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#009 Temporada

Quarter Past Midnight
Bastille



Secrets Are Flowing

Escrita por Luisa Silva | Revisada por Natashia Kitamura

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  – Daniel, tem um assunto muito sério que a gente precisa conversar. O Smith queria vir, mas com ele seria muito pior, então eu me ofereci. - o técnico Gally falou e fez uma pausa enquanto Daniel se mexia impacientemente na cadeira de couro, em frente à mesa de vidro do escritório. A enrolação estava deixando o rapaz moreno cada vez mais nervoso. - A comissão descobriu alguns comportamentos no seu... estilo de vida... que não combinam com a imagem do nosso time. - Gally falou devagar e Danny começou a ter uma ideia sobre o que era aquela conversa. A apreensão e o medo o paralisaram durante a próxima fala do homem sentado à sua frente. - Acho que você já sabe sobre o que eu estou falando, mas eu tenho que deixar bem claro. Se a sua... relação com outros homens vier a público, você sabe o que vai acontecer com a imagem do Vorpal Sword pra todo mundo, desde os patrocinadores, até os torcedores. Isso sem falar na sua carreira, que potencialmente vai estar acabada. Afinal, ninguém quer um viadinho no time. - O técnico concluiu e se recostou em sua cadeira, esperando alguma resposta do jogador.
  Danny não estava respirando direito, mas a dor em seu peito não se resumia a isso, ele sabia. Estava confuso, com raiva e, principalmente, aterrorizado. Sua carreira no futebol, a paixão de sua vida, não podia acabar simplesmente porque ele não era hetero. Ele tinha que arrumar um jeito de evitar isso, mas a raiva e o medo não o estavam deixando pensar com clareza.
  – E vocês querem que eu faça o quê? Não dá pra parar de ser 'viadinho'! - ele disse tentando não aumentar muito o tom. Pela expressão de Gally, não teve muito sucesso.
  – Garoto, não fala alto comigo. Se Smith estivesse aqui, teria te dado uma surra na primeira oportunidade, então agradece por eu só estar conversando. - Gally bateu as mãos na mesa com irritação, mas logo voltou ao seu semblante resignado. Soltou um suspiro, passou a mão pelo rosto e voltou a encarar Danny, que não conseguia disfarçar a dor e a fúria que estava sentindo. - Olha, se você fosse filho meu eu ia te matar, mas como não é, quem você leva pra cama não é da minha conta. O que a comissão sugeriu é que você mantenha as aparências, pelo menos até a gente decidir o que fazer. Pessoalmente, eu acho que você não pode dar bandeira de jeito nenhum e tem que evitar o Smith  e os outros por pelo menos um mês, até a poeira baixar um pouco.
  Sentindo o sangue ferver de raiva, o jogador assentiu.
  – Acho que eu consigo 'manter as aparências', como eu mantive a minha vida toda. - falou com sarcasmo. - Treinador, todo mundo sabe que eu saio muito, mas eu sempre tomei cuidado, eu nunca 'dei bandeira' e não vai ser agora que eu vou começar. - Concluiu firme. - O que exatamente vocês descobriram, afinal? - Danny perguntou ao perceber como foi burro por não ter negado tudo desde o começo e pedido provas.
  – GayMaleTube.com te lembra alguma coisa?
  – Vocês invadiram o meu computador? - De alguma forma, tudo ficou ainda mais vermelho na visão de Daniel. Gally apenas deu de ombros, sem responder. O jogador levantou-se abruptamente da cadeira, tentando conter a vontade de gritar e sair quebrando o escritório inteiro. Apoiou as mãos na mesa e inclinou-se para frente, deixando o rosto a centímetros do do homem mais velho, e falou no tom mais ameaçador que conseguiu: - Isso é ilegal, eu vou processar vocês.
  Gally soltou uma risadinha debochada, não se intimidando por nem um segundo, e rolou os olhos.
  – Sabe que se fizer isso sua carreira já era. O melhor que você pode fazer é ficar quietinho na sua e fingir que nada está acontecendo. - o treinador proferiu calmamente e continuou sem esperar uma resposta. - Pode ir agora. Se alguma coisa mudar eu te chamo de novo. - dispensou.
  Ainda fumegando, Danny saiu da sala pisando duro.

***

  Quase uma semana depois, a conversa ainda ecoava na mente de Daniel.
  "Ninguém quer um viadinho no time."
  "Se fizer isso sua carreira já era."
  O garoto já não aguentava mais, precisava sair, se distrair, pelo menos por uma noite.
  Estava sentado no balcão de mármore sua cozinha comendo distraidamente o sanduíche que havia comprado depois do treino do dia, o pensamento muito distante dali, quando recebeu uma mensagem no celular:
  "Wassaaap"
  Danny leu a mensagem e não conseguiu conter o sorriso, sentindo o coração palpitar com mais força. William Haynes provocava esse tipo de reação no jogador sempre que estava presente, fisicamente ou não. Não propositalmente, o olhar de Daniel parou por alguns momentos na foto de perfil do outro rapaz, que mostrava o seu semblante descontraído parcialmente coberto por um óculos escuro, os cabelos loiros voando no vento da praia, onde a foto fora tirada.
  "E ai"
  O moreno respondeu simplesmente. A próxima mensagem não demorou nem um minuto para chegar.
  "Vai fazer o que mais tarde?"
  "Nada. E mesmo se fosse fazer, desmarcaria pra ficar com você", era o que Daniel queria responder, mas sabia que só faria tudo ficar estranho.
  Quando se conheceram, há mais ou menos seis meses, Will e Danny se atraíram de cara. O fotógrafo estava trabalhando em uma campanha de roupas da esportivas em que Danny era um dos garotos propaganda, e durante toda a sessão de fotos Will não conseguia tirar os olhos do jogador. Danny tentava ser mais discreto, mas qualquer um que estivesse prestando atenção saberia que ele também estava interessado. Na mesma noite, por um acaso do destino (lê-se: pelas habilidades investigativas de Will), os dois se encontraram em um bar discreto e passaram o resto da noite juntos. Desde então, tinham uma espécie de esquema fixo de booty call que funcionou perfeitamente, até que Danny começou a desenvolver sentimentos por Will, algumas semanas antes. Sem saber se eram recíprocos e com medo de arruinar a relação que eles tinham, o esportista decidiu não dizer nada.
  "Nada"
  Ele enviou simplesmente, já sabendo o convite que viria a seguir.
  "Cacciatori's as onze?"
  "Te vejo lá"
  Marcaram. Daniel terminou de comer já se sentindo marginalmente melhor. Sabia que sair para beber com Will no momento não era a melhor das ideias, mas tentou afastar esses pensamentos e focar na parte divertida da noite.

