%Bruno% baixou a tampa do notebook em que ouvia aquele podcast horrível. Fofocas sem nenhum embasamento, feitas sem medidas para criar fake news e transformar a vida dele um inferno.

  Porque é óbvio que ele se sentia mal.

  Deitou na cama do hotel e permaneceu encarando o teto por um tempo.

  Havia algo naquele besteirol todo que era verdade:

  %Brenda%, de fato, passava mais tempo com Diego Assunção do que ele.

  É claro que a justificativa se devia ao fato de que eles eram uma dupla. Tenistas no topo de suas incríveis carreiras; os dois estavam próximos de se tornarem campeões olímpicos, tanto nas de gênero, quanto na mista. Já fazia dois anos que a dupla havia se formado para chegarem a este exato momento.

  %Bruno% adoraria estar 100% feliz com sua namorada e seu parceiro, mas fica difícil quando Diego é um fenômeno internacional, possui diversos contratos que o tornaram milionário muito cedo e está prestes a se tornar um dos 5 tenistas mais jovens a ganhar um grand slam.

  – Merda - ele dá um soco no travesseiro.

  O som da campainha do quarto soa e tudo o que ele deseja é se enforcar com o travesseiro e não precisar enfrentar a a realidade.

  A realidade de que, aos 18 anos, %Bruno% Lagoa não sabe o que quer da vida.

  Ele soube esconder e disfarçar bem da última vez que encontrou com %Brenda% e toda a turma que anda com ela quando está em treino.

  Na verdade, não é nada difícil para ele fingir que está tudo bem quando %Brenda% está por perto. Quando se separam, no entanto, é o momento em que ele percebe toda a tensão em seu corpo, que grita para que pare com toda a mentira.

  – %Bruno%, caralho, vamos nos atrasar para a janta!

  É a voz de Leonardo, seu melhor amigo.

  Todos estavam no Rio de Janeiro para prestigiar %Brenda%. Haviam pego um voo de São Paulo e passariam as duas semanas olímpicas acompanhando os jogos da amiga e aproveitando tudo o que a cidade maravilhosa havia para oferecer.

  A única pessoa que decidiu ficar trancada no quarto do hotel foi %Bruno%.

  Ninguém se importou no começo. Todos dividiam a opinião de que ele era um fantoche de %Brenda%. Ela, apesar de ser uma ótima pessoa e amiga, era uma péssima namorada. Nunca esteve nos momentos importantes para %Bruno% junto dele; sempre deu a desculpa de que a carreira a consumia.

  – Acho que não vou, cara - %Bruno% disse logo que abriu a porta.

  – Porra, %Bruno%, você ficou o dia inteiro enfurnado nesse quarto. 'Bora sair com o pessoal, nos divertirmos um pouco! É nossa primeira viagem com todo mundo maior de idade, vamos encher a cara!

  – Esse é meu medo, Leo. Po, amanhã é a final da %Bre% e todo mundo não está nem aí. Não é para isso que viemos?

  Leonardo colocou as mãos na cintura e respirou fundo.

  – Cara, vamos conversar rapidão - ele empurrou o amigo para dentro do quarto e fechou a porta atrás de si. – Está todo mundo pisando em ovos com você, mas acho que já deu.

  %Bruno% olhou para o amigo já sabendo o que viria para frente. Parte de si queria receber aquele sermão. Esperava por ele há tempo, já que não tinha forças para sair de onde estava.

  Agora que iria acontecer, não sabia se realmente queria ouvir as verdades.

  – Nós viemos por causa de você, %Bruno%. Porque achamos que você fosse se divertir com a gente ao invés de só ficar se dedicando à %Brenda%. - Leonardo suspirou e sentou ao lado do amigo na cama desarrumada. – É claro que vamos ver ela jogar, mas desde o mês passado ela vem recusando todas as ligações, inclusive suas, com a desculpa de que precisa treinar. Porra! Que tipo de treino a impede de mandar pelo menos um áudio dizendo como foi o dia? Ela não caga?

