e saiu, andando calmamente.
  Eu me limitei apenas a escorregar até o chão e deixar cair todas as lágrimas que não tinham escorrido até agora.

  ~FIM DO FLASHBACK~

  - , você tá bem? – parecia preocupada. Voltei à realidade e percebi que ela falava comigo há um tempo.
  - Oi, desculpa. – Forcei uma risada. – Eu vou tomar um banho e depois a gente termina essa conversa, pode ser?
  - Claro, não tem problema. Aproveita pra pensar um pouco no que você vai fazer agora.
  Sorri e fui em direção ao meu quarto.
  Soltei minha bolsa em cima da cama e fui direto pro banho. A água quente escorrendo pelo meu corpo sempre me ajudava a relaxar.
  Não que isso fosse possível na situação em que eu me encontrava.
  É claro que seria perfeito se o All Time Low tocasse no meu desfile. Já me convenci de que não existe banda melhor. Mas de jeito nenhum que eu pagaria para o fazer alguma coisa pra mim. Estou satisfeita em nem sequer ser lembrada por ele.
  Acontece que eu não posso fazer um desfile sem trilha sonora. E já tinha planejado tudo, tinha que ser uma banda.
  E a do é tão boa. Quero dizer, eu ouvi apenas uma das novas músicas e adorei. Se há cinco anos atrás elas já eram boas, agora estavam ainda melhores. Além do mais...
  Droga. Por que as coisas tem que ser tão complicadas? Eu não vou me distrair, pensando sobre o quanto a banda é ótima, se o da mesma é quem ele é. Não vou. Não é possível que dentre milhões de outras bandas não exista nenhuma tão boa. Tem que haver uma opção.
  Se bem que as duas horas que eu passei com o Dan mais cedo no escritório ouvindo dezenas de músicas foi um bom exemplo do quanto o All Time Low seria perfeito.
  Droga. Droga, droga, droga.
  Em meio a essa confusão de pensamentos e opiniões, terminei o banho e vesti alguma coisa confortável. Foi aí que percebi que estava morrendo de fome.
  - O que temos pra jantar? – Fui até a sala, encontrando sentada no chão e encostada no sofá assistindo Supernatural. – O que está fazendo aí? – Apontei para ela.
  - O quê? O chão é confortável às vezes. – Ela deu de ombros e eu ri. – Tava pensando em pedir comida chinesa, o que acha?
  - Perfeito! – Sorri e me sentei ao seu lado.
  - Tomou sua decisão? – Ela pausou o DVD e virou em minha direção.
  - Acho que sim. – A olhei, apreensiva.
  - , relaxe. Qualquer que seja a banda, qualquer que seja o , sua coleção permanece a mesma. E ela está ótima. O desfile vai ser perfeito, como o que você planejou. Sim, a banda do seu ex seria a melhor opção. – Meu estômago revirou quando ela mencionou o fato de o ser meu ex. É claro que eu sabia disso, mas se referir a ele dessa maneira... Tornava as coisas um pouco mais estranhas. E mais dolorosas, talvez. – Mas apesar de tudo – ela continuou – o que importa é o seu bem estar. Se você não se sentiria bem com ele lá, simplesmente não o contrate. – Percebi que nos referíamos à banda como se fosse formada apenas pelo , e tentei me recordar dos outros integrantes. Sei que tinha um , por quem sempre nutriu uma queda. Não lembro muito bem dele, mas lembro perfeitamente do quanto ela repetia no meu ouvido sobre “como aquele amigo do é bonito!”. – Faça a sua escolha pensando no que for melhor pra você. Para você e seu futuro. Todos nós confiamos em sua decisão, independente de qual seja.
  - Obrigada pelo apoio. – Sorri. – Só você pra me entender tão bem. – Ela me abraçou, e depois peguei meu celular para ligar para Dan. Tinha uma banda para contratar.
  E de preferência ainda hoje.

“As coisas, as pessoas, as situações mudam. E só nos resta aproveitar essas mudanças.”

  - Aqui, aqui! – Um dos meus maquiadores finalmente encontrou o batom que havia perdido.
  - Pronto, passe em todas as modelos que estão com o cabelo preso, assim como combinamos.
  - Já estou fazendo isso! – Ele me disse com um sorriso, e o retribuí.