***

  Durante o resto da tarde e o início da noite, porém, as preocupações de Danny voltaram. O Cacciatori's era um clube pequeno e escuro, porém aconchegante, servia bebidas decentes e normalmente não lotava a ponto de ser desconfortável, mesmo em noite de sexta-feira. Apesar de saber que a chance de ser visto com Will e reconhecido como o lateral do Vorpal Sword era pequena, ele estava apreensivo.
  Por isso, ao chegar, Danny foi direto ao fundo do local, onde ficava o bar. Pediu um shot de vodca e o virou de uma vez assim que o copinho foi colocado à sua frente, pedindo outro em seguida. Queria que o álcool fizesse efeito logo para poder relaxar e curtir a noite fora.
  Quando Will chegou, Danny já estava no terceiro shot.
  – Eu vou te dar um beijo, se você não gostar, pode devolver. - o loiro sussurrou em um tom sensual e brincalhão no ouvido do garoto, que ainda estava virado para o balcão. Sentindo-se arrepiar, Danny girou no banquinho, ficando de frente ao outro, e inclinou o rosto para cima, em algo que só podia ser lido como um convite.
  Will estranhou a atitude, mas não ia perder uma oportunidade tão rara, então cedeu e deu um leve beijo nos lábios do esportista. O loiro sabia que Daniel, compreensivelmente, não era fã de demonstrações públicas de afeto, mas o seu comportamento incomum logo foi parcialmente explicado pelos três copinhos vazios atrás de Danny. Sentou-se no banco ao lado, pediu ao barman o mesmo que Danny estava bebendo e voltou a fitar os recipientes transparentes. - Dia difícil?
  – Semana difícil. - Daniel respondeu, mas não elaborou. Apesar de todo o álcool já ingerido e pela feição aparentemente relaxada, os ombros de Danny estavam tensos e seu sorriso não chegava aos olhos, notou Will. Não sabia porque, mas a visão o fez querer abraçar o moreno e o confortar, beijá-lo até o convencer de que tudo ficaria bem, eventualmente.
  – Quer conversar?
  – Não. Quero beber.
  O próximo shot os dois viraram juntos.
  Por um tempo, só conversaram sobre amenidades, observando o local encher com o público de sexta-feira. Lentamente, Danny começou a relaxar de verdade, afetado pela companhia de Will e pelo álcool, a vodca tendo sido trocada por cerveja depois do quarto shot. A pista de dança, que ocupava a frente do estabelecimento, era onde a maior parte das pessoas ficava, ocasionalmente vindo ao bar para pedir alguma bebida. Sempre que alguém se aproximava demais, Danny abaixava o rosto em uma clara tentativa de se esconder, o que exasperava Will profundamente. A irritação não era causada pelo moreno, mas sim pelas pessoas que o faziam esconder quem ele realmente era. Tendo convivido por seis meses, Will entendia porque Danny agia assim e já estava relativamente acostumado, mas naquela noite o jogador estava sendo mais cuidadoso do que nunca, beirando o paranoico.
  – E como tá o time? - o loiro indagou casualmente, pois sabia que se fosse direto ao ponto Danny se esquivaria da pergunta.
  O sorriso solto desapareceu do rosto do esportista no mesmo instante, fazendo Will se arrepender de ter questionado. Danny não disse nada por um tempo, girando lentamente a longneck que segurava, quase acabada, e a olhando como se fosse a coisa mais interessante do mundo. Levantou o rosto abruptamente e deu um sorriso largo e obviamente forçado após finalizar a bebida e pousar a garrafa no balcão.
  – Vamos dançar. - disse e puxou Will pela mão até o aglomerado de pessoas se movendo no ritmo da música.
  A reação inesperada surpreendeu Will, mas ele resolveu deixar passar. "Vou deixar você fugir e fingir que nada está acontecendo, mais uma vez", pensou o loiro enquanto seguia Danny, que logo encontrou um espaço satisfatório para dançar.
  A bebida servida podia ser decente, mas a música definitivamente não era. O DJ tocava uma eletrônica ruim e sem letra após a outra, mas o público não parecia se importar, o álcool tornando tudo mais tolerável. Para qualquer pessoa observando, Danny estava se divertindo plenamente, movendo-se sem se importar com nada, mas Will o conhecia. A maneira como passava o olhar pelas pessoas ao redor rapidamente a cada momento e como estava mantendo-se afastado de Will, apesar de claramente querer chegar mais perto, revelava a sua apreensão, que o garoto logo percebeu era causada pelo medo de ser reconhecido por alguém. Em uma tentativa de deixar o outro mais confortável, Will foi se aproximando do canto lateral da pista, levando Danny consigo e o deixando de costas para as outras pessoas. Imediatamente a tensão do moreno se amenizou e ele aproximou seu corpo do outro rapaz, que sorriu, comemorando internamente. Esse pequeno gesto foi todo o necessário para Danny se soltar e permitir que William finalmente passasse os braços em torno de sua cintura e o beijasse, como estava querendo durante toda a noite.
  – Vamos sair daqui. - Will pediu alguns minutos mais tarde, quando finalmente separaram os lábios por tempo suficiente para falar, mas ainda sem desgrudar um do outro.
  – Ainda nem deu meia noite e meia, tá cedo. - Danny afirmou com a voz arrastando após olhar a hora em seu celular, marcando meia noite e quinze.
  Como resposta, Will abaixou o rosto e capturou os lábios de Danny novamente em mais um beijo quente, deslizando a mão esquerda por sua nuca e a direita por baixo de sua camiseta, a pousando em sua lombar.
  – Ok, ok, vamos. - Daniel manejou, sem fôlego e ainda de olhos fechados, aproveitando a sensação das mãos de William passeando pelo seu corpo. O loiro apenas riu e o puxou em direção à saída do clube, tendo parado para pagar as bebidas dos dois e pegando mais uma garrafa de cerveja para cada um no caminho.
