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#024 Temporada

Wildest Dreams
Taylor Swift



Staring At The Sunset

Escrito por Fe Camilo

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“Não se pode separar paz de liberdade porque ninguém consegue estar em paz a menos que tenha sua liberdade.” (Malcolm X)

  Olhei para a minha aparência no espelho sentindo a lágrima preencher meus olhos ao me deparar com o corpo curvilíneo moldurado pelo vestido de noiva branco cravejado de pequenos diamantes, o melhor e mais caro que o dinheiro poderia comprar, certamente. Ignorei os elogios ao redor forçando um sorriso aos meus lábios, era preciso manter as aparências, isso eu já havia aprendido.
  O vestido ficara tão perfeito quanto provavelmente seria o dia do casamento, o qual estava tão próximo que eu quase podia sentir o cheiro das camélias, as flores favoritas do meu pai. Apesar de todo o encanto que a data deveria trazer, em minha mente só havia um pensamento, de que em poucos dias meu destino estaria selado, e não havia nada que eu pudesse fazer. Fechando os olhos, me concentrei em acalmar minha respiração para que a ansiedade não me consumisse por inteiro.
  - Tudo bem, querida, é normal se sentir afetada nessas circunstâncias... no dia do seu casamento, todas as preocupações vão desaparecer em um instante, o Duque será o esposo perfeito. – ouvi a Sra. Brooks falar com sua voz irritantemente anasalada, tentando me acalmar.
  O Duque. Esposo Perfeito. Pareciam expressões que não cabiam na mesma frase; como seria possível que o homem destinado a mim era praticamente um desconhecido completo? É claro que eu sabia quem era o duque, todos sabiam, mas conhecer a figura pública que ele era, não era o mesmo que conhecer o homem por detrás da riqueza e dos elogios infinitos.
  O Duque de Andoza era conhecido basicamente por seu status social, um homem quase vinte anos mais velho que eu, o qual se orgulhava de ter mais propriedades do que qualquer pessoa do Reino, além da Rainha, é claro. A morte prematura do Rei antes mesmo que a Rainha pudesse gerar um herdeiro, o fez ser acolhido pela realeza como o filho perfeito que nunca puderam ter, assim ele era o próximo na linha de sucessão, destinado a se tornar rei antes mesmo de atingir a meia idade. E é claro que meu pai, Marquês de Erwin, viu em mim a oportunidade perfeita para subir alguns degraus de importância acima.
  Respirei fundo tentando acalmar a onda de pânico que começava a se formar e pedi licença, me afastando até a varanda da loja. A vista era tão alta que dava para ver todo o lado direito de Andoza, desde o castelo opulente da rainha até o vilarejo de Méhin, onde a loja se situava. Olhando para baixo, avistei os aldeões trabalhando, bebendo, conversando, sorrindo uns para os outros com uma leveza que causava uma pontada de dor em meu coração: eles eram livres como eu jamais seria.
  - Querida, venha testar seu sapato. Seu design é cravejado de pequenos cristais de diamante, tenho certeza de que irá amar! – dessa vez a voz mais terna e gentil vinha de Madame Ellin, a dona da loja.
  Limpei rapidamente uma lágrima teimosa que escapara e estava prestes a voltar em direção às moças que me aguardavam ansiosas quando me prendi - ou melhor, me perdi - em um par de olhos verdes que me fitavam como se eu fosse uma presa. Me inclinei sobre o parapeito para observá-lo melhor, notando um sorriso maroto alcançar seus lábios e um aceno como cumprimento em minha direção. Senti meu coração palpitar ao notar sua aparência distinta das outras pessoas do vilarejo: uma calça de camurça preta e um camisão largo e branco, além do chapéu preto que o protegia do sol escaldante da manhã. Sorri involuntariamente, pronta para – imprudentemente – acenar de volta quando ouvi meu nome ser chamado e me virei para perceber as moças me chamando de dentro da loja e me encarando com curiosidade; fiz um aceno para que aguardassem um minuto mais, e quando me virei novamente, ele havia sumido.

