Santa Claus Project
Escrito por Dana Rocha | Revisado por Mari Alves
Capítulo 1 - Santa Claus Project
- Vamos, , responda essa! - O professor de química sorria para mim de um jeito cínico. Ele sabia que eu não sabia a resposta, mas adorava me colocar nessas situações.
- Eu não sei. - suspirei, rolando os olhos.
- Não sabe, hein... Então parece que vai ter que ficar aqui depois da aula.
Ah é, no último dia de aula antes do feriado de Natal. Espera sentado, professor. Como se eu não soubesse que ele só fazia isso pra tentar pegar algumas alunas com falta de amor próprio (e de bom senso, hellooo! O cara era daqueles carecas baixinhos com cara de estuprador e bigode de Charles Chaplin! ECA!).
Óbvio que eu não ia ficar. Tipo assim, eu tinha combinado com a de irmos no shopping do meu pai (ok, o shopping não é dele, mas ele tem mais da metade das ações de lá) torrar nosso dinheiro. Eu não podia perder tempo com coisas idiotas como química.
O único problema era que, como essa era a última aula do dia, não tinha jeito de simplesmente não aparecer depois do sinal tocar. Eu teria que fugir da sala.
Se eu já não tivesse feito isso antes, acharia o plano completamente impossível e absurdo. Mas já é expert em fugir de recuperações e enganar professores pedófilos.
Assim que o sinal tocou (para o alívio de todos os que não entendiam nada da matéria, como eu), saí correndo feito uma desesperada, e acho que cheguei até a derrubar alguma garotinha infeliz que ousou cruzar o meu caminho. Ouvi de longe a voz irritante do professor me chamando, mas nem me dei ao trabalho de olhar pra trás. Só continuei correndo como se estivesse fugindo de um assaltante (daqueles bem feios e com PÉSSIMO senso de moda), até que senti uma dor forte e parei, dando de cara com um peitoril bem definido, escondido sob uma camisa pólo branca da lacoste. A minha camisa pólo branca da lacoste.
- Vai devagar, amor, assim vai machucar alguém! - sorria para mim (ou será que ria de mim?) enquanto seus amigos - idiotas - gargalhavam atrás dele.
- Aí, , a gente sabe que você morre de amores pelo , mas não precisa se jogar como uma bomba em cima dele não, hein! - O mais insuportável da gangue do meu namorado disse e eu revirei os olhos, com cara de desprezo.
É, o é meu namorado por quase 2 anos. Não me leve a mal, quando nós começamos a namorar, eu era completamente apaixonada por ele. Mas agora, acho que principalmente por causa dos amigos estúpidos dele, só o que sobrou daquela grande onda de paixão foi comodidade.
Eu não me sentia mais atraída por ele, e tenho certeza que ele também não gostava mais tanto assim de mim.
Por que não termino com ele? Porque o cara é o mais cobiçado pelas garotas dessa cidade, é tão rico quanto eu (e quando nós saímos, ele é quem paga tudo) e é bom de cama.
Ér... Bom, essa última afirmação eu não tenho como dizer se é mesmo verdade, porque o é o único cara com quem eu já fiz sexo na vida.
É, ao contrário do que pode parecer, eu não sou promíscua.
- ! Finalmente te achei! Fui na sala de química, mas me disseram que você saiu correndo! - chegou e foi logo me arrastando pelo braço. - Ah, oi, .
- Oi, . - ele sorriu e me deu um selinho, antes de me puxar com mais força, fazendo com que eu praticamente voasse pra fora da escola. O quê?! Eu sou pequenininha, ok? E quando as pessoas me puxam com força - como a sempre faz - eu voo! E até que é gostoso, sabe? Voar assim, sem sair do chão...
- Calma aí, menina! - eu disse, conseguindo fazer com que ela parasse de me arrastar.
- O que foi? Eu quero chegar logo no shopping, porque aquela parasita da Megan tá de olho no meu homem e eu não posso deixar ela chegar perto dele. E isso sem falar daquele vestido que ela me viu experimentando ontem. Tenho certeza que ela vai querer comprá-lo! - reclamava feito uma doida enquanto eu procurava meu carro naquela loucura de estacionamento.
- Seu homem? Acho que ele não sabe disso. - A tinha uma queda crônica por um atendente de uma loja do shopping. A gente ia lá sempre só pra ela ficar batendo papo com o cara. Ok, não era MESMO de se jogar fora. Os olhos dele eram lindos e brilhantes, e o sorriso dele era incrível. Na verdade, o pai dele era dono da loja em que ele trabalhava (o que fazia dele financeiramente aceitável). A tinha bom gosto, tenho que admitir.
Agora você deve estar se perguntando quem é Megan, certo? Bom, simples: Megan é a idiota sem vida que tenta (mas não consegue) ser a cópia da minha melhor amiga. Ela deve ser algum tipo estranho de lésbica psicopata. É, deve ser isso.
A hora do almoço no shopping normalmente era um inferno - especialmente dez dias antes do Natal.
Por sorte, eu e tínhamos sempre uma mesa reservada pra nós no nosso restaurante preferido.
- O de sempre, garotas? - Perguntou o nosso garçom de sempre assim que nos sentamos. dizia que ele tinha uma queda por mim, mas... Hellooo! O cara era garçom! Que tipo de presentes eu ganharia de Natal se fosse namorada dele? Um vale refeição?
- O de sempre. - Sorri pra ele e voltei minha atenção para o mesmo lugar que olhava: a loja do .
- Vai comprar qual videogame hoje? - perguntei debochada.
É, os tinham uma loja de videogames e acessórios nerd. Eca. Quer saber o que é mais eca ainda? A ficou craque em videogames e etc SÓ pra ter assunto com o . Ela vai todos os dias comprar jogos na loja deles. ECA.
- Tô precisando de uns jogos novos, na verdade. - Ela respondeu sorrindo e eu arqueei uma sobrancelha.
- , amor da minha vida, você realmente joga os jogos que compra?
- Ér... - ela se moveu desconfortável na cadeira. É, ela jogava. - Bom, sabe, , eles são até que bem divertidos.
- Eca, perdi até a fome agora.
- Não enche. - nós sorrimos juntas e ficamos jogando conversa fora até o garçom trazer nosso almoço.
- Tava uma delícia. - sorriu após pagar a conta (hoje era o dia dela) e nós fomos comprar um milkshake. O meu de chocolate e o dela de morango, como sempre. - Não olha agora, mas os manés do Projeto Papai Noel já começaram a encher o saco. - disse ao ver um grupinho de ótarios fantasiados ao estilo Papai Noel, abordando todo mundo que passava pra falar da merda que era o projeto voluntário que eles realizavam em todos os finais de ano.
- Eu achava que precisava ser no mínimo velho e obeso pra fingir ser o Papai Noel. - sorriu. Tipo, não tinha ninguém ali que passasse dos vinte e cinco anos. E nenhum dos homens/mulheres tinha ao menos uma barriga de chop.
- Papai Noel tomou o elixir da vida, é isso aí! - Levantei o copo do milkshake, para fazer um brinde, mas acabei - de novo - acertando alguém com o braço (e o copo).
- Aí, garota, não vê por onde anda não? - disse um ?Papai Noel? idiota (mas muito gato), me olhando com cara feia.
- Como é que eu ia adivinhar que ia aparecer um Papai Noel maluco na minha frente? E se isso tivesse caído em mim?
- Ah, tenho certeza que você pode comprar muitos outros troços como esse aí num instante. - Ele sorriu arrogante, apontando para a minha echarpe. - Ainda mais considerando que estamos num shopping. - O sorriso dele aumentou, e a minha vontade de dar um soco naquele rosto perfeito também.
- Quer saber? Você tem razão. E eu tenho mais coisas pra fazer fora ficar discutindo com um idiota como você. Ah, e pode ficar com isso. - eu disse, colocando o copo do milkshake - praticamente vazio - em sua mão. - Dá pra fazer várias crianças remelentas felizes. - Saí sorrindo de cabeça erguida daquela aglomeração de Papais Noel em que eu me encontrava e senti vários olhares de desaprovação em cima de mim.
Ah, quem liga para o que esses pobretões pensam?
- Espero que você nunca precise sair dessa bolha em que você vive! - Uma voz gritou por trás de mim, a voz daquele garoto idiota. - Vai descobrir que a vida não é um conto de fadas.
Quem ele pensava que era pra me dar lição de moral? Que imbecil! Sério, se ele não fosse tão lindo com aquele corpo escultural, aqueles olhos enormes e brilhantes e aquela boca... Ai, Deus, aquela boca...
! Recomponha-se. Ele é um idiota.
Continuando, se ele não fosse tão lindo, eu juro que falava pros seguranças do meu pai darem um jeito nele.
O meu mundo era um conto de fadas. Se o dele não era, o que eu podia fazer? Como se eu ligasse pra um monte de crianças idiotas e nojentas.
Me virei para poder dar uma bela de uma resposta bem mal-educada pra ele, quando senti me puxando pro outro lado. Eu deixei ela me arrastar pra longe da convenção de malucos, mas não estava nem um pouco afim de aguentar os papos nerds dela com o . Então, quando nós entramos na loja do , eu o cumprimentei e fui para o ?canto da vela? (uma poltrona circular super confortável que virara minha melhor amiga em horas como essa) e eu acho que eu caí no sono, porque eu só me lembro de ser - brutalmente - despertada por uma voz irritante não muito longe de mim.
- Como se uma vez não fosse suficiente! - ele bufou e se virou para ir embora, mas dessa vez eu não iria ficar quieta. Tipo, ele me acordou só pra me irritar?
- O que é, agora resolveu me perseguir, é? - Ele olhou pra mim com escárnio. Tipo, só eu tenho o direito de olhar para as pessoas assim. E ninguém, nunca mesmo, tinha me dirigido um olhar tão... tão cruel como aquele.
- Perseguir você? Por que eu faria isso?
- Não sei, porque eu sou rica, linda e todos os garotos me querem?
- Desculpa, mas bonecas de plástico não fazem meu tipo. - Ele sorriu com deboche e eu arregalei os olhos. Boneca de plástico? Agora sim ele me tirou do sério.
- Bom mesmo, porque pobretões não fazem o meu.
- Eu posso não ter nem um décimo do dinheiro que o sua família tem, mas pelo menos eu não dependo do meu papai pra viver.
- Ah, claro, porque você nem deve saber quem ele é. - Tá, confesso esse foi golpe baixo, mas o cara tinha me irritado. E, além do mais, era mais uma piada, não era pra ele ter ficado todo ofendido como ele ficou.
- Garota, você vai sofrer muito. - Ele suspirou, antes de me dar as costas e se dirigir para a porta. E eu fiquei lá, parada, com cara de tacho. Aquilo não me pareceu uma ameaça. Foi mais um aviso ou sei lá o que.
Eu, sofrer? Nunca. Eu tinha tudo o que precisava e poderia vir a precisar e não ia deixar um cara sem sorte na vida me abalar.
Deixei na casa dela e dirigi até a minha. O carinha da segurança abriu o portão pra mim e eu estacionei o meu Land Rover ao lado da Ferrari do meu pai.
Ganhei meu carro de presente de dezesseis anos. Eu tinha pedido um carro legal para o meu pai, um que me fizesse parecer (ser) a mais foda de todas.
E o que eu ganho?
Um carro gigante que cabe dez de mim. Eu já disse que sou pequena, né? Então, eu fico parecendo uma anã dentro desse carro.
Minha casa (lê-se mansão) estava inteirinha enfeitada com luzinhas e outras decorações de Natal.
- Seus pais te esperam para jantar. - A governanta, com voz de quem toma gás élio, disse, me empurrando para a sala de jantar. Não disse que todo mundo adora me empurrar?
- Dá licença, eu preciso deixar essas coisas no meu quarto e tomar um banho. - disse em tom de desprezo. Mulher folgada, só a podia me empurrar.
- Não, você vai jantar comigo e sua mãe. - Meu pai apareceu do nada atrás de mim. Pela expressão dele, lá vinha bronca.
- Tá, mas vou no banheiro primeiro. - Sem esperar por respostas, me tranquei no toalete ao lado da sala, lavei as mãos e fiquei enrolando lá (de pirraça mesmo), até meu pai bater na porta e me chamar com um tom irritado.
Pisando duro, me arrastei até a mesa e me sentei do lado direito dele, de frente para minha mãe.
- Sabe, querida, o diretor da sua escola ligou aqui hoje. - Meu pai disse com o mesmo tom de voz de que ele usava para demitir seus empregados. Merda.
- É? E o que ele queria? - perguntei tentando soar inocente, mas a minha voz falhou e acabei soando mais culpada ainda.
- Ele disse que você fugiu da recuperação hoje e que você tem matado várias aulas. - É, pra ficar de pegação com o , mas eu achava que ninguém sabia disso. - O que você quer da vida, hein? - Ele aumentou a voz e até a minha mãe se assustou.
Ótimo, hoje devia ser oficialmente o dia de pegar no meu pé.
- Calma, querido. - Minha mãe disse, mas foi cortada pela voz furiosa de meu pai.
- Eu pago o melhor colégio da cidade para você, te dou cartões de crédito ilimitados e te deixo livre pra fazer o que quiser. Mas se você não sabe lidar com toda essa liberdade, talvez seja hora de tomar alguma providência. Você está a ponto de repetir de ano.