  Uma palavra sobre backstages de desfiles: caos. Se ontem eu mal tive tempo para respirar organizando o local e conferindo os últimos detalhes, hoje então, nem se fala.
  Desde que acordei, vim direto para cá, e já fiz ensaios, supervisionei o trabalho da equipe de beleza, e principalmente, vesti as modelos e cuidei para que todas as peças ficassem com o caimento perfeito, entre outras coisas. Na verdade, mal tinha saído daquele ambiente onde a bagunça acontece. Dan estava cuidando de tudo lá fora, desde a decoração até...
  A banda.
  Resolvi não pensar nisso e continuei tomando conta de tudo no backstage.
  Depois de arrumar e conferir todas as modelos, fui lá fora me certificar de que estava tudo certo. Confiava em Dan, mas como boa perfeccionista que sou, não posso deixar passar nenhum detalhe.
  Saí, e o que vi conseguiu plantar um sorriso em meus lábios. Estava tudo perfeito. A iluminação, as cadeiras distribuídas de acordo com o que eu pensei, a decoração, o palco, a passarela. Tudo.
  Corri até Dan assim que o vi, e pulei em suas costas. Ele já estava acostumado com esse tipo de coisa.
  - DAN! Não poderia estar melhor, você é incrível. – Sorri ao ver a cara de susto que ele fez.
  - Tá louca, ? – Ele riu. – Sai daí. – Se balançou, tentando me fazer cair. Eu estava completamente pendurada nele. – Estou trabalhando, sabe.
  - ? – Fomos interrompidas por alguém. Olhei pra frente e vi com quem Dan conversava. Conhecia aquele cara de algum lugar, mas não sabia de onde. Voltei a ficar em pé.
  - Eu te conheço de algum lugar. – Falei, confusa.
  - Acho que sim. Esse é , do All Time Low. – Dan falou assim que percebeu que não iria se pronunciar. Ele parecia meio chocado ao me ver.
  - Ah, sim! – Forcei um sorriso. Não sabia que eles tinham chego. Mas aparentemente, só o estava aqui. Não vi ninguém mais além dele. – Faz tempo desde que nos vimos pela última vez.
  - É! Você... está ótima. – Ele se aproximou me dando um abraço, e eu retribuí. Não tinha nada contra ele. Aliás, sempre foi o meu preferido da banda. Nós já fomos bem amigos, na verdade. Agora estava começando a lembrar.
  - Parabéns pela banda. Vocês definitivamente foram pelo caminho certo. – Estava começando a relaxar, finalmente. – Não tinha ninguém melhor para o meu desfile. – Sorri, admitindo o que me perturbou nos últimos dias.
  - Seu desfile? Espera. Esse é o seu desfile? – Ele abriu um sorriso. – Wow, parabéns por isso. É o que você sempre quis.
  - Sim. Está perfeito, não é? – Olhei ao redor, sorrindo orgulhosa.
  - Não entendo muito bem disso, mas se eu vou estar tocando, provavelmente está perfeito. – Voltei a encará-lo e vi aquele mesmo sorriso irônico de sempre. Não pude deixar de rir.
  - Você não mudou nada.
  - Não mesmo. – Ele sorriu.
  - Obrigado por me incluírem na conversa. Aliás, esqueçam o trabalho. Podemos ficar aqui jogando conversa fora pelo resto do dia! – Dan falou ao meu lado, nos lembrando de que ele ainda estava ali.
  - Tinha me esquecido de você. – Falei.
  - Eu também. – completou.
  - Eu percebi. – Ele imitou nosso tom de voz, e eu ri.
  - Idiota. – Revirei os olhos. – Vou voltar ao trabalho, então. Depois a gente se vê, ! E Dan. – Completei ao vê-lo levantando a sobrancelha esquerda.
  Virei-me e voltei ao caos dos bastidores. Olhei meu relógio e sorri. Daqui a menos de uma hora o show iria começar.
  E eu não me referia apenas ao All Time Low.

  - Todo mundo pronto? – Dan apareceu para ver se estava tudo certo.
  - Vou só terminar de organizar a fila das modelos e já podemos começar. Como está lá fora?
  - Lotado. – Ele sorriu. – A banda já está em seu lugar, os fotógrafos também. Quando você quiser. – Assenti.