  O dia pareceu passar rápido depois de ter visto o rapaz estranho no vilarejo, houve mais algumas escolhas de roupas e enxoval para o casamento, além de um chá da tarde excruciante com as minhas damas de honra, nenhuma delas uma amiga verdadeira, apenas escolhas de jovens mulheres que meu pai considerou elegantes, bonitas e com dinheiro o suficiente para serem boas companhias.
  Pouco antes do jantar pude, finalmente, ter um pouco de descanso de todos os sorrisos falsos e conversas superficiais para encontrar a única pessoa com quem podia realmente me abrir e falar tudo que sentia: Noah, meu tutor e melhor amigo. O que posso dizer? Apesar de seus defeitos, meu pai se preocupava que eu não passasse vergonha na corte sendo completamente estúpida, portanto, eu tinha acesso a um tutor particular que deveria me ensinar somente o básico para que eu parecesse culta, mas não em demasiado para que fosse mais inteligente do que qualquer homem que eu conhecesse. Sendo um ótimo tutor, Noah sempre fez questão de me ensinar o máximo possível, afinal ele sabia que aprender coisas novas era a única distração que realmente me apetecia.
  Noah notou meu estado de espírito e me olhava com um olhar caridoso, como se compreendesse a dualidade de estar preso à uma vida que não representa sequer um pedaço de seu ser. Contei à Noah todas as minhas inseguranças e incertezas, me debulhando em lágrimas enquanto me sentia sufocar com as escolhas feitas para mim, mas o pior de tudo naquele novo cenário ao qual me destinava, era a solidão. Noah já havia sido dispensado pelo meu pai, não era prudente que uma mulher casada tivesse aulas particulares com um homem, e se já estava casada, não havia mais nada que fosse necessário aprender, exceto por como ser uma boa e obediente esposa. Como um bom amigo, Noah convenceu meu pai de que havia mais algumas informações importantes que poderiam ser úteis à vida de casada, as quais ele ficava feliz em me ensinar sem cobrar absolutamente nada, como um presente de casamento.
  - Eu não sei se posso fazer isso. – murmurei entre lágrimas, sentindo o abraço reconfortante e sincero de meu melhor amigo – eu realmente não sei, Noah, parece que estou caminhando rumo ao precipício.
  Ouvi o suspiro preocupado de Noah e, em seguida, antes mesmo que eu pudesse perceber o que estava acontecendo, ele se desvencilhou de mim e caminhou até o meu guarda-roupa, fuçando por entre as peças e escolhendo um vestido vermelho antigo e desbotado que meu pai jamais permitira que eu usasse em público, afirmando com sua voz grave que essa cor não era apropriada para jovens damas de respeito, e me deixando de castigo por uma semana por ter comprado a peça em primeiro lugar.
  - Esse é perfeito. Vista-se. – olhei para ele como se tivesse ficado louco, sem compreender aonde queria chegar – , não há tempo para explicar agora, levante-se, enxugue seu rosto e vista-se.
  Ainda incerta com a mudança de atitude de Noah, fiz como ele me ordenou, colocando o vestido e encarando com espanto minha aparência no espelho. A última vez que havia usado o vestido fora há dois anos, quando estava prestes a completar dezesseis, meu corpo havia mudado desde então, e as curvas mais acentuadas do meu corpo faziam com que o vestido ficasse mais apertado do que era recomendado, os seios quase saltando pelo decote.
  - Está perfeita. – Noah elogiou, colocando sua capa preta sobre meu ombro e o capuz sobre meus cabelos. – Agora vamos.
  Segui em passos rápidos atrás de Noah, tentando acompanhá-lo, uma tarefa que não era nada fácil considerando que o garoto parecia quase correr. Notei confusa que ao invés de seguir em direção à saída principal, seguíamos por corredores mal iluminados pelos quais nunca havia passado antes.
  - Noah! O que você está fazendo? Se meu pai nos pega rondando pela propriedade a noite e ainda por cima comigo vestida desse jeito, ele manda cortar sua cabeça! – resmunguei tentando manter o tom de voz o mais baixo possível.
  - , seu pai jamais rondaria por esses lados da mansão, aqui é a ala dos serviçais. Além do mais, pelo horário, ele já deve ter ido dormir, tem uma reunião com o Duque logo pela manhã.
  A atitude de Noah me surpreendia mais a cada minuto, mas a curiosidade e a emoção de escapar das asas do meu pai mesmo que por uma noite logo me fez ignorar qualquer outra reclamação que surgisse em minha mente. Somente depois de andar por quinze minutos, chegamos a uma carroça que parecia quase caindo aos pedaços. Noah conversou com o dono por alguns segundos e o mesmo logo entregou as rédeas para meu amigo, se afastando sem sequer olhar em minha direção.
  - Noah, para onde você está me levando? – perguntei cruzando os braços e arqueando a sobrancelha.
  - , minha querida amiga, estou lhe dando a oportunidade de não ser você por uma noite. Para onde vamos, ninguém vai lhe reconhecer, e mesmo se reconhecessem, ninguém se importaria com seu título ou com quem você vai se casar. Hoje você pode esquecer de seu pai, do Duque, das insuportáveis damas de honra e até mesmo do seu nome, se quiser. Apenas viva, por uma noite, se preocupe em viver como você nunca viveu antes.

A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos. (Chaplin)

