Say a Prayer

Escrito por Miu! | Revisado por Hels

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Atenção: O uso de drogas pode causar danos irreversíveis ao cerébro e ao organismo do usuário. Não use drogas.

Prólogo

Flashback on

  A brisa fria batia em seus braços fazendo com que seus pelos se eriçassem. O som da correnteza à sua frente estava em perfeita sintonia com o barulho que vinha da copa das árvores, causado pelo vento que era mais forte lá em cima. O céu estava nublado, em tons cinza escuro, e parecia refletir seu estado emocional.
  Seu cóccix doía por causa da pedra em que estava sentada. Uma lágrima teimava em descer por seu rosto, mas ela se recusava a permitir. Sentia uma dor no peito, uma dor no coração. Ele a usou, abusara de seus sentimentos, mentiu. Ela não podia acreditar naquilo, não podia acreditar que tudo foi mentira. Não queria aceitar.
  Perto de onde ela estava havia pessoas que se diziam suas amigas, mas que quando a viram ser enganada não fizeram nada para ajudar. A viram cair e sequer estenderam a mão.
  Levantou-se e respirou fundo, olhou em volta e tentou sorrir. Não conseguiu. Olhou para o rapaz que estava sentado do seu lado. Ele tinha cabelos escuros e olhos verdes, seu abdómen definido estava perfeitamente coberto por uma camisa branca que vinha acima de shorts azuis e chinelo.
  - Me ajuda a atravessar? - perguntou com a voz fraca, tendo como resposta um aceno de cabeça positivo.
  Ele se levantou e tirou o chinelo, ela já não vestia calçado algum. Ele estendeu a mão para ela, que a segurou um pouco hesitante.
  Seus pés entraram em contato com a água gelada, fazendo com que o frio subisse por seus ossos causando certa dor. Naquele ponto do rio a água não tinha muita força, mas se alguém caísse iria direto para uma pequena queda d?água e, certamente, se machucaria muito. Por isso eles tomavam extremo cuidado a cada passo, a pedra molhada poderia fazê-los escorregar.
  Quando chegou ao outro lado ela logo se sentou na pedra e puxou sua mochila vermelha para seu colo, retirando de lá um casaco azul. Ela secou seus pés e calçou o All Star preto, abaixando a bainha da calça que havia sido dobrada para que não molhasse.
  Quando terminou o que fazia ela enfiou o casaco molhado na mochila e jogou-a nos ombros, saindo do local às pressas. Ouviu algumas pessoas gritarem seu nome, mas sequer olhou para trás. Ela andava a passos firmes, determinada a não parar e muito menos chorar. Só parou quando chegou a um ponto de ônibus, onde se sentou com a mochila no colo. Apertava fortemente a mochila contra o peito, tentava de qualquer maneira impedir que as lágrimas caíssem. Jogou a cabeça para trás, respirando fundo. Mas quando voltou a olhar para frente as lágrimas desceram com violência.
   se controlou para não soluçar, mas a dor era grande demais e as lágrimas desciam livres.
  Um rapaz sentou ao seu lado e lhe ofereceu um lenço, ela aceitou e forjou um sorriso que mais pareceu uma careta.
  O rapaz se chamava . Ele tinha cabelos escuros e pele clara, seus olhos eram de um tom chocolate. Sua pele tinha algumas marcas avermelhadas e seus olhos eram contornados por olheiras.
   olhava para as mãos, remexia algo em seus dedos e sussurrava uma canção. Ele levantou o rosto e olhou para a menina que parecia não se acalmar, pelo contrário, parecia ficar mais nervosa a cada instante.
  Ela o olhou e ele sorriu fraco, voltando a olhar algo em suas mãos.
  - Desculpa, Eu... Eu... - Começou a menina olhando para o rapaz.
  - Não! Erm... Não tem problema. Eu entendo.
  - Como assim entende?
  - Eu vi o que aconteceu.
  A menina arregalou olhos e olhou para os próprios tênis, morrendo de vergonha.
  - Mas não precisa ficar envergonhada. Eu acredito que ninguém mais viu e, além disso, vocês não fizeram nada demais.
  - Onde você estava?
  - No meio da mata.
  - Fazendo o quê?
  - Trilha, é.
  - De sapatos Oxford?
  - Eu tenho mania de caminhar pelo meio do mato.
  A menina não acreditou, mas não queria se intrometer. Por alguns instantes havia se esquecido do que aconteceu, mas logo a lembrança voltou a sua mente fazendo com que mais algumas lágrimas rolassem.
  - Eu posso te perguntar o que aconteceu?
  Ela olhou pra ele, pensando se podia contar ou não. Ele lhe parecia tão sincero, suas preocupações pareciam tão "puras". Ela sorriu amarelo e começou.
  - Brendan, o cara que estava comigo, sempre foi minha paixão. Eu sempre gostei dele, desde pequena. Ele é "o cara" da escola, todas o querem. Então, um dia ele me disse que estava afim de mim e isso e aquilo... E eu cai na historinha. Agora eu descobri que ele só disse isso porque queria me comer. E ele ficou com a minha melhor amiga, sendo que nós estávamos "namorando", e ela sabe o quanto eu gosto dele.
  - Foi traída pela amiga e pelo "namorado" então?
  - Isso mesmo.
  Ela abaixou o rosto e começou a chorar mais uma vez, com ainda mais força. O rapaz puxou-a pra seus braços e ficaram abraçados por alguns minutos, até que ele sorriu e olhou pra ela, que parecia mais calma.
  - Ele não te merece.
  - Eu mereci. Eu já tinha ficado com um cara que ela gostava. Ela só se vingou.
  - Mas de qualquer jeito ele te usou. Sua amiga querer se vingar eu entendo, mas ele não.
  Ela passou a mão pelo rosto, tentando secar as lágrimas. Olhou pra ele mais uma vez e dessa vez sorriu de verdade, um sorriso triste, mas verdadeiro.
  - Obrigada. - Ela disse olhando nos olhos dele.
  - Que isso.
  O ônibus chegou e ela entrou e sentou-se no último banco, despedindo-se de com um aceno discreto de cabeça. Durante todo o percurso continuou a chorar. Ainda sentia uma dor enorme em seu peito, nada parecia diminuí-la, apenas o "cara com olheiras do ponto". Ele sabia algo que ninguém mais saberia, e ela sequer sabia seu nome.

Flashback off

I am the rain, who's held in disdain
The truth is I'm ruthless, I can't be contained...

Capítulo 1 - The Last of the English Roses

Alguns meses depois

  Era mais um dia comum de trabalho na ?Heart of all England?, uma das poucas lanchonetes de Hexham. servia todos com um sorriso cordial no rosto, ignorava constantes piadinhas de seus antigos colegas da Queen Elizabeth High School.
  Era sempre assim, sorria e sequer olhava no rosto das pessoas, ignorava a existência de todos os seres no universo. Ela quase não conversava com a própria mãe, o máximo de palavras que trocavam era quando brigavam. Ela não tinha amigos. Nada. Estava sozinha.
  Ela admitia que isto a estava enlouquecendo, mas não via necessidade em falar com aquelas pessoas. Não via necessidade em falar.
  - O que vão querer? - Disse a de olhos , que vestia um avental branco por cima da calça Jeans e da camisa do Sex Pistols.
   olhava para o bloquinho de folhas recicladas em sua mão, mas sorria fraco para os fregueses.
  - Eu te conheço, não conheço? - Disse o rapaz de cabelos escuros e olhos chocolates contornados por olheiras.
  Ela olhou para ele e seu sorriso aumentou um pouco, logo ficou vermelha e voltou a olhar para o bloquinho.
  - Eu sou a garota que alugou o seu lenço no ponto de ônibus. - Ela respondeu voltando a olhar pra ele, mas abaixando a cabeça logo em seguida.
   sorriu para ela.
  Ela olhou para baixo, estava completamente vermelha.
  - Eu me esqueci de perguntar o seu nome.
  - , mas pode chamar de . E o seu?
  - Eu sou , é o nome e o apelido então... Erm... Esses são , e . Meus amigos e colegas de banda.
  - Ah, vocês têm uma banda? - A menina perguntou com os olhos brilhando.
  - É temos sim, ainda não decidimos o nome. - Respondeu .
  - ! É PRA TRABALHAR E NÃO PRA BATER PAPINHO! - Gritou um homem gordo que estava atrás do balcão.
  - Desculpe-me Sr. Thompson. Tenho que trabalhar. O que vão querer?
  - Só quatro cafés mesmo.
  - Quatro cafés. Mais alguma coisa?
  - Não, não. Só isso.
  - Ok.
  Ela foi até o balcão e pegou dois cafés de cada vez e os colocou na mesa. Continuou atendendo os outros fregueses normalmente, sorrindo sem ao menos olhar para eles.
   levantou o braço pedindo a conta e foi até eles.
  - Aqui o dinheiro. Esta noite a gente vai fazer um ensaio, se quiser passar lá em casa aí está o endereço e também meu número, se precisar. - Disse enquanto se levantava.
  - Ah, eu vou! Tchau, foi um prazer te rever e também conhecer vocês. - Ela disse a e aos amigos dele, que acenaram.
  Eles foram embora deixando completamente indecisa. Ela não sabia se devia ir, ou não. Pelo que ela pode perceber no endereço que lhe foi entregue eles moravam em um lugar qualquer no meio do nada perto da Low Gate. Ela queria ir, mas tinha medo.