  – Leo…

  – Enquanto isso você está aí, se trancando no quarto com medo de aborrecer uma pessoa que não está nem aí para você.

  – Ela está perseguindo um sonho. Uma carreira. É normal que eu seja comp…

  – Corno, você quer dizer.

  – O quê?

  – Todo mundo ouviu o podcast Delas. Estamos putassos e enchendo a caixa de mensagem delas com emoji de cocô. Mas isso não muda o fato de que você precisa se tocar, cara!

  %Bruno% podia sentir as próximas orelhas se tornarem vermelhas pela vergonha. Parte também de raiva por estar sendo alvo de fofoca entre os amigos e de todos concordarem que ele era um corno.

  – Não me leve a mal, %Bruno%, mas acho que você podia se priorizar um pouco.

  – E como eu faço isso? - sua voz saiu em um sussurro.

  Leonardo foi pego de surpresa pela pergunta. Ao encarar o rosto do melhor amigo, soube que era genuína. %Bruno% estava em um loop de emoções sem saber como sair.

  Suspirou e passou a mão pelo rosto. Olhou ao redor e então de volta para o amigo.

  – Primeiro, se troca. Vamos sair com o pessoal.

  %Bruno% respirou fundo ao ver %Brenda% caminhar em sua direção quase que saltitando, o sorriso estampado no rosto formando uma pequena covinha na bochecha esquerda. Ele amava aquela marca; quando ela aparecia, significava que a namorada estava feliz.

  – Oi, bebê!

  – Parabéns, %Bre%. - ele ergueu um enorme buquê de flores que surpreendeu tanto %Brenda%, que a garota mal percebeu que ele a havia chamado pelo mesmo apelido que todos os amigos dela a chamavam, e não seu namorado.

  – Nossa, obrigada! - %Brenda% fez menção de dar um beijo no namorado, mas ele olhou para o lado. – Eu sei. Eu sei. Me desculpa. Eu queria poder ter encontrado com você lá no Rio, mas não consegui ser liberada. Eu precisava voltar com a comissão… existiam tantas regras! Podemos deixar isso passar? Hein? Por favorzinho…

  Sim, era a resposta que ele queria dar. Que ele costumava sempre dar.

  Ele sempre respondia tudo o que %Brenda% queria ouvir. Durante 3 anos, tudo o que %Bruno% fez foi se deixar ficar na escuridão da sombra dela e apoiá-la incansavelmente, mesmo quando, na verdade, deveria estar cuidando do próprio futuro.

  Ele a amava tanto. Ela, por outro lado, amava mais a carreira como tenista.

  – Decidi mudar de curso na faculdade.

  %Brenda% olhou para o namorado surpresa e deu um passo para trás.

  – Como?

  – Nunca gostei de administração. Decidi mudar.

  – Mudar? Para o quê? Por quê?

  %Bruno% riu.

  – %Brenda%, eu acabei de falar o motivo. Vou fazer gastronomia.

  – O quê? De onde surgiu isso, %Bruno%? Você nunca cozinhou! Como é que pode decidir uma coisa dessas sozinho?

  – Se você passasse tempo o suficiente comigo, saberia que cozinho todos os dias na minha casa, já que meus pais são péssimos. Você não se lembra do nosso último dia dos namorados?

  – Você disse que aquilo tinha sido uma aventura! - %Brenda% percebeu que estava aumentando o tom de voz e parou de falar. Fechou os olhos e respirou fundo. – Tudo bem, vamos falar sobre isso. Era para ser um reencontro feliz, mas você consegue transformar tudo em um drama sobre a sua vida, né?

  – Bem, aí é que está, %Brenda%. Eu não estava planejando um reencontro feliz.

  A garota olhou para ele confusa.

  %Bruno% respirou fundo. Bem fundo. Enquanto sentia o ar entrar, observou a namorada que acreditava tanto amar.

  Mas, como diz um ditado pouco dito, até o amor adoece.

  E, com toda a coragem reunida dentro de seu peito, %Bruno% disse:

  – Vamos terminar.