  Eu não reconhecia nada, nem ninguém presente na praça completamente enfeitada de cores e ornamentos diversos. A música que tocavam em instrumentos que jamais vira era diferente de tudo que já havia ouvido em vida, mas ainda assim atingiam meus ouvidos com uma sonoridade tão convidativa que era impossível não ser persuadida a mover pés e braços de acordo com o ritmo contagiante. Olhei ao redor para as pessoas presentes, todos dançando, comendo, bebendo e se divertindo como se não houvesse qualquer preocupação no mundo. As pessoas ali eram diferentes, se moviam com outra cadência, as mulheres se vestiam com cores vivas e decotes profundos que deixavam evidente seus lindos corpos bronzeados em movimento; e os homens se vestiam de maneira tão única quanto as mulheres, calças largas e leves e camisões que os homens do meu vilarejo só usariam para dormir. Era evidente olhando para aqueles corpos dançantes a razão pela qual Noah insistira em minha troca de roupa, eu estava um pouco mais próxima de parecer pertencer ao lugar.
  Noah sorriu largamente ao notar minha expressão de espanto e fascínio e se aproximou para tirar a capa que cobria meus ombros e escondia parcialmente meu rosto, se afastando em seguida e prometendo voltar logo, deixando-me sozinha a receber alguns olhares curiosos e outros sorrisos calorosos de recepção. Incerta do que fazer, comecei a caminhar até um canto da praça onde havia comidas e bebidas dispostas à regalia, observando com atenção algumas iguarias que nunca tivera a oportunidade de provar, mas pareciam extremamente apetitosas.
  - Prove este. Tenho certeza de que vai gostar. – em sobressalto me virei para a voz atrás de mim, encarando os mesmos olhos azuis e profundos que vira mais cedo da varanda da loja. O choque de vê-lo novamente seria o suficiente para me paralisar, mas o que fez meu coração palpitar no peito e a respiração quase escapar de meus pulmões foi notar a beleza única de seu rosto que parecia esculpido pelos próprios Deuses. – O gato comeu sua língua, milady?
  Lembrando de responder algo, balancei a cabeça para afastar o feitiço que ele parecia ter lançado sobre mim e fitei novamente seu rosto, notando um sorriso zombeteiro dominando seus lábios. Me forçando a parar de encará-lo, estendi a mão para pegar a taça que ele oferecia, sorrindo em agradecimento. O silêncio nos envolveu por alguns minutos, mas eu estava tão preocupada em conter a vermelhidão no meu rosto ao reparar sua camisa aberta deixando à mostra boa parte do seu peitoral definido, que nem conseguia me preocupar.
  - Prove. – ouvi sua voz sedosa encorajar, seus olhos azuis parecendo ter o poder de me hipnotizar, pois bastou ouvi-lo que imediatamente levei a taça aos lábios provando a melhor bebida que já tomara em toda minha vida, tão absolutamente deliciosa que um leve gemido escapou dos meus lábios, enquanto o sorriso do rapaz à minha frente se alargou. – Dance comigo.
  O poder hipnótico de seu olhar, é claro, foi instantâneo, e antes que eu pudesse notar o que estava fazendo já havia tomado mais um gole da bebida, deixando-a sobre a mesa, e aceitado sua mão estendida, seguindo em direção ao centro da praça, onde a multidão dançava alegremente.
  Aparentemente, os Deuses realmente gostariam de me desafiar a viver uma nova vida naquela noite, pois assim que chegamos à praça, um ritmo mais leve e cadenciado, romântico e sensual, passou a ser tocado pelos músicos. Com o sorriso maroto que parecia ser sua marca registrada, o estranho rapaz se aproximou um pouco mais do que o decoro social permitiria, mas ao olhar ao redor envergonhada, logo notei que todos ali faziam o mesmo.
  - Eu não sei dançar assim. – disse rapidamente, sentindo minhas bochechas corarem ainda mais ao ser invadida pelo calor do seu corpo. Ele se aproximou mais, envolvendo minha cintura com suas mãos e me puxando para ainda mais perto, seu corpo alto e esguio se moldando perfeitamente ao meu, antes de encostar sua bochecha na minha e sussurrar em meu ouvido.
  - Não se preocupe, milady, basta relaxar e deixar que eu conduzo. – meu cérebro logo registrou o duplo sentido da frase, mas eu não tinha certeza se ele, de fato, tinha a intenção de me cortejar, ou se era uma projeção dos desejos que ele despertava em mim.
  Procurei seus olhos uma vez mais, me permitindo mergulhar na profundidade de seu olhar que parecia fazer um convite silencioso, enquanto o calor que irradiava de seu corpo dominava cada pedaço do meu, me fazendo incendiar em uma ardência que jamais sentira antes, suas mãos em minha cintura levando meu corpo a movimentar-se em reflexo do seu, com uma fluidez e sensualidade que jamais poderia ter sonhado. A música se enredou em outra e em outra, e o tempo parecia ter parado enquanto me sentia imersa em sua presença, obcecada por seus toques sedosos em minha pele. Seu rosto agora estava enterrado em meu pescoço, enquanto ele inalava meu perfume com uma devoção perceptível.
  - Seu cheiro é tão inebriante... que preciso usar toda a minha força de vontade para não te beijar até fazer você perder os sentidos. – quando as falas dele registraram em minha mente me afastei um pouco, batalhando entre admitir que meus instintos mais primitivos também ansiavam por beijá-lo, e lembrar a mim mesma que aquele era um desejo proibido que jamais poderia se concretizar. Ele pareceu entender minha batalha interna, pois logo acrescentou com um sorriso malicioso – Não precisa se assustar, milady, jamais farei algo que você não queira.
  E esse era exatamente o problema: eu queria, como jamais quis tanto algo em minha vida, era como se ele instigasse em mim todos os desejos reprimidos por anos, como se ele pudesse satisfazer cada uma das minhas vontades. Ele era a personificação de tudo que eu sempre quis e nunca poderia ter: liberdade, aventura, diversão e imprudência.
  Me afastei subitamente, sentindo o calor se esvair de meu corpo quanto mais distante ficava de seu encanto. Alcancei a taça de bebida que havia deixado sobre a mesa e virei de uma única vez, percebendo talvez um pouco tarde demais que não era a mesma bebida, essa parecia ser mais forte, o álcool parecendo mais pungente, embora o sabor fosse quase tão gostoso quanto o primeiro. Me virei para observá-lo e notei que ele já não estava mais no centro da praça, onde o havia deixado. É claro, por que estaria?
  Fechei os olhos e respirei fundo tentando acalmar meu coração palpitante, só precisava me lembrar que ele era um desconhecido completo, potencialmente perigoso. Eu sequer sabia o seu nome, e ele certamente não era o tipo de companhia que meu pai aceitaria que eu tivesse por perto. Abri os olhos novamente e olhei ao redor, procurando e não encontrando o menor vestígio de Noah. Ótimo, agora estava completamente sozinha em um vilarejo desconhecido, cercada de pessoas desconhecidas.
  Decidida a não sucumbir ao nervosismo e cair em prantos ali mesmo, achei que talvez beber mais um pouco poderia ajudar a acalmar meus nervos, portanto procurei pela mesa repleta de comidas e bebidas até encontrar um jarro de bebida que se parecia com a que bebera mais cedo, saboreando com felicidade o líquido doce e ácido que dominava meu paladar. Estava prestes a levar outro copo aos lábios quando senti um olhar insistente em minha direção e notei que, ao fim da longa mesa com banquete, o charmoso desconhecido me encarava da mesma forma que havia feito quando o avistei da loja de vestidos pela manhã. Tomada por uma coragem que não sabia que havia em mim, e que talvez fosse influência da bebida em minhas mãos, tomei o líquido no copo em um só gole, seguindo determinada em sua direção, e notando um sorriso maroto se apossar de seus lábios assim que notou minha pretensão.