  - Ok, meninas. – Virei-me para as garotas esperando o meu sinal para começar. – Está tudo pronto! Por favor, sejam incríveis. – Sorri e elas retribuíram.
  - Vou cuidar da iluminação e avisar ao All Time Low que já podem começar. – Dan falou, já saindo.
  - Ao meu sinal. – Falei para a primeira modelo da fila, que fez que sim com a cabeça.
  Passados 5 minutos, o lugar já estava escuro, com as luzes concentradas na passarela. Ouvi o início da setlist que havia decidido ontem junto com Dan, e então a correria nos bastidores começou. A primeira modelo saiu, e quando voltou, todos correram para ajudá-la na troca de roupa. Assim se sucedeu com a próxima, e com a outra.
  Sorri. Essa era a profissão que eu amava. Nada era melhor que aquela bagunça organizada de roupas, sapatos, maquiagem. As coisas não poderiam estar mais divertidas.
  Ao final de tudo, fui até a passarela, sorrindo com o dever cumprido. Andei até o final, acenando para alguns conhecidos, e após algumas fotos rápidas, retornei em direção ao backstage. Estava quase no final quando o vi.
  Lá estava , sorrindo para mim como se nunca tivéssemos deixado de nos falar. Não pude deixar de sorrir de volta e acenar alegre para ele. Vi os outros dois integrantes da banda me olhando meio confusos. Acho que sabiam que me conheciam de alguma maneira. E provavelmente estavam achando estranho esse meu aceno para o .
  E . Ele me olhava como se tentasse adivinhar se era mesmo eu ali. Se ele não estava se confundindo. Gesticulei um “olá” com a boca, e o choque o atingiu em cheio. Abriu e fechou a boca duas vezes, e então decidiu apenas ficar calado. Ele não sorriu, mas também não estava sério. Estava apenas... surpreso. Acho que não esperava me ver ali.
  O não deve ter mencionado nosso encontro de hoje mais cedo, afinal.
  Voltei meu olhar para ele, e sorri. Estava começando a me lembrar do porquê eu sempre gostei tanto desse garoto.

  O que veio depois foi uma série de congratulações pela coleção e o evento. Algumas entrevistas, fotos e rápidas conversas.
  Tinha planejado o local para dar lugar a uma festa depois do desfile. A passarela saiu, dando lugar a uma enorme pista de dança, que logo já estava lotada. O All Time Low ainda tocava algumas músicas, enquanto eu estava pra lá e pra cá tentando dar atenção a todos os presentes.
  Depois de mais ou menos uma hora, pude relaxar e começar a aproveitar a festa. A banda tinha dado lugar a um DJ, que tocava uma música alta, e eu podia ver que todos estavam se divertindo. Não me surpreendi. Ninguém fica parado numa festa organizada por mim.
  Finalmente fui em direção ao bar, e pedi minha bebida. Sentei num banco e fiquei observando a festa enquanto esperava o barman voltar. Quando virei minha cabeça para o lado direito, encontrei um par de olhos me fitando.
  - Você já namorou o . Certo? – O cara sentado ao meu lado falou. – Sou . Da banda. – Completou com um sorriso.
  - Eu lembro de você. – Também sorri. – E sim, já fui namorada do , mas foi há muito tempo.
  - Quando a banda ainda estava no início. – Ele falou, e eu quase disse “sim, e aliás, esse foi um dos motivos de ele ter me abandonado logo depois de tirar a minha virgindade”, mas resolvi não mencionar esse fato. – Ele sempre ia te ver na faculdade e se atrasava para os ensaios. – Rimos.
  - Típico do . – Revirei os olhos. Então, um outro cara, também da banda, apareceu.
  - Hey, , estava atrás de você, nós va...
  - , lembra da ? – o interrompeu. – Que namorava o .
  - ? É você mesmo? – Ele parecia feliz ao me ver, o que me fez rir.
  - Em carne e osso.
  - Posso saber por que você sumiu? – Ele me deu um abraço, e parecia curioso sobre o meu paradeiro nos últimos cinco anos.
  - Eu sumi? Passei quatro anos fazendo faculdade no mesmo lugar! Vocês é que não pararam quietos com essa banda.
  - É verdade. – admitiu. – Mas nem pense que vai se livrar de nós assim tão facilmente.