  Passaram cambaleando pela pequena porta de metal e foram prontamente atingidos pelo ar frio da noite. A rua não estava exatamente deserta, mas o movimento era mínimo, apenas umas duas pessoas fumando e conversando na esquina e alguns carros estacionados.
  Daniel virou a garrafa escura que pegou de Will na boca, dando grandes goles no líquido inebriante. Queria calar a voz ao fundo de sua mente que dizia que ele já estava bêbado o suficiente e que era perigoso andar pela rua nesse estado, pois poderia cometer um deslize que acabaria com tudo, sem falar na dor de cabeça infernal que teria pela manhã.
  Conseguiu ignorar esses pensamentos ao ver William espelhar o seu movimento, sabendo que não estaria sozinho. Estar com Will em um local aberto provocou uma série de outros pensamentos complicados e irritantes, então Danny se esforçou para se distrair. Observou o garoto abaixar novamente o vidro marrom e passar a língua pelos lábios, gesto que arrancou de sua mente qualquer ideia coerente que não envolvesse beijar Will até nenhum deles lembrar o próprio nome.
  Por sorte, Will ainda tinha um pouco de consciência e arrastou Danny para uma rua lateral verdadeiramente deserta, onde podiam fazer exatamente o que queriam sem se preocupar de serem acusados de atentado ao pudor.
  Algum tempo mais tarde - nenhum dos dois saberia dizer quanto - os beijos e carícias trocadas foram se acalmando, e por alguns momentos os dois rapazes apenas aproveitaram o silêncio na companhia um do outro. Nessas horas, depois que o desejo intenso e consumidor passava e a quietude tomava conta do espaço em que estavam, Danny se deixava levar por seu coração, que queria mais do que tudo que aquilo fosse real, que sua relação com Will não fosse apenas casual e sem sentimentos envolvidos. Um pouco tarde pra isso, o moreno pensou, mas não disse nada. Passou a mão lentamente pelo cabelo de Will, que estava pressionado à sua frente, mantendo a cabeça apoiada em seu ombro e as mãos em seu quadril, enquanto Danny recostava-se na parede sem reboco. Mesmo se revelasse o que sentia a ele, Danny sabia que não podiam ficar juntos, não podia arrastá-lo para a complicação que era a sua vida de verdade, não seria justo.
  – Vamos dar uma volta. - Will ofereceu e desgrudou seu corpo do do outro garoto, que imediatamente sentiu falta de seu calor, arrepiando-se com o ar gelado que tomou o lugar antes ocupado por ele. Daniel assentiu e afastou-se da parede, à procura das garrafas ainda meio cheias de cerveja que tinham depositado no chão algum tempo antes. Saíram do beco e voltaram à rua da frente do Cacciatori's, mas continuaram andando em frente, sem rumo, em um silêncio confortável, usando um ao outro como suporte, logo terminando as bebidas e jogando os recipientes em um canto qualquer.
  Dois ou três quarteirões depois, Daniel parou abruptamente ao ver uma lata de tinta spray aparentemente abandonada no chão, próxima a um muro branco. A ideia surgiu na mente do jogador repentinamente, e a vontade de realizá-la aumentava a cada passo que dava em direção ao pequeno cilindro de metal.
  – O que você tá fazendo? - William questionou quando o viu pegar a lata e balançá-la, aproximando-se do muro.
  – Uma coisa maluca. - só pra provar que eu posso, completou mentalmente, mas o loiro entendeu mesmo assim. Sabia que tentar impedir não ia adiantar de nada, pois Danny bêbado era teimoso demais, sem mencionar que Will não estava em melhor estado de sobriedade.
  Danny escreveu algo na parede em letras garrafais e afastou-se da parede. Assim que Will conseguiu ler o que era, seu coração acelerou.
  Love is not a crime, podia ser lido em preto, e ao lado via-se um coração consideravelmente menor apresentando as iniciais do par na parte de dentro, ligadas por um símbolo de 'mais' e acompanhadas por dois escudos de marte* entrelaçados.
  William não pensou duas vezes antes de fechar o espaço existente entre eles em passadas largas e capturar os lábios de Danny em um beijo acalorado, mas diferente de todos os outros que já havia dado, sem dar a chance de o jogador depositar a tinta no chão. O esportista não era afetuoso em nenhum sentido da palavra, portanto aquele gesto, por mais estranho que fosse, significou muito para Will, que entendia o tanto de coragem aquela semi-declaração havia demandado. Por mais que tentasse esconder, Will não podia negar que também sentia o mesmo por Danny, que com aquele ato revelou a ele um pouco mais de seu coração.
  Estavam tão distraídos com a explosão de emoções e o calor do momento que não perceberam o flash de uma foto sendo tirada e nem ouviram o som de um carro se aproximando, só se separaram ao ouvir uma voz grossa e passos vindo em sua direção.
  – Além de vagabundo tinha que ser viado, né. - o policial falou quando saiu do lado do motorista da viatura, apertando o botão de gravação na pequena câmera grudada em seu colete. Parou de andar abruptamente ao aproximar-se do par. - Puta que pariu, é isso mesmo que eu to vendo? Daniel McClare pegando outro macho? E ainda pixando o muro de um hospital?
  Nenhum dos dois respondeu, apenas encararam o homem, sem reação. Danny tentou pensar em algum jeito de sair daquela situação, mas a bebida e o pânico estavam enevoando sua mente. Eu estou completamente fudido, era o que ecoava na cabeça do rapaz.
  – Os dois, pro carro, sem gracinha. Não vou algemar vocês a não ser que vocês me obriguem. - Outro policial saiu do carro segurando outra câmera. - Caralho, é o nosso dia de sorte, Cameron. - ele disse olhando para o outro oficial. - Tá ligado em quando o League Express vai pagar por essas fotos?
  O primeiro policial - Cameron - sorriu de lado enquanto abria a porta para os outros dois entrarem. Ainda em choque, aproximaram-se do veículo e entraram no banco de trás, sem dizer nada.
  Completamente fudidos.

