Projeto Reciprocidade

Escrito por Marina Armani | Revisado por Isabelle Castro

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Capítulo 1 - O começo?

Essa história contém: uma garota e um garoto.

Observações: os produtos quando expostos à emoções genuínas, transbordam.

Leia a bula para maiores informações.

  Meu nome é Carmen Elizabeth. Sim, parece que eu sou do século passado mas eu estou viva da silva na mesma época que Trump está no governo. E que Leonardo Dicaprio finalmente tem um Oscar. Século 21. Tenho 25 anos, moro em São Paulo e sou publicitária. Trabalho na Editora Abril, lidero todo tipo de projeto e trabalhos feitos e pendentes no departamento. Pareço séria falando assim, mas é só pra causar boa impressão, fingir que sou toda executiva. Muito pelo contrário, todos que me conhecem sabem que eu sou séria em momentos necessários (ou não tão necessários assim), mas que na maior parte do tempo sou louca, gosto de falar alto, responder o que me vem na cabeça, e ser eu mesma. Apenas.
  Nunca fui uma pessoa séria, nem nunca gostei de seriedade. Foi um dos motivos que me fez escolher publicidade. Algo que eu pudesse sempre inovar, que não ficasse apenas naquela coisa da rotina e me tornasse uma pessoa infeliz. Felizmente eu era e sou muito criativa, tenho ideias novas até quando tô comendo banana. Entrei na empresa com pouca experiência, claro, era meu primeiro trabalho, os chefes foram se surpreendendo com o rendimento e a ajuda que eu conseguia dar pra gente que já estava lá fazia um tempo, e foram me promovendo, e promovendo. Me sinto orgulhosa até hoje. Sinto que faço parte de algo e que minha existência tá valendo a pena. Todos nós humanos precisamos disso, dessa sensação de que estamos fazendo algo certo, deixando nossa marca. É revigorante.
  Hoje terá uma festa da empresa, me chamaram pra recepcionar os convidados e meio que pra ser a "anfitriã", a festa não é pra mim, mas mesmo assim, aceitei. Eram 7 horas da noite, combinei com meu amigo, Danilo, que iríamos juntos. Eu tô atrasada, pra variar. Terminei meu cabelo, e fiquei impressionada em como estava com um tom ruivo maravilhoso. Me olhei no espelho, o vestido preto colado e um pouco curto, acentuava minhas curvas e eu, sinceramente? Eu tô maravilhosa. Um xuxuzinho. Dei risada com os próprios pensamentos e desci até a portaria. Dan já estava lá, como sempre, pontual.
  - Meu Deus, mulher, como você consegue sempre se atrasar? - o cumprimentei com um beijo na bochecha e dei um sorriso amarelo. Colocando o cinto, respondi que era uma fórmula secreta, que só os escolhidos sabiam usar. Chamava "Efeito Ninguém-vai-perceber-que-você-atrasou-porque-você-está-linda". Ele deu risada, e acelerou. Chegamos lá em 15/20 min. Quando cheguei, vi o tanto de gente que já estava esperando pra entrar, porque todos estavam ME esperando pra RECEPCIONAR as pessoas. Entrei no salão que eles tinham alugado, conversei com os funcionários, eles me deram alguns cartões para entregar quando cada pessoa fosse entrando, e era isso que eu tinha que fazer. Recepcionei todos e depois subi pra festa. Tinha comida pra dar e vender, muita gente bonita e chique. Tinha até pessoas que eu jurava que nunca ia conhecer, famosas, naquele lugar. E eu pensando que seria algo simples.
  Andei pela festa, procurei algum conhecido. Danilo havia sumido, devia estar paquerando alguma menina nova. Achei meu chefe, acenei. Várias pessoas me cumprimentando, mas eu não conhecia ninguém. Era um tal de "Essa é Carmen, nossa menina de ouro! Já conhece?", "Olha, Carminha, queria te apresentar Fulano!". Não estava entendendo nada, admito. Fui até a mesa comprida e CHEIA, juro, ESTAVA REPLETA, de comida. Vários frios sendo servidos, alguns aperitivos, um arranjo de flores no meio, maravilhoso. Além da janta que estavam preparando. Tudo coisa chique. Peguei um prato, coloquei alguns queijos, salgados, e outras coisas que couberam no prato minúsculo demais pra suprir o meu estômago sem fundo. Fiquei parada um pouco longe da mesa, de pé, encostada em uma cadeira vazia. Observando todos, reparei num rosto familiar. Mas como seria família se nunca havia visto o mesmo no prédio da empresa? Não sou a melhor em disfarçar, então continuei encarando, com uma cara de interrogação. Era um moreno, cabelos raspados, era magro mas não era feio, era o tipo de cara que me chamava atenção. Segurava um copo com alguma bebida, viu que eu estava encarando e começou a me encarar. O mais estranho é que ele começou a ficar com a mesma expressão que eu, como se me conhecesse. Algumas memórias começaram a vir, mas não tinha certeza se era mesmo ele. Fiquei meio tensa. Continuávamos nos encarando. Em algum momento, um de seus amigos contou algo engraçado e ele sorriu. Meu coração bateu forte. Eu conhecia aquele sorriso. Era ele. Porra, era ele! Tirei os olhos dele, e olhei pro chão. Danilo chegou do meu lado, eu estava com o coração batendo muito, muito forte.

