ReBirthday
Escrito por TiiaMeddy | Revisado por Jubs
Capítulo Único
"Depressa..."
"Depressa, Stein..."
"Livre-se de sua pele falsa..."
"Vá para onde seu corpo mandar..."
Estes pensamentos rondavam inconscientemente minha mente desde que eu havia acordado naquela versão monocromática e silenciosa de Death City cercada por uma neblina espessa , a única cor que fugia deste padrão sendo o trio de olhos escarlates que apareciam pelas construções como decoração. Não me recordava de muito antes de simplesmente surgir naquele local, apenas da loucura de Asura, antes suportável com bastante esforço, multiplicar imensamente de intensidade.
Caminhando sem rumo naquele local ao mesmo tempo familiar e confuso, findei por encontrar Spirit-senpai em frente a um grande portão. Ele parecia decepcionado comigo, me encarando como os demais membros da Shibusen quando me viam vacilar enquanto lutava contra minha insanidade. Eu sabia... aquilo na verdade era pena.
"Você abusou da insanidade..." Ele disse, ainda com a mesma expressão, aos poucos assumindo características de cão, incluindo orelhas e uma cauda. "Eu sou apenas um cão de guarda que obedece a certas ordens. Protejo a saída para que ninguém fuja da insanidade. Não se aproxime novamente desta porta."
Voltando a andar, mais estranhando aquela aparição que qualquer outro motivo, acabei parando em uma encruzilhada, cada uma das ruas parecendo um perfeito espelho de tão idênticas. Quatro garotinhas apareceram ao meu redor naquele momento, idênticas, e então restou apenas uma. Cada maldito segundo naquele lugar estava me deixando mais confuso que o normal.
"Também está perdida?"
"Eu... sempre estive sozinha..." Ela me responde, estendendo-me a pequena mão. "Por isso estou contente... de ter te conhecido. Venha comigo, te levarei até a saída."
Findei por segurar a mão da pequena, ela me guiando novamente até a porta onde senpai antes estava, porém agora ele dormia, permitindo nossa passagem. Enquanto nos aproximávamos, O enorme pedaço de madeira vermelha que bloqueava nossa entrada desaparecia. Pouco depois de ambos entrarmos, Spirit-senpai desperta, pulando em nossa direção, tentando nos impedir. Ou melhor, tentando me impedir.
No momento em que a porta se fecha, tudo pode se resumir ao mais puro negro, por mais que ainda pudesse ver a mim mesmo perfeitamente. Olhando na direção da pequena, ela já não estava mais lá, nem sentia sua mão segurando a minha, até mesmo a porta que atravessei havia desaparecido. Mais uma ilusão criada por Asura. Voltei a caminhar pelo estranho local, e quanto mais eu andava, mais eu via que estava absolutamente sozinho naquele espaço. Não via ou ouvia nada, nem mesmo os cliques de meu parafuso. Aquilo era mais estranho que o "furry Spirit" de mais cedo.
Tão repentino como tudo ficou tão escuro, uma voz ecoou por aquele local, um curto riso feminino estranhamente familiar e provocante. Por mais que eu soubesse que o conhecia, não conseguia me recordar de forma alguma quem era a dona daquele riso. Pouco depois, ela prossegue, me fazendo olhar ao redor em busca de sua origem.
"Homem pecador, você passará a eternidade nesse lugar... nunca mais sairá deste quarto..."
Ao finalizar aquela frase tão curta, caí de joelhos, sendo inundado por lembranças de toda minha vida, passando-se rápido e todas de uma vez por minha mente. Aquilo conseguia ser pior que as alucinações e sintomas de conter a loucura do kishin. Cada uma delas, seja feliz, satisfatória ou decepcionante. O dia que me tornei parceiro de Spirit-senpai, quando o abri pela primeira vez, ele me impedindo de conseguir novas vítimas, sua despedida para ser parceiro de Kami, o início de minhas pesquisas usando a mim mesmo como cobaia, Hoshizoku, traitors, meu primeiro dia como professor...
E por fim, aquela noite de primeiro de Abril, quando Asura retornou. Eu mesmo rindo louco sendo banhado pelo sangue de um terceiro enquanto a insanidade me consumia naqueles poucos minutos que o Shinigami estava envolvido em uma luta contra Kishin Asura.
Mas... de quem era aquele sangue...?
Independente da resposta, eu entendi porque estava naquele lugar. Mesmo ao lado da Shibusen, cometi muitos pecados imperdoáveis, e não posso mais voltar atrás. Estaria eu morto? Ou dormindo? Mesmo pensando nisso, sabia que não teria uma resposta, e nem a voz me diria.