- E o que você quer? É, você paga a melhor escola pra mim e me dá cartões ilimitados e me deixa fazer o que quiser. Mas só porque vocês acham que me enchendo de coisas caras vão compensar o tempo que vocês preferem não gastar comigo. E me dão toooda essa liberdade porque não querem ter dor de cabeça. Porque vocês não se importam com o que eu faço ou deixo de fazer, só querem manter essa imagenzinha de família perfeita que os desocupados acham que nós somos. - Explodi irritada. Meus pais nunca se importaram com nada do que eu fazia, e agora, só porque baixou um espírito de bom pai no meu progenitor, ele acha que pode me fazer mudar só porque ele quer.
- Cala a boca, mocinha. Nós precisamos tomar uma providência. Você está ficando muito mimada. - Rolei os olhos. - Mas tem razão, nós temos uma imagem a manter. E é por isso que aceitei logo de cara a opção que o diretor deu para que você não repetisse.
- Ah é? E qual é essa opção divina?
- Você vai ter que fazer trabalho voluntário.
- O QUÊ? - dei um berro, pulando da mesa. - Ah, não! Nunca!
- Vai sim. E já até foi escolhido um.
- Não, não, não, não. - Alguma coisa no meu subconsiente me dizia que eu já sabia qual era esse trabalho, mas simplesmente não podia ser verdade.
- Projeto Papai Noel. Você começa amanhã às nove da manhã. E terá alguém te vigiando, então nem pense em escapar para comprar coisas, certo? Ou serei obrigado a pegar seu cartão de volta.
- Ok, oficialmente minha vida virou um inferno. - bufei, saindo da sala de jantar e correndo escadas acima em direção ao meu quarto. Quando cheguei lá, bati a porta com força e peguei meu celular para ligar para a .
Eles não podiam me obrigar a fazer aquilo. Não podiam.
Capítulo 2 - 1º dia
Ok, aparentemente podiam. Caso contrário eu não estaria às nove horas da manhã dentro do shopping, esperando um bando de nerds aparecer (cartão de créditos ilimitado, o que eu não faço por você).
- Só pode ser brincadeira! - Aquela conhecida voz irritante disse por trás de mim. - O que você está fazendo aqui?
- Não enche, tá? Ou você acha que eu realmente queria fazer parte dessa droga?
- Você é a garota nova?
- É, sou sim. Meu pai teve uma crise de pai de verdade e resolveu me obrigar a vir pra cá. - Ah, não. Ele não estava mesmo rindo da minha cara, estava? É, estava. E se o sorriso dele não fosse tão lindo, eu dava um tapa na cara dele.
- , você fez as contas de quanto nós já arrecadamos? - Uma garota com voz (e cara) de puta nerd se aproximou de nós.
- Ah, sim, Lois. Tá na minha bolsa, já pego.
- Ok. Quem é essa? - A tal Lois perguntou, levantando o pescoço na minha direção.
- Eu sou . E não, não é um prazer te conhecer. - Eu disse com a minha melhor cara de bitch, e (pelo menos foi assim que Lois o chamou) rolou os olhos.
- Tanto faz. Você vai trabalhar com a gente? - Que nojo, ela mascava chiclete de boca aberta. Eca.
- Vou. - Suspirei.
- Vai precisar de uma roupa. - Lois disse, me medindo da cabeça aos pés.
- Ah, não! Nem morta eu uso uma dessas roupas fedidas e horrorosas!
- Lamento dizer, , mas vai ter que usar sim. - (isso é nome ou apelido? Porque se for apelido, vai ser meio idiota eu chamar ele assim).
- Eca. A propósito, qual é seu nome? - Perguntei e o vi ter um ataque espontâneo de risos. O que é, eu não sabia o nome dele. Era obrigada, por acaso?
- É . . - Foi impressão minha ou ele fez uma careta ao dizer seu sobrenome? Esse deve ter problemas com a família. - Ah, vai sim. Senão vou ter que falar para Sr. Brekley (esse maldito é o diretor da escola) que você não está cumprindo com o combinado.
- Ah! Então você é o bode espiatório? Olha, eu tenho um cartão ilimitado em mãos. O que você quer pra falar pro meu pai que eu tô trabalhando?
- Você quer me subornar? - Ele só fingiu aquela cara de indignação, né? Fala sério, em que mundo esse garoto vive?
- É, é. Vai, compro qualquer coisa que você queira.
- Certo, . Vamos deixar algo bem claro: ninguém aqui vai aceitar dinheiro em troca de nada. Nós não somos assim.
- Sério? Em que mundo você vive?
- Certamante não no mesmo que você. - Ele disse baixo (acho que mais pra ele mesmo do que pra mim.) - Olha, garota, nem tudo na vida se compra com dinheiro.
- E o que vocês estão fazendo aqui?
- O objetivo do Projeto Papai Noel é arrecadar brinquedos para crianças carentes e recrutar voluntários para visitar abrigos e orfanatos e animar as crianças. - O tom de professor que ele usou me fez rir.
- Que palhaçada. - eu disse, encarando-o. E de novo aquela expressão de nojo surgiu no rosto dele. - É sério, eu não vou ter que passar o meu Natal com um bando de crianças choronas, vou?
- Você já foi em alguma instituição? - Ele tentava conter a raiva, dava pra perceber. Pra que tanto fuzuê por causa de crianças?
- Não, eca.
- Então você não sabe mesmo como são essas crianças.
- São delinquentes e vagabundos. - respondi sem olhar pra ele. - A maioria. - Acrescentei ao ver a expressão com que ele me olhava.
- Você é mais tapada do que eu pensei, francamente. Talvez seja melhor eu dizer ao seu pai que não tem solução mesmo para você. Pode voltar pra casa, se quiser.
- O quê? Não, não! Se eu voltar agora, meu pai vai tirar o meu cartão de mim! - Choraminguei, me pendurando em seu braço. parou de andar e suspirou.
- Pegue uma roupa pra você com a Lois e peça pra ela te dar uma lista com os nomes e os telefones do pessoal do projeto. Depois encontre o , ele vai ser seu parceiro hoje. Vamos ver no que isso vai dar.
Bom, eu ia berrar e choramingar pra não ter que usar aquela roupa ridícula, mas o modo frio com que falou comigo me fez desistir do meu plano infantil. Derrotada, a única coisa que pude fazer foi assentir e procurar a vaca nojenta mascadora de chicletes.
Aquele foi o dia mais cansativo da minha vida. Sério. Talvez pelo fato de ter sido a primeira vez em 17 anos que eu trabalhei de verdade.
O (o garoto que ficou comigo o dia inteiro) era até que bem legal. Fofo e simpático. E *tchatchatcharam* eu descobri que os pais dele tinham uma boa posição no mundo das pessoas decentes. Foi aí que perguntei para ele por que diabos ele participava daquele projeto. E sabe qual foi a resposta? "Eu gosto de ajudar as pessoas. Ver o sorriso das crianças quando ganham os presentes dá uma sensação maravilhosa."
What a fuck, ?
Enfim, fora isso, passar o dia com ele foi até que bem agradável (mesmo tendo que convencer um monte de gente de que ajudar as crianças a ter um bom natal era algo legal - coisa que nem eu achava).
Às seis da tarde, todos os Papais Noeis se reuniram numa salinha reservada só pra eles e começou a falar, com uma voz cansada:
- Bom trabalho, gente, mas as pessoas não estão ajudando tanto assim. Hoje não conseguimos arrecadar quase nada. - Aquilo pareceu deprimir todos ao meu redor. Eu achava que era óbvio que eles não conseguissem nada. - ? Como foi hoje? - O tom que usou fez eu me sentir como um fardo. Meu Deus, esse cara me odeia.
- Foi bem legal, na verdade. - sorriu sem graça. Ele era um fofo.
- Deu tudo certo?
- O que você quer dizer, hein? Eu fiz tudo o que me pediram. Olha, desculpa se eu não sou a miss conciência, mas o meu horário já deu e tenho que chegar logo em casa pra assistir Gossip Girl! - Fui embora pisando duro no chão, após acenar para . Ele era o único daqueles Papais Noeis nerds que era legal.
Ninguém veio atrás de mim ou pediu para que eu ficasse. Tá, confesso que isso me incomodou, porque geralmente, quando eu fazia um showzinho assim, as pessoas sempre vinham de joelhos pedindo desculpas. Nerds idiotas.
Capítulo 3 - Abrigo infantil
Era o meu quarto dia de Projeto e os presentes no cesto de doações não estavam aumentando. Normalmente, eu não me importaria, mas eu precisava que o projeto fosse um sucesso para garantir boas notas e a segurança do meu cartão de crédito.
E foi só por isso, repito, SÓ por isso (eu não estava me envolvendo de verdade com o projeto nem nada), que eu contratei uma equipe do jornal local para entrevistar o pessoal do projeto.
- Cadê o ? - perguntei para Lois quando cheguei no shopping. O era o responsável pelo projeto, então ele precisava estar ali para falar com os repórteres. Mas, não... Ele não estava.
Pelo amor de Deus, ! Você sempre é o primeiro a chegar!
- O não vem hoje, pensei que você soubesse. - Eu podia ver o chiclete barato dela dar voltas e voltas dentro de sua boca. Eca, eca!
- Como assim não vem? Eu preciso dele aqui agora!
- Sinto muito, princesa... - É, eles começaram a me chamar assim depois que eu e tivemos um pequeno desentendimento e ele gritou pros quatro ventos que eu era mimada demais. - Mas ele sempre vai visitar o abrigo da cidade nas sextas.
- Ah, não! Liga pra ele e fala pra ele vir aqui!
- Se você quiser falar com ele, vai ter que ir até lá.
- O quê? - comecei a rir (de nervosismo, ok? Só de ouvir a palavra abrigo já ficava completamente arrepiada.) - Não, não. - Lois deu de ombros e me deixou sozinha.
Logo Lady Gaga começou a tocar dentro da minha bolsa e eu peguei meu celular.
- Alô?
- Srta. ? Sou Fred Stuart da Splich. Só avisando que já estamos indo para o shopping. Tudo certo aí?
- Tá, tá sim. Até daqui a pouco.
É agora, . Ou você faz uma coisa certa na sua vida, toma coragem, vai atrás do naquele lugar horrível que me recuso a dizer o nome, salva o dia (ou o projeto) e consegue ficar na boa com o seu pai, ou você liga para o Sr. Stuart e diz que não dá para fazer a matéria.
Como se estivesse carregando um elefante nas costas, suspirei e fui me arrastando até o meu carro.
Eu sabia que o abrigo ficava bem afastado do centro. Na verdade, ficava numa zona bem pobrezinha... Nem preciso completar o resto do meu pensamento, né?
Enfim, no caminho liguei para o Sr. Stuart para avisar da mudança de local para a reportagem e em cerca de quinze minutos eu já estava na porta daquele grande casarão mal-assombrado. Ou pelo menos era assim que eu imaginava o lugar até sair do carro e me deparar com um casarão todo colorido, com desenhos meio tortos nas paredes, cercado por um jardim até que bonitinho.
- As crianças que desenharam nas paredes. - Uma mulher alta, de cerca de quarenta anos, disse ao meu lado.
- Ah, que legal. - Sorri amarelo, ainda atordoada com o susto que levei. De onde ela saiu mesmo?
- Não sabia que viria mais alguém do Projeto Papai Noel hoje. Normalmente, só o aparece. Ou algum dos outros garotos, mas em dias alternados.
- Como você sabe que eu... - Nem precisei completar a frase para entender como ela me reconhecera. O maldito uniforme.
- Sou Molly Davis, a propósito.
- . - sorri.
- Vamos, o está montando a árvore com as crianças. Sabe, desde que o projeto começou, há alguns anos atrás, as crianças ficaram bem mais felizes. Acredita que até o rendimento escolar e a disciplina delas melhorou? Você precisa ver as carinhas alegres deles quando chega o natal e eles sabem que o e os outros Noeis vão vir visitá-los.
- e os outros Noeis?
- É, é assim que os garotos chamam vocês. - Ela sorriu e eu não tive escolha a não ser repetir o gesto. Aquela mulher me parecia tão dócil e legal. Mesmo pra uma quarentona sem muito senso de moda. - E na manhã de Natal então, quando eles vão correndo para a sala para ver os seus presentes.
- Quantas crianças vivem aqui? - Desculpa, por que eu perguntei isso? Quem se importa com quantos macaquinhos moram nesse lugar? Eu não, quero deixar claro. A pergunta só escapou. Foi meu subconsciente, ok?
- Nessa casa, trinta, mas a Fundação Raio de Sol tem mais doze casas pelo resto do país.
- Uau. - Tá, essa resposta me surpreendeu. Eu achava que ela ia dizer que moravam tipo uns cem monstrinhos remelentos aqui.
Se bem que, se fossem mesmo monstrinhos remelentos, eles deviam ser até que limpinhos, pois os corredores do abrigo eram bem bonitinhos, com dinossauros e outros seres estranhos nas paredes.
- Esse movimento do significa muito para a nossa Fundação, sabe? Ele conseguiu uma bolsa na melhor escola aqui da cidade há alguns anos atrás e foi transferido pra cá. E o legal é que, mesmo depois de completar a maioridade, ele não se esqueceu dos garotos daqui. Tem rapazes que vão embora e nunca mais sequer mandam uma carta, como se quisessem esquecer que já viveram aqui. Em certo ponto, eu até os entendo. Deve ser duro viver sem família, não?
Tá, agora eu tô confusa. Como assim, o já morou num abrigo?
- É... O morava aqui? - perguntei ainda atônita. Eu sempre humilhava as crianças de abrigos e agora eu descubro que ele já foi uma delas? Parabéns, , agora você sabe porque ele te odeia tanto.
- Bom, ele morava em uma outra casa da Fundação, aí ele veio pra cá estudar e arranjou um emprego. E também conseguiu um apartamento, que ele divide com um amigo. Você não sabia?
