Rain, Rain, Go Away
Escrito por Caterina Pesce | Revisado por Paulinha
10:32pm. Londres e sua maravilhosa chuva de outono. Perceba que utilizei ao máximo toda a ironia do mundo na palavra “maravilhosa”. Não consigo entender por que aceitei esse estágio na cidade com o clima que menos me agrada em todo o planeta. Tudo bem que não é todo dia que você recebe uma oferta pra trabalhar com eventos internacionais. “Eu devia ter comprado aquele guarda-chuva mais cedo...” pensava enquanto lutava pra chegar ao menos em algum lugar com táxis. Se Londres já é fria sem a chuva, imagina com suas roupas encharcadas e botas cheias d’água?
11:04pm. Novamente correndo contra o vento. Achei um ponto de ônibus sob o qual poderia esperar um táxi. Não iria de ônibus porque não sei chegar até meu hotel e fiquei com medo de ir para o hotel errado e ser ainda pior. “Por que você não chamou o maldito táxi antes de sair da reunião?!” continuava me xingando nos pensamentos.
11:17pm. Meus dentes batiam, nunca senti tanto frio em toda a minha vida. “Você vai pegar um grande resfriado, filha!”, pensava na voz da minha mãe. Foi quando eu o vi. Um homem, aproximadamente 22 anos, no máximo. Atravessou a rua até mim. “Pronto. Vão me sequestrar, me estuprar e minha família nunca mais vai achar meu corpo”. A esse ponto cheguei ao máximo do meu drama. Comecei a chorar, sem que ele pudesse perceber mesmo chegando ainda mais perto, já que a água nos meus cabelos escorria pelo meu rosto não deixando diferenciar das lágrimas.
11:19pm. Ele tira a capa que vestia e coloca em mim. “Você precisa de ajuda?” me perguntou. Eu, ainda assustada, não respondi. “Tudo bem, não precisa falar se não quiser. Quer que eu lhe peça um táxi? Está perdida?” Continuei sem responder. “Você parece estar mal...” “É? Mas está uma noite tão quente, tão agradável” disse e ele riu. Encostou brevemente na minha testa com sua mão. “Nossa, você está com febre! Muito alta! E eu não estou com um termômetro!” eu já havia percebido, mas acho que por isso não conseguia me mexer a ponto de conseguir um táxi. Eu precisava voltar pro hotel o mais rápido possível, mas mesmo não estando no meu melhor, queria entender esse homem tão intrigante. Por que ele ajudaria uma completa estranha? E no meio de uma chuva dessas.
11:25pm. Um taxi aparece e o homem faz o sinal por mim. Pergunta se eu quero ir pro meu hotel ou para um hospital. Com medo, falo o hotel. Tenho pavor a hospitais, ainda mais em um local que nunca estive e sem nenhum conhecido por perto. Vou para o hotel e peço ao gerente que chame um médico, em último caso vou para um hospital. “Leve-a até seu hotel. Ela lhe dirá onde fica” disse o homem misterioso ao motorista. “Eu perguntaria seu nome, mas algo me diz que logo mais saberei. Que seja o destino querendo agir e nos surpreender.” Me disse. “Mas...” “Sem mas. Vá para seu hotel e descanse. Em breve, quem sabe, nos veremos?” fechou a porta do taxi assim que terminou de falar e fiquei com aquilo na cabeça. O que aquele maluco estava falando? Será que ele vai me perseguir? “DROGA! Esqueci-me de lhe entregar o casaco!”
11:47pm. Chego ao meu quarto do hotel, já tomando um remédio que minha mãe havia mandado para abaixar febre, caso tivesse. Ai, mãe, sua neura com minha saúde até que foi de boa ajuda. Ligo o chuveiro na água morna e vou fui tirar o casaco do sujeito sem nome. Sem querer sinto algo no bolso de dentro, perto do peito. “Cartões de visita? Jack... Estudante e guia de turismo?” Não é possível!
00:31am. Depois de um banho e um chocolate quente, sentei na cama e abri o laptop para procurar sobre o tal homem. Foi quando me lembrei do que ele havia dito “Que seja o destino querendo agir e nos surpreender”. Sem a mínima noção, apaguei feito pedra, com o computador aberto e seu cartão em minha mão. O remédio era forte.
09:01am. O despertador gritava ao meu lado. Nós – os estagiários contratados para um dos eventos de Londres –, teríamos um passeio turístico pela cidade durante todo o dia. Por mais que ainda estivesse com o corpo pedindo por mais descanso e a febre insistindo em voltar, algo me dizia para ir e aproveitar a cidade e a viagem.
09:23am. Cheguei três minutos atrasada ao ônibus, que quase não esperou por mim. “Eu não disse tinha algo reservado para nós?” Um sorriso brotou no meu rosto. Era Jack, ele era assistente do nosso guia.
E então, o possível assassino de Londres virou um homem bondoso numa noite chuvosa, e depois de um sujeito sem nome, passou para Jack e, agora, é Jack Martin, uma obra do destino. Que venham outras chuvas! Se possível com um guarda-chuva, dessa vez.