  O dia ocorreu normal, servia os fregueses com seu típico sorriso enfadonho estampando o rosto. A indecisão de não saber o que fazer a irritava. Ao fim do dia ela voltou pra casa.
  A Rua 3 Windsor Terrace continuava fria e sem vida, como sempre foi. Sua casa era pequena, tinha dois quartos, um banheiro e uma sala que dividia espaço com a cozinha. Tinha também uma minúscula área de serviço que ficava atrás, onde havia o secador de roupas, a máquina de lavar e o tanque.
   estava à beira do tanque lavando seu avental de trabalho, como fazia todos os dias, quando sua mãe chegou. Os cabelos dela estavam presos em um rabo de cavalo para que não molhasse a camisa preta já estava completamente molhada e a calça começava a ficar também.
  - , por que você não lavou a louça e nem fez a janta? - Perguntou Joanna, sua mãe.
  Os cabelos da mulher eram um pouco mais escuros que os de , estavam caindo aos seus ombros com os cachos discretos. A mulher era baixa e barriguda, tinha o rosto duro e a aparência de uma mulher rude. Seus olhos eram quase negros e seriam capazes de assustar.
  - Desculpe mamãe, eu cheguei agora do serviço e tive que lavar meu avental.
  - Por que chegou essa hora? Já são oito horas, você sai às seis.
  - Tinham muitos clientes, hoje é sexta-feira então sempre fica mais cheio. Então o Sr. Thompsom pediu para que eu ficasse.
  - Bitch, não minta pra mim!
  - Eu não estou mentindo, mãe. Você fica me xingando a toa.
  - A toa?! Eu vou comer o que agora? Pizza? Hambúrguer? Eu trabalhei feito uma condenada o dia inteiro. Ouvi choro daquelas pestes que chamam de crianças. Quando chego em casa sequer tenho o que comer!
  - Eu também trabalhei o dia inteiro, mãe!
  - Só sorrir um pouquinho e passar o trabalho duro pros cozinheiros não é trabalho!
  - Ah não? Então quer dizer que o dinheiro que eu ganho lá não te ajuda nessa merda de casa? Sou eu quem pago a maioria das contas, EU ganho mais que você! Então pára de encher o meu saco!
  No instante seguinte a mão de Joanna deixou uma marca vermelha no rosto de . A olhou para a mãe com ódio e saiu correndo para o seu quarto.
  Ela trocou de roupa rápido, colocando uma camisa xadrez e uma calça Jeans. Calçou uma sapatilha preta e pegou a bolsa Mulberry, jogando seu celular e sua carteira dentro dela.
  Saiu do quarto a passos firmes e logo bateu a porta de entrada atrás de si. As ruas estavam escuras e, apesar de ser verão, estava muito frio.
  Ela ficou andando pelas ruas escuras de Hexham por algum tempo, até que se lembrou do convite que recebera mais cedo. Revirou toda a bolsa e encontrou o papel com o endereço e o telefone de . Ela andou mais um pouco e parou um táxi, entregando o papel para o homem.
  Durante o percurso suas suspeitas foram confirmadas, o endereço que ele lhe deu era de um lugar no meio do nada nas imediações de Low Gate. O taxista parou o carro e esperou o pagamento.
  Após pagar o homem desceu do carro e olhou em volta. Nada. Tudo o que via era mato, árvores, estrada e o céu. Resolveu ligar para .
  - Alô?
  - ?
  - Oi !
  - Então, eu entreguei o endereço que você me deu e o taxista me deixou no meio do nada. O que eu faço?
  - Você deu exatamente o endereço que eu te dei?
  - Sim, eu entreguei o papel que você deixou comigo.
  - Ok, eu vou ai te buscar então! Não sai daí, me espera.
  - Pode deixar, sou uma estátua.
  A chamada terminou e a menina ficou olhando a tela de seu Blackberry. Havia um aperto em seu peito, um medo talvez. Ela estava nervosa com algo, não sabia o que. Após uns 5 minutos, que passaram lentos e cheios de motoristas loucos que passavam por ela e soltavam cantadas toscas, ela viu um homem alto sair de uma estradinha de terra sorrindo.
  - Heeey ! - O rapaz cumprimentou-a animado.
  - Oi !
  - Vem, por aqui. - Ele disse colocando o braço em suas costas e a puxando na direção pela qual chegou.
  O rapaz estava fumando, o que já suspeitava devido à cor amarelada de seus dentes. Ele vestia uma camisa social branca com vários botões abertos, uma calça social preta e sapatos Oxford. Eles andaram por alguns minutos conversando e se conhecendo. riu como há muito não fazia e estava menos envergonhado do que no dia em que se viram pela primeira vez.
  Chegaram a uma casa pequena, que tinha uma enorme sala que dividia espaço com a cozinha e tinha cinco portas. Uma porta era para o banheiro e as outras eram para os quartos. Ela se sentou junto com outras três ou quatro mulheres em um sofá enorme de couro preto. Em frente a elas a banda começou a tocar versões acústicas de músicas próprias e fazendo covers. A pedido de eles tocaram a versão do Nirvana de ?The man Who sold the world? que foi gravada originalmente por David Bowie. cantou toda a música de olhos fechados e com o copo de whisky na mão.
  Ela conversou com as meninas que já estavam lá, todas tinham uma amizade colorida com os caras da banda. Ficaram colegas rápido, ao contrário do que a própria esperava.

Sometimes you can't change
There'll be no place
Ce soir, disons chez moi
Enfin je compte de toi
Je te drague la rose mystique
Tu l'arrose mystique?
Ha, vas-y
C'est mon monde de soleil
She?s the last of the English roses?

Capítulo 2 - Boys in the Band

"They twist and they shout, for the boys in the band"

  Após o ensaio todos se sentaram e começaram a conversar. Com exceção de , todos estavam fumando. Ela até pediu para experimentar, mas não deixou, disse que aquilo não era pra ela.
  Passaram horas assim, os caras da banda com violão do lado e tocando qualquer coisa quando o assunto acabava, ou quando eles não estavam em meio a viagem que a heroína ou a cocaína proporcionava. No fim cada casal foi para um quarto, inclusive e , mas nada aconteceu. Quando passava das cinco horas, foi para a cozinha e viu preparando algo em uma colher.
  - O que é isso?
  - Nada, .
  - É ¹candy?
  - É.
  - Me deixa experimentar?
  - Não , o não vai gostar.
  - Por favor!
  - Não. Você é muito nova.
  - Fala sério, eu tenho dezenove anos.
  - , por favor, não insiste.
  - Então me deixa cheirar.
  - Caralho garota!
  - Vai deixar né?
  - Tem pó na gaveta.
  A menina sorriu e se virou para o balcão branco que tinha algumas gavetas. Abriu a primeira e viu o pacotinho com um conteúdo branco.
  Ela respirou fundo e despejou tudo no balcão. chegou atrás dela e a fez sentar em uma cadeira com encosto, deixando a seringa com o liquido transparente em cima do balcão. Ele arrumou o pó formando uma carreirinha, tirou uma nota do bolso e enrolou em formato cilíndrico.
   coçou o nariz, tentando tirar qualquer resíduo que impedisse a passagem do pó. Ela pegou o papel e posicionou-o acima da carreirinha. Aspirou. Sentiu o pó subir por suas narinas, primeiro veio uma sensação de dor, era como se aquilo subisse cortando. Depois vinha a dormência, e então vinha uma sensação que tomava o corpo inteiro.
  Sentia-se forte, feliz, nada poderia atingi-la. Ela riu e se encostou à cadeira, com a cabeça jogada para trás e os olhos fechados. pegou a seringa e sentou no chão, esticou o braço esquerdo e enfiou a agulha em sua veia sem o mínimo cuidado.
  Ouviam-se alguns gemidos e risadas, provindos do efeito de delírio e euforia das drogas que ambos utilizavam. O barulho acordou , ele se levantou e foi até a cozinha.
  Encostou-se no balcão e ficou olhando . Ele sabia que isso seria inevitável, todas as mulheres que se aproximavam dele ficavam dessa maneira, mas ele realmente esperava que pudesse adiar um pouco mais. A garota dava gargalhada e olhava pra ele, enquanto estava jogado no chão viajando por causa da heroína.
  - Que tal a gente ir pro quarto para que ninguém te veja assim? - Sugeriu já a pegando no colo e indo em direção ao quarto.
  Quando ele a deitou na cama ela tentou puxá-lo pra cima de si, mas ele segurou seus braços e fez que não com a cabeça.
  - Por quê? - Ela perguntou com a voz arrastada.
  - Porque se nós formos fazer algo eu quero que você esteja completamente sóbria. - Ele disse sentando-se ao lado dela na cama.
  - Mas eu quero. - Ela ficou completamente deitada e mais uma vez tentou trazê-lo pra si.
  - Eu quero ter um jatinho particular e nem por isso tenho. - Ele riu e deitou ao lado dela, virado para ela que estava fitando o teto.
  - Vai à merda, . - Ela disse empurrando o rosto dele de brincadeira.
  - Bom, para a merda eu acho que eu não vou. Mas há uma enorme possibilidade de eu nadar em vômito.
  - Hã?
  - É a primeira vez que você usa drogas. Eu percebo porque você usou pouco e isso já fez um enorme efeito. Você, certamente, vai vomitar as tripas depois que acordar.
  - Não to com o mínimo sono.
  - Eu sei que não está.
  - Mas eu quero transar. - Ao dizer isso ela empurrou e sentou em cima de seu quadril.
  Ela começou a beijar , que correspondeu. Após pouco tempo ele empurrou e sentou-se na cama fazendo cara de quem se divertia.
  - Por favor, . Quando você acordar vai se arrepender disso. - Ele disse e logo em seguida sentou-se na parte de cima da cama, encostando as costas na cabeceira.
   sorriu pervertida e foi até ele, sentando-se em seu colo. Ele simplesmente olhou-a e ficou acariciando suas coxas descobertas (já que ela conseguiu os shorts minúsculo de uma das amigas deles).
  - Eu garanto que não vou me arrepender.
  - Vai sim.
  - Como você pode ter tanta certeza?
  - Você é mulher. Quando acordar vai morrer de vergonha disso tudo.
  - Fala sério, eu to bem.
  - Você ta chapada. Não vai se lembrar de nada do que está fazendo ou falando. Mas você, certamente, vai perceber se nós transarmos. E isso vai te deixar envergonhada, e eu não quero estragar esse nosso inicio de relação.
  Ele colocou-a a seu lado mais uma vez, cobrindo-a com um cobertor e deixando outro pra ele, na tentativa de mantê-la afastada.
  - Dorme pequena, é melhor. - Ele disse enquanto apoiava-se em seu cotovelo e acariciava o cabelo de com a outra mão.
  - Eu não quero dormir. - Ela disse com a voz arrastada e os olhos quase se fechando.
  - Você bebeu whisky e cheirou cocaína, é obvio que quer dormir.
  - Não. - Ela se arrastou para frente e ficou deitada no peito dele que se ajeitou embaixo dela ainda acariciando-a.
  - Eu tenho certeza disso.

You're walking like you never seen the light
You're walking like it every night
But then I start to think
and I ask myself why
It's one of those things that darling you must try
It's all so rudimentary

Capítulo 3 - Don?t be Shy

?For if you are shy for tomorrow
You'll be shy for one thousand days?