- Não. - respondi quando Molly finalmente parou em frente a uma grande sala de estar. Bem no centro da sala havia um monte de crianças pulando alegremente em volta de alguém.
estava sentado no chão, com um sorriso bobo - e terrivelmente perfeito - que me fez perder o ar por um segundo. Ele tinha um ar tão infantil e ao mesmo tempo tão... tão perfeito. Ah, Deus, quando eu comecei a reparar (e elogiar) tanto assim nele?
- Olha, uma Mamãe Noel! - um menininho (muito fofo por sinal) loiro, com um corte de cabelo tipo tigelinha, apontou pra mim, e de repente me vi cercada por várias crianças. E, por incrível que pareça, eu não senti nojo nem nada do gênero quando elas se aproximaram. Eu senti muita carência por parte delas, e de um modo bastante estranho, até entendi um pouco como elas deviam se sentir ali.
Tipo, o lugar podia ser bonitinho e tudo, mas era um abrigo. E nem com todo o empenho do pessoal que trabalhava lá aquele lugar poderia ser chamado de lar. Nenhuma daquelas crianças tinha um pai, ou uma mãe pra quem pedir alguma coisa, ou pra dar uma bronca quando fosse necessário, ou mesmo pra abraçá-los e confortá-los nos momentos mais desesperados. A Sra. Molly podia até se esforçar pra tentar ocupar esse lugar na vida daquelas crianças, mas nunca seria o suficiente.
E bem, não que seja uma comparação muito justa, mas no quesito bons pais eu estava praticamente igual a eles. Tipo, eu tenho pai e mãe e uma casa muito linda e aconchegante. Mas a verdade é que meus pais não estão nem aí pra mim. Como se cartões de créditos sem limites pudesse compensar a falta de amor.
parou de montar a árvore para descobrir a razão do pequeno tumulto, e quando seus olhos encontraram os meus, pude ver a expressão de surpresa que tomou conta de seu rosto. Que foi, é tão difícil assim me imaginar num abrigo de menores?
Tá bom. É sim.
Automaticamente, sorri para ele - Opa, opa, calma aí! Vamos dar uma paradinha pra discutir sobre esse ?automaticamente?. Preciso dizer que essa palavra nunca fez parte do meu vocabulário. Eu sempre tenho os meus movimentos friamente calculados, e eu ter deixado escapar um sorriso totalmente involuntário para é uma coisa que deve ser digna de experimentos científicos - e ele arqueou uma sobrancelha.
- Você é muito linda, sabia? - Uma menininha que devia ter uns seis anos, mais ou menos, disse, puxando minha roupa pra conseguir a minha atenção. Awwn, não é fofo?
- Obrigada. Você também é muito bonitinha. - Respondi e logo depois fiquei assustada comigo mesma. Da onde saiu toda essa gentileza?
- Você veio ajudar a montar a árvore? - O loirinho tigelinha me perguntou, esperançoso.
- Claro. - Sorri e deixei que as crianças me arrastassem (eu adoro isso!) até a árvore gigante que eles montavam. Achei que havia poucos enfeites (na minha casa quase não dava para ver a árvore, por causa dos ornamentos), mas guardei isso pra mim mesma.
- Oi, . - disse com a voz mais simpática que consegui fazer (o que não foi nada difícil, por incrível que pareça!) e, para a minha surpresa, ele sorriu pra mim.
Pára tudo! Ele sorriu e não me olhou com aquela expressão de ódio mortal. É, garota, isso que é progresso!
Ah, a propósito, já falei que o sorriso dele, quando direcionado exclusivamente para mim, fica ainda mais lindo do que o habitual? Pois é.
- É... Eu chamei um pessoal da Splich para entrevistar você, mas a Lois disse que você não ia hoje, então resolvi fazer a entrevista aqui mesmo. - Eu disse, tentando encontrar o ar que fugiu de mim assim que fiquei perto o suficiente de para sentir o seu perfume (E que perfume!).
Olha, o meu olfato não é fácil de agradar, mas nem o perfume da Clive Christian que o tem é tão bom quanto o perfume de . E não parece muito ser do tipo de cara que usa perfume, então essa história de cheiros me deixou meio desnorteada.
Aquele não podia ser mesmo o cheiro dele, né? É surreal uma pessoa cheirar tão bem assim naturalmente. Sério, o cheiro dele despertou tantas sensações em mim que vocês nem vão querer imaginar.
Tá, dando um basta nesse papo de cheiro, a expressão que usava para me olhar parecia mais confusa do que quando eu cheguei na sala. O que é? Só porque eu fiz algo de bom de verdade?
Felizmente, o Sr. Stuart me ligou, fazendo aquele desconfortável contato visual acabar.
- Eles chegaram. Onde a gente pode ir para conversar com eles? - Perguntei no tom mais profissional que consegui usar.
- Acho que Molly não vai se importar se nós usarmos o escritório dela. - Ele sorriu, puxando meu braço (delicadamente. Ele não me arrastou) para sairmos do meio do círculo de crianças. - Já voltamos, pessoal!- Ele disse para as crianças e se virou para mim - O que aconteceu com você?
- Como assim? - me soltou e eu comecei a seguir ele pelos corredores coloridos.
- Você veio a um abrigo, teve uma ideia legal para divulgar o projeto...
- Ah. Bom, eu preciso que esse projeto seja um sucesso. Só assim meu pai vai me devolver meu cartão. - O sorriso divertido de morreu e senti uma pontada bastante dolorida. - E eu gosto de caprichar em tudo o que eu faço. Além do mais, esse lugar é até que bem legal. - Passei na frente dele e sorri de leve, antes de terminar o percurso até a sala de Molly, pulando como uma coelha louca. E acho que ele sorriu também, porque senti que tinha ganhado um ponto com ele quando nós entramos na sala da Sra. Molly.
- Ah, chegaram. Esses dois senhores disseram que vieram fazer uma entrevista com vocês, e então eu pensei que vocês pudessem usar meu escritório. - Molly disse sorrindo.
- Que bom que tivemos a mesma ideia. - retribuiu o sorriso e cumprimentou o Sr. Stuart e o outro homem.
Eu ia sair da sala junto com Molly, mas pediu para que eu ficasse. Um pouco surpresa, mas bastante sorridente por saber que eu tinha mesmo feito algo certo pra variar, me sentei na cadeira ao lado da dele e acho que fiz um papel até que razoável durante a entrevista.
- Obrigado por isso. - Apesar da expressão séria em seu rosto, pude sentir que ele estava realmente comovido com tudo aquilo.
- Ah, não foi nada. E obrigada por me deixar participar também. - Ele me encarou com uma expressão divertida.
- Você faz parte do projeto também! - sorrimos juntos, mas logo senti o dever me atingir como um balde de água fria.
- Ah, Deus! É verdade! Eu preciso ir. Droga, droga, droga!
- Eu pensei que você fosse ficar. - Tá, essas mudanças de humor repentinas do tavam começando a me irritar. Em um minuto ele era um cara super legal e no outro já era aquele chato de sempre. - Mas claro, você não gosta de crianças remelentas, né?
- O quê? - Eu sei que não é certo rir dos outros assim, mas eu não pude evitar. - Pra onde você acha que eu vou? - Ele deu de ombros e eu rolei os olhos. Só faltava ele fazer bico, agora. - , eu combinei com o de ir em uma escola perto do shopping, pedir pro pessoal ajudar. E acho que agora ele deve estar com muita raiva de mim porque eu o deixei esperando.
Acho que o é meio louco, sério. Por quê? Porque agora ele estava rindo de novo. Aliás, quase gargalhando. Eu mereço?
- O nunca fica com raiva de ninguém, pode acreditar. Além do mais, você não deixou de estar trabalhando no Projeto, então ninguém tem o direito de falar para o seu pai que você não ajudou hoje. E seu cartão está a salvo. - Essa última frase acho que ele falou meio contra vontade, mas se ele estava dizendo que eu não estava encrencada, então tudo bem.
- Então não tem problema se eu ficar? - Hahá, consegui fazer aquela expressão fofa de surpresa aparecer em seu rosto de novo!
- Você quer mesmo ficar?
- Claro. Acho que vou até pedir o telefone daquele menininho loiro de cabelo tigelinha, sabe? - rolou os olhos, com um meio sorriso no rosto, e nós voltamos para a sala de estar para enfeitar a árvore.
Capítulo 4 - Royal Place
Considerando a falta de enfeites, a árvore ficou até que razoável. E tenho que admitir que o dia não foi ruim. Na verdade, aquelas crianças eram até que legais (para crianças, claro). Enfim, Molly insistiu para que ficássemos para jantar, e após uma certa relutância, acabei aceitando o convite, de forma que eram quase oito horas da noite quando eu e saímos do abrigo.
Fiquei tão absorta em meus próprios pensamentos que demorei um pouquinho pra perceber que não acompanhava os meus passos para o estacionamento.
- ? Pra onde você vai?
- Pegar o ônibus. E você?
- Tô de carro. - Eca, pegar ônibus? Nunca. - Quer carona?
Ele pareceu refletir por um minuto, olhando para o caminho escuro que teria que fazer até o ponto, e o ?estacionamento? do abrigo. Então, piscou os olhos, suspirou e disse:
- Ok, vamos lá.
- Eu não vou te matar, tá bom? - Mostrei a língua pra ele, que revirou os olhos. - Aqui. - Destravei o alarme e sorri ao ver a expressão de surpresa dele.
- Esse é seu carro?
- É. Você queria o quê? Um fusquinha? - Ele riu.
- Não, mas ele não é meio... grande? - sorri irônica e entramos no carro.
Liguei o rádio e ele fez uma careta quando Britney Spears começou a cantar.
- Não gosta?
- Não, eca. - rolei os olhos e desliguei o rádio.
- Gosta do que, então?
- Qualquer coisa menos pop.
- É? Até ópera? - ele fez outra careta. - Sabia. Gosta de Beatles?
- Ahan.
- Tem um CD deles no porta luvas. - , parecendo meio surpreso (isso estava começando a me irritar já. Como será que ele imaginava que eu era? Uma louca consumista e insensível? Aff), pegou o cd e colocou no rádio.
- Beatles?
- Eles são demais, ok?
- Não imaginei que você gostasse. - Rolei os olhos irritada a constatar que ele devia mesmo me ver como uma louca consumista e insensível e dirigi minha atenção para a estrada, cantando trechos das músicas vez ou outra.
Só voltei minha atenção pra ele novamente quando chegamos ao centro da cidade.
- Onde você mora? - perguntei, agora não tentando mais manter a minha voz num tom agradável.
- No Royal Place, perto do shopping. Conhece? - Claro que conheço, é onde o mora. A vive falando em se mudar pra lá!
- Ahan. - Chegamos no prédio em cerca de cinco minutos. Quando parei na porta e se mexeu para tirar o cinto de segurança, um desconforto começou a tomar conta de mim. Tipo, será que ele não podia deixar pelo menos o cheiro maravilhoso e aquele sorriso perfeito - que não aparecia há algum tempo - comigo?
- Tcha...
- Pera aí! Aquele é o carro da ? - Gritei histérica, apontando para um carro cinza que eu não sabia identificar a marca, mas sabia que era da minha melhor amiga.
- Quê? - seguiu a direção que eu apontava, confuso. - Quem é ?
- , minha melhor amiga. - O que ela tá fazendo aqui?
- Não conhe... Pera aí, a do ?
- do ? Você conhece o ?
- Eu moro com ele.
- Você mora com o ?
- Moro. Ele é meu melhor amigo.
- Então, o mora aqui e o carro da tá parado na porta do apartamento dele... E eles se gostam há não sei quantos séculos...
- Ah, não, já vi que vou ter que arrumar outro lugar pra ficar. - reclamou e eu ri. , sua safada!
- Quanto tempo você acha que eles estão aí em cima? - perguntei, ainda rindo.
- Sei lá, mas espero que estejam no quarto do . - Ele fez uma careta engraçada.
- Você vai subir?
- Vou, né, fazer o que. Se eu aparecer com olheiras amanhã, você já sabe por quê. - Nós começamos a rir juntos, mantendo contato visual. O que não foi boa ideia, pois quando o riso sessou, ficamos num silêncio estranho e um clima esquisito ficou no ar. Esquisito porque tudo o que eu queria era pular no pescoço de e descobrir se o seu gosto era tão bom quanto o seu cheiro.
É verdade que era bastante próximo de um galã de filmes de Hollywood, mas eu conhecia muitos garotos lindos e nenhum deles nunca me fez ter vontade de agarrá-lo e dar um beijo tipo desentupidor de pia nele.
- Bom, boa noite, . - disse cortando aquele clima antes que eu fizesse alguma loucura. Porque, afinal de contas, eu tinha namorado. E embora tenha certeza que já o tenho feito comigo, eu não o trairia. Ainda mais porque... Bem, porque e eu nunca teríamos um futuro juntos.
- Boa noite, . - sorriu e saiu do carro um pouco tonto. Olhei novamente para o carro de e ri sozinha. Pelo menos alguém estava feliz de verdade. Dei a partida e fui para casa ouvindo Beatles, contente por ter deixado um vestígio de seu perfume para trás.
Capítulo 5 - Super
Pela primeira vez desde que comecei a fazer parte do Projeto eu estava acordada antes de o meu despertador tocar, às oito horas.
É, estava ansiosa para ver a reportagem sobre nós no Jornal da Manhã e para ter notícias da . Ela me devia explicações.
Cheguei no shopping mais cedo do que o habitual e fiquei esperando no lugar de sempre. Logo vi chegar junto de e sorri involuntariamente. Será que se eu pedisse detalhes para o ele me acharia estranha? Acho que sim.