***

  Os dois policiais entraram na delegacia arrastando Will e Danny pelos braços como se fossem prêmios, mesmo eles não tendo oferecido nenhuma resistência. Quase toda a equipe da noite torcia para o Red Queen, o maior rival do Vorpal Sword, então enquanto a papelada necessária era preenchida, os oficiais não podiam estar mais felizes.
  – Aquele timeco vai desmoronar, agora que vão demitir o único lateral que não era um merdinha completo.
  – Pelo visto era sim, só escondia no quê.
  – Aposto dez libras que já rolou uma orgia no vestiário.
  Danny tentava ignorar o que ouvia, mas sua cabeça estava a ponto de explodir, os efeitos do álcool tendo infelizmente passado durante o longo caminho. Will estava visivelmente mais calmo, mas os sintomas da ressaca também já eram sentidos por ele. Não demorou muito e todos os formulários estavam preenchidos e os dois foram levados a uma cela de contenção, tendo os policiais dito que de manhã eles poderiam fazer uma ligação cada um.
  O cubículo de cimento tinha apenas uma cama, se um banco de cimento com o colchonete de menos de 10cm podia ser chamado de cama, e um sanitário de metal que parecia não funcionar desde os anos 90. Os dois entraram e imediatamente Will sentou no colchonete, usando a parede para encostar a cabeça e fechando os olhos, a dor de cabeça aumentando a cada segundo. Danny não o imitou, preferiu ficar andando pelo espaço, dando três passadas de uma parede a outra.
  – Você está fazendo minha cabeça doer mais. - disse o loiro ainda de olhos fechados, pouco tempo depois.
  – Will. Foda-se. - O jogador parou de andar de repente, virando-se para o garoto, com olhos vermelhos. Will abriu os olhos, perplexo, pois nunca tinha visto Daniel com tanta raiva. Não, não era raiva. O sentimento estampado no rosto do esportista era aflição, desespero. - Você não tá entendendo. Eu vou ser demitido, e provavelmente nunca mais vou jogar profissionalmente na vida. Meu time vai me odiar, eu vou ser... - Sua voz quebrou e uma lágrima solitária desceu por seu rosto, mas foi logo interrompida por um movimento brusco de sua mão direita.
  – Você não tem certeza disso. E além do mais, não tem nada que a gente possa fazer agora. - Will racionalizou. - Senta. Tenta descansar. Amanhã a gente resolve.
  Danny respirou fundo e sentiu a exaustão tomar conta de seu corpo, sabendo que o rapaz tinha razão. Sentou-se ao lado de Will em um movimento fluido e deixou seus corpos pressionados um contra o outro, mas não olhou em seus olhos. Sem perceber, encostou a cabeça no ombro do loiro e caiu em um sono agitado.

***

  – McClare! Haynes! - um policial gritou para a cela enquanto abria a grade, acordando os dois em um susto. - A multa de vocês foi paga, estão liberados.
  Levantaram devagar, as cabeças explodindo em agonia tanto pela ressaca quanto pela falta de água e comida desde o início da noite anterior. Saíram da cela, recuperaram seus celulares e carteiras  e voltaram à parte da frente da delegacia, dando de cara com o treinador Gally. O homem estava vermelho e com os punhos fechados, os olhos semi-cerrados e fixos em Daniel como se estivesse se segurando para não avançar no rapaz. Lançou um olhar desgostoso a Will e virou-se para a saída sem ainda dizer nada, apenas indicando que eles deveriam o seguir.
  Gally sentou no banco do motorista e arrancou com o luxuoso carro preto assim que William fechou a porta do banco de trás. O silêncio dentro do automóvel foi ensurdecedor até o primeiro sinal vermelho, quando o técnico esticou a mão para o banco ao seu lado e levantou uma pequena pilha de papéis, em seguida a jogando entre Danny e Will, que estavam sentados o mais distante possível um do outro.
  – Olha, eu não sei o que você pensou que 'manter as aparências' significava, mas definitivamente não era isso. - O homem grisalho indicou os jornais com um movimento da cabeça.
  O carro voltou a se mover pouco tempo depois, mas logo parou novamente no trânsito de Londres. Já era perto de dez da manhã quando Gally chegara na delegacia, então a imprensa já havia tido bastante tempo para produzir suas matérias de capa do dia. Enquanto lia a chamada do primeiro jornal da pilha, Danny ouviu o treinador perguntar a Will seu endereço, mas a conversa estava abafada a seus ouvidos. Na capa do League Express estava estampada uma foto de péssima qualidade exibindo as costas de Will ao lado do muro pixado por Danny. O jovem loiro pressionava o jogador, que ainda segurava a lata de tinta, contra a parede com seu corpo. Danny começou a ler, já se sentindo péssimo.

  Daniel McClare deveria mudar seu número para 24 ou 163?
  O lateral do Vorpal Sword passou a noite no xadrês por ter sido visto pixando um muro do St. Sebastian General Hospital nesta madrugada junto a outro rapaz, ainda não identificado. Os dois foram flagrados em um momento íntimo por uma dupla de polícias que patrulhava o local...

  Outros jornais esportivos apresentavam manchetes semelhantes. Ao final da pilha, porém, havia um par de revistas de fofoca, o que surpreendeu o Danny. Ele sabia que algo do tipo aconteceria, mas não esperava que a história fosse sair do ciclo do esporte. A HelloMagazine estampava na capa a mesma foto do muro, e na matéria na parte de dentro da revista eram vistas outras fotos de Danny, mais definidas, e mais uma em preto e branco, certamente vinda das gravações da polícia.