  - Qual é o seu nome? – questionei incisiva, uma parte de mim se recusava a continuar pensando nele como um desconhecido, e a outra parte estava simplesmente morrendo de curiosidade.
  - Hum. – foi a única resposta que ele deu antes de assumir uma posição pensativa, como se ponderasse se eu deveria saber seu nome ou não. Por fim seu olhar suavizou e sua voz de veludo apresentou o nome que me parecia uma representação perfeita do rapaz – .
  - Não vai perguntar o meu nome? – incitei, arqueando a sobrancelha em zombaria.
  - Acredito que todos aqui sabem seu nome, Milady. Não é todo dia que temos a oportunidade de estar tão próximos da realeza, quem dirá a futura rainha do reino. – pude ouvir o amargor e julgamento em sua voz, e o lembrete da minha vida real foi como um balde de água fria.
  Me afastei novamente, determinada a encontrar Noah em meio à multidão dançante, me espremendo entre corpos suados e tentando escapar das mãos que me puxavam para juntar-me ao ritmo musical. A atmosfera no lugar parecia exatamente a mesma, mas já não conseguia ver beleza nas cores e ornamentos, ou me deixar embalar pelos sons mágicos produzidos pelos músicos; minha cabeça parecia girar em vertigem, meu corpo parecia pesar mais a cada instante que passava e tentava com todas as forças segurar as lágrimas que ardiam em meus olhos.
  Finalmente avistei o perfil magro e pálido de Noah em um canto escuro da praça, conversando com outro rapaz com o mesmo tom dourado de pele que os outros presentes na festa. Me aproximei de meu amigo como se ele fosse meu bote salva vidas e me joguei em seus braços, que me abraçou mesmo sem compreender o que acontecia.
  - ? O que houve? Alguém te machucou? – perguntou preocupado ao notar as lágrimas que não pude mais segurar.
  - Podemos voltar, por favor? – respondi com outra pergunta, percebendo com uma sensação aterrorizante que, não importava o quanto eu tentasse fingir – mesmo que por uma noite – que eu era alguém diferente, uma pessoa comum com um destino cheio de possibilidades, a realidade não deixaria de voltar e me fazer encarar a verdade nua e crua.
  Noah assentiu à minha pergunta, se despedindo rapidamente do rapaz com quem conversava e colocando sua capa novamente em meus ombros e sobre meus cabelos, me abraçando e praticamente me carregando de volta para a carruagem de onde viemos. Antes da carruagem dar partida, olhei uma vez mais ao redor da praça, notando os olhos azuis me encarando em meio à multidão.
  Noah me deixou em casa por volta de três horas da manhã, preocupado em me acompanhar até meu quarto, mas o assegurei de que ele poderia voltar para a festa e se divertir pelo resto da noite. Não havia motivo algum para que ele se sentisse tão miserável quanto eu. Caminhei pelos corredores mal iluminados até encontrar a porta do meu quarto, tirando o vestido imediatamente e vestindo a camisola de cetim para me certificar de que meu pai jamais me visse naquele vestido novamente.
  Deitei-me em minha cama sem o menor sinal de sono, meu corpo ainda quente pela bebida e o efeito de em mim, ainda me lembrava com vividez do toque de suas mãos me conduzindo pela dança e o calor de seu corpo junto ao meu. Como era possível que uma pessoa completamente desconhecida despertasse em mim desejos tão profundos? Sem conseguir evitar, imaginei como seria beijar seus lábios, quão deliciosamente proibido deveria ser o sabor de seu beijo?
  Minha mente tentava pensar em todos os motivos pelos quais pensar em daquela forma era simplesmente errado, quando ouvi o barulho na varanda. Demorei alguns segundos decidindo se me escondia embaixo da cama, checava o que fizera barulho ou simplesmente saía correndo gritando por ajuda. Desci da cama em um salto ao ouvir o barulho novamente, prestes a escolher a última opção, quando ouvi a voz de quem há pouco perturbava meus pensamentos.
  - Milady. - disse simplesmente, batendo levemente na porta de vidro. Sem querer acreditar nos meus ouvidos, peguei o castiçal na mesa de cabeceira e me aproximei cautelosamente, afastando a cortina para dar de cara como . Seus olhos, como sempre, foram a primeira coisa que notei, mergulhando naqueles azuis profundos, antes de descer meu olhar para seus lábios carnudos, imediatamente me lembrando das imagens que dominaram minha mente alguns minutos antes, meu rosto vermelho de vergonha. Por fim, notei o gesto que fazia com a mão para que o deixasse entrar. O que ele fazia ali? Atordoada, abri o tranco da porta, o deixando adentrar meu quarto sem me lembrar que vestia apenas uma camisola fina.
  Seus movimentos foram tão rápidos que sequer tive tempo de registrar o que ele fazia até sentir seu calor ao encostar seu corpo no meu, suas mãos deslizando pelos meus braços e pousando em minha cintura, e – se fosse possível – minhas bochechas queimavam ainda mais enquanto sentia um ardor me consumir por inteira.
  Depois de se certificar de que estávamos o mais próximo um do outro possível, sua mão direita traçou um caminho lento até meu rosto, seu polegar tocando meu lábio inferior com uma concentração desconcertante antes de emaranhar-se em meus cachos. Abri a boca tentando formular alguma frase, mas a tentativa logo foi silenciada ao sentir seus lábios colidindo com os meus. No momento que senti seus lábios nos meus foi como se uma chama se acendesse em mim, e sem ter qualquer controle sobre minhas ações, minhas mãos envolveram seu pescoço, tentando trazê-lo para mais perto. respondeu com um leve gemido de rendição, aprofundando o beijo com uma intensidade que foi imediatamente retribuída. Meu primeiro beijo. E não foi nada romântico e fofo como acontecem nos livros. Foi eletrizante, intenso e selvagem, seu beijo era como uma premissa da minha perdição.
  Quando nossas mãos já não se continham paradas, explorando diferentes partes dos corpos um do outro e tentei sem pensar tirar a camisa que vestia, segurou minhas mãos, quebrando o beijo e o encanto no qual eu parecia me encontrar. Abaixando o olhar mortificada, me afastei alguns passos, perguntando mais para mim do que para o rapaz à minha frente.
  - O que foi isso? – Será que ele estava de fato em meu quarto, ou tudo aquilo era um sonho da minha cabeça e eu acordaria a qualquer momento para perceber que o belo desconhecido havia dominado meus pensamentos de tal forma que não conseguira escapar nem mesmo em sono.
   - Não podia terminar a noite sem beijar a mulher mais bela da festa. – o ouvi responder, e quando levantei o olhar notei que ele já estava próximo à porta da varanda, um sorriso maroto dominando seus lábios antes de acenar em despedida, sumindo noite afora.
  Devo admitir, o choque de toda a situação me paralisara de tal maneira que somente alguns minutos depois consegui comandar minhas pernas a se moverem, seguindo na direção da varanda e procurando pelo gramado da propriedade, sem notar qualquer rastro do rapaz que há pouco me segurava em seus braços. Ainda em transe, voltei para meu quarto, trancando o fecho da porta da varanda e desligando as luzes antes de me enfiar para debaixo das cobertas. O sono me atingiu rapidamente, mas sonhos que nunca tivera antes me mantiveram inquieta noite adentro, fantasias proibidas com um belo desconhecido.