Os garotos perceberam meu olhar e acenou para mim. sorriu e veio em minha direção. Não, , ele viria pra cá de qualquer jeito. Ele trabalha aqui.
- Oi. - Sorri um pouco constrangida. (What a fuck?)
- Oi. - Ele me imitou (mas não ficou vermelho) e eu tenho certeza que ele ia dizer mais alguma coisa, mas não tem como saber, já que aquela puta louca da Lois gritou bem no meu ouvido:
- ! Nossa, eu fiquei tão animada quando você me ligou ontem à noite e falou sobre a reportagem! Ótima ideia! - Ela pulou em cima dele, que pareceu meio desconfortável.
- Na verdade, ideia da . - Lois ignorou a informação e continuou agarrada em seu pescoço. Mas, obrigada pelos créditos, .
- O pessoal já está na sala de TV dos funcionários esperando começar. - E ela não podia ter me dito isso? Se eu tivesse chegado depois, ia ficar esperando feito uma tonta o povo aparecer. Que ódio!
- Ok, vamos então. - a empurrou para longe discretamente e foi andando para a tal sala, com Lois no seu pé. Eu fui logo atrás, sem outra opção.
- ! - sorriu assim que me viu. Legal, pelo menos alguém ficava feliz com a minha presença. - Ótima ideia a sua! E eu não fiquei com raiva por você ter me abandonado. - Por isso eu adorava o . Ele era um cara tão fofo! Se eu não gostasse dele, não teria me dado ao trabalho de ligar pra ele às nove da noite para pedir desculpas por ter furado com ele.
Me sentei ao seu lado, em uma cadeira não muito confortável, e ficamos todos naquela salinha minúscula esperando a reportagem começar. Ta aí um lugar nesse shopping que eu nunca tinha entrado.
Todos bateram palmas quando a reportagem começou e o Sr. Stuart apareceu falando vários dados sobre o Projeto. deu um gritinho bastante feminino quando o rosto de tomou conta da tela. E eu tive que prender a respiração. Fala sério, ele ficava ainda mais lindo na TV.
Vi de canto de olho Lois dar uma risadinha de bitch pra cima de e tive que me concentrar na tela à minha frente para não dar um soco naquela vaca.
- Ui, você fica mais gata na TV! - sorriu pra mim quando eu apareci. Dessa vez tive prazer em olhar para Lois e ver a careta dela. Toma essa, bitch!
Quando a reportagem acabou, todos bateram palmas e alguns uivaram. E eu também fiquei feliz, por mais assustador que isso seja. Eu tinha feito algo bom!
- Aí, , parabéns! - Um carinha do Projeto deu um tapa nas costas de .
- É, ficou ótimo, cara! - disse outro, fazendo a mesma coisa.
Eu ria feito idiota junto com os outros, até aquela voz insuportável acabar com a alegria de todo o mundo:
- É, mas por que a ? Tipo, ela tá no projeto há menos tempo que qualquer um de nós, e também não sabe de muita coisa. - O clima na sala pesou e eu fechei a cara, respirando fundo para não meter a mão na cara daquela puta. Felizmente, não tive que me preocupar em criar uma resposta à altura, porque a voz dura de quebrou o silêncio na sala.
- Porque a ideia foi dela, e se isso der certo, nós teremos que agradecer à ela. - Sorri com a cara de bunda que Lois fez, mas não consegui olhar nos olhos de naquele momento.
Alguns Noeis me cumprimentaram meio tímidos, e eu, do mesmo jeito, agradeci. notou minha cara de fossa e disse antes que o pessoal começasse a sair:
- A tá aqui há cinco dias e conseguiu ter uma ideia inovadora para o nosso Projeto. É verdade que a maioria de nós está aqui desde que o Projeto começou, há três anos atrás, mas dizem que às vezes a gente precisa da opinião de pessoas de fora para nos ajudar a enchergar soluções para os nossos problemas. Então, , se tiver mais alguma ideia dessas, pode contar comigo. - Ele sorriu pra mim e me abraçou, e eu pude ver vários outros Papais Noeis cochichando entre si. Olhei para Lois e vi a cara de merda dela ainda maior do que antes. E tenho quase certeza de ter visto um sorrisinho torto no rosto de .
Aquela tarde foi simplesmente maravilhosa para o projeto. Várias pessoas apareceram para deixar presentes e nos cumprimetar. No final do dia, quando nos reunimos de novo, tinha um sorriso lindo no rosto, assim como todos os outros (exceto Lois, que ainda mantinha a cara fechada).
- Hoje foi incrível, pessoal! Conseguimos mais presentes do que nos outros dias, mas ainda falta bastante para alcançarmos a nossa meta, e o Natal já é daqui há cinco dias. - Agora a expressão dele era de preocupação. Não era pra deixar o pessoal animado?
- Eu tenho uma ideia! - eu disse sem pensar e vi todos os rostos se virarem pra mim.
- Ótimo, mais ideias da Super . - Lois virou os olhos e eu a ignorei.
- E se nós mudassemos a nossa abordagem?
- Como assim? - Um Papai Noel perguntou. Eu acho que devia aprender o nome deles.
- Tipo, ninguém gosta de ser abordado no meio do shopping. Ainda mais com essa roupinha rídicula que nós temos que usar. - revirou os olhos e eu bufei. - Olha, tô falando a minha opinião de jovem consumista. Eu não pararia pra ajudar ninguém que usasse essa roupa. Tipo, a cor do Natal é vermelho, então nós podemos usar roupas vermelhas, mas sem ser essa coisa horrível.
- É, e onde a gente vai arranjar outra coisa tipo pra amanhã? - Lois perguntou com deboche e eu sorri pra ela.
- Deixem isso comigo. E... Bom, eu sou bem popular na escola, e o pessoal lá morre para ir nas minhas festas. Então eu podia organizar uma e pedir brinquedos para o pessoal poder entrar.
- Brilhante! - gritou do meu lado com um sorriso de orelha a orelha. , eu acho que te amo.
Sorri junto com ele e, olhando ao redor, percebi que vários outros Noeis também sorriam.
- Acho que isso garante pra gente bastante presentes. E pode ser para daqui depois de amanhã. Ah, e é lógico que todos vocês podem ir. Mas tem que levar brinquedos! - Aquela foi a primeira vez que eu realmente me senti parte daquele grupo. E, acreditem ou não, a sensação foi ótima.
Cheguei em casa absolutamente exausta, mas ainda tinha coisas à fazer. Primeiro planejei um estilo bem legal de roupa pro pessoa do Projeto usar, e depois peguei o celular para ligar para a . De hoje ela não passava.
- Alô? - Ela atendeu com voz de quem tava dormindo.
- Eu te acordei?
- Tá tudo bem? São onze horas da noite.
- Ah, é. Esqueci que você dorme cedo. - brinquei. - O que você estava fazendo na casa do ontem à noite?
- Eu? Ér... - Ih! Se ela ficou sem graça, alguma coisa tem! - Co... Como você sabe?
- Quer esconder as coisas da sua melhor amiga? sabe tudo, amor! Mas vamos lá, me conta!
- Bom, ele me chamou pra jogar videogame e eu fui. - Eca! Fala sério. - Aí uma coisa levou à outra e nós estávamos sozinhos e... Bom...
- Tá, teve patete ou só pegação? - Vai, ! Quero os detalhes sórdidos!
- ! - Aposto que ela cobriu a cabeça com o travesseiro de vergonha. - Só pegação, tá? O chegou e atrapalhou tudo. Sabia que eles moram juntos?
- É, fiquei sabendo.
- Pera aí! Você que deu carona pra ele?
- Foi. O cara ia pra casa de ônibus e a gente mora até que perto. Não custava nada.
- Hmm, , sei, hein! - Agora eu fiquei vermelha. Obrigada, !
- Sério! Além do mais, eu e somos de mundos diferentes. - Suspirei. No final das contas, essa era mesmo verdade. - que sumira desde que o feriado começou - era do meu mundo e era com ele que eu tinha que ficar.
- Faça-me o favor, .
- Mas tem o .
- O ? Vocês se falaram desde o último dia de aula?
- Não, mas...
- Então, , quer parar de ser idiota? O não tá nem aí pra você. E você também não devia ligar pra ele. - disse com o tom de mãe que eu odiava quando ela usava. - E tem mais, o é supeeer gato! - Essa era minha . - E você não tem que ligar para o que as pessoas vão dizer só porque ele não é socialmente aceitável ou qualquer uma dessas baboseiras que você costuma dizer.
- Você não ficaria com o se ele fosse pobre.
- , eu gosto dele de verdade, e mesmo que ele fosse, sei lá, garçom do nosso restaurante, eu ficaria com ele. Porque não me importa se o presente de natal que ele vai me dar é lindo e caro. Mesmo que ele não me desse nada, ficaria feliz só de ficar ao seu lado. - E essa era a , romântica e melosa. - Lembra daquele vestido da Chanel brega que o te deu no natal passado? Então, ele foi caro, mas 1º: foi empregada dele que foi comprar e 2º: você nunca usou aquilo.
- E daí? Todo mundo escorrega um pouco na hora de comprar presentes.
- E lembra aquele seu namoradinho da quinta série? Aquele que te deu aquele porta-jóias que ele mesmo fez? - Como não lembrar? Igor foi meu primeiro amor e eu até hoje ainda uso aquela bugiganga. percebeu que eu não ia responder nada e continuou - Então, , acho que está na hora de você começar a rever os seus conceitos. E boa noite, tô morrendo de dor de cabeça.
- Boa noite.
- Um beijo. E não fica mal, ok? Só disse tudo isso porque eu te amo e já vi há muito tempo que a sua relação com o já foi pro buraco.
- Ok. Beijos. Te amo. - Desliguei o telefone e me afundei no meu travesseiro fofinho de pena de ganso. E só quando o senti úmido é que percebi que estava chorando.
Sem saber o que fazer, resolvi ligar para .
- Alô? - Pela voz de quem comeu merda, acho que acordei ele também.
- ?
- Ah, oi, . - Tá, aparentemente ele não tava animado por ouvir minha voz.
- Amor? Quem é? - Opa, essa voz de puta louca vinda do outro lado da linha é de quem?
- Amor?
- Ah, não, você ouviu?
- A puta do seu lado perguntar quem é? É, ouvi. E desculpa se eu atrapalhei vocês, não se preocupe que eu não ligo de novo.
- Não, , espera! Ela é só...
- Nunca mais. Tchau, . - Desliguei o telefone sem esperar resposta e me afundei ainda mais no meu travesseiro. Acho que daqui a pouco eu e ele viraríamos um só.
Eu não sei por que fiquei tão mal pelo que aconteceu. Como se eu já não desconfiasse que estivesse me traindo. Mas ô vozinha irritante dessa garota. De qualquer jeito, continuei chorando até o sono tomar conta de mim, e juro que a última coisa que vi antes de me entregar de vez para o cansaço foi um par de olhos lindos me encarando.
Capitulo 6 - 4 dias para o Natal
Meu calendário dizia que hoje era 21 de dezembro, e ainda tinha muita coisa a ser feita até o Natal. Pela primeira vez em anos eu tinha mesmo alguma coisa para fazer no feriado de fim de ano, sem ser ficar morrendo em casa ou gastando por aí.
Faltavam 2 horas para meu expediente (olha, falei bonito) no Projeto começar e eu já estava totalmente pronta. É, tinha coisas a fazer antes de ir trabalhar. Coisas que envolviam o shopping também, mas enfim...
É, minha vida era esse shopping.
Acho que fui a primeira louca a entrar lá (assim que abriu, eu corri pra dentro). Fiz tudo o que tinha que fazer, e quando deu nove horas eu já estava no ponto de encontro dos Papais Noeis.
- Bom dia, gente! - eu disse feliz e vi todos olharem torto as sacolas que eu tinha nas mãos. - Ah, isso? São os nossos novos uniformes.
Saí distribuindo as roupas para todos (para os meninos escolhi uma camisa pólo (é, eu as amo) super chique (vermelha, óbvio) e uma calça preta (porque calça vermelha é o ó, né?) jeans, tipo skinny. Para as meninas escolhi uma blusa justa decotada - temos que chamar atenção - e uma saia pregada verde (que não deixa de ser cor natalina)).
Como eu não sou santa, não pude deixar de fazer uma pequena brincadeirinha: calculei que Lois devia vestir o mesmo número que eu, então comprei um número menor pra ela, só para ela passar vergonha! Hahá, quem tá rindo agora, bitch?
E quando todos estavam devidamente vestidos (e lindos) ela apareceu com a cara mais medonha do mundo (e sem o uniforme).
- O que foi, querida? Não serviu? - Perguntei na maior inocência e ela fez uma careta pior ainda. - Se não tiver ficado bom, é só você ir na loja que eu comprei e pedir pra trocar. Quer a nota? - Lois pegou a nota da minha mão e saiu bufando.
- O que é isso? - A voz de preencheu minha mente de um jeito tão estranho que me fez esquecer de como se respirava. Como ele tinha esse dom?
- São os novos uniformes, gostou? - Perguntei insegura, mordendo o lábio inferior. Ao que parecia, todos haviam gostado, mas era a opinião de que realmente importava.
sustentou o seu olhar no meu pelo que pareceu uma eternidade. Depois me estudou da cabeça aos pés (o que me deixou tão vermelha quanto a minha roupa, mas quem liga?) e analisou um a um os outros garotos. Eu estava tão nervosa que podia até vomitar se ele demorasse um pouquinho mais para dar a sua opinião final.