  Sua cabeça parecia latejar e seu nariz coçava. Ela não queria levantar, mas foi obrigada quando sentiu algo subindo por sua garganta. Quando virou para o lado pra colocar tudo pra fora ela deu de cara com um segurando um balde.
  Segurou nas bordas do balde e um liquido agridoce começou a sair de sua garganta. segurava seu cabelo para que não sujasse e olhava para o lado evitando olhar o vômito.
  Após tossir algumas vezes ela passou a mão na boca e olhou envergonhada para .
  - Não precisa ter vergonha, isso sempre acontece.
  Ela iria responder: "O que aconteceu depois que eu senti alguma coisa cortando minhas narinas?", mas na hora que abriu a boca sentiu mais uma vez um liquido subir por sua garganta. Ela decidiu que não ia tentar falar, pediu que saísse e ficou vomitando durante mais de uma hora. Obviamente houve vários intervalos, que só serviram para que ela se lembrasse de parte do que aconteceu na noite anterior.
  Apesar de fazer uma enorme força lembrava-se apenas da felicidade e da excitação (no sentido sexual), nada além disso. Não sentia nada diferente em seu corpo e quando acordou estava vestida da mesma maneira que na noite anterior, mas mesmo assim a dúvida não lhe saia da mente.
  Ela levantou, pegou uma escova de dente que carregava na bolsa e foi direto para o banheiro. Escovou os dentes umas três vezes e só então saiu do banheiro.
  Quando chegou a sala/cozinha viu sorrindo para ela. sentou em uma das cadeiras do balcão e olhou para as próprias mãos pensando em uma maneira de perguntar aquilo.
  - Não aconteceu nada. - Ele começou a dizer enquanto colocava algo no microondas. - Apesar de ter sido difícil, não aconteceu nada. Nós não transamos.
   não conseguiu disfarçar o enorme alívio que sentiu e apenas riu dela, ele estava certo.
  - Mas o que, exatamente, eu fiz? - Ela disse ainda receosa em relação ao que aconteceu.
  - Acho que você não vai querer saber. - Ele disse enquanto abria o microondas e tirava um copo lá de dentro.
  - Por que eu não iria querer? - Ela perguntou enquanto ele depositava o copo com leite a sua frente.
  - Gosta de leite puro ou quer achocolatado? - Ele perguntou já indo em direção ao armário.
  - Achocolatado. Mas, por favor, me fala o que eu fiz.
  Ele colocou a lata com o pó achocolatado em frente a ela junto com uma colher, sentou-se à frente dela e respirou fundo sorrindo em seguida. Ele olhou para as próprias mãos, pensando nas palavras certas.
  - Pelo amor de Deus , fala logo.
  - Bom...
  - Ah não, sempre que começa com esse "bom" é porque não é boa coisa. - Ela disse tirando gargalhadas do rapaz.
  - A cocaína tem substâncias que ativam a líbido.
  - Espera, a cocaína faz com que as pessoas fiquem taradas?
  - Não exatamente, mas entre os efeitos imediatos dela está o aumento do desejo sexual.
  - Eu fiz o que eu to pensando?
  - Depende do que você está pensando.
  - Eu te assediei.
  - Não leve como assediar, afinal de contas eu gostei. Qualquer cara gostaria.
  - Eu pedi pra você transar comigo! Meu Deus, eu nunca mais uso isso.
   olhou para as próprias mãos e soltou uma risada nasalada. Era sempre assim, com todo mundo. Eles usavam, diziam que era só pra experimentar, faziam um monte de merda enquanto estavam chapados e no dia seguinte diziam que nunca mais usariam nada. E naquele mesmo dia "experimentavam" algum outro tipo de droga ou até compravam a mesma que já haviam usado. Ele realmente não queria o mesmo destino para , mas era quase inevitável agora que ela já havia visto as estrelas que certas drogas fornecem. Ela iria querer mais, mesmo que não admitisse nem para si mesma. Ela já estava viciada, mas sequer havia percebido.
  Ela percebeu que estava perdido em seus pensamentos e por isso não quis ser inconveniente e preferiu ficar em silêncio. Ela esticou a mão e pegou seu leite, misturando-o com algumas colheres do achocolatado e logo bebendo.
  - Não tem ninguém em casa? - Ela perguntou olhando para que lhe sorriu.
  Ela realmente não entendia essa mania que ele tinha de sorrir daquela forma tão... Doce, sim ele sorria de forma doce e gentil para ela, e isso a deixava confusa. Afinal, por que diabos aquele homem sorria de forma tão carinhosa para ela?
  - Não, todos foram a Sound.
  - O pub?
  - Sim.
  - Mas essa hora?
  - Você acha que são que horas? - Ele perguntou fazendo-a arregalar um pouco os olhos.
  - No máximo meio dia. - Ela respondeu.
  - É porque aqui nós não temos muitas janelas e as luzes são potentes. - Ele justificou o provável erro da garota.
  - Que horas são? - Ela perguntou curiosa terminando de beber seu leite.
  - Quase oito da noite. - A garota arregalou os olhos sem acreditar que dormira tanto.
  - Por que você não me acordou? - Ela perguntou indignada.
  - E por que eu faria isso? - Ele perguntou surpreso pelo jeito da garota.
  - Cara, eu dormi o dia todo!
  - Qual o problema? - Ele perguntou não entendo o motivo de tanto estardalhaço.
  - Você devia ter me acordado.
  - Pra que eu te acordaria?
  - Sei lá. Você devia ter me acordado, é.
  - Não faria sentido. - Ele disse simplesmente, levantou-se com o copo de nas mãos e o colocou na pia.
  - Por que você não foi com eles? - Ela perguntou.
  - Não podia te deixar sozinha, certo? - Ele respondeu como se fosse óbvio.
  - Errado. Eu não me importaria.
  - Fala sério, eu não te deixaria sozinha aqui. - Ele disse indo em direção a ela e parando ao seu lado. - Se você quiser ir acho que dá tempo.
  - Eu quero. - Ela respondeu animada e já se levantando.
  - Ok, se arruma e a gente já vai.
  - To indo.
   foi até o quarto de pegou suas roupas, indo para o banheiro em seguida.
   se sentia mal, sabia que se ela fosse a Sound, iria usar drogas outra vez e isso iria virar rotina. Ele tinha certeza disso.

Capítulo 4 - I Get Along

"You caught me in the middle dazed and confused
I was following the good steps,
fancy free and footlose."

   tentava se enganar, dizia que era forte o suficiente pra não usar nada ilícito naquela noite. Ela queria sentir de novo a sensação que a cocaína lhe proporcionou, mas também não queria ficar viciada e estragar a própria vida. Ela vestiu uma das roupas de Savannah - uma das meninas que conheceu na noite passada e que estava com -, vestia uma calca black jeans skinny rasgada, uma camisa preta do David Bowie, uma jaqueta de couro com tachinhas e um salto vermelho. estava com uma camisa branca de malha, calcas com a barra dobrada, terno e sapatos Oxford.
  Durante o percurso de carro até o pub eles conversaram sobre várias bandas e sobre que aconteceu a no dia em que se conheceram. Ela se sentia bem em conversar com ele, por algum motivo se sentia bem a seu lado.
  Chegaram ao pub quase nove horas. O lugar não era muito iluminado e não tinha nada que avisasse que ali havia um pub. Ele estacionou o carro no meio fio e logo ambos estavam à porta do local. estava animada, sempre ouviu falar da Sound, mas nunca fora. O sorriso abria-se de orelha a orelha e ela sequer conseguia esconder sua ansiedade. E estava nervoso, sabia muito bem qual o caminho que a garota seguiria dali em diante.
  Após responderem algumas perguntas dos seguranças eles entraram no local. Passaram por um corredor relativamente largo, cheio de fotos de mulheres nuas nas paredes e a luz vermelha mudando de tom a todo instante, e então entravam em um local que era grande demais para fama de pub.
  Quando o corredor terminava havia dois degraus e após alguns passos já estava na pista de dança. As luzes mudavam a cor rapidamente na pista e todo o resto era iluminado por uma luz azul fraca. Nas paredes haviam enormes pôsters com imagens de cenas de sexo ou mulheres nuas, abaixo deles havia vários sofás com dois lugares de couro preto.
  Após atravessar a pista de dança havia uns cinco degraus e então tinha um bar. Ali a luz era azul e bem fraca, várias mesas redondas se espalhavam pelo local com várias pessoas conversando e bebendo. Uma mureta preta separava esse bar da pista de dança e ali havia mais mesas, só que quadradas. Em frente a isso tudo havia um balcão enorme, onde era o bar. Ao fundo havia um vão que parecia dar para uma escada.   Aquilo definitivamente não era um pub, se perguntava como aquele lugar pode ganhar fama de pub.
  - O que é aquilo? - perguntou se referindo ao vão.
  - Banheiros e cinema. - respondeu.
  - Cinema? - Ela não acreditou que podia ter um cinema naquele lugar.
  - É, um cinema. Com telão e várias poltronas. - respondeu divertido.
  - Que tipo de filme passa lá?
  - Quando não é pornô é algo como ?Lolita?, ?Perfume de Emmanuelle²?... - Ele respondeu colocando as mãos na cintura da garota e indo em direção a seus amigos.
  - Eu deveria ter imaginado. - Ela disse.
  - Hey! - Savannah, Barbie, Sabine, , e disseram quase que em uníssono.
  - Então você deu uma viajada ontem à noite? - Perguntou Barbie dando beijos no rosto de e chamando-a para sentar-se ao seu lado.
  - É. - Disse , olhando pra baixo.
  - E como foi? - Barbie perguntou enquanto exalava a fumaça de seu cigarro para o outro lado.
  - Erm... Eu não sei.
  - Você pode até ter se arrependido e não querer usar mais, mas você é obrigada a admitir o que sentiu. - Barbie olhou pra ela de canto de olho e bebeu um gole do whisky.
  - Foi muito bom Barbie, muito bom. - admitiu. - Mas eu não quero usar isso nunca mais.
  - Tenho certeza. - Barbie respondeu rindo. entendeu.
  - Minha roupa ficou boa pra você ein! - Disse Savannah.
  - É! Principalmente a camisa do Bowie! - disse enquanto enchia seu copo de whisky.
  - Percebi que vocês já ficaram bastante amigas. - Disse sorrindo para as meninas.
  - Ela é legal, . Bem melhor que aquelas idiotas metidas que você trazia pra cá antes. - Disse Sabine sorrindo para .
  - Eu sei que você sempre adorou minhas ex-namoradas, Sabine. - Ironizou .
  - A atual é bem melhor. - Disse Savannah dando um empurrãozinho em .
  - Hã? Atual? Eu? - perguntou transtornada olhando para Savannah.
  - E não é? - Sabine perguntou enquanto remexia em sua bolsa.
  - Nós somos só amigos, meninas. - disse, sorrindo para .
  - Ok, a gente finge que acredita. - Disse Sabine se levantando com uma seringa, uma colher, um isqueiro e um pacotinho na mão. - Alguém vem comigo? - Perguntou, referindo-se a heroína.
  Barbie e Savannah levantaram-se e olharam interrogativas para que fez sinal negativo com a cabeça.
  - Isso mesmo gracinha, não vai na onda delas não. - Disse sorrindo irônico pra ela.
  Eles conversaram por mais alguns minutos, bebendo e fumando o tempo inteiro. Quando um cigarro de estava no fim ele pegava outro e acendia naquele que estava acabando, jogava a guimba fora e continuava fumando o novo. Todos conversavam sobre assuntos aleatórios, o tempo inteiro falando da suposta relação de e . Até que decidiram ir ao cinema. Estava passando ?O Perfume de Emmanuele?, para sorte de que não estava afim de ver filme pornô.
   sentou sozinho em cima e os outros quatro sentaram na fila de baixo conversando. Vez ou outra sentava algum homem ao lado de , tentando agarrá-la, mas logo os caras da banda o afastavam. Após pouco mais de meia hora conversando e fumando percebeu que não ouvira a voz de uma vez sequer. Ela olhou para trás e para os lados mas não o viu.
   levantou-se e disse a que iria ao banheiro. Saiu da sala e começou a andar pela ?discoteca?. As luzes a confundiam, faziam com que visse o rosto de em todo lugar.
  Enquanto passava pela pista várias pessoas a empurravam, até que os olhos dela miraram . O problema é que junto dele vinha uma cabeleira loira quase branca e ele estava com a língua na garganta dessa pessoa. se sentiu traída, por mais que não entendesse o porquê disso, já que o conhecia há pouco tempo. Mas ela não conseguira esconder a decepção. As lágrimas vieram a seus olhos com uma força que ela desconhecia e seu peito doía de maneira que ela só sentira uma vez.
  Ela começou a andar para trás, sendo empurrada e xingada por todos. Quando chegou ao bar ela pediu uma dose dupla de whisky cowboy. Quando chegou ela bebeu em um gole. Bebeu mais algumas doses, até que se lembrou da noite anterior. Da proposta que Barbie lhe havia feito horas antes. Levantou-se e foi em direção ao banheiro, que ficava praticamente ao lado da porta do cinema.
  O local era todo branco, quer dizer, era para ser branco. As paredes eram todas rabiscadas e algumas tinham até manchas de sangue. Ela começou a abrir todas as portas das cabines, na última encontrou Barbie caída e pálida. Ela se ajoelhou ao seu lado e tirou o cabelo castanho de seus olhos.
   sentiu-se mal ao ver a garota naquele estado, mas sabia que ela já estava acostumada. Sentou-se no chão sujo de frente pra ela e sorriu pra garota, que lhe retribuiu com algo que era pra ser um sorriso, mas parecia uma careta.
  - O que você quer gatinha? - Perguntou Barbie com a voz arrastada e com os olhos quase se fechando.
  - Quero um pico. - Respondeu .
  - Na bolsa. - Barbie apontou a bolsa caída atrás do vaso sanitário. - Garota, você tem certeza?
  - Absoluta. Eu preciso disso.
   pegou o papel laminado em tom dourado que continha a heroína sólida, parecia com sal. Ela colocou na colher e acendeu o isqueiro ali embaixo, derretendo o pó.
  Quando o pó já estava liquido ela o colocou na seringa. Soltou a colher em cima da tampa do vaso e tirou uma tira de pano que estava enrolada no braço de Barbie e logo amarrou bem forte no seu, prendendo o sangue. Ela deu alguns tapinhas naquela área e esfregou para esquentar. Pegou a seringa e aos poucos foi injetando o liquido.
  Gemidos saiam de sua boca e ela mal conseguia terminar de injetar o liquido em si. Seu coração disparava e seus olhos fechavam-se involutariamente. A respiração começou a sair pesada de sua boca e seu peito descia e subia. Barbie viu a situação da amiga e apenas riu, tirando a seringa do braço de , o que causou um pequeno sangramento na região do furo. A cabeça de girava e ela sentia um prazer inigualável, quase um clímax sexual.
  Após pouco mais de 10 minutos já estava quase completamente recuperada dos efeitos da droga. Ela saiu do banheiro deixando Barbie sozinha. Ela foi esbarrando em todos e se apoiava em todas as paredes que encontrava.
  Ouviu algumas pessoas chamarem seu nome, mas sequer olhou para trás. Quando ela saiu do bar encostou-se à parede e começou a vomitar. Sentiu alguém chegar atrás de si e segurar seus cabelos.
  Vomitou mais um pouco e logo parou, andou até um lugar afastado do vômito e se jogou sentada no chão. sentou ao seu lado e sorriu, ela olhou para o chão, não conseguia olhar pra ele.