  - É mesmo, que droga. – Fingi estar irritada e eles riram, revirando os olhos quase ao mesmo tempo.
  Percebi que provavelmente o não tenha realmente se importado muito com o nosso término. Ele deve ter chegado pros três amigos há cinco anos atrás e ter dito “hey, terminei com a . Vamos jogar vídeo game para comemorar?” de uma maneira casual. Enquanto eu estava na casa da drenando toda a água do meu corpo em forma de lágrimas e me lamentando sobre como eu amava aquele filho da puta.
  Bem, a vida não costuma ser justa.
  - Sim, e o que você estava dizendo? – pareceu lembrar-se de que tinha ido até ele para falar alguma coisa específica.
  - Ah, sim. Nós estamos sentados naquela mesa – ele apontou – e todo mundo tá chamando vocês.
  - Nós? – Perguntei confusa.
  - mandou chamar o . mandou te chamar. Quer dizer, você é a única estilista que eu conheço. Bem, quando ele falou da estilista, não achei que fosse você. Mas agora vejo que sim. Ou não é você quem está por traz de todo esse desfile?
  - Na verdade, sou eu mesma. – Sorri.
  - Sabia que tinha te visto naquela passarela. – Falou como se agora tudo fizesse sentido. – Então, o mandou te chamar. Vou só pegar uma bebida e você vai lá com a gente. Não tem opção. – Ele disse quando viu que eu estava prestes a recusar.
  Droga, eu não quero ir lá e sentar numa mesa com o . Não sozinha.
  Peguei o celular e mandei um SMS para , perguntando onde ela estava. Segundos depois ela respondeu dizendo que tinha acabado de entrar no salão (o que foi estranho, pois jurava a ter visto sentada na primeira fila assistindo o desfile), então a mandei vir até o bar. Rápido de preferência.
  Esperei mais uns dois minutos (ainda bem que o barman estava demorando com a bebida do ) e ela finalmente chegou.
  - , parabéns! O desfile ficou lindo.
  - Onde você tinha ido, que só chegou agora?
  - Trocar os sapatos. – Ela fez uma careta. – Bem que você falou para não usar aquela sandália preta. Quase arrancou meus pés fora.
  - Vamos ? – fez cócegas nas minhas costas me fazendo dar um pulo do banco onde estava sentada.
  - Hey, não faz isso! – Ri e puxei . – E sim, vamos. Vou levar minha amiga , ok? – Apontei para a garota com uma cara confusa que estava atrás de mim.
  - Sem problemas. – Ele disse um “oi” rápido pra ela e me puxou para a tal mesa, onde nos esperava com mais algumas pessoas.
  - ! Finalmente! – se levantou e veio em minha direção para um dos seus típicos abraços.
  - ? Dá pra me soltar agora? – Falei depois de alguns segundos. – Como conseguiu ficar bêbado em tão pouco tempo, aliás? – Falei confusa e todos riram. Ele então me soltou, fazendo bico.
  - É assim que todo o meu amor é retribuído.
  - Para de manha. Olha, lembra da ? Ela com certeza consegue retribuir todo o seu amor. – Apontei pra ela, que parecia ter se situado.
  - Ai meu Deus, é o ? Aquele amigo do ? – Ela me perguntou e eu assenti.
  - Eu lembro de você!
  - Ela não é aquela amiga da que você vivia dizendo que era “a melhor amiga que a namorada do poderia ter?” – falou e eu gargalhei. Então quer dizer que todo aquele blá blá blá da tinha sido correspondido? Ótimo. Já fiz minha boa ação do dia juntando esses dois.
  - Ai que amor, . Igual você, que vivia falando que “o amigo do é gato”. – Falei, tentando conter o riso. Ela me mandava o seu melhor olhar “, cala logo essa tua boca, ou não vou mais pagar seu jantar quando a gente sair de novo”, o que tornava tudo ainda melhor. Enquanto isso, tentava jogar alguma coisa na cabeça do pobre , que desviava.
  O amor é lindo.
  - Bom, eu sei que esse momento “lembrando os tempos da faculdade da e da , já que nós sempre fomos vagabundos e nunca estudamos mais nada depois do ensino médio” é lindo e emocionante, mas se vocês quiserem se sentar, seria ótimo. – falou atrás de mim. Nós estávamos impedindo sua passagem, e ele provavelmente já estava começando a ficar cansado de aturar o reencontro gay do e da .