“A prisão não são as grades, e a liberdade não é a rua. (Mahatma Gandhi)

  Encarei as olheiras sob meus olhos com a testa franzida em irritação. Meu pai havia ordenado que eu fosse acordada cedo e submetida a um tratamento de beleza no decorrer do dia, pois teríamos um jantar com o Duque e a Rainha naquele dia, a primeira vez que encontraria meu noivo e estaria próxima o suficiente para que pudéssemos conversar ou - como pontuou meu pai - a primeira vez que ele estaria próximo o suficiente para conferir seu prêmio, portanto precisava estar linda como nunca.
  Em uma tentativa vã de espantar o sono, tomei mais um gole de café, ignorando as camareiras que se ocupavam em fazer minha manicure, pedicure e cabelo, a última delas ralhando sobre meus cachos volumosos e tão embaraçados que pareciam não ver um pente há dias.
  O dia passou entre diferentes banhos, cremes, massagens - que até ajudaram no nervosismo, mas me deixaram com ainda mais sono - provas de vestido e, por fim, a maquiagem. Quando finalmente me vi livre das camareiras, olhei no espelho uma vez mais, notando que, realmente, a maquiagem fizera milagres em esconder a noite mal dormida. O vestido branco me fazia parecer pura e inocente, como provavelmente era a pretensão, os brincos de pérolas e as joias banhadas em ouro davam o toque perfeito para que eu parecesse uma princesa, a qual se materializou de um conto de fadas.
  Apesar do dia ocupado, o belo desconhecido apareceu em meus pensamentos com mais frequência do que gostaria de admitir. Alguns momentos me imaginei fugindo, correndo até ele e me jogando em seus braços pronta para renunciar a tudo que sempre fui criada para valorizar. Em outros, imaginava se ele causaria o mesmo efeito em mim se fosse um nobre rico como o duque, se ele fosse o homem com quem seria obrigada a me casar mesmo mal o conhecendo. E ao lembrar de sua aparência destemida, os olhos azuis hipnotizantes e os lábios tentadores, sabia que a resposta era sim, bastaria um beijo ou mesmo um olhar, e jamais poderia resistir.

  Naquele mesmo dia, algumas horas depois, lá estava eu na presença da rainha, que me observava com aprovação, embora com tentativas constantes de me testar, com perguntas estrategicamente pensadas para analisar minha reação e atitude. Meu pai parecia nas nuvens pela honra de estar presente, fazendo de tudo para agradar a rainha e o duque com elogios forçados; enquanto eu me ative a responder as perguntas direcionadas a mim, mantendo-me em silêncio na maior parte do tempo.
  - , minha querida, não pude deixar de reparar que você não está se alimentando bem, a comida não é do seu agrado? – perguntou a rainha me tirando de meus devaneios uma vez mais.
  - Por certo que não, sua majestade, a comida é excelente! Estou apenas um tanto nervosa pela sua companhia.
  Sua risada se fez ouvir por todo o salão de jantar, antes que ela tocasse minha mão em um afago.
  - Bobagem, querida, estamos em família aqui. é como um filho para mim, portanto tenho certeza de que você será como a filha que nunca tive também. – sua voz doce me fazia crer que esse era exatamente seu desejo, e uma parte de mim se sentiu um pouco mais tranquila em relação ao casamento. – , você é um rapaz de sorte, meu querido – continuou a rainha – é a própria personificação da beleza, vocês terão herdeiros belíssimos.
  - Você está definitivamente certa, Julienne. Ela é a personificação da beleza. – concordou o Duque me fazendo levantar o olhar em sua direção, encontrando seus olhos azuis esverdeados me fitando com admiração. Aproveitei o momento para observar seu rosto com calma pela primeira vez, não havia como negar que ele era um belo homem, alto, cabelos escuros, atlético, tudo que poderia se esperar de um duque. Quando percebi seu sorriso de quem havia notado minha análise, logo abaixei o olhar, corando envergonhada, e tratando de prosseguir o resto do jantar da mesma forma que o havia iniciado, em silêncio.