Capítulo 5 - The Man Who Would Be King

"I watched friendship slip away
But it wasn't s'posed to be that way
I lived my dreams today I lived it yesterday
And I'll be living yours tomorrow"

  A luz atingiu em cheio seus olhos e ela foi obrigada a acordar pelos gritos de sua mãe. Havia passado mais de um mês que estava supostamente namorando , saía na sexta-feira e só voltava no domingo de madrugada.
  A filha estava a cada dia mais magra, gastava todo o dinheiro que ganhava em pouquíssimo tempo. estava se tornando um zumbi, não trabalhava direito, não dormia bem, sequer falava com a mãe. A menina simplesmente levantou-se, fez sua higiene e vestiu uma calça jeans qualquer, uma camisa listrada em preto e branco, uma sapatilha preta e uma jaqueta jeans.
  Ao chegar à cozinha viu um bolo de chocolate com velas formando o número 20. Era seu aniversário. Ela revirou os olhos e sorriu para a mãe que chegava à porta com um enorme sorriso no rosto.
  - Parabéns meu amor! - Disse a mulher abraçando-a.
  - Não precisava disso tudo mãe. Eu não gosto de aniversários. - A menina disse sentando-se.
  - Mas hoje é especial, você esta completando duas décadas de vida. - A mulher acariciava os cabelos da filha que já estava comendo o bolo.
  - Pra mim não faz diferença. - A menina disse de boca cheia.
  - Eu quero me reconciliar com você. Nós ficamos muito distantes nesse tempo todo. - A mulher disse cortando um pedaço para si.
  - É a gente pode tentar. - A menina sorriu para a mãe.
  - Você vai trabalhar hoje?
  - Não. Fui demitida.
  - Eu soube disso há uma semana. , por que você não me contou? - A mulher perguntou preocupada.
  - Não vi necessidade nenhuma em te contar.
  - Você não tem visto necessidade em me contar nada. Está namorando e eu sequer conheço o rapaz. - A mulher disse quase que indignada.
  - Qualquer coisa que eu te falo, você me responde com sete pedras na mão. O que eu posso fazer?
  - Desculpe . Eu estava passando por maus bocados.
  - Eu entendo.
  - O que você vai fazer de bom hoje?
  - Vou pra Londres. Show da Amy Winehouse.
  - Você vai que horas?
  - Daqui a pouco nós iremos sair.
  - Nós quem?
  - Dá para parar? Eu vou comemorar meu aniversário com meus amigos. Qual o problema?
  - Calma . Não tem problema nenhum, só quero saber mais de você. É minha filha e eu sequer sei com quem está andando.
  - Nós não agimos como mãe e filha há um bom tempo.
  - Eu tento, mas você não dá brecha.
   cortou um pedaço grande do bolo e colocou num pote verde. Pegou uma bolsa preta grande e de lado e colocou-o lá dentro. Sorriu para a mãe e saiu de casa sem ao menos se despedir. Ela sabia o que iria acontecer se a conversa continuasse daquele jeito. Ela foi até o parque da cidade, chegando lá ela começou a procurar por . Achou e e estes lhe levaram até seu namorado que a recebeu com um sorriso.
  - Oi meu amor! - Ele disse, abraçando-a e a beijando em seguida.
  - Senti sua falta. - Ela disse o abraçando.
  - Eu também. E seu aniversário, parabéns minha velhinha. - Ele disse acariciando seus cabelos.
  - É, estou ficando velha mesmo. - A menina disse fingindo cara de tristeza.
  - Você é linda e vai continuar, pode ficar tranquila. , eu não te quero aqui ok?
  - Por que ?
  - Aqui não é lugar pra você. Os caras daqui não são como o , o ou o . Acho melhor nós irmos lá pra casa.
  - Não, eu quero comprar um pico. To precisando.
  - A gente compra e depois vai pra casa ok?
  - Ta, eu trouxe um pedaço de bolo pra você.
  - Ok. Quando forem umas três a gente sai daqui de trem e vai pra Londres.
  - Ta bom. Vamos lá ao Axel.
  Eles saíram abraçados e rindo, deu beijo na testa de e a apertou mais em seu abraço. O casal parecia feliz, apaixonado, quem os via dizia que eram perfeitos um para o outro, mas talvez todos estivessem errados.
  Chegaram a Axel e logo tinham sua droga. preferiu comprar o liquido já na seringa, para poder usar na hora já que em pouco tempo poderia sofrer uma crise de abstinência.
  Entrou no banheiro fétido do parque. Tinha cheiro de podre e de fezes, a pintura inicial da parede era branca, mas estava amarela. Tudo estava rabiscado, manchado. Seringas, guimbas e papelotes se espalhavam pelo chão. Aquele era o local proibido da cidade, onde apenas os mais viciados frequentavam. Quem ia ali não tinha muitas chances de socializar com o povo do centro. Hexham era uma cidade pequena e por isso as pessoas julgavam e rotulavam, e aqueles que iam ao parque eram os drogados que ninguém poderia andar junto.
   sempre fora uma das excluídas, o fato de agora estar sentada no chão sujo do fétido banheiro do parque completamente drogada, era apenas uma consequência de tudo o que viveu. Ela estava pálida e suava frio, a seringa estava injetada em seu braço, mas logo fora tirada por Barbie, que havia chegado naquele instante a ponto de ter uma crise de abstinência. A menina preencheu o objeto com a droga e injetou em si mesma. Ela ficou na mesma situação que .
  Após pouco mais de meia hora elas já voltavam pra casa com seus baseados na mão rindo e brincando, ainda eufóricas pelos efeitos da droga. apenas as segurava para que não caíssem e ria vez ou outra de algo que elas falavam. Ele se sentia mal por elas, pelo caminho que seguiam. Apesar de ser viciado, ele sabia que aquilo não era bom, sabia que aquilo destruiria a vida delas como destruiu a sua própria. Sentia-se culpado principalmente por ter usado a droga pela primeira vez por causa dele. Se ele não tivesse ficado com qualquer uma no dia que foi a Sound com ela não teria experimentado candy, logo ela não seria viciada.
  Chegaram à casa de e seus colegas e logo e Barbie corriam para se arrumar pro show da Amy. apenas jogou-se no sofá e ficou bebendo whisky enquanto ouvia as risadas e gritos das meninas.
   saiu lá de dentro com uma calça black jeans rasgada, uma camisa do "God save the Queen" do Sex Pistols, um salto scarpin vermelho e uma jaqueta de couro preto. O cabelo estava meio bagunçado e um batom vermelho acentuava seus lábios. Barbie estava com um vestido preto curto com a cintura marcada e o sutiã vermelho aparecendo, o salto era igualmente vermelho e ela carregava uma jaqueta jeans com a língua símbolo dos Rolling Stones. O cabelo que lhe vinha nos ombros estava com as pontas espetadas e a franja estava perfeitamente jogada. Nos lábios ela usava apenas gloss. Ambas tinham os olhos marcados da maneira que Amy o fazia, estavam radiantes. sorriu para elas e foi se arrumar deixando-as conversando sobre qualquer coisa na sala.
  Depois de pouco mais de meia hora saiu do quarto um de chapéu, camisa listrada em preto e branco, calça black jeans com a bainha dobrada e um Oxford preto. Por cima vinha uma jaqueta de couro simples. Os três saíram de casa e telefonaram para Savannah, , , e Sabine que já estavam em Londres esperando por eles. A noite prometia, acreditava fielmente que aquele seria o melhor dia de sua vida.

Capítulo 6 - Time for Heroes

"Tell me what can you want
When you've got it all, the whole scene is obscene"

  Todos estavam muito animados, já passava das dez e meia e a casa de shows já estava cheia. Apesar de o show só começar às onze, uma hora antes já se via pessoas desmaiadas sendo carregadas pelos seguranças e não pense que era pela emoção de ver a Amy ao vivo. estava sentada em uma mureta que havia há alguns metros do palco, com um cigarro em uma mão e o copo de whisky na outra. Jurou para si mesma que antes do show não usaria nada.
   estava no estacionamento usando qualquer coisa, ele parecia um zumbi quando chegaram lá. Havia doado sangue para conseguir dinheiro e isso o deixou fraco. Agora ele tentava ficar forte usando crack ou qualquer outra merda que não sabia o que era.
  Ela olhou para o palco e viu que a banda já se postava em seus devidos lugares, as luzes vermelhas foram acesas e o coração de parecia querer sair pela boca. Uma mulher com o cabelo alto e um vestido curtíssimo marcando a cintura entrou no palco, sem sorrisos e muito menos apresentações ela começou a cantar. Várias músicas que amava começaram a ser tocadas e cantadas pela voz forte de Amy, "Boulervard of broken dreams", "Wake up alone" , "Addicted" , "Love is a Losing game", "In my bed" , um cover de "All my loving", "You know I'm no good", "Rehab" e por último veio "Back to Black".