- Ok, as roupas ficaram legais. - Ele deu um pequeno sorriso e eu soltei o ar que estava prendendo, dando um gritinho de alegria e pulando (sem parar pra pensar) em seus braços.
ficou sem ação pela minha atitude, e quase tive um colapso nervoso ao cogitar que ele não retribuiria o gesto, mas logo senti seus braços ao meu redor e minhas pernas ficaram moles igual gelatina. Foi um abraço rápido, mas o suficiente para o cheiro dele ficar em mim por mais da metade do dia.
Eu estava tão distraída conversando com uma senhora que foi levar um presente para as crianças que nem me dei conta de que já eram seis horas.
- Vamos, gatinha, eu não quero perder a cara de bunda da Lois quando o falar que hoje foi um sucesso de novo, graças a você. - disse no meu ouvido e eu não tive como segurar o riso. Então eu tinha um aliado contra a Lois!
- Então, gente, hoje foi um dia bem produtivo. Se continuarmos assim, acho que vai dar para alcançarmos sim a nossa meta. - Era isso o que dizia quando eu e chegamos à sala. Nós trocamos um olhar rápido, mas eu tive que interromper aquilo para poder achar um lugar para sentar.
A reunião da manhã era realizada no meio do shopping mesmo, mas a da noite era num lugarzinho reservado. Melhor pra gente, ficar o dia inteiro em pé era muito exaustivo.
- Ér, ? - Chamei assim que consegui achar um lugar para mim e .
- , as roupas novas foram uma ótima ideia. As pessoas não fogem mais de nós agora. - Ele riu e os outros acompanharam. Eu sorri sem graça e pisquei discretamente para Lois, que estava em pé ao lado de . Bitch.
- Obrigada. Mas eu queria saber se amanhã eu posso sair mais cedo. É que tenho que arrumar o salão lá de casa para a festa.
- Okay. Mas você tem que dizer pra nós onde você mora, se não nós não vamos poder ir. - Ele sorriu novamente e todos os garotos vieram pra cima de mim, pedindo meu endereço.
Eu tinha bons pressentimentos a respeito dessa festa.
Capítulo 7 - Festa
Fui dormir após ligar pra mais de oitenta pessoas. Não chamei , nem nenhum de seus amigos.
E nenhuma das vadias que podiam vir a ser a tal razão dos meus chifres também. No final das contas, só pessoas legais viriam na noite seguinte.
Dormi com um sorriso no rosto e uma sensação de dever cumprido (já disse que adoro essa sensação?), e durante meus sonhos, só um par de olhos e sorriso perfeito tomava conta da minha mente.
Fui para o shopping no dia seguinte, e por volta das quatro da tarde pedi para liberar a mim e ao (que se dispôs a me ajudar, não é um fofo?) para que nós pudemos comprar os enfeites e os comes e bebes (muuuitos bebes, afinal, era uma festa da ) e ir para a minha casa arrumar tudo.
Meus pais não estavam lá quando cheguei (como sempre), então aproveitei que as empregadas estavam livres e pedi ajuda à elas. Quando deu sete horas, tudo já estava devidamente pronto.
foi para sua própria casa para se arrumar e buscar o seu presente (É, os Papais Noeis também tinham que colaborar) e eu fui para o meu quarto me preparar também.
Como o combinado era nove horas, eu ainda tinha um tempo razoável para me arrumar. Tomei um banho relaxante, escolhi um vestido curto vermelho (essa cor vicia) de frente única e tecido brilhante e completei com alguns acessórios. O cabelo, resolvi deixar solto (já que hoje ele estava colaborando comigo) e só fiz alguns cachinhos nas pontas para mudar um pouco aquele liso escorrido que ele era. Peguei um salto preto que eu a-ma-va e fiz uma maquiagem com os olhos esfumaçados e um batom cor de boca. Até eu me pegava.
Lurdes, a minha criada (é, só minha), bateu na porta para me avisar que já tinha gente chegando, e me assustei ao ver que já eram nove e meia.
Desci as escadas apressada e fui receber - e cobrar os presentes - do pessoal que ia chegando.
- , você tá gata! - chegou sorrindo, ao lado de ninguém mais, ninguém menos do que . Ah, garota esperta! Ela estava com um vestido azul muito lindo, que eu mesma havia dado para ela. Eu tenho ou não um bom gosto?
- Oi, . - sorriu e eu retribuí.
- Cadê o ? - Perguntei meio sem pensar e olhou desconfiada pra mim.
- Ele já tá vindo. Acho que ele combinou de trazer a Lois com ele, por isso não veio com a gente. - Meu mundo caiu ao meu redor, mas acho que era ingênuo demais para perceber.
- Ah, tá. - Sorri amarelo, sentido o olhar preocupado de . - Entrem, a festa já está bombando.
- ?
- Tá tudo bem, . - Ok, ela me conhecia o suficiente para saber como era o meu sorriso forçado, mas não importa, fiz ele mesmo assim. - Agora vai lá se divertir com seu homem - Rimos juntas do jeito como costumava chamá-lo quando não tinha mais ninguém ouvindo, e ela me abraçou rapidamente antes de ir atrás de .
Fiquei na porta por mais uns dez minutos, até resolver entrar e (tentar) aproveitar a minha festa. Pedi para Lurdes receber os presentes, peguei um copo de tequila e tomei de uma vez, sentindo a bebida descer quente e rasgar a minha garganta.
Já nem sabia mais que horas eram, e estava distraída demais sentada no sofá curtindo minha fossa para perceber que alguém se sentara ao meu lado. Então, é natural que eu tenha tomado um super susto quando aquela voz chamou o meu nome de uma forma que eu achei extremamente sensual.
- ? Quando você chegou? - perguntei ainda um pouco atordoada. Olhei em volta para achar a forma desprezivel da bitch master, mas não encontrei nem sinais dela.
- Há mais de uma hora, mas não consegui te encontrar nessa loucura. - Ele sorriu. - Tá tudo bem com você?
- Ahan. Só um pouco de dor de cabeça.
- Ah. - Ele fez uma careta. - Eu só queria agradecer pelo que você está fazendo. Eu sei que é só pelo seu cartão e talz, mas você realmente nos ajudou muito. - Eu ainda estava achando a voz dele a coisa mais sexy do mundo e ele estava muito próximo (para que eu o ouvisse mesmo com a música alta). E minha visão, afetada por causa da bebida, não parava de oscilar entre seus olhos e seus lábios. Meu Deus, como eu queria beijá-lo agora! - Acho que nós estariamos desesperados nesse momento e não festejando, se não fosse por você. - Continua falando assim e eu caso com você.
- , eu não tô fazendo isso só por causa do meu cartão. Eu realmente quero que isso dê certo. - Nossa, eu tava muito bêbada para assumir aquilo em voz alta. Tá, se eu disse isso por causa da tequila, então tenho que agradecer muito à ela depois, pois abriu o sorriso mais perfeito que eu já vi na vida naquele momento.
Eu não conseguia ouvir mais nada que não fosse a batida descompassada do meu coração. Não conseguia ver mais nada a não ser os lindos e brilhantes olhos de . Não conseguia sentir mais nada além da vontade de beijar o cara que estava na minha frente. Eu queria muito . Mais do que qualquer outra coisa que eu já quis na vida. Mais do que o pônei cor de rosa que pedi para o meu pai de Natal quando eu tinha 5 anos.
E quando começou a se aproximar mais ainda, me intoxicando com o seu perfume assassino, uma voz extremamente insuportável (aquela que eu ouvia nos meus piores pesadelos) surgiu em minha mente, fazendo com que todo o clima sumisse num piscar de olhos. E quando me virei para olhar com a minha pior cara de psicopata louca, dei de cara com a maior e mais cretina bitch do universo: Lois Puta da Esquina (é não sei o sobrenome dela, mas esse servia muito bem).
- Oi, . Sua festa tá muito legal, parabéns. - Cretina falsa.
- Obrigada. Sua roupa é muito bonita - Pra embrulhar cocô de cachorro, só se for.
- , vem dançar comigo? - Ela estendeu a mão, e meu mundo caiu quando ele colocou a sua por cima da dela e levantou. Lois piscou pra mim e foi puxando (que nem sequer olhou pra mim) para o meio da pista.
E quando eu me vi sozinha de novo naquele sofá, senti finalmente o peso da bebida no meu estômago vazio e me contorci inteira, vomitando sei lá o que no chão. Eca!
Ainda enjoada, deixei toda a barulheira da festa para trás e fui me sentar na escadinha que tinha na entrada do salão. Ainda dava para ouvir a música, mas estava suportável lá fora.
O que eu tinha feito de errado, afinal? Por todos esses dias eu quase não gastei nada, me comportei super bem e fiz um monte de gente feliz. Eu tinha virado quase um bom exemplo e só estava recebendo coisas ruins em troca.
Primeiro descubro que o meu namorado estava me traindo e termino com ele, depois me apaixono (apaixonada? Quem disse que eu estou apaixonada?) por um cara totalmente diferente de mim, que na certa me odeia. Ou sofre de transtorno bipolar.
É, , no final das contas, sua filosofia de vida estava certa: os bonzinhos só se fodem.
Eu juro, juro que quando esse negócio de Projeto Papai Noel acabar, eu nunca mais vou querer saber de nenhum projeto social e muito menos de nenhum .
- , tá tudo bem? - se sentou ao meu lado na escada. Eu tive que segurar a vontade de rir, porque ele era simplesmente alto demais para sentar naquele degrau minúsculo, e ficou todo encolhido.
- Mais ou menos. - me envolveu com um braço e fez com que eu encostasse a cabeça em seu peito. - Desde quando a Lois tá no Projeto?
- Desde que começou, que eu saiba. E ela sempre teve uma queda pelo , mas esse ano tá demais. - Ele disse olhando para dentro do salão, e eu tive que me controlar para não imaginar o que podia estar acontecendo lá.
- E o ?
- O o quê? Se ele já deu bola pra ela? Nunca. Na verdade, o nunca deu bola pra ninguém. Tanto que a Grace e a Kelly até desistiram de tentar alguma coisa. Por isso e porque elas tem medo da Lois. - riu e eu o acompanhei. Então esses eram os nomes das outras meninas do Projeto. Bom saber.
- , você ainda vai continuar sendo meu amigo depois que o Projeto terminar? - Minha voz parecia a de uma criança que tinha se machucado feio e não parava de chorar. Pensando bem, eu estava mais ou menos assim. Só acrescentar o ?bêbada? e voilá. me encarou, sorrindo.
- Claro que sim. Eu te adotei como irmã mais nova carente.
- Carente? Uns falam que eu sou mimada, outros que eu sou carente. Oh, vida.
Fiquei o restante da noite conversando com e me distraí tanto que até me assustei quando as pessoas começaram a ir embora, uma mais bêbada do que a outra.
Pensei ter ouvido a voz de Lois, mas nem me dei ao trabalho de sair de perto de (onde estava confortável) para estragar mais um pouco a minha noite. Ainda bem que ela estava indo embora, e que se foda se o estivesse indo com ela. Quem se importa?
- Tchau, , tchau, Lois. - Por que o tinha que ser simpático? Eu não queria saber desses dois.
Lois não respondeu e pareceu no mínimo irritado quando respondeu de má vontade o "tchau" de .
- , eu preciso ir embora. - disse após um tempo, parecendo contrariado.
- Ah, desculpa! Você deve estar exausto e eu aqui dormindo em cima de você... - Nós rimos juntos enquanto nos levantamos, ambos tontos.
- Você vai ficar bem?
- Ahan, pode deixar. - Nos despedimos e eu subi para o meu quarto. Não queria saber de mais nada nem ninguém naquela noite.
Capítulo 8 - Tempestade de neve
Quando desci as escadas naquela manhã, tomei um susto com uma árvore de natal que surgira do nada, bem no meio da sala de estar. Olhar para ela assim, tão cheia de enfeites, me fez lembrar das crianças do abrigo.
- Você tem que parar de comprar enfeites para a árvore a cada natal, querida. Tivemos que aposentar vários, por não caberem na árvore. - Meu pai conversava com minha mãe enquanto descia as escadas.
Pera aí, tinha enfeites sobrando?
- Bom dia, querida. - Meu pai beijou a minha testa. - A festa ontem foi boa?
- Que horas acabou? - perguntei, ainda com sono.
- A música parou cerca de três da manhã. - Três da manhã? What a fuck!
Ainda bem que o carinha que coordena o Projeto, que eu me recuso a dizer o nome, deixou todo mundo chegar só depois do almoço.
- E que horas são? - Eu tinha a leve impressão de estar parecendo um zumbi de ressaca, mas quem liga?
- Onze. Melhor começar a se arrumar. Me disseram que você tem que estar no shopping à uma hora.
- Eu sei. - bufei contráriada. Odiava que ficassem reportando tudo o que eu fazia para o meu pai.
- ...
- Que é?
- Só queria te dar parabéns. Você está fazendo um ótimo trabalho e eu estou realmente orgulhoso de você. - Tá, esse era mesmo o meu pai? - Sabe, eu sempre estive muito preocupado em conseguir sempre mais dinheiro do que eu já tinha, e acabei perdendo a melhor coisa que eu já tive na vida: você. Eu sei que eu e sua mãe erramos quando não te dávamos atenção, e para compensar isso, te enchíamos de brinquedos. Nós achávamos que tudo bem, que você era uma criança feliz. Com o tempo, isso foi se tornando rotina, e quando eu finalmente me toquei da merda - Ops, papai falando palavrão na frente da filha... - Que eu fiz, pensei que já era tarde demais.
- Pai... - Eu não queria que ele continuasse. não queria chorar agora. - Ok, já estava chorando. Mas todo esse sentimentalismo vindo de Raymond era algo que se presenciava uma vez a cada século.