Capítulo 2 - O reencontro

  - Ei, você tá bem? - assenti com a cabeça, eu provavelmente estava com cara de assustada e meio branca. - Tem certeza? Aconteceu alguma coisa? Algum cara foi babaca com você? - abri um sorriso fraco.
  - Não, eu só... Sabe aquele moreno ali? - ele olhou pra direção que eu apontava discretamente. Assentiu com a cabeça. - Eu era apaixonada por ele. Anos atrás. O nome dele é Matheus. Danilo, eu amava esse homem. A gente perdeu contato e agora ele tá aqui. Meu Deus... - ele me passou seu copo. Só conseguia sentir o gosto de puro álcool, meu maior perigo, a vodka. Com morango. - Você pegou uma batida pra mim?
  - Sim, é claro. E como assim? Vocês se conheceram como?
  - Lembra que eu falava que conhecia muita gente virtualmente? Então, ele era praticamente o amor da minha vida. Sempre acreditei nisso. A gente parou de se falar, e eu fiquei na maior deprê. Não aconteceu nada, sabe? Ele só sumiu. Não tinha mais nada, em rede social nenhuma. Até hoje não sei o que aconteceu. - fiquei em silêncio, e respirei fundo. - Preciso falar com ele. Vou esperar ele ficar sozinho.
  A chance surgiu minutos depois. Estava tocando Tuesday, uma música pouco conhecida, eletrônica. Ele estava sozinho, parado, olhando pra pista de dança onde algumas pessoas estavam dançando. Fui até ele, parei do seu lado.
  - Oi... - ele olhou pra mim. Engoliu seco. Eu também. - É possível que seja você mesmo, Matheus? - suspirei.
  - Sou eu. É você mesmo, Carmen? - eu estava praticamente tendo um ataque de ansiedade. Soltei um ar inexistente do meu pulmão.
  - Uhum. - ficamos nos olhando por alguns segundos. - Eu não acredito que você tá aqui. - ele sorriu de canto. Me lembrei de como eu era apaixonada por aquele sorriso. Não tinha nada mais bonito.
  - Eu também não acredito. Esperamos isso por tanto tempo, pra depois acabar e... - percebi um ar de arrependimento na sua fala – Agora a gente tá aqui.
  - Eu nunca pensei que eu te veria de novo. - ele me olhou nos olhos.
  - Você tá linda. - sorriu e balançou a cabeça. - Não acredito que você é a famosa "menina que trabalha no setor de publicidade".
  - Nem eu acredito às vezes. Eu sou meu maior orgulho.
  - Você sempre foi muito mais do que aparentava ser. - engoli seco. Respirei fundo. Eu precisava dele de volta na minha vida. Eu ainda amava ele. Eu ainda amava ele...