  - Tá bom, já to indo. – Falei, mas não me mexi, o que fez com que tomasse medidas drásticas e recomeçasse a fazer cócegas em mim. – NÃO, JÁ TO INDO, É SÉRIO! – Falei aos risos. – Olha, já to sentada, parou, parou. – Tentei segurar as mãos dele, mas mesmo estando sentado, ele insistia em continuar. – ! SAAAAI! – Falei, e ele finalmente obedeceu. Estirei a língua para ele e finalmente me recompus do momento constrangedor. – Vai ter troco, viu? – Falei pra ele, que apenas ignorou o comentário.
  - Hey, parece que todos já estão melhores amigos de novo, e só eu estou sobrando? – Uma voz falou ao meu lado, e mesmo sem olhar já sabia quem era. Respirei fundo e virei-me para ele. – Oi, .
  - Oi, . – Forcei um sorriso. – Há quanto tempo.
  - É. – Ele falou, me dando um beijo na bochecha. – Vejo que conseguiu tudo o que planejava na faculdade. – Sorriu e apontou para a festa.
  - Sim. – Sorri, dessa vez orgulhosa. - Você também conseguiu muita coisa com a sua banda, devo dizer.
  - Acho que as coisas deram muito certo para nós dois. – Ele me fitou por um tempo, e odeio admitir, mas meu estômago deu um pequeno pulo.
  Céus, qual é o meu problema?
  - Definitivamente. – Concordei. – Acho que merecemos isso.
  - E talvez a vida tenha dado um empurrãozinho, também.
  - É verdade. – Sorri. Olhei ao redor procurando alguém para me salvar do , mas todos pareciam estar muito entretidos. Principalmente a , que não tirava os olhos do , aliás. O resto da mesa estava conversando e bebendo. Teria que manter aquela conversa por um tempo.
  - Hm, aquelas roupas. – começou, me fazendo voltar minha atenção para ele. – Elas me lembraram... Você ainda tem aquelas coisas que você desenhava quando namorava comigo?
  - Não eram coisas! - Falei achando engraçado seu jeito de se referir aos meus desenhos. – Eram croquis. E sim, ainda os tenho. Foram inspiração para essa coleção.
  - Ah sim. Bem que eu imaginei.
  - Você ainda lembra daquilo? – Perguntei surpresa.
  - É claro que sim. – Ele falou como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. O encarei por um momento.
  - Então, vocês estão de férias, ou alguma coisa assim? Não é normal uma banda como o All Time Low estar livre num sábado à noite. – Decidi mudar de assunto. Ainda estava atordoada com a última informação.
  - Sim. Terminamos uma turnê há mais ou menos uma semana, teremos o próximo mês inteiro de férias. – Ele sorriu. – É bom estar em casa.
  - Achei que preferia estar sempre viajando. – Falei fitando a mesa. De repente havia me lembrado do motivo que o fez me deixar. – Conhecendo o mundo.
  - É claro que amo sair em turnê, mas com o tempo a gente aprende que não existe nada melhor que passar um tempo em casa. Sabe, na companhia de antigos amigos e da família. É como um alicerce que nos mantém sempre com os pés no chão. – Ele disse calmamente, e voltei a encará-lo.
  Ele estava diferente. Mais maduro. Não parecia mais aquele moleque de cinco anos atrás. E as mudanças não eram só fisicamente. Até seu jeito de falar havia mudado. E pude perceber que, principalmente, seu jeito de pensar. Fico imaginado, se nós namorássemos hoje, será que ele me abandonaria como fez antes?
  - Espero que tenha conhecido todos os lugares que sempre sonhou conhecer. – Falei, desviando dos meus pensamentos.
  - Sim. Nós já tocamos até no Japão! – Ele dizia orgulhoso. – É um país incrível. E muito diferente dos Estados Unidos.
  Então ele começou a me contar de todas as histórias engraçadas e constrangedoras que eles tinham vivido nos últimos anos, enquanto viajavam pelo mundo com a banda. E cada vez mais eu me convencia de que, mesmo ainda sendo o mesmo maluco idiota de sempre, havia mudado muito mais do que eu imaginava desde que nos vimos pela última vez.