  'He left no time to regret
  Kept his dick wet with his same old safe bet
  Me and my head high
  And my tears dry, get on without my guy
  You went back to what you knew
  So far removed from all that we went through
  And I tread a troubled track
  My odds are stacked, I'll go back to black
  We only said goodbye with words
  I died a hundred times
  You go back to her
  And I go back to
  I go back to us
  I love you much
  It's not enough, you love blow and I love puff
  And life is like a pipe
  And I'm a tiny penny rolling up the walls inside
  We only said goodbye with words
  I died a hundred times
  You go back to her
  And I go back to
  We only said goodbye with words
  I died a hundred times
  You go back to her
  And I go back to
  Black, black, black, black
  Black, black, black...
  I go back to
  I go back to
  We only said goodbye with words
  I died a hundred times
  You go back to her
  And I go back to
  We only said goodbye with words
  I died a hundred times
  You go back to her
  And I go back to black?

   havia tomado um comprimido de LSD no início do show, queria sentir as batidas do soul e a voz forte de Amy ao invés de simplesmente ouvi-las. Suas pupilas estavam dilatadas agora e ela estava completamente fora de si, seu corpo se movia sozinho ela simplesmente sussurrava a letra da música. Ela se sentia feliz, solta, tranquila, sentia-se em outro mundo. Mas agora, duas horas depois, ela estava apenas feliz e com medo ao mesmo tempo. As pessoas lhe empurravam e ela sentia como se não conseguisse andar, como se estivesse presa.
  Após alguns minutos ?fora do ar?, começou a andar, só foi entender o que acontecia quando viu policiais baterem em algumas pessoas. Barbie chegou ao seu lado e puxou-a pelo braço, quando chegaram ao estacionamento viram alguns carros pegando fogo e várias pessoas gritando e correndo machucadas.
  - O que ta acontecendo? - perguntou desesperada enquanto corria com Barbie.
  - Não sei, os tiras entraram e baixaram o cacete em todo mundo! - Barbie gritou parando em seguida e olhando em volta. - Merda, a Savannah deve ter ficado lá dentro. Vou lá procurar ela, fique aqui!
  Barbie saiu correndo e ficou ali, ela começou a andar por entre a confusão. Estava completamente perdida. Olhava para os lados a procura de alguém conhecido, mas não encontrava ninguém. Ela gritava e berrava o nome de seus amigos, mas ninguém lhe atendia. Ela fora empurrada e jogada para vários lados, havia até apanhado. Depois de quase minutos assim ela chegou a um lugar mais fechado, onde havia alguns casais. Ela passou por eles olhando para o chão, até que um par de oxfords entrelaçados a um par de saltos agulha chamou sua atenção.
  Ela olhou para o casal e viu com uma loira qualquer. Eles praticamente se engoliam, uma das mãos de apertava fortemente o seio da mulher enquanto a outra apertava a bunda dela por baixo da minúscula saia, deixando a mostra a calcinha.
  - Eu não acredito nisso. - Disse chamando a atenção de , que soltou bruscamente a loira.
  - , não é isso... - Ele começou a dizer indo em direção a que saiu correndo.
  Ele tentou ir atrás, mas sabia que agora ela não lhe responderia de maneira nenhuma. A menina corria por entre a confusão que ainda acontecia no estacionamento, ouviu algumas pessoas gritarem seu nome, mas não conseguia pensar direito. Empurrou várias pessoas e também foi empurrada.
  Ela andou e correu por uns vinte minutos, até que resolveu sentar-se no chão imundo de um beco sem saída. Ela enfiou as mãos nos bolsos da jaqueta e retirou de lá mais um comprimido de LSD e uma dose de heroína. Ela retirou a seringa pequena e a agulha embalada que estavam no outro bolso e então preencheu o objeto com a heroína.
  Ela arrancou o casaco, sentindo instantaneamente o frio que já se aproximava com o fim do verão. Ela esticou o braço esquerdo e localizou facilmente a veia em sua pele branca. Posicionou a agulha ali em cima e aos poucos foi enfiando-a em sua veia, injetando todo o liquido de uma vez só. Assim que terminou ela jogou a seringa para o lado e engoliu o LSD.
  Ela tombou a cabeça para traz e começou a sentir coisas ruins, sentimentos que ela não esperava tendo em vista que ambas as drogas sempre lhe deixavam eufórica. O efeito do LSD que havia tomado antes do show ainda a estava dopando, agora com mais uma dose relativamente grande da mesma droga e mais a heroína ela estava tendo alucinações.
  Via rostos deformados e ouvia gritos. Via seus amigos e parentes como se fossem monstros. Ela estava ouvindo e vendo coisas completamente irreais. Arrastou-se até o canto mais escuro do beco e deitou-se de lado no chão. Rostos apareciam para ela e em instantes contorciam-se. Gritos, gritos, gritos. Loucura, ela estava ficando louca, era loucura, tudo uma loucura. Ela não iria morrer, ela não queria morrer, ela não podia morrer. Mas eles a mataria. Isso era tudo o que se passava pela mente de .
  Depois de alguns minutos sentindo calafrios percorrerem todo seu corpo, uma tristeza sem tamanho, suor frio, dores em todos os ossos, coração disparado e mais milhares de sensações, ficou tudo negro. As luzes foram apagadas.

Capítulo 7 - For Lovers

"I'm running away with you
Thats all I ever do
Thats all we ever mean
I forgive you everything"

  As luzes claras atingiram-lhe os olhos com violência, causando dor e náuseas. Ela virou-se e vomitou em uma espécie de balde. Seu peito doía, sua cabeça doía, suas pernas e costas doíam. Tudo em si doía. olhou em volta e percebeu que estava em um hospital, viu sua mãe sentada em uma poltrona qualquer, olhando-a com frieza.
  - Mãe, eu... - A menina começou a dizer sendo interrompida por sua mãe.
  - Cale a boca. Nós conversaremos em casa. - A mulher disse simplesmente e logo se levantou, saindo do quarto.
  Segundos depois entrou um homem que aparentava uns cinquenta anos, era meio gordo e bem baixinho, tinha o rosto no formato de um rato, um nariz enorme e sobrancelhas que eram tão grossas que pareciam uma coisa só. O cabelo em excesso acima dos olhos era completamente contraditório quando se olhava a careca do homem, tão lisa que parecia refletir algumas imagens.
  - Menina, dessa vez você escapou por pouco. Quando chegou aqui já havia sido medicada lá em Londres, mas ainda estava em um estado que nós tínhamos medo de que você não superasse o coma. - O homem disse sorrindo.
  - Há quanto tempo eu estou aqui? - Ela perguntou ignorando a sua quase morte.
  - Cerca de um mês. - A menina arregalou os olhos não acreditando naquilo.
  - Eu tive uma overdose. - Não foi uma pergunta e sim uma afirmação. Ela teve uma overdose.
  - Algumas pessoas vieram aqui lhe visitar, além de sua mãe que passou todas as noites ao seu lado. - O medico informou-lhe.
  - Quem?
  - Um rapaz chamado vinha quase todos os dias até que sua mãe teve uma conversa com ele, então nunca mais veio. Umas meninas, eu acho que se chamavam Savannah e Sabine. E alguns outros rapazes também.
  - Uma menina chamada Barbie veio aqui?
  - Barbie Thompson?
  - Sim.
  - Essa morreu pisoteada naquele show da Amy.
   arregalou os olhos e logo as lágrimas desceram violentamente. Ela não podia acreditar que aquilo havia acontecido com sua amiga. O médico só percebeu que havia falado demais quando ela começou a chorar desesperadamente. começou a debater-se na cama querendo a todo custo se levantar e ir ver suas amigas, o médico a segurava e pedia que se acalmasse. A mãe da menina entrou chorando no quarto, também pedindo que a filha se acalmasse. A cada segundo a menina berrava mais alto, o médico quase não tinha mais forças para segura-la quando a enfermeira aplicou o calmante em segundos a menina adormecia tranquilamente outra vez.