  Babado envolvendo jogador de futebol
  Daniel McClare é o assunto do dia após ter sido preso por atos de vandalismo na madrugada de sexta. O gato foi flagrado pela polícia com a lata de tinta na mão e... beijando outro cara!!! Daniel joga no Vorpal Sword FC e não é um rostinho muito conhecido fora do mundo do futebol, mas com essa polêmica, com certeza vai ser...

  – Ei - William chamou suavemente. Danny levantou os olhos da revista e percebeu que estavam aproximando-se da casa do outro rapaz. -, você vai ficar bem. - Não era uma pergunta, mas Danny assentiu segurando as lágrimas. Ele se recusava a chorar na frente de Gally.
  Antes de sair do carro, Will esticou a mão e tocou o braço de Danny em um gesto confortante. Seus olhares se encontraram, mas logo Daniel abaixou os olhos de volta para o próprio colo.
  – Vai, garoto. Aproveita enquanto a mídia ainda não descobriu quem você é direito. - Gally proferiu bruscamente. Will saiu sem responder, bateu a porta e ficou na calçada observando o veículo afastar-se até o perder de vista.
  O resto do caminho até a casa de Daniel foi feito em um silêncio constrangedor, até que o treinador o quebrou novamente, antes que o garoto alcançasse a maçaneta do carro.
  – Daniel, pelo amor de Deus, não piora as coisas. Você tá suspenso dos treinos essa semana e tá proibido de dar entrevista até a comissão resolver o que fazer. Fica em casa e não abre a porta pra ninguém. - Danny fechou os olhos e respirou fundo, querendo que o pesadelo acabasse logo. - Entendeu? - o treinador insistiu, tentando capturar a atenção de Danny pelo retrovisor. O jogador abriu os olhos com esforço e assentiu, o que agravou sua dor de cabeça. - Ótimo. Agora vai, que eu tenho muita coisa pra resolver.
  Gally destrancou as portas e Daniel saiu do carro rapidamente. Entrou em casa sem olhar para trás e fechou a porta da frente o mais rápido possível, recostando-se nela e escorregando até o chão. Recolheu as pernas, apoiou os cotovelos nos joelhos e escondeu o rosto nas mãos.
  Tudo estava desabando ao seu redor, e Danny só queria... queria tanta coisa. Primeiramente, queria beber uns três litros de água e comer uma quantidade proporcional de qualquer coisa, e tomar algum remédio para passar aquela dor de cabeça infernal. Queria tomar banho para se livrar do cheiro de álcool ainda impregnado em suas roupas. Queria dormir para parar de pensar em como tudo que ele sempre temeu estava se tornando realidade. Queria voltar para a noite anterior e dispensar o convite de Will. Queria não ter conhecido Will-- não, isso não. Nunca se arrependeria de ter conhecido William, de ter deixado o garoto entrar em sua vida e trazer toda a sua tranquilidade e leveza junto. Will sempre fez bem a Danny, sempre conseguia arrancar um sorriso do garoto, em especial recentemente, quando Danny apaixonou-se por ele. Acima de tudo, queria estar com Will de verdade, sem ter que arrastá-lo pela bagunça da sua vida.
  Ficou naquela posição por não sabia quanto tempo, até ser trazido de volta à realidade pela vibração do seu celular, sinalizando a bateria baixa. Antes que o aparelho desligasse, tirou-o do bolso e checou a tela, que mostrava dezenas de mensagens e quinze chamadas perdidas, sendo pelo menos três de sua mãe e uma de Will. Passou a mão livre pelo cabelo em frustração enquanto a bateria chegava a zero. Levantou devagar e, sentindo a cabeça latejar, finalmente foi fazer algo sobre seu estado deplorável.

***

  Quando estava suficientemente recuperado, Danny ligou para a sua mãe e explicou o que tinha acontecido na madrugada anterior, mas não respondeu quando ela perguntou sobre o que os técnicos pensavam da situação. A conversa não foi pior do que Danny esperava, e ao desligar percebeu que a sua mãe o confortou mais do que ele a ela, considerando que ele a tinha preocupado por ter passado a noite em uma cela de contenção.
  O resto da semana passou em um permanente estado de tensão e preocupação, tanto para Will, quanto para Danny. O moreno não retornou a ligação recebida, apesar de ter quase clicado no botão várias vezes, mas apenas mandou uma mensagem dizendo que estava bem e que depois conversariam. Depois do quê, nenhum dos dois sabia. Alguns colegas de time também mandaram mensagens, tendo alguns da geração mais nova enviado frases de apoio e outros fazendo piadinhas de mau gosto como sempre fizeram, tentando fingir que nada havia mudado. A maioria, porém, não deu notícia, o que só serviu para piorar a ansiedade do jogador.
  Quando o sábado chegou, Daniel já estava escalando as paredes de nervosismo, sabendo que logo receberia algum comunicado da comissão administrativa do time. Como esperado, estava terminando de comer o que restara da pizza da noite anterior quando seu celular tocou, o barulho ecoando na espaçosa cozinha. Não olhou quem era e atendeu.
  – McClare. - Uma voz que definitivamente não era do treinador Gally soou no ouvido de Danny. Surpreso, afastou o telefone e encarou o nome de Joseph Smith piscando na tela por alguns segundos.
  PutaQuePariuPutaQuePariuPutaQuePariu.
  – Diretor Smith? - perguntou finalmente em uma voz pequena e quase inaudível, encolhendo-se na cadeira inconscientemente.
  – McClare, você tem uma coletiva de imprensa ao vivo marcada pra amanhã de tarde. Alguém vai ter buscar às 13h. - o diretor foi direto ao ponto, falando rispidamente e sem dar tempo para o jogador responder. - Você vai falar exatamente o que eu mandar. Se você falar ou fizer alguma coisa, qualquer coisinha que estrague a imagem do Vorpal Sword ainda mais, você tá fora.
  – Eu não to fora ainda? - perguntou esperançosamente, sem conseguir se segurar.
  O suspiro de Smith pôde ser ouvido do outro lado da linha.
  – Ainda não. Infelizmente, apesar desse seu cu arrombado, você tem talento.
  Uma confusão de pensamentos se formou na mente de Danny e ele não sabia o que sentir. Se aquilo era para ser um elogio, Smith tinha que praticar mais. Na dúvida, não disse nada.
  – 13h. Não se atrase. - o diretor disse e finalizou a chamada. Daniel soltou o ar que não sabia que estivera segurando durante a semana inteira e relaxou a pose na cadeira, o último pedaço de pizza ainda na metade. Sua carreira no futebol não estava terminada, ainda havia esperança.