- Mas eu sempre soube que embaixo da garotinha mimada que você se tornou, ainda tinha a boa e inteligente que você costumava ser. - Ele abriu os braços, e eu não precisei pensar duas vezes antes de me jogar sobre ele e abraçá-lo como nunca tinha feito antes. Nos braços dele eu me senti segura como nunca antes, porque ele era o único cara que nunca me machucaria de propósito.
- Pai, eu preciso mesmo me arrumar. - eu disse, tentando fazer com que as lágrimas parassem de cair.
- Ok, filha, vai lá. - Ele me soltou, rindo. - E arrebenta com eles! - Tá, eu não sei o que isso devia significar, mas acho que papai realmente precisava de um filho homem.
Quando me olhei no espelho, quase tive um infarto. Eu estava horrível!
Olheiras profundas, checado.
Cabelo parecendo ninho de pássaro, checado.
Cara de zumbi de ressaca, checado.
Me recusando a olhar para qualquer lugar (naquele banheiro com um espelho que ocupava a parede inteira) que pudesse mostrar o desastre que eu estava, entrei embaixo do chuveiro e fiquei lá até me sentir limpa.
Depois de banhada, vestida e maquiada, peguei minha bolsa, e já estava me preparando para ir embora quando uma ideia subtamente surgiu na minha cabeça.
Fui até a dispensa onde se guardava as coisas natalinas e peguei a caixa aonde ficavam os enfeites de árvore. Coloquei-a no meu carro e fui até o salão buscar a caixa com os presentes.
Bingo, ela estava transbordando de tão cheia!
- Bom dia, gente! - Sorri quando cheguei ao shopping. Um bando de Papai Noeis zumbi me cumprimentaram, e meus olhos traidores ficaram buscando por um Papai Noel em especial, até encontrá-lo ao lado da bitch chefe. Toma, ! - A festa ontem foi um sucesso! Olha só quantos presentes! - Sorri, tentando parecer mais feliz do que eu realmente estava.
- Whoa! Acho que isso faz a gente atingir a nossa meta, não? - Kaio, um dos garotos do Projeto (viu, tô aprendendo) disse sorrindo.
- Acho que sim. - Retribui o gesto, mas mudei de expressão logo que meus olhos e os de se encontraram. Por sorte, ele desviou os dele para a enorme caixa de presentes que eu carregava. Ele caminhou em minha direção (só pelos presentes, ) e vi seus olhos brilharem.
- Garotos, por que vocês não ajudam a com a caixa? Isso deve estar pesado. - É, está, mas ninguém pediu sua ajuda.
- Certo. - Kaio pegou a caixa das minhas mãos e, com a ajuda de outro garoto, a levou para a nossa sala.
- Cadê o ? - Perguntei para quebrar o silêncio que se formou assim que ficamos sozinhos.
- Ele não vem hoje. - respondeu de mau humor.
- Droga. Bom, eu só vim trazer os presentes. Preciso ir embora.
- Como assim ir embora? Você tem que ficar aqui. - Sem dar ouvidos para ele, fui caminhando a passos rápidos até o estacionamento. - , volta aqui! - Aumentei o ritmo dos passos quando me dei conta de que estava me seguindo, mas ele me alcançou na porta do carro. - Se você for embora, vou ter que ligar para o seu pai e seu direitor.
- Não enche, . Eu não vou fugir nem nada assim.
- Então, aonde você vai?
- No abrigo. - A expressão de mudou de irritada para chocada.
- No abrigo?
- É, quando a gente foi lá da última vez, achei que a árvore precisava de mais enfeites. E como na minha casa tem de sobra, resolvi levar pras crianças. - Tá, agora a expressão dele era indescritível. Por que esse cara era tão confuso? - Quer ir comigo? - Não, não, não! Merda, , por que você foi perguntar isso? Você precisa ficar longe dele, idiota!
pareceu pensar por um instante e então concordou, contornando o carro para entrar no lado do passageiro. Vai, , essa é a sua chance de acelerar e deixar ele pra trás com cara de idiota!
Tá, eu não fiz isso, e a viagem até o abrigo foi bastante desconfortável e silenciosa.
Molly nos recebeu (surpresa) com um sorriso fofo no rosto. Quando expliquei o que fomos fazer lá, achei que ela fosse chorar de tão emocionada.
Que é, são só alguns enfeites.
- , você voltou! - O menininho de cabelo tigelinha (que eu descobri que chamava Brian) disse, me abraçando de forma desajeitada (já que ele era bem mais baixinho do que eu, e eu estava em pé).
- Posso pegar ele no colo? - Perguntei para Molly, ignorando o olhar de sobre mim. Molly riu e assentiu. - Ah, eu trouxe uma coisa que vocês vão adorar! - disse para Brian, enquanto pegava ele no colo. Ele riu e eu fiz o mesmo.
- É? , você sabe o endereço do Papai Noel? - Ele me perguntou e eu ri mais ainda.
- Não, por quê?
- Porque eu escrevi uma carta pra ele, mas eu não sei onde ele mora. - Ele parecia triste de verdade.
- Então vamos fazer o seguinte: Você deixa a sua carta comigo e eu entrego pra ele.
- Sério? - Ele gritou, feliz, e me abraçou. - Oba, oba! Então eu vou pegar ela. Não vai embora!
- Ok. - Coloquei Brian no chão e ele saiu correndo em direção ao dormitório (acho).
- As crianças estão brincando lá fora, mas mais tarde elas aparecem aqui. Agora vocês tem que me dar licença que eu tenho muitas coisas pra fazer. - Molly saiu da sala, deixando eu e sozinhos. Pensei em ir atrás dela e implorar para que não me deixasse sozinha lá com ele, mas achei que seria no mínimo uma atitude infantil e desesperada. Em minha defesa, eu estava desesperada.
- Então, vamos arrumar a árvore? - Perguntei de forma objetiva, me sentindo incomodada com a forma que me olhava. Não sabe que encarar as pessoas é falta de educação?
- Ah, claro. - Parecendo despertar, pegou um dos enfeites e colocou na árvore, fazendo com que seu braço roçasse no meu (o que me deixou estranhamente arrepiada). Me movi desajeitada para longe dele, antes que eu parasse de responder por mim mesma.
Horas se passaram enquanto nós enfeitávamos a árvore em silêncio (e numa distância confortável). Logo, sons de passos e gritinhos de crianças começaram a tomar conta do corredor, indicando que o tempo de brincar lá fora tinha se esgotado. Me perguntei mentalmente que horas deviam ser, mas como não tinha relógio e minha bolsa estava meio longe, resolvi deixar essa pergunta pra depois.
- , trouxe minha carta! - Brian disse, puxando minha roupa. - Quis te trazer mais cedo, mas a bruxa da Sra. Margô não me deixou. Ela disse que eu tinha que brincar com as outras crianças. Mas agora que estava ficando divertido, porque começou a nevar...
- Pera aí, tá nevando? - Perguntei assustada.
- Tá sim! Muuuuuuito forte! Você precisa ver! - Merda, merda, merda. E se começasse a nevar tanto que as estradas ficariam bloqueadas?
Peguei a carta de Brian e saí correndo até a janela para constatar, com desespero, que se aquela neve não sumisse, eu não poderia voltar para casa.
- !
- Quê? - Ele se aproximou da janela e arregalou os olhos, provavelmente pensando o mesmo que eu.
- Que horas são?
- Seis e meia.
- Droga. , eu não posso ficar presa aqui!
- Nem eu. Faltam dois dias para o Natal. Tenho que checar se concluímos nossa meta e mandar os presentes para as outras casas da Fundação. - Tá, os argumentos dele eram menos egoístas que os meus, por isso resolvi parar de fazer manha e tentar pensar em uma solução.
- Será que a neve vai diminuir? - perguntei, tentando controlar meu desespero.
- Droga, não sei. - Ficamos olhando, com cara de paisagem, a neve cair, até que umas crianças pularam em nós, fazendo com que despertássemos.
- Nós podemos ajudar vocês a arrumar a árvore? - Uma menininha perguntou.
- Claro. - respondeu e nós fomos terminar de pendurar os enfeites.
Às sete e meia, a árvore estava pronta, linda e com luzinhas coloridas. Molly chamou todos para jantar e eu tive que aceitar, já que meu estômago estava quase latindo de tanta fome. (É, quando estou faminta, meu estômago late, vocês precisam ver! A fala que eu sou paranormal).
- Crianças, - Molly chamou e eu fiquei olhando em volta procurando algum macaquinho, mas só havia nós três na sala. - vocês não estão pensando em ir embora essa noite, estão?
- Nós precisamos, Molly. - disse, mordendo o lábio inferior de nervosismo.
- Só que o carro da está completamente preso na neve...
- O quê? - perguntei (tá, gritei) desesperada. Meu bebê estava lá fora, congelando, e ainda coberto de neve?
- E nenhum ônibus está autorizado a circular. Tá tudo parado. - e eu ficamos em silêncio, então Molly continuou - Nós só temos um quarto desocupado. - Ela olhou de mim para para estudar nossa reação.
Qual você acha que foi a minha? Eu congelei. Dormir no mesmo quarto que o ? Oh, God! Ah, antes que queiram saber a reação dele, vou dizendo que eu não tive coragem de olhar pra cara dele e ver.
- Tá bom. Acho que é nossa única alternativa. - disse, resignado.
- O quê? - Tá, eu não me conformaria com aquilo.
- Ah, , não começa! Ou você tem uma ideia melhor? Você pode ir andando até o centro, ou... Já sei! Por que você não usa o seu cartão de crédito ilimitado para contratar um jatinho particular para te buscar? - explodiu e eu me encolhi no sofá. E daí que ele estava nervoso? Não era desculpa para ele descontar em mim. Idiota. Eu queria dar um soco na cara dele, mas Molly pediu para nós nos acalmarmos e voltou a se sentar, de cara feia.
- Ok. Então onde é o quarto? - Perguntei emburrada.
- Vamos. - Molly pareceu refletir se era mesmo uma boa ideia nos deixar sozinhos no mesmo quarto, mas por fim só suspirou e nos levou até o tal lugar. - Boa noite. - Ela disse antes de sumir no corredor escuro, e eu quase tive uma crise histérica quando abri a porta e me deparei com, não duas camas, como era necessário, mas uma cama de casal.
Ah, não. Como se já não fosse desconfortável o suficiente dividir um quarto com e aquele perfume alienígena (é, porque pra ser tão perfeito, só podia ser de outro planeta) dele, agora teria que dividir a cama também?!
- Merda. - Ele resmungou quando acompanhou minha linha de pensamentos. - Ok, . Você dorme na cama e eu no chão.
- O quê? Não! - Dividir a cama com ele (pois tentador que fosse) era loucura, mas deixar que dormisse no chão frio, em um quarto mais frio ainda, era ainda mais insano. E se ele ficasse doente? Além do mais, não tinha cobertas o suficiente para isso.
- E você tem uma ideia melhor? - Ele perguntou nervoso. Essa raivinha dele tá começando a me irritar de verdade. Eu também não estava muito feliz de estar ali, mas não estava gritando com ele por isso.
- Bom... É uma cama de casal, né? Isso significa que é feita para duas pessoas. Então a gente pode dividir. - Eu ficava mais vermelha a cada palavra dita. - Você fica de um lado e eu do outro, ok? - Fiquei até aliviada por ver que parecia tão nervoso quanto eu. Pelo menos eu não era idiota sozinha. - É melhor do que você dormir no chão e acabar ficando doente.
- Acho que você tem razão.
É, eu tenho. Mas tenho que confessar que parecia menos estranho em tese do que na prática. Porque quando nós dois estávamos devidamente deitados, acabei constatando que a cama era menor do que aparentava, e que não teria como manter uma distância confortável de ali. Sempre que um de nós se mexia, acabava encostando no outro.
'Let's have some fun, this beat is sick, I wanna take a ride on your disco stick' Meu celular começou a tocar alto, quebrando o silêncio e me assustando (coisa que acontecia sempre, mas ninguém precisa saber).
- Alô?
- ? rima com deusa, sabia? - Fechei os olhos com força e respirei fundo. Era , e ele estava bêbado.
- Não, , não rima.
- Mas pra mim rima. Você é a deusa da minha vida, sabia? - É, ele estava ridiculamente bêbado.
- , o que você quer, hein? - perguntei de mal humor, sentindo o olhar de sobre mim.
- Eu quero que você volte pra mim, porque eu te amo e quero casar com você. - Credo, sai, exu!
- Quanto você bebeu?
- Só um pouquinho. - Ah, tá.
- Olha, são onze da noite - Obrigada, relógio da parede! - E eu quero dormir.
- Por que você está tão grossa assim, ? Você deu uma festa ontem e nem me chamou.
- Pra você aparecer lá com a sua vadia? Acho que não. - O bêbado era extremamente irritante, sério.
- Ela não é vadia, o nome dela é Alice.
- Tanto faz. Cadê ela, afinal? Tá te colocando chifres com outro cara?
- Não vamos falar dela, eu tô com saudades de você.
- Ótimo, então continue assim. Porque eu não quero mais saber de você, . E estou tentando apagar os últimos dois anos da minha mente. - Desliguei o telefone sem esperar resposta e o deixei em modo silencioso.
- , tá tudo bem? - Só quando me chamou com uma voz preocupada é que eu fui perceber que eu estava tremendo e chorando.
- Tá, eu só... - não me deixou terminar, e logo me vi envolvida por seus braços fortes. O calor e o perfume que exalavam dele tiveram efeito tranqüilizante em mim e acabei adormecendo enquanto ele escorria os dedos pelo meu cabelo.