  Ao fim do jantar, a Rainha nos direcionou a uma pequena sala de estar, na qual pudemos comer a sobremesa e tomar café, mas ela logo tratou de persuadir meu pai a acompanhá-la para observar um de seus artefatos favoritos, deixando o Duque e eu completamente sozinhos, algo um tanto incomum de se acontecer, devido à necessidade de manter o decoro social. Tentei me manter o mais distante possível, considerando o tamanho pequeno do recinto, mas segui na direção oposta ao Duque, concentrando toda minha atenção nas pinturas da parede. Estava concentrada a tal ponto que somente notei a aproximação do Duque quando ele estava logo atrás de mim, suas mãos deslizando ousadamente pela minha cintura e seu rosto se afundando em meu pescoço, de modo que pudesse melhor sentir o meu cheiro.
  - Seu cheio é incrível. – sussurrou por entre meus cabelos, apertando a mão em minha cintura e juntando seu corpo ao meu, fazendo um calafrio percorrer minha espinha. – Mal posso esperar para você ser minha. – continuou, a voz um pouco mais grave enquanto sentia seu lábio tocar minha nuca.
  - Duque, por favor, creio que essa atitude não é apropriada. – disse cerrando os dentes. Quem ele pensa que é para me tocar dessa forma?
  - Shh... está tudo bem, querida, eles não voltarão tão logo. – respondeu sem se afastar um milímetro que fosse, sua mão esquerda percorrendo meu braço até encontrar a alça do vestido, a deslizando um pouco para baixo e expondo meu ombro para que pudesse beijá-lo, senti um pânico crescente na boca do estômago, um tremor percorrendo meu corpo.
  - Duque, por favor, se afaste. – pedi, tentando me movimentar para me afastar do seu corpo, mas sendo imediatamente barrada, seus braços envolvendo minha cintura e me mantendo no lugar.
  - Tão pura e ingênua, parece um passarinho assustado. – ouvi o sussurro em meu ouvido com uma sensação terrível se instalando em mim – Está tudo bem, querida, vou te ensinar tudo que você precisa saber... e quando for minha, vou poder te tocar quando e como eu quiser. – complementou, me girando para que pudesse encarar seus olhos que pareciam arder em desejo.
  E, repentinamente, tão rápido como havia se aproximado, ele se distanciou, sentando-se em uma poltrona do outro lado da sala, no tempo exato em que meu pai e a rainha adentraram pela porta com largos sorrisos estampados em suas faces. Balancei a cabeça tentando dissipar a áurea de terror que havia se apossado de mim e adotei a postura impassível que meu pai me ensinara desde tenra idade, seguindo assim pelo resto da noite, embora – por dentro – meu coração palpitava e minha mente não podia deixar de imaginar qual seria meu destino nas mãos do temível Duque de Andoza.

  Acordei na manhã seguinte com um humor ainda pior do que quando havia dormido na noite anterior. Nem mesmo a presença de Noah serviu para me animar minimamente, e notando que não havia muito que pudesse fazer a respeito, meu velho amigo tentou me distrair com a lembrança do belo estranho na festa que havíamos ido.
  - Acredito que tenha sido a garota mais invejada da festa, minha amiga. O lendário Capitão Hakham, mais conhecido como “O Saqueador” é extremamente cobiçado.
  - Capitão? O que quer dizer? Ele faz parte da Marinha? – perguntei, ansiosa por saber mais sobre .
  - Oh, , como você é ingênua! Acredita mesmo que um capitão oficial da Marinha de Andoza estaria em meio à ciganos e lacaios às margens do vilarejo?
  - Não entendo. Como ele pode ser um capitão, então? – insisti, tentando imaginar o belo rapaz explorando os mares em seu navio.
  - “O saqueador” não lhe diz nada? Ele é um pirata, minha querida. E, digo mais, se você não parecesse tão encantada por ele naquela festa, eu seria obrigado a intervir, a fama dele não é das melhores.
  - E qual seria a fama dele? – continuei mesmo sabendo que quanto mais soubesse de , mais estaria tentada a fazer parte de seu mundo.
  - Bom, além de ser um criminoso aos olhos da Coroa, o que já é ruim por si só, o saqueador é conhecido por sua impulsividade e pelos corações partidos que deixa a seu redor. – disse a última parte me olhando diretamente nos olhos, como se estivesse à procura de alguma informação.
  - Não se preocupe, Noah, não tenho a menor intenção de ter meu coração partido por um pirata. – o tranquilizei, sabendo muito bem que meu coração já havia se partido há muitos anos, quando descobrira que em minha vida não havia espaço para romances, sonhos tolos e devaneios.
  - Ótimo. Agora... – Noah suspirou com um semblante triste dominando sua face, estendeu as mãos para segurar as minhas e então completou – , essa é a última vez que nos veremos, minha amiga, e acredito que seja o momento perfeito para lhe contar.
  Fiquei em silêncio, me esforçando para ignorar a informação de que esse seria nosso último encontro. Eu já sabia, é claro, que não havia espaço para nossa amizade quando estivesse casada com o Duque, eu soubera desse fato há alguns meses, quando meu pai anunciara o noivado, mas entre saber e vivenciar havia uma grande distância.
  - Amanhã, após o seu casamento, eu vou embora do Reino. – arregalei meus olhos em espanto e estava prestes a questioná-lo quando ele levantou a mão em sinal de espera, continuando seu relato – Andoza não é o melhor lugar para alguém como eu, . Eu conheci alguém muito especial, você deve se lembrar do rapaz com quem conversava na festa. – Assenti, um tanto confusa. – O nome dele é Antonie, e nos tornamos noivos no mês passado. Como você já deve saber, em Andoza o nosso amor é proibido e tanto Antonie, quanto eu, podemos ser mortos por isso. Antonie já viajou por diversos reinos com sua gente, e ele conhece lugares em que podemos viver em paz, sem sermos perseguidos pelo que sentimos, então é o que faremos.
  Quando Noah terminou seu discurso, a única coisa que pude fazer foi abraçá-lo com todo amor que tinha por ele, jamais poderia imaginar como ele devia se sentir, fugindo de sua casa para ser feliz com quem amava, mas ao mesmo tempo entendendo exatamente a necessidade de ser livre e buscar sua felicidade.
  - Noah, você merece toda a felicidade do mundo, meu amigo.