***

  – Você vai falar exatamente o que está escrito no papel, sem tirar nem pôr, e depois vão começar as perguntas. É tudo ao vivo, então se comporta. - Gally falou e Danny rolou os olhos. Não era como se nunca tivesse participado de uma coletiva antes. Tudo bem, as outras vezes o time todo estava presente e poucas perguntas eram direcionadas a ele, mas a experiência ainda valia. O garoto aceitou o papel que o treinador o entregou e ouviu alguém dizer que faltavam cinco minutos para o início da transmissão. Danny leu o breve discurso rapidamente antes de subir ao palco, não deixando de notar que não havia nada sobre Will e agradecendo aos céus mentalmente por isso.
  – Um minuto! - Alguém gritou e Danny viu o técnico gesticular que estava na hora de entrar. Limpou as mãos em seu terno e andou até o púlpito com duas dezenas de microfones no centro do palco, o nervosismo tomando conta mais uma vez. Aguardou a luz vermelha no fundo do pequeno auditório se acender, indicando o início da transmissão, e só então olhou para o enorme grupo de jornalistas que estava sentado nas cadeiras acolchoadas do recinto. Respirou fundo mais uma vez e começou a ler:
  – Boa tarde aos presentes e a todos os telespectadores. Meu nome é Daniel McClare e eu sou o lateral titular do Vorpal Sword Football Club, mas acho que todos aqui já sabem disso. Acho que todos sabem também porque estamos aqui, então vou direto ao ponto. Semana passada, na madrugada de sexta-feira perto de uma da manhã, eu fui levado a uma delegacia por praticar um ato de vandalismo. Obviamente, não tenho como negar minhas ações, todos já viram as provas, mas tenho como anunciar publicamente o meu mais sincero pedido de desculpas. - Daniel falou devagar e levantou a cabeça, vendo todos os olhares dos presentes grudados em si. - Naquela noite eu havia bebido demais e minha cabeça já não estava no lugar certo antes disso, mas eu estava consciente de meus atos, admito a culpa e me arrependo profundamente. Como tentativa de remissão, vou pagar a repintura do edifício e doar cinquenta mil libras ao Saint Sebastian General Hospital.
  Finalizou e a plateia aplaudiu sem entusiasmo. Danny olhou nervosamente para o lado direito do palco, onde Gally, Smith e o restante da comissão do time o estavam observando, e soltou o ar que não sabia que estava segurando ao ver o diretor assentir minimamente com a cabeça, em sinal de aprovação. Primeira fase completa com sucesso, pensou.
  Logo voltou os olhos para os jornalistas e outros profissionais da mídia, que o observavam com expressões variantes entre não impressionadas e famintas. Todos sabiam que Danny ia falar sobre a - prisão -, mas estavam esperando um pouquinho mais que isso, ao menos uma menção do rapaz que estava junto com ele naquela madrugada. Ouviu alguém dizer que a sessão de perguntas ia se iniciar e preparou-se psicologicamente para a parte mais perigosa da tarde.
  – Mary Hillard, do DailyMail. - a primeira repórter se apresentou e Danny assentiu. - Daniel, com toda essa polêmica a imagem do Vorpal Sword ficou um pouco deteriorada. Você vai continuar no time? - a jovem questionou e o jogador suspirou aliviado. Era uma pergunta meio sem sentido, mas pelo menos ele sabia responder.
  – Isso é assunto que a comissão vai resolver junto com os presidentes do time, mas eu não pretendo pedir demissão. - disse firme e recebeu um olhar atravessado de Smith, mas resolveu ignorar por ora.
  – Robert Allen, HelloMagazine. - um garoto se apresentou e o atleta se esforçou para manter uma expressão neutra ao reconhecer o nome da revista. -Daniel, você não estava sozinho quando foi flagrado pela polícia. O que você tem a dizer sobre a pessoa que te acompanhava?
  Danny abaixou a cabeça e apoiou as duas mãos no pequeno espaço que não estava ocupado por microfones no palanque a sua frente.
  É isso, os tempos de se esconder se foram.
   – Não posso dizer nada sobre ele, só falo por mim mesmo. - Hesitou, mas ergueu o rosto e prosseguiu determinadamente. - Eu sou gay, e não tem nada que ninguém possa fazer para mudar isso.
  Um tumulto explodiu no auditório, com todos falando e gritando ao mesmo tempo. Daniel sentiu o celular vibrar no bolso da calça, mas não fez menção de pegá-lo. Arriscou uma olhada para Smith, que tinha os punhos cerrados e uma expressão tempestuosa, e Gally estava com o rosto escondido nas mãos. Passou os olhos ao redor a procura de alguém que pudesse controlar a plateia e finalmente avistou a mulher que estava coordenando o evento. Danny não sabia como, mas tinha certeza que ela causou uma microfonia ensurdecedora, tendo o efeito desejado de fazer todos se calarem e voltarem a se comportar civilizadamente. A mulher apontou para mais um jornalista, indicando a sua vez de fazer uma pergunta.
  – David Jones, The Sun. - o homem falou e Danny resistiu a vontade de rolar os olhos. A última coisa que precisava era a maior revista de fofocas que conhecia fazendo perguntas inapropriadas ao vivo. - Quem é ele? É seu namorado? Vocês estão juntos a muito tempo? Ele trabalha-- - perguntou rápido e com o brilho nos olhos de um homem faminto em frente a um banquete, mas o seu microfone foi cortado e a mulher interrompeu:
  – Senhor Jones, só é permitido fazer uma pergunta por vez. - ela falou elegantemente e Danny a lançou um sorriso agradecido.  
  Voltou a encarar o jornalista e respondeu com ar de finalidade:
  – Como já disse, não posso dizer nada sobre ele. Próxima pergunta.
  Tentou não pensar em como realmente não sabia a resposta para algumas daquelas questões. Até onde tinha certeza, Will não era seu namorado, eles estavam juntos já fazia bastante tempo, mas as coisas poderiam ter mudado drasticamente desde aquela noite, quando ele praticamente declarou a quem quisesse ouvir, ou ler, que amava Will. Afastou esses pensamentos rapidamente e tentou se concentrar na próxima pergunta.