~

  Mãe e filha adentraram juntas a casa escura da periferia de Hexham. Nenhuma das duas se atrevia a dizer uma única palavra, apenas se olhavam e logo viravam o rosto para evitar o contato incômodo.
  , que estava muito mais magra que o normal e isso era facilmente perceptível já que a camisa listrada em preto e branco de malha agora estava larga para ela, assim como a calça skinny black jeans.
  A sala da casa era pequena e simples, as paredes eram brancas com algumas coisas que foram rabiscadas por durante a infância. Os dois sofás, um de quatro lugares e outro de dois, eram de couro bege e formavam um L. Ambos eram encostados nas paredes. Havia uma pequena estante para a TV, o rádio e alguns porta-retratos com fotografias antigas de e Joanna. foi até o sofá e jogou-se nele, o tempo deitada ainda fazia suas articulações doerem.
  - Eu não vou fazer janta hoje, se quiser comer alguma coisa tem uns muffins no armário da cozinha. - Joanna disse.
  - Ta. Mas você vai sair? - perguntou enquanto via a mãe colocando algumas coisas dentro da bolsa.
  - Eu vou fazer o pedido de um visto para a Alemanha e se possível comprar a passagem. - A mulher respondeu de má vontade.
  - Você vai visitar a vovó?
  - Não. Você vai morar com ela. - A mulher disse friamente, olhando para a garota que no segundo seguinte arregalou os olhos.
  - Você só pode estar louca. Eu não vou morar com ela nem amarrada. - A garota levantou-se e olhou duramente para a mãe.
  - Você não pode ficar aqui . Lá você vai conseguir se curar desse vicio.
  - Então eu vou ligar para o e nós nos curaremos juntos. - A menina disse já indo procurar seu celular.
  - Esquece esse rapaz, minha filha. É por culpa dele que você esta nessa situação deprimente. - A mulher disse como uma suplica.
  - Não é por causa dele mãe. Quando eu o conheci eu já estava mal demais e foi ele quem me ajudou!
  - Te ajudou? Ajudou te dando drogas? Filha, essas coisas podem até parecer uma forma de liberdade, mas elas são uma prisão. Elas matam. - A mulher disse demonstrando sentimentos pela primeira vez.
  - De todas as drogas que usei, e não foram poucas, a mais destruidora, a mais insana e a mais viciosa foi o amor.
  - Com 20 anos de idade todo mundo é o amor da sua vida. Nós, mulheres, somos inteligentes e maduras, mas somos bobas. Qualquer um pode nos enganar com esse papo de amor. - A mais velha disse com lágrimas nos olhos.
  - Mãe, se você tivesse prestado atenção em mim por pelo menos 5 minutos nos últimos seis meses teria percebido que eu já vivi muita coisa. Que eu sei o que é ser enganada.
  - Ele te traiu. Aquele tal te traiu e você quer voltar para ele. Você não é tão burra assim , eu sei que não é.
  - Mãe, eu sou virgem. Ele não, ele tem certas carências que eu não estou preparada pra suprir. Eu sei que hoje em dia não é normal ouvir isso, que uma garota de 20 anos que é viciada em heroína é virgem. Mas eu sou e não estou realmente preparada pra mudar essa condição.
  - Eu entendo minha filha. Mas ele devia ter te respeitado e você deve respeitar a si mesma.
  - Mãe, eu prefiro saber que ele está comendo qualquer uma simplesmente por comer do que ele forçar a barra comigo e eu fazer algo que vá me arrepender.
  - Por favor, não volte com ele.
  - Eu vou sim, mãe. Não precisa perder seu tempo e seu dinheiro para eu ir para Alemanha, eu não vou.
  - Não faça isso consigo mesma. Digo isso para o seu próprio bem.
  - Tchau mãe. - A menina disse já batendo a porta atrás de si.
  Ela foi até o ponto de ônibus mais próximo e viu que tinha pouco dinheiro, mas dava para a passagem. Logo o ônibus veio e ela estava no último banco, olhando pela janela e pensando em tudo que vivera. Pensando na falta que fazia para si. Ela abaixou a cabeça e fechou os olhos, adormecendo em seguida. As pessoas estranhavam a presença dela ali, sabiam de tudo o que havia acontecido e achavam que ela iria para Alemanha como sua mãe lhes informou.
  Todos sentiam pena dela, estava muito magra e com profundas olheiras. Podia-se notar a maioria dos ossos dela sob a pele. Ela estava em um caminho que não havia volta. Sentiu alguém lhe balançar de leve e levantou o olhar, vendo que havia chegado ao seu destino. As pessoas ainda lembravam o ponto em que descia todos os dias quando pegava aquele ônibus.
  Ela desceu e viu o ônibus seguir seu caminho. Olhou em volta, a estrada, os campos perfeitamente verdes, as lindas árvores floridas devido à primavera. Era um lugar lindo, extremamente lindo. Olhou para frente, onde havia alguns carvalhos que escondiam a estreita estrada de terra que começava ali. Eles tinham uma aparência meio sinistra, eram escuros e dava a estrada uma aparência de cenário de filmes de terror. riu com seus pensamentos completamente idiotas em relação à paisagem do local e foi em direção a estrada. Ela andou os 5 minutos que geralmente levava para chegar até o galpão-casa onde morava.
  De repente um enorme medo tomou conta de si. O que diria? Como diria? E se ele estivesse com outra? E se não fosse ele quem a atenderia? E se ele não estivesse em casa? E se sua mãe tivesse falado tantas barbaridades que ele desistiu dela? Inúmeras perguntas apossavam-se seus pensamentos, até que ela decidiu que iria dar à cara a tapa e falaria qualquer coisa que viesse a mente.
  Ela deu os últimos passos que faltavam e bateu três vezes na porta. Logo a atendeu sorridente.
  - ! Garota, que susto você deu em nós! - a abraçou fortemente e logo a arrastou para dentro de casa.
  Savannah e Sabine estavam deitadas juntas em um dos sofás, estava jogado no chão bem em frente a elas, e estavam sentados de qualquer jeito no outro sofá. Estavam todos assistindo ?Psicose? de Hitchcock.
  No momento em que a viu, sentou-se direito e segurou um sorriso que queria a todo custo abrir-se. Todos se levantaram e foram cumprimentá-la.
  - E ai, como estão as coisas? - Savannah perguntou sorrindo.
  - Eu acordei antes de ontem. Ainda sinto muitas dores no peito e nas costelas. Mas fora isso, eu to indo né.
  - Cara, você é louca? Que merda foi aquela de misturar dois papeis de LSD com uma dose enorme de heroína? Você queria se matar? - Sabine perguntou quase gritando com .
  - Não, eu só queria esquecer os problemas.
  - Porra, quer esquecer os problemas toma ?bola? e vai ter um barato, e não misturar LSD e Candy. - Disse a outra, com raiva. - A gente achou que tinha te perdido, que se você não morresse iria sumir da nossa vida por causa da sua mãe. Já basta a Barbie ter morrido mais essa eu não ia aguentar.
  - É eu soube da Barbie. - disse triste.
  - É, contaram para a gente que você precisou ser sedada senão ia bater naquele médico. - disse rindo um pouco.
  - Eu sou fodona, eu sei.
  - É sim pequena! - Gritou a abraçando.
  - Bom, gente, é melhor nós irmos embora porque a e o tem muito que conversar. - Savannah disse levantando-se e pegando sua bolsa.
  Alguns minutos depois todos já tinham ido embora e só restaram os dois na sala. Um silêncio incomodo se apossou do local e ambos ficaram apenas se olhando por algum tempo. Até que o quebrou.
  - Me desculpa. - Ele pediu com a cabeça abaixada.
  - Desculpar pelo que? - perguntou sentando-se de frente para que logo desandou a falar.
  - Por ter feito isso com você. Eu não queria estragar sua vida dessa forma, eu te amo. Eu te amei no dia que nós nos vimos pela primeira vez e continuo amando até hoje. Eu só quero o seu bem, mas sou eu mesmo quem esta causando mal a você. Eu não quero isso. Acho que seria melhor se você fosse para Alemanha e tentasse melhorar, eu não sou bom para você. Eu não sou bom para ninguém. Mas tem pessoas que eu não me importo realmente em fazer mal entende?
  - Você não me faz mal, . - Ela disse olhando para as unhas roídas.
  - É lógico que eu faço! Olhe pra você, esta parecendo um zumbi. Parece comigo. Fui eu quem fiz isso com você. É tudo culpa minha. - Ele disse com lágrimas nos olhos.
  - Não . É tudo culpa do Brendan. Foi ele quem me traiu, foi ele quem me deixou triste e quem me fez procurar pelas drogas. Você realmente acha que eu não sabia que se viesse na sua casa naquela noite há quase dois meses atrás haveria todo tipo de droga? Você acha que eu não sabia muito bem os riscos que corria quando resolvi experimentar? Hoje em dia só fica viciado quem quer. E nem adianta vir com aquele papinho de que precisa experimentar pra dizer que não gosta, ou que foi muita curiosidade. Isso é mentira, a partir do momento que você nunca usou nada você pode facilmente ignorar os seres que estão usando no mesmo ambiente que você. Eu usei porque quis, eu usei porque queria esquecer meus problemas. Eu sabia de tudo quando entrei nessa e nada disso é culpa de ninguém. É tudo por minha culpa. - disse com raiva enquanto estava quase chorando.
  - É pior ainda saber disso. Saber que você queria usar drogas para se libertar e que no fim elas te prenderam. Quem lhe apresentou a essa falsa liberdade fui eu. Você não pode continuar se enganando, mentindo para si. Entenda que se você não me conhecesse não iria usar isso. As pessoas, como você, dizem que fazem certas coisas porque querem e não por serem influenciadas. Isso é mentira, para tudo na vida há uma influência de outra pessoa. Os Beatles assumiram que tiveram influencia de Elvis Presley e agora a música de forma geral é influenciada pelos Beatles. Sempre há uma influência e eu fui a sua. - disse enquanto duas lágrimas teimosas corriam por seu rosto, sendo rapidamente secas pelos dedos finos e macios de .
  - Não importa. Nós podemos vencer juntos. Eu acredito em nós, acredito no que sentimos um pelo outro. Por favor, acredite comigo. - Ela disse chorando enquanto se aproximava dele.
  - Eu acredito, eu acredito. - Ele disse enquanto ela sentava-se ao seu lado.
  Ele a olhou e acariciou seus cabelos, ela se aproximou até seus rostos ficarem a três centímetros de distância. encostou seus lábios aos de , apenas sentindo a respiração do rapaz. Logo ele tomou os lábios dela para si, invadindo-os com sua língua e puxando-a pela cintura. Beijavam-se com paixão e saudade, misturando culpa e tristeza. Era algo quase melancólico de se ver. Lágrimas desciam de seus olhos e algumas delas terminavam em seus lábios, dando um sabor agridoce ao beijo.
  Após alguns minutos já estava deitado sobre a garota que havia jogado a camisa dele e a própria para qualquer lugar do local. parou o que fazia e a olhou, ela estava com a respiração descompassada e com o coração batendo tão alto que ela jurava que estava ouvindo.
  - Tem certeza? - Ele perguntou.
  - Absoluta.
  Eles voltaram a se beijar e tinha certeza de que nada mais os podia separar.

  You put your love upon me
  Though i was but poor
  We lived a twisted little fairy story
  Up on the 5th floor

  I said you can have my love for a song all right
  But don't hold it up to the light
  Oh loveless
  My loveless love

  I can't give you anything but love
  (love for loves own sake)
  It's like a message from above
  (all the love we make)
  Watch out for those foreign girls
  (they never seem to make much sense)
  Mistake my plastic beads for pearls
  (we'll leave all life's pretence)

  Don't you walk down lonely streets
  Under darkened skies
  Come on up with me to my lonely retreat
  I will sing you lullabies
  We string it up and string it along
  And listen to those old time songs
  And make believe that they were written for you and me

  I can give you anything but love
  (love for loves own sake)
  It came like a message from above
  (all the love we make)
  Watch out for those foreign girls
  (they never seem to make much sense)
  Mistake my plastic beads for pearls
  (we'll leave all life's pretence)

  If you still love me
  By morning
  Oh you'll find me waiting in the garden
  By the cherry blossom tree
  Bring tin cups of wine and cigarettes
  Come to me in pirouettes
  My darling
  Save all your love for me

  I can't give you anything but love
  (love for loves own sake)
  It came like a message from above
  (all the love we make)
  You watch out for those modern girls
  (who never seem to make much sense)
  Mistake my plastic beads for pearls
  (in a world of innocence)

  I will sing you lullabies in all your dreams
  (if you tell me that you will)
  I've seen those dirty magazines
  (and i got my cheap thrills)

  I can't give you anything but love
  Was that that sweet old song
  That you sung when i held you in my arms
  I can give you anything but love?