  - Preciso de algo para beber! – Falei exausta.
  Depois de passarmos muito tempo sentados naquela mesa bebendo e conversando, achamos melhor aproveitar enquanto a pista estava lotada para dançar da maneira mais estranha que conseguíssemos.
  Então estávamos na pista há pelo menos uma hora, dançando sem parar. já estava tão bêbado que todos acharam melhor levá-lo para algum lugar seguro. Obviamente, a encarregada disso foi , que não achou essa obrigação nem um pouco ruim. Agora estávamos apenas eu, , e uma garota que ele tinha tirado sei lá de onde. E eu não sei aonde se meteu.
   me puxou até o bar, e nos sentamos enquanto esperávamos nossas bebidas. Minha garganta implorava por algo líquido o mais rápido possível. Assim que o barman chegou, peguei meu copo e já ia beber, quando segurou o meu braço.
  - Hey, vamos fazer um brinde antes. – Franzi o cenho.
  - Brindar a quê?
  - Ao fato de estarmos aqui, depois de tanto tempo, juntos novamente. – Ele me encarava intensamente. Percebi que não tinha mais aquela mania idiota de desviar os olhos a cada minuto, hábito que me tirava do sério. Ele sorriu torto, e eu estendi meu copo. Ele fez o mesmo e os tocamos, dizendo depois:
  - A nós.
  Sorri, e finalmente satisfiz minha sede. Descansei o copo à minha frente, e quando voltei a olhar para , constatei que ele ainda não havia desviado os olhos de mim.
  Ele havia me causado as piores sensações possíveis quando eu tinha dezessete anos. Mas esta noite, enquanto conversávamos, ríamos e dançávamos, percebi que, se não fosse por tudo aquilo, com certeza eu seria uma pessoa diferente do que sou hoje. As pessoas erram. E aprendem com seus erros. Às vezes, aprendemos também com a perda. Sem esse pacote de coisas dolorosas do passado, eu não seria o que sou hoje. Então, se eu parar para pensar, tudo o que o me causou pode não ter trazido necessariamente coisas boas de imediato. Mas com certeza influenciou no meu futuro.
  Eu posso dizer, com toda certeza, que não estaria aqui hoje se não fosse por ele. Só precisava esquecer tudo o que passei e me concentrar nas coisas boas que eu tinha agora.
  Eu ainda encarava os profundos olhos de . Nós não éramos mais jovens imaturos, afinal. Tínhamos passado por muita coisa nos últimos cinco anos. E devido a tudo isso, definitivamente não faríamos como no passado. Percebi subitamente que as coisas, as pessoas, as situações mudam. E só nos resta aproveitar essas mudanças.
  De repente, nós dois nos levantamos e ficamos cada vez mais próximos. Parecia que existia um ímã nos atraindo um para o outro. A próxima coisa que me lembro é de estar com os braços no pescoço de , que me segurava com firmeza pela cintura, em um beijo rápido e urgente.
  E, sinceramente, foi como se todo o sentimento de anos atrás tivesse voltado. Por um lado, o pânico tomou conta de mim. E se ele estivesse apenas se divertindo, como já fez uma vez? Mas, por outro lado, e devo acrescentar que o maior, eu sentia que aquilo era o certo. O que sempre foi certo, aliás.
  Depois de um tempo, nos soltamos e me olhava divertido, enquanto sorria.
  - O que foi? – Perguntei envergonhada.
  - Nada. – Ele disse, enquanto passava os dedos delicadamente pelo meu rosto. – É só que você parece tão... você. Apesar de estar diferente, permanece a mesma.
  - E isso é bom? – Perguntei.
  - Não poderia ser melhor. – Falou me puxando para mais um beijo, o interrompendo apenas para sussurrar em meu ouvido:
  - Mereço uma chance?
  Sorri, sentindo seu cheiro habitual em seu pescoço. Não o perfume. O cheiro dele. Que eu conhecia como ninguém.
  - É claro que sim. – Falei, vendo um sorriso se formar em seu rosto. Dessa vez fui eu quem o agarrou pelo pescoço, o trazendo para ainda mais perto, se é que isso era possível.
  Então me permiti esquecer tudo, e me concentrar apenas em mim e em . Agora.
  E confesso que foi essa uma das melhores decisões da minha vida.

FIM



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