Capítulo 9 - Surpresa
Quando acordei de manhã, ainda nos braços de (que dormia feito uma pedra), tive um vislumbre rápido dos últimos acontecimentos da noite passada (lê-se a ligação de ) e estremeci, sentindo o abraço de se intensificar. Estar ali com ele era como estar no paraíso. Me sentia nas nuvens e por um minuto desejei que ele demorasse bastante para acordar e, consequentemente, me afastar de perto de si.
Mas, como sempre, sempre tinha alguém pra estragar, e no caso foi o celular de , que começou a tocar (uma música que eu não conhecia) e o fez despertar num pulo.
- Alô? - Ele atendeu com uma voz rouca (e maravilhosa) de sono. - Ah, bom dia, Lois. - Lois! Essa puta nasceu pra acabar com a minha vida, não é possível! Merda! - Hmm? Que horas são? - Olhei para o relógio: nove e quinze. Droga, será que já tinha parado de nevar? - Sabe se ainda está nevando? Eu tô preso aqui no abrigo. - Ele perguntou, também olhando para o relógio. - Ótimo, estou indo, então. - Ele desligou o telefone e olhou pra mim. - Está melhor?
- Ahan. Nós estamos atrasados.
- É. Mas a boa notícia é que a neve diminuiu e acho que podemos ir.
- Então acho melhor tomarmos cuidado para não encontrar Molly, senão ela vai querer que a gente tome café da manhã aqui. - Ri, me levantando da cama e pegando meu celular de cima do criado mudo, antes que esquecesse ele lá.
24 ligações perdidas. Quatro de casa, duas da e dezoito do . Acho que estava na hora de bloqueá-lo.
Abri a porta do quarto com cuidado, como uma espiã daqueles filmes de nerd. Ninguém a vista. Fui andando em passos leves pelo corredor, atenta a qualquer barulho. Felizmente, não encontramos ninguém até chegarmos à porta de entrada, onde ouvimos de longe a voz doce de Molly, conversando com alguém.
rapidamente pegou minha mão e nós saímos correndo até o estacionamento. Mal deu para sentir a diferença de temperatura enquanto corríamos.
Paramos em frente ao meu carro e começamos a rir igual dois idiotas. Só quando conseguimos respirar e parar de rir foi que percebi que a mão de ainda estava sobre a minha e corei. também pareceu perceber, porque logo me soltou e foi até o lado do passageiro.
- Hoje é o último dia de Projeto. - Ele disse com uma voz estranha e eu assenti, sentindo um vazio tomar conta de mim. Isso significava que era o último dia que eu passaria ao lado de . Ficamos em silêncio - mas não um silêncio desconfortável. Só estávamos ocupados demais com nossos próprios pensamentos para dizer alguma coisa.
- Vamos, temos que fazer esse dia ser o melhor possível. - Sorri enquanto fechava a porta do carro, e sorriu de volta.
- , ainda bem que você chegou! Fiz as contas ontem e... - Lois parou de falar assim que me viu chegar ao lado de . A cara de merda que ela fez foi tão engraçada que tive que me segurar para não rir.
- É, eu fiquei presa no abrigo também. Obrigada por ter ligado, senão estaríamos dormindo até agora. - Disse do jeito mais simpático e inocente que consegui. Ela deu um sorriso bitch falsa pra mim e se voltou para .
- Então, conseguimos até passar da nossa meta, então eu arranjei... - pigarreou atrás dela, fazendo as nossas atenções se virarem para ele.
- Eu arranjei uma outra fundação para doarmos os outros presentes.
- - Sorri e dei um abraço rápido nele. Quando me recompus, notei que parecia evitar olhar para mim. Bipolar. Dorme comigo e depois não quer nem olhar pra minha cara (ignorem o duplo sentido dessa frase, por favor).
- Eu imaginei que fossem sobrar presentes, então fui atrás de outros abrigos e achei um bem legal. Fica numa cidade vizinha. - continuou e eu adorei ver a cara de cú de Lois.
Ninguém mandou tentar dar uma de Superpoderosa. Essa sou eu, queridinha.
- Enfim, os meninos que têm carro já foram levar os presentes para as Fundações mais próximas, e o Peter já tá com as caixas das outras fundações no caminhão. - Lois continuou, consternada. Tão eficiente como sempre. Eca.
- O que eu vim fazer aqui então? - sorriu (o MEU sorriso) e Lois deu uma risadinha de bitch. E eu? Eu fiquei com vontade de vomitar.
- E deixamos alguns presentes aqui pro Chris - esse eu sabia quem era: o "Papai Noel" oficial do shopping. Um cara baixinho e gordo (como um bom papai noel) que era amigo do meu pai. - distribuir pras crianças que vierem aqui hoje. Agora vem cá comigo, . - me puxou para um canto. Por que todo mundo vive me puxando e empurrando por aí? - Preciso que você ligue para todas as Fundações e converse com as responsáveis, ok?
- Tá. - Assenti e já ia pegar meu celular quando me mandou ir numa tal Sala de Controle do Shopping e usar o telefone de lá. Ele estava estranho, mas depois eu me preocupava em descobrir o porquê. Agora tinha trabalho a fazer.
Enquanto subia as escadas rolantes, pude ver dizendo algo para t e a bitch chefe rolar os olhos. O que estava acontecendo, afinal?
continuou me dando tarefas estranhas pra fazer até o dia acabar. Pê da vida com ele, fui andando a passos duros até chegar na nossa sala. Abri a porta, estranhando o silêncio, e várias vozes gritaram "surpresa" em coro.
estava mais próximo de mim e me recebeu com um abraço forte e um sorriso super fofo.
- Desculpa pelos trabalhos doidos, , mas a gente precisava te manter ocupada pra você não descobrir a surpresa. - Era só me deixar lá no abrigo com o que eu ficaria beeem ocupada.
- É, , porque se não fosse por você, a gente estaria chorando agora. - Kaio sorriu e eu achei que ele queria me abraçar, mas estava com vergonha demais para fazê-lo, então eu mesma tomei atitude, deixando-o surpreso. Depois de Kaio, todo mundo veio me abraçar e abraçar uns aos outros. No final, acho que abraçei todo mundo, com exceção de e Lois.
Nós comemoramos o fim do projeto, e pouco a pouco o pessoal ia embora. No final só sobrou eu, , , Grace e a bitch na sala. Ofereci uma carona para , que aceitou na hora. Não tive coragem de me despedir de , então só dirigi um rápido sorriso e um "tchau" antes de me virar para a porta e sair. Então, a ficha de que era a última vez que eu sairia daquela sala caiu e algumas lágrimas rolaram pelo meu rosto.
Quando chegamos ao estacionamento, me dei conta de que esquecera minha bolsa e pedi para esperar enquanto eu ia buscá-la.
Entrei no shopping e caminhei até a salinha do Projeto, pensando no quanto as coisas haviam mudado nesses dias. Abri a porta, totalmente distraída, e senti como se tivesse sido atropelada por um caminhão de carga quando processei a cena: Lois e estavam lá, se beijando.
Provavelmente devem ter se assustado com o barulho da porta, porque se separaram e olharam para mim, que estava lá, parada na porta, sem ação, sentindo um buraco se abrir no meu peito e meu estômago revirar. Lois me lançou um sorriso de bitch desprezível e ficou me encarando assustado.
Tentando segurar as lágrimas que teimavam em querer sair, corri para onde sabia que tinha deixado minha bolsa e saí daquela maldita sala sem dizer nada, batendo a porta com força e tropeçando nos meus próprios pés até chegar no estacionamento. Minha visão estava embaçada por causa das lágrimas, e isso não ajudava a localizar meu carro.
Quando finalmente lembrei onde deixara minha Land Rover, fui andando cegamente até lá, e eu devia estar horrível, porque saiu do carro com uma expressão toda preocupada e me abraçou.
- O que foi, ?
- Você... Você pode dirigir? - perguntei e ele sorriu, assentindo.
Quando consegui respirar, liguei para e pedi para ela ir para minha casa.
Eu precisava da minha melhor amiga.
- Desculpa, , eu sei que te prometi uma carona, mas...
- Não esquenta, , eu pego um táxi até em casa. Vai ficar mesmo bem? - Ele estacionou na minha garagem e me abraçou de novo.
- Ahan, a já está vindo pra cá.
- Okay. Hmm, até depois então.
- Tchau. - beijou minha testa e se dirigiu para o portão. Entrei em casa, para me afundar no meu travesseiro.
- Amor, tá tudo bem? - bateu na porta do meu quarto com uma voz preocupada. - Posso entrar? - ela não esperou resposta e invadiu meu quarto, se sentando na beirada da minha cama. - Quer desabafar?
Tirei a cabeça do meio dos travesseiros (é, eu tinha uns quatro só pra mim, ok?) e encarei com a minha cara mais criança que fez dodói, com direito até a biquinho.
- Ah, eu conheço essa cara. Foi o ou o ? Hmm, pelo jeito que o chegou em casa hoje, foi ele.
- Como assim? - corou e eu entendi tudo.
- Eu estava lá com , quando o chegou com uma cara horrível e saiu jogando as coisas dele pra todo lado. O que aconteceu? - Suspirei e comecei a contar tudo o que tinha acontecido desde a festa até algumas horas atrás. Quando terminei, estava até de boca aberta. - Que filho da puta! - Ela disse com uma expressão engraçada, que me fez começar a rir como uma idiota, mesmo que não tivesse nada de engraçado em tudo aquilo.
- ! O que eu faço?
- Sobre? - Fechei a cara pra ela.
- Como eu o esqueço?
- Não esquece, oras.
- Como assim, não esquece? Que tipo de amiga você é? - Reclamei, jogando um travesseiro nela.
- É, não esquece. Pelo o que você me disse, essa Lois é uma vaca. Você vai deixar uma vaca ganhar de você?
- Mas, ...
- Nossa, esse Projeto te mudou mesmo, hein! - Já disse que odiava quando usava esse tom de voz comigo? Pois é.
- Mas eles se conhecem há um tempão, eles são do mesmo mundo, falam a mesma língua...
- E ele nunca deu bola pra ela.
- Eles se beijaram!
- E daí?
- E daí que o não me parece o tipo que sai beijando por aí sem nenhum sentimento. Ele não parecia feliz quando chegou em casa. Quando a gente beija alguém que a gente gosta, fica todo contente e não destrói a casa inteira.
- Eu não quero tomar um não na cara. Não dois dias depois de ter terminado com meu namorado. - eu disse, reprimindo as lágrimas traiçoeiras.
- Covarde.
- Quê?
- É, covarde. Lembra quando você gostava do ? Então, você foi lá e contou pra ele.
- Mas é diferente.
- Por quê?
- Porque o gostava de mim, e eu sabia disso.
- Eu tô dizendo pra você arriscar, mas você não quer me ouvir... Depois não vem me ligar às onze horas da noite pra reclamar do seu amor não correspondido.
- ! - Ela estava sendo tão grossa que desisti de segurar as lágrimas. Um tapa na cara doeria menos do que ouvir minha melhor amiga falar daquele jeito comigo.
- Boa noite, . - E assim, sem dizer mais nada, se levantou e foi embora, me deixando lá, aos prantos, me sentindo pior do que antes.
Me afundei no travesseiro de novo, e já devia ser madrugada do dia vinte e cinco quando resolvi parar de me lamentar e relaxar. Quando o sono finalmente chegou, me entreguei a ele com um sorriso no rosto e com todo o dia de Natal planejado na cabeça.
Capítulo 10 - Então é Natal
Tomei café da manhã com meus pais e nem abri meus presentes. Na verdade, a tradição da minha família era abrir os presentes só na hora do jantar do dia vinte e cinco, quando os outros parentes chegassem.
É, teria que fazer tudo o que eu precisava até às oito da noite, que era a hora que o jantar estava marcado.
O primeiro lugar da minha lista mental ficava um pouco longe, então me arrumei rapidamente, aproveitando a sensação maravilhosa e mágica que o Natal provocava em mim, e peguei o casaco mais grosso que eu tinha. A neve lá fora deixava toda a paisagem bem mais linda do que o normal, mas por causa dela, demorei o dobro de tempo que o habitual para chegar ao meu destino.
Molly me recebeu com um sorriso de orelha a orelha e me levou até a sala de estar, onde todas as crianças abriam seus presentes com sorrisos imensos.
Naquele instante, entendi o que queria dizer com "Ver o sorriso das crianças quando ganham os presentes dá uma sensação maravilhosa".
Procurei com os olhos uma criança em especial - a razão de eu estar ali - e fiquei intrigada ao encontrá-la sozinha num canto, com uma expressão triste no rosto.
Caminhei até ele e me sentei ao seu lado. Brian olhou pra mim e sorriu triste, voltando a prestar atenção na neve lá fora em seguida.
- O que foi? - perguntei, fazendo cafuné no cabelo dele.
- Acho que o Papai Noel não recebeu minha carta a tempo. - Ele respondeu com uma carinha que cortou meu coração.
- Ah, é isso. Bom, na verdade, hoje quando fui olhar minha árvore, encontrei isso aqui... - Entreguei um pacote em suas mãos e sorri junto com ele. Seus olhos brilhavam. - E só pode ser seu, porque eu não conheço nenhum outro Brian.
- É meu! - Ele disse decidido, rasgando o embrulho com os olhos ainda brilhantes. Seu sorriso aumentou quando viu o boneco do Buzz Lightyear (aquele carinha do toy story). De repente, Brian abaixou a cabeça e eu senti que ele estava triste.