“A paixão é ver o fogo e querer brincar com ele.” (Honoré de Balzac)

  Depois de tranquilizar Noah acerca de seu relacionamento, garantindo que sentia apenas felicidade por ele e seu noivo e que esperava que eles tivessem uma ótima vida juntos, o convenci a me levar novamente para a praça que me levara há dois dias para que eu pudesse conhecer Antonie. Esperamos até que meu pai estivesse dormindo para escapulir pelos corredores escuros dos serviçais novamente, e a viagem foi ainda mais rápida do que da primeira vez, embora a ansiedade que eu sentia fazia com que cada minuto parecesse uma vida; uma parte de mim ansiava por encontrar com o belo pirata uma última vez, a oportunidade de mergulhar em seus lindos olhos sendo tentadora demais para negar.
  A praça estava bem mais vazia dessa vez, e não havia nenhuma festa acontecendo, mas um grupo de pessoas faziam música do lado direito da praça, enquanto outros dançavam em reação ao som contagiante. Encontramos Antonie em sua casa, e conversar com ele foi tão fácil quanto conversar com Noah, e enquanto ouvia com atenção a história de como se conheceram e de seu amor improvável, pude me distrair o suficiente para não lembrar do Duque e do quão próximo do fim estava a vida que conhecia.
  Duas horas depois pedi licença aos rapazes, permitindo que aproveitassem algum tempo sozinhos, e partindo em uma caminhada determinada pela praça à procura dos olhos azuis que não escapavam da minha mente. Caminhei por todo o lugar sem qualquer sinal do pirata, e estava prestes a desistir quando ouvi sua voz atrás de mim em meio às sombras de um corredor cercado por casas, logo ao fim da praça.
  - Procurando por mim, milady? – me virei imediatamente, encarando seus olhos hipnotizantes e traindo meu autocontrole ao fitar seus lábios grossos e deliciosamente beijáveis, lábios esses que se abriram em um sorriso zombeteiro ao notar minha atitude. Ele não disse mais nada, mas pude ver o convite implícito em seus olhos antes que ele se virasse e caminhasse pela escuridão do corredor, e antes que pudesse frear a mim mesma, lá estava eu seguindo seus passos.
  Apressei meus passos para acompanhá-lo, com medo de perdê-lo de vista, mas logo notei que ele entrava em uma casa de dois andares ao fim da alameda, de frente ao mar. Sem pensar duas vezes, voltei a me apressar em sua direção, adentrando a porta aberta pela qual ele passara sem bater ou questionar, para logo sentir meu corpo ser empurrado contra a porta que se fechou atrás de mim. Subitamente, seu corpo estava junto ao meu e o calor que sempre me dominava quando o sentia próximo voltou a me consumir, suas mãos se emaranharam pelo meu cabelo no mesmo momento que minhas mãos se prenderam em sua camisa o puxando para mais perto, seus lábios colidindo com o meu. Beijá-lo era como ópio, extremamente perigoso, mas irrefutavelmente viciante, e quanto mais o beijava, mais próximo o queria. deslizou suas mãos por minhas costas, bumbum e coxas até encontrar o melhor ângulo para me levantar, usando a porta como apoio para minhas costas enquanto eu envolvia minhas pernas ao redor de seu corpo, suspirando ao notar seu membro enrijecido tocando em minha parte mais íntima.
  Noah havia me ensinado sobre anatomia feminina e masculina em nossas aulas, fazendo questão de me explicar tudo que acreditava ser importante para que eu estivesse preparada em minha noite de núpcias, mas nenhuma explicação poderia captar com precisão a maneira como meu corpo respondia à de forma automática e intensa. Deslizei minhas mãos pelo peitoral exposto pela camisa semiaberta sentindo cada músculo de seu corpo definido tensionar com o meu toque, enquanto seu quadril se movia para encaixar-se mais perfeitamente com o meu, as roupas parecendo um desserviço à nossa vontade de grudarmos um no outro.
   quebrou o beijo para depositar beijos por meu maxilar e pescoço, soltando meu cabelo do coque em que estava preso e observando com admiração a maneira como meus cachos escuros emolduravam meu rosto.
  - Tão linda. – disse antes de selar nossos lábios novamente, se esforçando para levantar os tecidos do vestido e tocar minhas coxas por debaixo dos panos, fazendo com que um gemido escapasse por meus lábios ao sentir seus dedos tocarem minha virilha. – Está brincando com fogo, milady, e se é isso que você quer...
  - Sim – respondi antes que ele terminasse o que dizia – É isso que eu quero. – completei, puxando sua camisa e arrancando os últimos botões antes de deslizá-la por seus braços, tendo livre acesso ao seu torso que parecia esculpido com perfeição e levando meus lábios ao seu pescoço, chupando e mordendo sua pele até ouvir um gemido gutural escapar de sua garganta. Seus dedos encontraram seu caminho até meu sexo, tocando-me com uma maestria que me levou a segurar seus braços com força para manter-me em posição, seus lábios procurando os meus em um beijo intenso para disfarçar meus gemidos.
  Seus toques no meu ponto íntimo eram o suficiente para que calor irradiasse por todo meu corpo e sensações incríveis que nunca havia sentido antes dominassem meu corpo e mente, mas quando ele introduziu um de seus dedos em mim acompanhado de sua língua em meu pescoço, um tremor involuntário se apossou de mim e o gemido se tornou algo mais, meu quadril se movendo na direção da sua mão que já se encontrava molhada com o meu gozo.
  Mal tive tempo de me recuperar do meu primeiro orgasmo, me levou no colo até o andar de cima, adentrando um quarto com paredes escuras e duas portas gigantes de vidro que permitiam a entrada da luz da lua. Ara me colocou no chão em frente ao que presumi ser sua cama, suas mãos trabalhando com pressa e precisão para tirar as peças que cobriam minha nudez. Paralisada, apenas permiti que ele me despisse completamente, embriagada demais pelas sensações que ele me causava para me importar com a vergonha de ser vista nua por um homem pela primeira vez, ou mesmo de me preocupar que estava prestes a perder minha virgindade para um homem que ainda era um desconhecido quase por completo, na noite anterior a do meu casamento.
  - Perfeita. – elogiou com um sorriso maroto nos lábios, observando com uma atenção desconcertante cada pedaço exposto do meu corpo nu. Se aproximando novamente, o belo pirata me beijou intensamente uma vez mais, me empurrando com delicadeza em direção à cama antes de dizer com a voz rouca – Eu quero sentir o seu gosto.
  Deitada na cama, suspirei em antecipação ao sentir seus beijos subindo pelas minhas pernas e coxas até chegar em minha vulva, beijando-me delicadamente antes de começar a – como ele disse – sentir meu gosto, me levando às nuvens com sua boca. A cada minuto e a cada nova sensação que ele me proporcionava, mais certa eu estava de que ali era exatamente onde deveria estar, em seus braços.
   parecia incansável, e seus gemidos quase superavam os meus, me deixando saber que ele estava gostando tanto quanto eu de nossa pequena aventura. Seus lábios somente deixaram minha intimidade quando sentiu meu corpo tremer em mais um orgasmo, sua boca saboreando meu gozo com avidez. Estava tão imersa no prazer que se espalhava por cada parte de mim, que mal notei o momento que se livrava do resto de suas roupas, unindo seu corpo ao meu uma vez mais.
  - Milady... – sua voz tremia de desejo. – tem certeza de que é isso que deseja? – respondi assentindo a cabeça e o puxando para mais perto, beijando-o apaixonadamente.
  Paixão. Era exatamente esse o sentimento que apagava qualquer sinal de juízo da minha mente e fazia com que cedesse a meus instintos mais primitivos. O pirata sobre mim despertava em mim uma paixão tão tórrida que parecia como fogo, que se alastra e queima tudo por onde passa, não dando espaço para escapar. A paixão que me lançara em seus braços, foi a mesma que me fez gritar em um misto de dor e prazer ao senti-lo dentro de mim, e me guiou noite adentro enquanto nossos corpos se uniam como um e os movimentos, toques e beijos se tornavam cada vez mais selvagens.
  Naquela noite, naquela fatídica noite, entendi que viver não é sobre seguir regras e fazer aquilo que é esperado de mim para manter-me segura das dores e problemas do mundo. Viver é sobre ser livre para fazer suas escolhas, sejam elas boas ou ruins, e se permitir fazer aquilo que seu coração anseia mesmo que as consequências não sejam tão previsíveis ou perfeitas como esperamos. E, ser aprisionada nos sonhos de outrem, não era uma vida para mim, não após ter provado o gosto da liberdade nas mãos de um belo pirata.