  – Michael Blake, do Sporting Life. Daniel, existe um estudo feito com um time feminino que compara a performance das jogadoras que passaram a noite com o parceiro com a performance das que passaram sozinhas, e foi revelado que as meninas que ficaram sozinhas jogaram muito melhor que as outras. Você não acha que uma situação parecida se aplicaria a você e traria complicações nos seus jogos? - um rapaz moreno perguntou seriamente.
  A mente de Danny parou de funcionar por alguns momentos, sua expressão congelada em choque. Abriu a boca algumas vezes e a fechou novamente, sem conseguir formular uma resposta para aquela pergunta mais do que absurda. Aquele cara tinha que estar de brincadeira, porque não era possível que alguém falasse uma coisa dessas e esperasse uma resposta séria. O silêncio se esticou e Danny percebeu que não, ele não estava brincando.
  – Eu acho que eu nunca ouvi alguém falar tanta coisa ridícula em menos de um minuto. - começou e tentou fazer suas mãos pararem de tremer de raiva. - Sabe, eu li esse tal 'estudo' sobre o time feminino e eu lembro que pensei que não era possível que alguém acreditasse naquela baboseira sem fundamento nenhum. Sério, não tinha nenhuma pesquisa de base e era literalmente só um artigo publicado no Daily Testicle, que todo mundo sabe que é um dos maiores propagadores de fake news da internet. - Daniel observou com satisfação o jornalista arregalar os olhos e ficar vermelho como um tomate, mas ainda não tinha terminado. - Olha, as meninas já sofrem demais com a falta de reconhecimento, mesmo quando todo mundo sabe que elas dão pau em alguns jogadores, e aí ainda vem uns babacas falando um monte de merda pra tentar diminuir elas ainda mais? Pelo amor de Deus, né! - o jogador falou com desdém. Algumas repórteres se endireitaram em suas cadeiras e soltaram sorrisos orgulhosos. Pelo menos alguma coisa certa eu falei.
  Ao ver pelo canto do olho os técnicos mortificados ao lado do palco, pensou: É melhor eles se prepararem. Respirou fundo antes de continuar, tentando parar de ver vermelho, sem sucesso.
  – Eu não sei se vocês lembram de um jogo contra o Cheshire que eu fiz dois gols e uma assistência pro Hamish - pausou mais uma vez e tentou controlar a acidez na voz, mas não funcionou, seu sangue estava quente demais, o coração acelerado e toda a cautela demandada por Smith evaporou. Fitou a plateia, todos com os olhos grudados em si e encarou o repórter mais idiota que já tinha visto na vida. -, na noite anterior ao jogo eu tomei no cu tão forte e gostoso que depois eu não conseguia nem sentar sem lembrar do meu namorado. Se eu não me engano, foi o seu Sporting Life que falou que foi o melhor jogo da minha carreira. Então antes de sair espalhando coisas sobre 'estudos' e me comparando com uma mulher, um organismo totalmente diferente do meu, você devia fazer um pouco mais de lição de casa.
  O silêncio chocado dos espectadores durou pouco. Mais uma vez a sala explodiu em barulho e mais perguntas, mas Danny saiu do palco sem dizer mais nada. Seu celular vibrava como louco no bolso, mas ainda estava sendo ignorado. Sentindo cada batida de seu coração por causa da adrenalina liberada em suas veias, o rapaz parou bem na frente do diretor da comissão, que o olhava com fúria. Tentou pensar em algo para dizer, mas apesar de no fundo não querer piorar mais as suas chances de continuar no time, ele realmente não estava arrependido de nada que havia falado.
  – Garoto, se você não sair da minha frente agora, eu vou te matar. - Smith disse entre dentes.
  – Você não vai encostar em mim em uma transmissão nacional ao vivo. - Danny respondeu indicando com a cabeça as câmeras atrás de si, que ainda estavam ligadas e viradas para ele. Smith desviou o olhar para o local indicado e sua expressão tremeu. - Se você acha que ter um gay assumido no time é pior do que ter que encontrar um jogador tão bom quanto eu, pode me demitir, mas a decisão é sua. - finalizou e continuou seu caminho para a saída, sem lançar nem um olhar para trás em uma falsa demonstração de confiança.
  Por sorte, assim que saiu do hotel onde a coletiva estava acontecendo avistou um táxi vazio do outro lado da rua. Atravessou rapidamente e entrou no banco de trás, falando seu endereço e sentindo o carro se mover em seguida. Por alguns momentos fez-se silêncio, estando desligado o rádio do taxista, que graças a Deus não reconheceu o jogador, até que o celular de Danny voltou a vibrar, dessa vez com uma chamada. Conseguiu tirar o aparelho do bolso com algum esforço e soltou um suspiro ao avistar o nome de Will na tela, recostando-se no banco do carro. Passou uma mão pelo cabelo e fechou os olhos ao aceitar a chamada.
   – Já tava na hora de você parar de me evitar, né? - Will falou em um tom leve antes mesmo de Daniel dizer 'alô'. Só de ouvir a voz do loiro Danny já estava sorrindo sem perceber, a adrenalina se dissipando aos poucos.
  – Desculpa, é que... - não completou, pois não tinha uma boa explicação.
  – Tudo bem, eu entendo. - Will disse suavemente após alguns segundos, e Danny sabia que ele realmente entendia. Meu Deus, o que eu fiz pra merecer esse cara?
  – Você assistiu? - o jogador perguntou baixinho momentos depois, não sabendo se queria que a resposta fosse sim ou não.
  – Tudinho. - Ouviu em seguida e aguardou apreensivamente o outro rapaz falar mais alguma coisa. - Você me chamou de namorado mesmo ou foi uma projeção do meu subconsciente? -
  Daniel encolheu-se com uma expressão de arrependimento e apressou-se em falar:
  – Desculpa Will, eu tava...
  – Não pede desculpa, isso é... - o loiro interrompeu. - Onde você tá? - perguntou, em vez de completar a fala.
  – Indo pra casa.
  – Ótimo, chego em vinte minutos. - Will afirmou e Danny arregalou os olhos em pânico. Queria ver o garoto, mas não sabia como estava a situação em casa. E se algum jornalista estivesse de tocaia só esperando para encurralá-lo?
  Sabia que era um pouco paranoico, mas não conseguiu evitar de pedir:
  – Entra pela porta de trás.
  – Sempre, meu bem. - Will riu da própria piada e desligou. Danny rolou os olhos, mas não conteve o sorrisinho, que durou o caminho inteiro.