Capítulo 8 - Dancing with Mr. Browstone

"I used to do a little, but a little wouldn't do
So the little got more and more
I just keep tryin' to get a little better
Said, a little better than before"

  Havia passado mais de uma semana desde que voltara. Estava morando com e, talvez por isso, seu vicio só estava piorando, a cada dia ela usava mais e mais drogas. Misturava algumas coisas e brincava com o perigo, brigava com ela e pedia para que não fizesse aquilo, mas nada adiantava.
   estava saindo sozinha no parque, havia saído de casa de manhã e deixado sozinho. Já passava das oito da noite e ele não havia ido ao parque encontrá-la como sempre, o que era estranho.
  Ela chegou a casa e chamou por , a resposta veio com um gemido que parecia ser de dor. Ela percebeu que o barulho vinha do quarto e então foi até lá, encontrando um completamente suado o chão todo vomitado. O rapaz parecia estar sentindo dor, ele estava em posição fetal, escondendo o rosto. foi até ele e sentou-se ao seu lado, ele deitou a cabeça em suas pernas e segurou com força. Ele tremia muito e suava frio, sequer conseguia falar.
  - O que está acontecendo, ? - perguntou preocupada e horrorizada com a situação do namorado.
  - Abst... Abstinência. - Ele disse com dificuldade.
  - Vou ver se arranjo algo pra você. - Ela se levantou e começou a procurar pela casa, mas percebeu que já estava tudo revirado.
  - Eu já procurei. Você não tem nada aí? - Ele disse com a voz esganiçada.
  - Não. Merda, por que você não foi ao parque?
  - Porque eu já acordei mal.
  - Droga. Vou ver se arranjo alguma coisa. Aguenta ai. - Ela disse isso e saiu do quarto, logo em seguida bateu a porta de entrada atrás de si.
  A rua estava escura e deserta, ela andou por quase uma hora até chegar à área do parque. À noite aquele lugar era cheio de prostitutas, não que durante o dia não fosse, mas naquele horário elas diminuíam bastante o comprimento de suas saias. viu Savannah e Sabine conversando. Estranhou aquilo, mas não se importou. Foi falar com elas, quando estava chegando perto foi recebida por uma Sabine sorridente.
  - Fala ae, ! Fazendo o que aqui? - Perguntou Sabine dando um beijo no rosto de que, obviamente, estranhou a atitude.
  - Vim ver se encontro alguém disposto a doar um pico para o . - Disse jogando uma indireta para as amigas.
  - Nós estamos aqui fazendo o mesmo , se tivéssemos a gente daria na boa, você sabe, não sabe? - Disse Savannah.
  - Sei sim, mas eu não faço a mínima idéia de como conseguir.
  - Faz o mesmo que a gente ora! - Disse Sabine como se fosse óbvio.
  - Vocês estão... Se prostituindo certo? - Perguntou .
  - Sim. Por quê? - Sabine olhou-a sem entender.
  - Não sei... Erm...
  - Você é virgem? - Savannah perguntou sem cerimônias.
  - Não.
  - Fala a verdade . - Sabine ordenou.
  - To falando, mas eu perdi a virgindade semana passada. - Ela disse, envergonhada.
  - Ah, quando você e o voltaram, sei. - Savannah disse dando um empurrãozinho em .
  - Cara, o ta muito mal? - Perguntou Sabine.
  - Muito. Ele ta tendo uma crise de abstinência né. Ta suando e tremendo muito. Ele ta até com algumas marcas roxas.
  - É porque quando a dor fica muito grande a gente sente uma dormência e por algum motivo começamos a socar o local. Ai fica tudo roxo. - Explicou Savannah.
  - Cara, bate uma para qualquer um desses velhos babões que tem aqui e arranja dinheiro só pra conseguir um pico pro . - Disse Sabine olhando em volta.
  - É verdade, cara, vai por mim, o não merece ficar desse jeito. É uma sensação horrível, dica de quem já passou por isso. - Savannah disse pesarosa para a amiga.
  - Olha aquele lá é o Fritz. Ele é um coroa alemão que ta caindo aos pedaços, mas gosta de novinha. Ele sempre vem comigo, vou dizer que hoje não dá, mas que você sabe fazer muito bem o meu serviço. - Disse Sabine enquanto tentava encurtar as roupas de .
  - Mas do que ele gosta? - perguntou quase com nojo na voz.
  - Ele só pede pra bater uma e em troca dá umas cinco libras. Mas dependendo do dia ele pode pedir sexo oral, então te paga 20 libras. - arregalou os olhos sem acreditar naquilo.
  - É o jeito gracinha, ou você faz isso ou o pode morrer de uma parada cardíaca. - Savannah disse simplesmente.
  - Eu vou tentar. Tentar. - disse.
  O carro preto, que parecia ser de luxo, parou em frente a elas. O vidro do carona desceu e Sabine encostou os cotovelos na janela, falando qualquer coisa com o homem. Ela puxou e a fez dar uma girada. O homem sorriu, Sabine abriu a porta e empurrou para dentro.

~

   saiu do carro completamente envergonhada, não acreditava que havia feito aquilo. Savannah e Sabine já haviam saído de lá com outros clientes. Ela estava com 20 Libras nas mãos procurando Axel, quando o encontrou gastou todo o dinheiro com heroína, o que era bastante tendo em vista que o preço dessa droga diminuiu bastante depois do surgimento do crack. Ela voltou para casa e encontrou na mesma situação de antes. Entregou-lhe a droga e foi para o banheiro tomar banho.
  Estava terminando de enxaguar o cabelo quando viu a porta ser aberta. empurrou a cortina de plástico que tampava o boxe para o lado e olhou nos olhos de .
  - Obrigado por ter conseguido a droga e melhorado minha situação, mas como você conseguiu isso? - Ele perguntou suspeitando de que a menina havia se prostituído.
  - Eu pedi ajuda ao pessoal oras. - Ela disse como se fosse óbvio.
  - Você pediu ajuda a Savannah e a Sabine? - Ele perguntou enquanto fechava os olhos tentando a todo custo acreditar que ela não havia feito o que ele estava pensando.
  - Sim, pedi. Qual o problema? - Ela disse tentando em vão esconder o medo.
  - Que tipo de ajuda ? - Ele abriu os olhos e havia ódio e nojo neles.
  - Não interessa.
   tentou sair do boxe, mas segurou em seu braço e jogou-a no chão. Por sorte ela não bateu a cabeça. abaixou até estar de frente para ela, que estava jogada no chão do boxe, segurou forte demais em seus braços e olhou no fundo dos olhos dela.
  - Me diz o que você fez. - mandou.
  - , você esta me machucando. - disse chorando.
  - Me diz logo o que você fez! - O rapaz ordenou balançando-a. soltou um grito esganiçado e lágrimas desciam livremente por seu rosto.
  - , por favor, pára. - Ela implorou chorando.
  - Me diz o que você fez e eu paro, gracinha. - Ele disse em um tom irônico e ameaçador.
  - Eu fiz isso por você seu babaca! Não foi por mim, era você quem estava colocando as tripas pra fora naquele quarto! - Ela gritou, recebendo um soco no lado esquerdo do rosto em seguida.
  - Sua puta! Não venha me dizer que fez merda nenhuma por mim, eu não pedi que fizesse nada. - Ele disse enquanto saia do banheiro batendo a porta atrás de si.
   ficou deitada no chão, o sangue, que saia de um corte que acabara de ser feito em sua boca, escorria junto com a água que ia para o ralo. O piso era branco e gelado, já que a água que saía do chuveiro chegava lá embaixo significativamente mais fria. Ficou lá, chorando, jogada no chão por quase meia hora. Até que se levantou e fechou a torneira do chuveiro. Pegou a toalha e secou-se, colocou uma calça jeans qualquer e uma camisa branca que havia levado para o banheiro. Olhou no espelho, sua boca estava inchada.
  Ela saiu de lá e foi direto ao quarto, encontrou que tentou falar algumas coisas que ela não estava dando a mínima atenção. Pegou todas as suas roupas e saiu de casa.
  Andou pela rua chorando, ouvindo ?Boulevard of Broken Dreams? e rindo de como o destino zoava com a cara dela até quando ela coloca o iPod no aleatório.

'My shadow's the only one that walks beside me
My shallow heart's the only thing that's beating
Sometimes I wish someone out there will find me
'til then I walk alone'

  Seus pés já estavam doendo quando chegou à cidade. Ela simplesmente não sabia o que fazer. Não sabia se ia para casa ou não. Pensou em como sua mãe a receberia às quatro da manhã, com a boca inchada e o cabelo bagunçado, sem mencionar as manchas roxas por todo o corpo.
  Ela se sentou em um dos vários bancos que havia nas calçadas de Hexham. Sentia-se sozinha como nunca havia sentido antes. O melhor a dizer é que ela não sentia nada. Ela só sentia o vazio por dentro, junto com algo que ela denominava dor, mas que poderia ser vontade de morrer. Lembrou-se que ainda tinha Candy em sua bolsa, então resolveu usá-la. Fez o mesmo ritual de sempre e logo estava deitada no banco viajando para mundos desconhecidos.

Capítulo 9 - Music When The Lights Go Out

"And the memories of the pubs and the clubs
And the drugs and the tubs we shared together
Will stay with me forever
But all the highs and the lows and the tos and the fros
They left me dizzy
Won't you please forgive me
I no longer hear the music"

  A luz atingiu seus olhos em cheio, sua cabeça doía como toda manhã. Ela se lembrava perfeitamente de que havia dormido em algum banco da cidade, mas o lugar sobre o qual estava deitada era muito mais macio que um banco e muito mais quente que os ventos de Hexham. Ela se sentou e olhou para os lados, olhou em volta e percebeu que estava em seu quarto na casa de sua mãe. Levantou-se e tentou abrir a porta, estava trancada. Gritou por sua mãe e logo ouviu o som de passos do outro lado da porta.
  - Mãe! Mãe, me tira daqui! - A menina gritou enquanto batia na porta.
  - Não , você vai ficar ai. - A mulher respondeu do outro lado.
  - Você não pode fazer isso! - Gritou mais uma vez.
  - Posso sim, querida. Eu estou fazendo. - Ela disse pesarosa.
  - Por que você ta fazendo isso, mamãe? - perguntou chorando.
  - É para o seu bem meu amor, por mais que você não acredite nisso.
  - Por favor, mãe, me tire daqui.
  - Desculpe-me meu amor, por favor.
  - Não faz isso comigo! - A menina gritou enquanto ouvia os passos de sua mãe se afastando.
  Em seu quarto não havia janela alguma, nenhum lugar pelo qual pudesse sair. Havia um banheiro pequeno que sua mãe mandara fazer para que não ficasse tendo de dividir o banheiro com seus os ?hóspedes?. Ela encostou as costas na porta e foi descendo devagar até o chão. As lágrimas começavam a descer, ela apertou os lábios e estes doeram fortemente.
  Ela se levantou e começou a revirar todo o quarto a procura de alguma droga. Jogava todas as roupas no chão, virava os móveis, e quebrava várias coisas por pura raiva.
  Joanna ouvia o som da filha quebrando as coisas dentro do quarto e não conseguia fazer nada além de simplesmente chorar. Sentia uma enorme dor por estar causando aquilo à filha, mas ela não podia fazer nada.
  - DESGRAÇADA! EU TE ODEIO! - gritava enquanto chutava e socava a porta do quarto. - VOCÊ ME PAGA QUANDO EU SAIR DAQUI! VOCÊ SÓ SABE RECLAMAR DE MIM, MAS NUNCA FOI MINHA MÃE APESAR DE DIZER O CONTRÁRIO. VOCÊ NUNCA SE IMPORTOU COMIGO NEM POR CINCO MINUTOS! VOCÊ NÃO TEM O DIREITO DE FAZER ISSO COMIGO! EU NÃO SOU UM ANIMAL!
  - Por favor, me perdoe meu amor. - A mulher sussurrou para si mesma enquanto bebia um gole de seu café.
  A menina continuou socando a porta, quando se cansava de fazer isso ela ia quebrar as coisas do quarto. O chão estava cheio de cacos de vidro, e por isso estava manchado do sangue que saia dos pés de quando pisava nos cacos.
  Ela deitou no chão em posição fetal, uma dor latejante tomou conta de seu peito. Gotas de suor formavam-se em sua testa, ela sentia um frio enorme, mas não tinha forças para levantar e deitar debaixo dos cobertores. Seus olhos queriam fechar-se, mas não conseguiam. Algo que ela não sabia o que era os mantinha abertos, arregalados. Quando suas pernas começaram a ficar dormentes ela se esforçou para sentar e começou a socá-las. Um grito esganiçado saiu do fundo de sua garganta. Dor, dor, dor, dor, dor. Era tudo em que pensava. Apenas a dor, nada mais que aquilo. Aliás, até tinha algo mais, frio, calafrios que desciam de sua nuca até a ponta de seus dedos dos pés.
  A todo o momento alguma parte de seu corpo ficava dormente, endurecida.
  Ela ficou ali, deitada no chão contorcendo-se de dor durante todo o dia. Algumas vezes sua mãe entrava no quarto e deixava alguma comida que não comeria. E não porque ela não quisesse, é porque ela estava vomitando qualquer coisa que colocasse em seu estômago.
  Quando a dor se tornou insuportável ela resolveu fazer o teste de algo que ouvira quando era criança: ?Uma dor mais intensa pode te fazer esquecer a outra?. se arrastou até o banheiro e pegou uma gilete. Abriu, com muita dificuldade, a mão esquerda. Ela colocou a ponta da gilete em sua palma e foi cortando-a de um lado até o outro. Gritos de dor ensurdecedores saiam por seus lábios, mas ela não queria parar. Era melhor que seu cérebro desse prioridade aquela dor do que a da abstinência, que a enlouquecia.
  Sua mão estava completamente cortadas, o sangue escorria por seu braço, pelo chão. Estava tudo sujo.
  Uma hora ela se cansou, aquilo não fazia mais efeito. Ela se arrastou até o quarto, e com a mão cortada começou a escrever coisas aleatórias e desconexas na parede. Apesar de lhe proporcionar dor aquilo não era o suficiente para lhe fazer esquecer a loucura.