  ARAN POV

  Acordei com a luz clara do sol incomodando minha retina, demorando alguns segundos para notar que estava nu na cama, percebendo que a luz vinha das portas da varanda abertas. Esfreguei os olhos para olhar com mais atenção, reparando na figura de branco inclinada sobre o parapeito. Ao observar a maneira como a luz do sol brilhava sobre sua pele castanha, reconheci a minha camisa branca que parecia um vestido sobre seu corpo esbelto, escondendo as curvas que pareciam um caminho para o paraíso.
  Sentado na cama, relembrei os acontecimentos inesperados da noite anterior. Havia pensado que o beijo que lhe dei em seu quarto seria a única lembrança que levaria comigo, mas agora tinha comigo algo muito mais difícil de esquecer: seu gosto, seus toques, a sensação única e viciante de seu sexo molhado me prendendo da maneira mais gostosa possível. Nada do que aconteceu foi planejado, nem por mim, nem por ela, mas ainda assim parecia predestinado.
  Olhei novamente para seu corpo esguio inclinado sobre o parapeito e imaginei como seria tê-la todos os dias, mergulhar em seu corpo sempre que quisesse, me perder em seu calor, mas sabia que isso seria impossível. Ela estava destinada a outro homem, e eu estava destinado ao mar.
  Ainda assim, não pude deixar de cogitar por um minuto apenas que, ela seria a mulher perfeita para mim, e que se eu não fosse quem eu fosse – um saqueador condenado aos olhos da sociedade, sempre em fuga e sempre em perigo – e ela não fosse importante como era – filha de um Marquês, prestes a se casar com um Duque, rumo à se tornar Rainha algum dia – talvez pudéssemos ter algo além de uma noite de sexo intensa e memorável. Mas, ao menos sabia que jamais a esqueceria, e que ela provavelmente não se esqueceria de mim.
  Me permiti fantasiar com seu corpo mais uma vez, observando suas coxas torneadas, o bumbum arrebitado marcado pela camisa branca, os cabelos cacheados completamente desgrenhados, e me perguntei se não deveria caminhar até ela e tomá-la ali mesmo, na varanda, tendo o mar como testemunha. Fantasia essa que logo foi interrompida ao notar que ela se inclinava um pouco mais do que deveria, em menos de um segundo seu corpo se virou completamente sobre o parapeito, caindo mar abaixo.

  PRÓLOGO

  Apertei o casaco de Antonie sobre mim com mais força, observando o Reino de Andoza cada vez mais distante, me perguntando o que meu pai faria ao notar que eu havia desaparecido no dia do meu casamento.
  Após a melhor noite da minha vida com , concluí que seria impossível voltar para as asas de meu pai e me casar com o medonho Duque. Da varanda do pirata, pulei ao mar, nadando de volta até o corredor por onde perseguira o mesmo na noite anterior e correndo até a casa de Antonie, pedindo para que ele e Noah me levassem junto em sua fuga do Reino. Noah aceitou sem titubear, me emprestando algumas roupas de Antonie para substituir minhas roupas molhadas e se apressando a ajeitar as coisas para nossa partida. Aproveitamos que ainda era cedo, cedo demais para ter muitos olhares à espreita antes de seguirmos em direção ao barco que haviam reservado, iniciando nossa viagem mar adentro.
  Olhei em direção à casa do pirata, tentando enxergar sua figura ao longe, mas não havia ninguém ali. Teria de me contentar com a lembrança de seus lábios, seus braços, seu corpo junto ao meu, e a consciência que me deu, de que viver é muito mais do que sobreviver.

“Procuro viver intensamente todos os meus “agoras”, tão intensamente como se fosse minha última hora, tão honestamente como se fosse durar eternamente.” (Diego Vinicius).

Fim