***

  Meia hora depois, Daniel ouviu a porta que dava para o quintal dos fundos da casa abrir e fechar com um clique. William nunca foi de chegar na hora marcada, então Danny já estava acostumado a seus atrasos.
  – Danny?
  – Na sala. - o moreno respondeu sem tirar os olhos da televisão e aguardou Will atravessar a cozinha e sentar-se ao seu lado esquerdo no sofá.
  Danny ainda vestia a camisa social branca e a calça preta do terno, apesar de ter tirado a jaqueta e os sapatos assim que chegou em casa. Estava sentado na ponta do móvel e encarava a televisão a sua frente. A grande tela de plasma na parede oposta ao assento estava ligada no ESPN e mostrava a cena de Danny menos de uma hora atrás.
   -... você devia fazer um pouco mais de lição de casa. - Os dois assistiram o jogador sair furioso da tela, a câmera movendo-se para o acompanhar momentos depois.
  – Isso foi tão sexy. - Will murmurou e recebeu um olhar incrédulo do rapaz ao seu lado.
  – Você sabe que esse foi o momento que eu arruinei a minha carreira, né?
  – Sexy e corajoso. - o loiro disse simplesmente e puxou o atleta para trás até ele parar de resistir e recostar-se em seu peito, colocando as penas para cima do sofá, em uma postura mais relaxada. - Estou orgulhoso de você. - disse e Danny sorriu levemente, sentindo um pouco mais de tensão se esvair de seu corpo.
  O moreno pegou a mão de Will que estava apoiada em seu ombro e passou a brincar com seus dedos de maneira distraída, desejando mais do que tudo que aquele momento confortável durasse para sempre, mas sabendo que não iria. Podia sentir que Will queria falar sobre alguma coisa, e que seria um assunto sério.
  – Então, sobre você me chamar de namorado... - Will começou fingindo casualidade após alguns minutos de quietude e Danny grunhiu frustradamente, endireitando-se no sofá.
  – Olha, desculpa, eu tava muito nervoso e não tava pensando direito, eu...
  – Calma, Danny. - Will riu e tirou as mãos do moreno do cabelo, onde sempre iam parar quando ele não estava confortável com alguma coisa. Dobrou as pernas para cima do móvel acolchoado e virou-se para o outro rapaz, apoiando suas mãos ainda conectadas em seu colo. - Eu não achei ruim. - disse finalmente.
  – Não achou? - O esportista levantou os olhos de repente.
  – Não. - Soltou uma risadinha apreensiva e tomou coragem para continuar. - Na verdade, eu... eu gosto da ideia.
  – Sério? Desde quando? - Daniel questionou tentando não deixar a esperança crescer demais.
  – É... acho que já faz uns meses, mas eu tive certeza quando... quando você escreveu naquele muro que... que me amava. - Will disse devagar e sem fazer contato visual, mas ainda sem soltar as mãos de Danny. Sentiu o coração acelerar a cada segundo que passava sem resposta, e pular uma batida quando uma das mãos do jogador se desvencilhou da sua e pousou em seu rosto, levantando-o.
  – É verdade - Daniel sussurrou fitando os olhos claros do garoto. -, eu nunca teria feito tudo o que fiz hoje se eu não te amasse, se eu não quisesse nos dar uma chance de ficar juntos de verdade. Mas eu não tinha certeza se você também queria.
  Will fechou o espaço entre eles e selou seus lábios. O beijo foi como o daquela noite fatídica, mas melhor. Suas línguas dançavam em um ritmo lento e de alguma forma conseguindo transmitir todo o sentimento, todo o amor que sentiam um pelo outro. Naquele momento Danny não ligava para mais nada, nem para as críticas, nem para a comissão, nem para a sua carreira. Sabia que, contanto que tivesse Will ao seu lado, ficaria bem.

FIM

  DISCLAIMER: Tudo que eu sei sobre times de futebol, delegacias e coletivas de imprensa eu aprendi nas copas e em filmes, então por favor ignore as inconsistências e aproveite a leitura!

  Nota: Primeiramente vim agradecer a pessoa que enviou essa música maravilhosa que é Quarter Past Midnight, você é incrível <3
  Eu estava querendo escrever essa história desde a época da copa, então quando eu recebi a música da Songfic e ela se encaixou bem, aproveitei a oportunidade e deu nisso!
  Os times e as pessoas da história são todos inventados (bônus para quem souber de onde vêm os nomes dos times), só os jornais que eu usei alguns de verdade de Londres (Deus abençoe o Google).
Muito obrigada por ler! xx