Após me acalmar, percebia que suava muito, e enxugando a testa com a manga de meu jaleco, senti algo frio tocar minha pele. Ao afasta-lo, notei, em ambos os braços, grandes e grossas algemas vermelhas, tão escuras quanto o sangue que já derramei. As correntes desciam pela escuridão, não me permitindo ver se estavam ou não presas a algo. Ao mesmo tempo que havia as notado, sinto algo pesar em meus tornozelos, algemas azuis presas a eles. Eram mais frias que as dos pulsos, e ao encará-las, eu conseguia sentir que elas emanavam uma tristeza enorme, como se feitas de lágrimas congeladas.
Uma canção ecoara naquele local, uma calma canção de ninar em uma voz infantil a qual eu desconhecia o autor ou a voz, porém ainda me era familiar. De alguma forma, estava curioso, talvez por não ter mais nada naquela sala. Por falta de opções, findei deitando no chão, ouvindo aquela bela voz calma.
Já havia desistido de contar quanto tempo havia se passado desde as primeiras três horas, eu ainda no mesmo local desde sabe-se lá quando. A falta de qualquer coisa me fazia perder a noção do tempo, eu apenas apagava de cansaço ou tédio e acordava pouco depois, não sabendo se passaram-se minutos ou dias. Haviam vezes que eu tentava caminhar, porém após um tempo as correntes ficavam pesadas demais, me forçando a parar.
Este lugar não me ajudava em nada a conter a loucura do kishin. A extrema falta do que fazer e o tédio mortal pioravam minha mente que nunca fora completamente sã, me fazendo ouvir outras vozes além daquela que cantava a canção de ninar de forma serena. Pareciam que as algemas falavam comigo.
"Um novo mundo não irá nascer se você não nascer de novo..." dizia a vermelha.
"Isso, renasça... tire sua pele falsa..." dizia a azul.
Isso já chegou a um ponto que poderia chamar de irritante.
Haviam momentos em que eu implorava por algum objeto cortante para ao menos me usar novamente como cobaia.
Porém, sempre que isso acontecia, a canção retornava. Como se aquela voz fosse a única coisa que cuidava de minha alma, que me trazia paz naquele inferno negro cruzando os limites da sala. Em todas as vezes que ela voltou a cantar para mim, não pude evitar um leve sorriso. E aos poucos, eu me unia a ela, nossas vozes ecoando naquele local vazio onde existia apenas eu e aquela tão familiar voz.
Então, uma coisa nova acontecera.
De cima, uma pequena e fraca luz descera até mim, a garotinha retornando com ela. Segurei-a como pude, visto que descia bastante rápido e eu não tive muito tempo, quase indo eu e ela ao chão. Ao colocá-la de pé, ela arruma suas roupas, estendendo na minha direção a luz que levava.
"Tome... ela irá me matar do jeito que você desejar..." como se ela tivesse ouvido meus pedidos de dias(?) atrás, ela fica na ponta dos pés, ainda esticando os pequenos braços com o brilho hipnotizante em minha direção. "Você vai se sentir aliviado."
Mal podia ver o que era, porém o desejo de devorá-la crescia quanto mais eu a olhava, mesmo não estando com fome depois de tanto tempo naquele local, consumindo até mesmo minha vontade de descobrir os reais significados das palavras da pequena. Os músculos de minha face se contraíam, forçando um sorriso louco à medida que eu a aproximava de mim mesmo, mais e mais perto...
"Não se deixe enganar..." uma voz diferente das anteriores ecoa, desta vez vinda de trás de mim. Um pequeno garotinho de cabelos e roupas tão brancos que incomodavam minha visão naquela sala escura.
"Você... sou eu...?" Ele sorri, tomando de minhas mãos a pequena luz, que agora em suas mãos, podia ver que era uma alma humana. Como ela aparecera aqui? Eu havia... matado alguém? Porém, momentos depois da alma estar nas mãos da minha "versão mais nova", ele desaparece a levando.
A voz dona do riso provocante do primeiro dia retornara, me fazendo olhar instintivamente para cima.
"Não pense que seus pecados foram perdoados... no entanto, palavras como 'água e trevas'... vamos transformá-las em uma canção. Assim como você fez com a minha canção de ninar. E... como você fez comigo naquela noite."
Não consegui entender bem seu significado, porém no final delas, as algemas de meus pulsos se dissolveram em um líquido rubro, tomando a forma do Spirit-senpai em minha frente. Este, ao contrário da versão que encontrei antes de adentrar esta sala, sorria tranquilamente, como se me desejasse "boa sorte".
"Você agora vai renascer, Stein. Assim como este mundo." Ele disse, desaparecendo em seguida.