~

  Quase um mês se passou e já havia melhorado bastante. Não havia mais dor e ela já conseguia comer. A tremedeira e o frio ainda não haviam sumido completamente, mas ela já estava melhor. Sua mãe não a tirou do quarto, ela continuava trancada, presa. Ela sentia falta de e de seus amigos, mas preferia não vê-los agora. A lembrança do que lhe fizera ainda estava viva, o rosto dele cheio de ódio era seu pesadelo durante todas as noites.
  As feridas em sua mão estavam cicatrizando rápido. Seu quarto ainda estava bagunçado, mas ela já havia arrumado muita coisa.
  Estava lendo o livro ?Mais pesado que o céu?, uma biografia de Kurt Cobain. É contraditório o fato de alguém ler uma biografia do cara que aparentemente se suicidou por causa das drogas enquanto tenta se curar delas. Mas não se importava se alguém entenderia, não era esse seu objetivo.
  Ela estava sentada na cama, com o livro nas mãos - a esquerda estava enfaixada -, a camisa tinha o símbolo do ?The Strokes? e a calça era jeans normal. Ela respirava fundo algumas vezes, uma tentativa de calar a voz que clamava por drogas. Levantou-se, seu corpo doía pelo tempo deitada. Ela foi até a porta, como fazia todos os dias, colocou a mão na maçaneta. Ao contrário de todas as outras vezes, a porta abriu.
   não conseguiu conter sua felicidade, vestiu o All Star preto surrado e saiu correndo de casa. Ela não sabia pra onde ir, só queria correr e sentir a liberdade outra vez depois de tanto tempo.
  Seus pés moviam-se automaticamente seguindo o caminho que já estavam acostumados. Quando ela parou de correr já morta de casaco reparou que estava no parque.
  Ela tentou se segurar, mas não conseguiu. Entrou no local e foi direto para a área em volta dos banheiros, onde seus amigos costumavam ficar.
  Quando chegou lá olhou para o grupinho que estava conversando. Savannah, Sabine, , , e . Ela respirou fundo e abaixou a cabeça. Não havia coragem alguma e o fato de o cheiro de cocaína ser forte demais ali não a estava ajudando em nada.
  Inspira, expira, inspira, expira, inspira, expira. Era tudo em que ela pensava.
   respirou fundo e virou as costas para os amigos, pronta para voltar para casa e tirar aquele cheiro de drogas que a estava deixando louca.
  - Hey gracinha! Ta indo embora por quê? - Ela ouviu a voz de Savannah a chamar.
  Ela virou para elas e sorriu. Foi em direção a eles e quando chegou recebeu um forte abraço de .
  - O que aconteceu nesse tempo, hein? - perguntou vendo que a garota estava diferente.
  - Eu não uso nada desde a última vez que nos vimos. - Ela disse e o rapaz arregalou os olhos.
  - Como você conseguiu isso? - Ele perguntou com um enorme sorriso no rosto.
  - To presa no quarto desde aquele dia. - A menina disse tentando segurar a lágrima que queria cair.
  - Como assim? - perguntou sem entender. Todos prestavam atenção, principalmente .
  - Minha mãe me prendeu no quarto. Eu estava presa no meu quarto até uma hora atrás. - Ela disse não conseguindo mais aguentar a tristeza e o alívio, deixou que as lágrimas corressem livres por seu rosto.
  - Sua mãe está te mantendo em cárcere privado? - perguntou a abraçando e depositando um beijo em sua testa.
  - Mas é para o meu bem, eu sei disso. - Ela disse se afastando dele e indo em direção a Savannah.
  - Cara, senti muito sua falta. - Disse Savannah enquanto a apertava.
  - Também senti sua falta! - disse se afastando e já indo em direção a Sabine.
  Ela abraçou todos, menos .
  - Nós precisamos te pedir desculpas. - Savannah disse referindo-se também a Sabine.
  - Desculpas? - não entendeu de inicio.
  - Sim, desculpas por termos te influenciado a... Você sabe. - Disse Sabine.
  - Sei. Mas não precisa pedir desculpas. Seria necessário se houvesse arrependimento da minha parte. Não houve. - disse sorrindo.
  - Oi, . - disse chamando sua atenção. olhou para baixo e pigarreou antes de dizer:
  - Oi, . - Ela disse evitando olhar nos olhos do rapaz. - Nós podemos conversar?
  - Bom, hora de nós irmos embora não é? - disse puxando todo mundo para longe.
   olhou os amigos se afastarem e sorriu para Savannah e Sabine que haviam virado e mandado beijos. Ela olhou para os tênis sujos e depois sorriu para , que parecia nervoso.
  - Então, como vai a vida? - Ela perguntou sem saber como começar aquela conversa.
  - Bem. Eu nem vou perguntar como vai a sua. Já tive a resposta. - Ele disse encostando o quadril na parede parda do local.
  - É. - Ela disse estranhando aquela situação. - Você não me perdoou não é mesmo? - Ela perguntou sentindo mais lágrimas vindo a seus olhos.
  - Eu que tem que ser perdoado, . - Ele disse simplesmente.
  - Para de se culpar por tudo. Eu fiz merda, eu sei. Sua reação foi exagerada, eu sei. Mas... - Ela foi interrompida.
  - Sem ?mas? dessa vez ok? Nós não conseguimos fazer bem um ao outro. Não tem mais jeito para nós. Eu te amo, . Te amo mil vezes mais a cada dia que passa, mas nós fazemos mal um ao outro. Não há maneiras de mudar isso. - O rapaz disse sem olhar nos olhos dela.
  - Por quê? - Foi tudo que ela conseguiu dizer.
  - Eu não faço idéia. Mas nós não podemos mais continuar juntos, se ficarmos iremos nos matar. E nós nunca vamos conseguir juntos. Nunca. - Ele disse isso e beijou a testa dela antes de sair andando.
   encostou-se na parede e fechou os olhos, deixou a lágrimas descerem. Ela olhou para o céu nublado e sorriu ironicamente. Respirou fundo e foi em direção ao centro do local a procura de Axel.
  Ela o encontrou e o convenceu a lhe dar uma dose de heroína. Foi para um dos banheiros e deu fim a toda àquela dor e abstinência que vinha sentindo há tanto tempo.

Epílogo - Say a Prayer

"Inside I felt
So, so alone
Locked in a room
Waiting til kingdom come
Although I felt elated
I felt like I was scum"

  ?s Pov

  A paisagem completamente branca era tudo com o que convivia há pouco mais de um mês. Quando fui falar com e tive uma recaída, minha mãe me encontrou e no mesmo dia conseguiu me mandar para a fazenda de minha avó em Cuxhaven, interior da Alemanha. O local é no meio do nada, um lugar qualquer entre a vida e a morte que Deus certamente não tem se preocupado tanto assim. Mas esse fim de mundo tem me ajudado, depois de ter tido uma crise mais horrível que a primeira as coisas se acalmaram.
  Estou tentando não pensar em e nas coisas que ele me falou, nas coisas que ele me fez, na frieza com a qual ele saiu de minha vida. No fim das contas sempre foi assim, as pessoas vem e vão com uma rapidez tremenda. Isso me faz sofrer, mas eu não posso obrigá-las a me aguentar. Eu mesma não me aguento as vezes. Mas que dói muito, ah, isso dói. Mas eu já me acostumei, são vinte anos vivendo assim, não nada mais que possa ser feito.
  Eu não me arrependo de nada do que fiz, faria tudo outra vez. Mas a lembrança dói. É óbvio que tem coisas boas, não posso ser hipócrita. Mas há coisas muito ruins também. Pergunto-me se alguém chegou até aqui. Acho que não, minha história não é muito interessante. Eu não sou uma pessoa realmente interessante. Eu mato as pessoas. Eu sugo a alma delas e monopolizo tudo o que elas tem, depois elas cansam e me deixam. Isso não é algo legal. Não é mesmo. Eu não sei por que ainda estou escrevendo, disseram-me que se escrevesse iria conseguir liberar minha raiva e meu ódio. Sinceramente? Eu conheço drogas que fazem isso com maestria.
  Não devia falar assim, agora sou uma moça comportada que vai a igreja todos os domingos e que mudou de vida. Minha avó me disse isso ontem. Eu quase ri, mas sou uma boa neta. Talvez eu enlouqueça se passar mais algumas semanas aqui, já pensei em fugir, mas quando olho para as cicatrizes em minha mão esquerda me lembro de tudo pelo que passei e desisto. Bom, se alguém chegou até aqui, muito obrigada por ler minha história.
  So, let me fill your nightmares baby...

  -

  ¹ Candy - Significa 'doce', apelido de heroína.
  ² Perfume de Emmanuelle - Sequência de filmes eróticos que foram lançados em 1969 e duraram até 2004.



Comentários da autora


Eu não tenho o que falar nessa nota. Realmente espero que tenham gostado, Julia principalmente. Essa fic é baseada no filme e no livro 'Christiane F. - 13 anos, drogada e protituída'.
Espero não ter assustado ninguém e nem nada do tipo, é só que eu gosto de escrever sobre essas coisas. Cara, agora, enquanto eu escrevo, são duas da madrugada e eu to morrendo de sono. Vou acabar por aqui. Beijos :*