- O que foi? - Perguntei confusa. Era isso que ele tinha pedido na carta! AimeuDeus - Não era isso que você queria?
- Era. - Ele estava chorando? - É que eu tinha um igualzinho quando era menor. Era meu brinquedo preferido.
- E o que aconteceu com ele?
- Faz três anos que eu moro aqui. Antes, eu morava com meu pai e minha mãe. Eu não lembro direito, porque eu era muito pequeno... - Claro, porque ele devia ter uns sete anos agora, então quando ele chegou aqui tinha quatro. - Mas estava quente e minha mãe estava gritando. E meu pai estava muito machucado. Tinha fogo pra todo lado...
- Psiu... - Achei melhor não deixar ele continuar, porque ele tremia de tanto chorar. Ele perdeu os pais num incêndio, então.
- Eu tentei pegar o Buzz, mas eu não encontrei.
- Tudo bem, agora ele voltou pra você. - Eu disse tentando acalmá-lo, sentido lágrimas começarem a cair sobre meu rosto.
- Você acha que meus pais também vão voltar? - Ele olhou pra mim com olhinhos esperançosos e eu não consegui dizer nada. Era como se eu sentisse a dor dele.
- Eu acho que eles nunca foram embora de verdade. E nunca vão ir enquanto você os manter aqui - apontei para seu coração. - Eles vão estar sempre aqui, te protegendo.
- Foram eles que fizeram eu te conhecer? - Depois dessa não aguentei mais e o abraçei forte. Será que foram? Porque o vínculo que eu criei com ele desde a primeira vez que o vi era algo totalmente sobrenatural. Não fazia sentido eu me apegar tanto a uma criança assim, do nada.
- Acho que sim. - Sorri pra ele e ficamos em silêncio por um minuto.
- Vou mostrar meu boneco pra Molly. - Brian disse olhando para algo (ou alguém) atrás de mim e saiu correndo para fora da sala.
- Você foi incrível. - Aquela voz fez com que todo o meu corpo estremecesse.
- ? O que você tá fazendo aqui? - Ele apareceu na minha frente enquanto limpava minhas lágrimas.
- Eu sempre passo a manhã de Natal aqui. - Os olhos dele brilhavam enquanto encaravam os meus. Ele parecia admirado.
- Eu só vim trazer o presente do Brian.
- ...
- Acho que acabei mesmo me envolvendo com o Projeto. - Ele sorriu, limpando uma lágrima teimosa que escorreu pelo meu rosto.
- Como você consegue? - manteve a mão em meu rosto, segurando-o delicadamente. O olhei confusa e ele continuou - Me surpreender tanto? Você sempre faz alguma coisa inesperada.
- Acho que você teve um pré-conceito ruim sobre mim.
- É.
- Então você não me acha mais mimada?
- Não. Eu te acho fascinante. - colocou a outra mão no meu rosto e se aproximou devagar. Novamente entrei numa bolha em que só o que existia era eu e ele. O cheiro, os olhos, a boca e o calor dele. Então eu descobri que estava certa: o gosto dele era tão bom quanto o cheiro. Nosso beijo foi lento, explorador.
E dessa vez não teve nenhum idiota para nos interromper. Aquele momento foi só nosso.
Nos separamos para poder respirar, mas continuamos com o contato visual. Aqueles olhos brilhavam de felicidade para mim, e acho que eu devia estar com uma cara de boba pior ainda.
Uma boba apaixonada.
- Achei que você não gostasse de bonecas de plástico. - Brinquei e ele sorriu.
- Achei que você não gostasse de pobretões. - Fiz uma careta e ele me deu um selinho. - Vem comigo? - Ele perguntou depois de um tempo.
- Pra onde?
- O tá sozinho no apartamento com a e eu tenho medo do que pode acontecer lá. - Ele disse com uma cara preocupada e eu ri. Esse era o meu próximo destino antes de encontrá-lo ali mesmo.
- É, acho melhor irmos rápido, então.
A viagem para o Royal Place foi bem mais agradável dessa vez. Tá, muuuito mais agradável. Nós ficamos ouvindo Beatles e conversando sobre bobagens, enquanto eu falava o que e podiam estar fazendo (e em que lugares) e fazia caretas.
Quando chegamos ao apartamento, e estavam deitados no sofá, assistindo algum filme de Natal.
- Você tava com medo disso? - Perguntei para em meio a risadas, fazendo com que o casal no sofá se levantassem para nos encarar.
- ? - perguntou confuso e eu sorri pra ele. Ele refletiu por um momento e depois foi correndo se jogar (literalmente) em cima de . - Aê, dude, se deu bem!
- Sai de cima de mim, seu gay! - ria enquanto tentava derrubar (que afundava a mão na cabeça de em um cafuné beeem doloroso).
veio até mim e me abraçou forte, como devia ter feito ontem - mas eu sei aquele tapa foi extremamente necessário pra mim.
- Feliz Natal, .
- Feliz Natal, . Eu te amo. - Ela piscou pra mim e logo e vieram pra perto de nós.
- Feliz Natal, ! - me pegou no colo e saiu pulando comigo pela sala. E eu, coitada de mim, só pude rir até perder o ar. Aquele cara era doido, só podia.
e também riam quando trocaram "Feliz Natal", e quando finalmente me pôs no chão, eu tive a chance de convidá-los para o jantar em casa.
- Eu topo! - levantou a mão e eu rolei os olhos. Ela iria de qualquer jeito, nossas famílias sempre passam o Natal juntas.
e se entreolharam por um instante e depois concordaram em ir também.
- Eba! Ah, o também vai, então você vai poder conhecer ele, . - Dei um pulinho e fez uma careta. Tá, agora ele me devia uma explicação. - ?
- Quê? - Ele bufou e eu entendi tudo. Dei um selinho nele, tentando não explodir numa gargalhada (não tive muito sucesso, mas que se dane).
- Você tem ciúmes do ? - É, não consegui mesmo ficar séria e começei a rir. fechou ainda mais a cara e disse um "não" nada convincente. - Tem sim.
- Tá, eu tenho. - Ele rolou os olhos. - Porque vocês se deram bem logo de cara e você vivia falando "o isso, o aquilo..."
- Awwn! - Não aguentei e dei um beijo desentupidor de pia nele, sem nem me importar que e estivessem na sala.
- Eca! - jogou uma almofada em nós, fazendo uma voz de gay.
O restante da tarde foi super divertida, ao lado daqueles três doidos (tá, eu era uma também). Quando deu seis horas, resolvi ir pra casa me arrumar (já que, como eu era anfitriã, tinha que estar lá pra receber os convidados). Me despedi dos três e saí do prédio para encontrar uma rua deserta e muito, muito gelada.
Tá, não totalmente deserta, porque tinha um casal feliz caminhando. Fiquei observando-os de longe, e quanto mais visíveis eles ficavam, eu começava a reconhecer o garoto.
Sorri balançando a cabeça, quando identifiquei ao lado de uma garota que já tinha visto algumas vezes na escola. Eles estavam de mãos dadas, sorrindo um para o outro.
Quer saber? Acho que nosso rompimento foi o melhor presente de Natal que podíamos dar um para o outro.
Entrei no carro e liguei o rádio, deixando a voz de Chris Daughtry invadir o ambiente.
Para o jantar em família, escolhi um vestido mais comportado, azul marinho, tomara que caía e a nossa cabeleleira particular (sim, em datas assim ela sempre ia lá em casa arrumar o meu cabelo e o da minha mãe) fez um coque chique no meu cabelo, deixando alguns fios soltos e levemente ondulados. Modéstia a parte, eu estava linda.
Despois de pronta, desci para receber os convidados (e os presentes, óbvio).
- Feliz Natal, filha. - Meu pai me abraçou sorrindo - Você está linda.
- Obrigada. - Sorri de volta e fui cumprimentar minha mãe, que me abraçou um tanto desajeitada e voltou a fofocar com umas amigas.
É, minha mãe definitivamente não nascera com o dom da maternidade.
Meu sorriso aumentou quando chegou com seus pais e ficou do meu lado, esperando e chegarem.
- Oi, ! - me deu um abraço apertado e depois colocou um embrulho nas minhas mãos - Feliz Natal!
- Feliz Natal. Essa é a .
- Ah, a famosa ! Prazer! - a abraçou também e nós três ficamos conversando até meus olhos fazerem contato com um par de lindos olhos .
estava mais lindo do que nunca, com uma camisa social preta e uma calça jeans de lavagem escura. Tive que fazer um esforço para lembrar como se respirava e para manter a boca fechada. entrou logo depois e eu cutuquei , que ficou na mesma situação que eu.
Nossos garotos sorriam entre si e vieram em nossa direção.
deu um beijo daqueles de filme em (acho que ele não sabia que os pais dela estavam praticamento do lado) e me deu um selinho demorado, me abraçando pela cintura.
- Finalmente! - bateu palmas e nós olhamos pra ele. - Tava achando que vocês dois não iam se acertar.
- Feliz Natal, ! - o abraçou (eu achei a cena a coisa mais fofa), e logo o jantar foi servido.
A mesa estava repleta de pessoas que, de alguma forma, eram importantes pra mim. Meus pais, meus amigos, parentes que eu quase não via, mas que sempre ficava feliz em encontrar, os pais de , que eram quase como segundos pais pra mim, e é claro, o cara que, em dez dias, tinha mudado completamente minha vida. O cara por quem eu estava completamente apaixonada. E era isso o que eu mais gostava no Natal: a união, o amor, a paz que conectava todas as pessoas, uma a uma, na noite mais especial do ano.
Senti a mão de envolver a minha por baixo da mesa e sorri discretamente para ele. Oficialmente, eu era a garota mais feliz do mundo.
Epílogo
O jantar já tinha terminado e agora o pessoal só abria os presentes e conversava. Eu aproveitei a distração dos meus amigos para fugir um pouco para o jardim. Adorava ficar observando o céu à noite. E, naquela noite em especial, ele estava magnífico.
Sorri ao me lembrar de quando era pequena e ia pro jardim a noite com a procurar fadas no meio das flores.
- Espero que todos possam sentir o que eu estou sentindo. - eu disse olhando para o céu.
- ? - A voz de chamou, me despertando.
- Oi. - Sorri pra ele e chamei-o para se sentar ao meu lado.
- Tá tudo bem?
- Ahan.
- Eu... - Olhei para ele, estranhando o seu comportamento e percebi que ele parecia nervoso. - Ér... Eu te trouxe uma coisa.
- Um presente? - Perguntei com os olhos brilhando
- Ahan.
- E cadê? - Ri ao perceber que ele ainda estava tenso.
- Olha, não é bem o tipo de presente que você está acostumada, mas...
- Tá, tá! Anda logo. - Eu ri e ele fez o mesmo, parecendo menos tenso. Se karma existir, eu estaria prestes a ganhar um vale refeição.
pegou um pequeno embrulho (não me pergunte da onde ele saiu) e colocou na minha mão.
Desembrulhei o presente e não pude acreditar no que vi: era uma fadinha de louça, toda brilhante. Era a fadinha mais linda que eu já tinha visto em toda a minha vida. Como ele sabia?
- A me disse que você sempre adorou fadas, então achei que... - Colei meus lábios nos de , sem nem deixar ele terminar a frase. - Whoa! - Ele sorriu, me beijando de novo. - Você tá chorando?
- Eu amei, ! - Tá, vamos fingir que ninguém notou que essa foi a primeira vez que eu chamei ele pelo apelido (pelo menos em voz alta). - E eu também tenho um presente pra você.
- Tem?
- Ahan. Mas só vou te dar mais tarde, porque ele tá lá no meu quarto e eu tô com preguiça de pegar. - Ele riu
- Qual a diferença de pegar agora ou depois? - fez uma careta engraçada e eu ri também.
- É porque mais tarde você também vai estar no meu quarto, então você já pega.
- E o que eu vou estar fazendo mais tarde no seu quarto? - Sorri pra ele sugestiva e seus olhos brilharam. Garotos, todos iguais.
- ? - chamou depois de um tempo que estavamos deitados na grama olhando as estrelas em silêncio.
- Quê? - Perguntei sem olhar pra ele.
- Eu te amo. - Fechei os olhos para absorver o que ele tinha acabado de dizer e senti o seu olhar sobre mim. Um sorriso besta surgiu do nada na minha cara e eu me joguei sobre ele, beijando-o com mais intensidade e paixão do que eu sabia que tinha.
- Eu também te amo, . - Sorri mordendo o lábio inferior, e pude jurar que vi uma estrela cadente super brilhante no céu no mesmo instante em que eu disse isso.
The End!
N/a: Nossa, sem palavras pra descrever o que essa fic é pra mim... EU acho que é a minha preferida, dentre as que eu escrevi. huaahuhua
Eu ri e chorei junto com a principal. Espero que vocês gostem tanto quanto eu! E não deixem de comentar. Não esperava que ficasse tão grande assim, quando começei a escrevê-la, mas conforme eu terminava um capítulo, uma nova ideia surgia.
Bom, me resta desejar um feliz natal pra todas vocês e um ano novo maravilhoso. AH, não esqueçam de assistir In the darkness & in the light, tá? Tô ansiosa *-* uhahuauh
Tem tanta coisa no final de dezembro, né? O filme do The Maine, o niver do Harry (Judd), do Jared (Leto), da Hayley... OMG huauha
Bom, bjs bjs pessoal ;*
N/b: Gente, desculpa pela demora pra mandar a fic, haha. Dana, sua estória ficou maravilhosa, você escreve muito bem e eu sou tua fã! Quero ver todo mundo votando, hein, gente?
E feliz Natal e um ótimo³³³ Ano Novo para todos nós! Weeeee!!!
Beijos:*