Segundos depois, podia sentir minhas próprias pernas mais leves, levantando e virando-me. As algemas dos tornozelos igualmente dissolverem-se em uma forma líquida, porém este se assemelhava mais a água, um líquido transparente, porém, mesmo no escuro, podia-se ver uma leve tonalidade de azul. Ele tomou a forma da arma que atualmente é minha parceira na Shibusen, Marie, e assim como o senpai, ela parecia ter o mesmo desejo.
"Deve existir um mundo melhor para você. Alegre-se, Stein. Hoje é seu 'novo aniversário'." E assim como o senpai, ela dissolvera-se ao final daquelas palavras, deixando-me uma sensação de paz. Era estranho, a ausência da deathscythe acalmava mais minha alma que quando estávamos em ressonância, mas este não era o local nem o momento para pensar sobre isso.
Toda a sala foi tomada repentinamente por um branco extremamente puro e claro, fazendo meus olhos doerem mais que a visão de minha versão mais nova, e ao acostumar-me com a claridade, novamente o vi. Ele estava parado, ansioso, aguardando-me como um guia.
"Você deve imaginar o lugar que deve retornar." Como se lesse minha mente, ele segue, estalando os dedos e criando inúmeras portas ao redor de nós dois. "Só existe uma saída. Você tem que abrir a porta certa. O mundo que você deseja o espera." E ao fim daquelas palavras, ele novamente desaparece.
Então, "eu" faria um jogo de sorte comigo mesmo?
Interessante...
Comecei a andar por elas, analisando-as bem. Afinal, só teria uma única chance. Como "eu mesmo" disse, só existe uma saída. A princípio, todas pareciam muito comuns, até mesmo reconheci algumas como as de minha casa ou da Shibusen, porém ao me aproximar delas, ainda não sentia que era a escolha certa.
"Se confiavam em mim, por que eu estava sob prisão domiciliar?"
"Se eram meus aliados, por que me temiam?"
"Se eram meus amigos, por que me olhavam com pena e desconfiança?"
"Isso não é uma lei criada por um Deus altruísta..."
"É uma coleira e uma focinheira em um cão considerado perigoso."
Tomado por estes pensamentos, destruí aquelas portas com minhas projeções de alma, rindo nervoso. Não havia um lugar que eu pudesse retornar. Que pudesse ser "eu mesmo". Demorei para perceber, mas agora via, a ordem do Shinigami não se aplica a mim.
"O que eu devia fazer...?" Pensei alto, a mão em meu rosto tentando conter a loucura e o nervosismo tomar minha alma.
"Conter"... é isso... eu não devia fazer isso. Isso seria reforçar a coleira. Eu deveria ser livre de minhas próprias amarras. Das amarras que o Shinigami me obrigou a ter. Livre para abrir e retalhar qualquer coisa que eu desejasse. Então, finalmente lembrei a origem daquela voz. Tanto a voz do riso provocante como a da criança amável. A voz que já havia me chamado uma vez.
"Você viria comigo?"
Por um momento, pensei ter ouvido aquela voz novamente, o que me fez virar-me bruscamente. Com isso, eu vi uma porta mais afastada das demais. Uma porta negra de madeira, parecendo muito gasta ou até mesmo queimada. Nela, haviam símbolos entalhados por algo pequeno e afiado, porém desconhecia a origem. Ao encostar nela, ao contrário das demais que havia destruído, ela me chamava. Atraía meu corpo, mente e alma.
Não hesitei em abri-la.
Ao abrir os olhos, eu encontrava-me em um pântano enevoado, tudo parecendo ter tons de preto e verde. Apenas caminhava sem rumo, no automático, esperando encontrar algo ou alguém.
"Depressa..."
"Depressa, Stein..."
"Livre-se de sua pele falsa..."
"Vá para onde seu corpo mandar..."
Os pensamentos iniciais retornavam quanto mais eu andava, porém ao perceber, eu estava parado em frente a um grande lago, as árvores vetoriais abrindo espaço naquele local onde eu apenas poderia ver pouco da água, a neblina e parte do céu. Seria uma bela visão se não fosse o momento.
Então... ela aparecera.
Completamente diferente de como eu lembrava, ela agora possuía um corpo infantil, não parecendo ter mais de sete anos. Porém aquele sorriso, os olhos cor de âmbar e o símbolo de olho em seu agora vestido ainda eram inconfundíveis para mim, mesmo no estado em que me encontro. Aumentando seu sorriso infantil, ela aproxima-se, estendendo seus pequenos braços em minha direção.
"Seja bem-vindo, Stein..."
Não pude evitar soltar um riso louco enquanto era invadido tanto pela insanidade de Asura como a da pequena Medusa que agora tinha em meus braços em um forte abraço.
Sim...
Este seria meu Re_Birthday.