Capítulo 3 - O café

  1 mês depois

  Ele me convidou pra ir numa cafeteria perto do serviço. Não estava atrasada, quando cheguei lá, ele já estava me esperando, mesmo assim. Me cumprimentou com um beijo na bochecha.
  - O que vai beber? - o garçom disse.
  - Pode ser um chocolate quente. - sorri.
  - Você sempre amou isso, né? - ele reparou que eu não havia esquecido das suas manias.
  - Sempre. Como não amar? - ficamos conversando ali por um tempo.
  - Você tá trabalhando na empresa com quê?
  - Eu trabalho no RH. A psicologia tem essa área que podemos fazer análises quando vêm alguém fazer entrevista, ou que vai ser mandado embora.
  - Nossa, que legal! Não sabia disso.
  - Pois é, foi uma oportunidade e tanto. Você sabe, eu sempre quis vir pra cidade grande. Rondônia era o lugar que eu nasci e amava, mas eu precisava de outras oportunidades.
  - Você merece seu lugar aqui.
  - Obrigada, ruiva. - ele disse aquilo, e me relembrou de tantos momentos... Me chamava assim muitas vezes. Eu amava. Ele sabia que eu amava.
  - Que saudade de ouvir isso. - sorri, tímida, olhando pro meu café.
  - Saudades de você. - ele disse, me olhando nos olhos.
  - Tá me provocando, Matheus? - mostrei meu sorriso de provocação. Ele abriu aquele sorriso gigante.
  - É, já que só você fazia isso antigamente. - revirei os olhos e dei risada. Ele se referia à algumas fotos sensuais que eu mandava. Até mesmo outras coisas idiotas, brincadeiras nossas.
  - Você gostava.
  - Como não gostar? - sorri. Começamos a relembrar milhares de coisas, histórias, piadas, estava muito gostoso. - Meu Deus, só assim pra eu perceber a falta que você fazia pra mim.
  - Eu nunca esqueci você. Seu sumiço me devastou. - disse, sendo sincera. Na época, eu simplesmente fiquei triste por meses. Era difícil sem ele. E ainda estar sem nenhuma resposta, justificativa ou algo do tipo.
  - Eu sabia que aquilo ia mexer muito com você, fui um idiota. Queria poder voltar atrás, sabe? Eu te perdi. - balancei a cabeça em reprovação.
  - Nunca perdeu. - olhei pro meu café de novo.
  - Posso não ter perdido você, mas perdi momentos que poderia ter passado com você. - ele tentava disfarçar o constrangimento e culpa. Ficamos em silêncio.
  - Vou no banheiro. - ele assentiu e eu fui. Me olhei no espelho e só conseguia pensar: "Meu Deus, que sorriso é aquele? Que cara é aquele? Eu quero ele pra mim. Eu quero agarrar esse homem, alguém me segura". Arrumei meus cabelos e quando abri a porta do banheiro ele estava do lado de fora, me esperando. Estranhei. - O que tá fazendo aqui? - ele me puxou pelo braço e me levou pro banheiro de deficientes. Me encostou na parede. Faltavam 20 minutos pro nosso almoço acabar. Olhei pra ele.
  - Eu não quero esperar mais. - sorri de canto. - Porra, a gente esperou anos e anos e agora ter que esperar mais? Não aguento, desculpa. - e ele me beijou. Era o beijo que eu estava procurando, e o cara que eu sempre quis. Apertava minha cintura com força, me beijava com a maior vontade. 10 min. Ele beijou meu pescoço, sussurrou "você é a mulher que eu mais quis em todo esse tempo" no meu ouvido. 5min. Beijos e mais beijos, eu me sentia totalmente dele. Me sentia completa e apaixonada. - Nosso horário de almoço acabou.
  - Nesse momento, eu não me importo nem um pouco, Carmen. - ele sorriu. Eu era tão apaixonada por ele. Desde sempre, aquele sentimento só estava escondido. Ele era meu sonho. O único cara que parecia que se encaixava em tudo que eu queria, até nos defeitos.
  Ficamos assim por 6 meses, juntos, namorando, voltando a nos amar com a força de antes. Eu nunca imaginei que eu teria algo do tipo, que viveria esse amor, que eu seria suficiente pra alguém, que eu quisesse alguém do meu lado pra sempre. Depois que ele sumiu, eu perdi todas as esperanças, e agora com a volta dele, eu tenho tudo. Eu amava ser independente, não ter que dar satisfação pra ninguém, ser quem eu queria, mas sempre pensava naquele amor antigo, alguém pra pode abraçar e me dar casaco dele quando sentisse frio. Eu sabia que Deus me daria alguém especial, a espera valeria a pena.

Capítulo 4 - O projeto

  - Ê, magrela, quem diria que você estaria nessa confusão. Apaixonada de novo, hein? - sorri.
  - Pois é, Dan. Eu, que dizia que gostava de estar sozinha, que não queria ninguém pra me dizer o que fazer... Encontrei, pela segunda vez, a pessoa que eu posso ter pra abraçar, o amor jovem que quero ter mesmo quando estiver velha. - disse, colocando meus anéis.
  - E eu te desejo toda a sorte do mundo. Você foi a pessoa que me acolheu, que me amou, que me ajudou aqui nessa cidade. Ele, sendo de longe, também vai ter esse mesmo posto que você teve na minha vida. Eu espero muito que ele seja o amor da sua vida, porque se ele te magoar, eu quebro a cara dele. - dei risada. - Não duvide de mim, Carmen Elizabeth. Você me conhece.
  - Eu sei, dandan. Você acabaria com ele. - sorri e lhe abracei. Ele era meu melhor amigo. Não tinha alguém na minha vida que eu amasse mais. Sempre ali pra mim, sempre me ajudando, sempre do meu lado.
  Terminei de me arrumar e Danilo me levou até o apartamento do Matheus. Toquei o interfone, subi até o apê.
  - Bem vinda. - ele sorriu. Ah, esse sorriso. O apartamento era aconchegante. A iluminação era bem convidativa. Olhei para o lado esquerdo, havia uma mesa posta. Umas taças, um champagne na mesa. - Não é nada chique, mas...
  - Não diz mais nada, Matheus. Tá perfeito. - ele sorriu de canto. Eu balançava a cabeça, tentando entender como chegamos ali. Como meu sonho de adolescente, voltou com tudo pra minha vida. Do nada. Coloquei um pouco da bebida nas taças, e levei as duas pra cozinha. - Vamos fazer um brinde. - ele se virou e agora me olhava nos olhos. - Um brinde às nossas conquistas. Á tudo que vivemos. Á tudo que já fizemos um pro outro. Á essa noite.
  - Saúde. - bebemos um gole, ele colocou sua taça na pia e ficou frente a frente a mim. Eu estava encostada na pia, ele colocou suas mãos na minha cintura. - Não queria ter esperado tanto tempo pra te encontrar. - eu não sabia o que falar – Eu... Nunca te esqueci, Ca. Não teria nem como esquecer. Eu... Ainda amo você, sabe? - meu coração parou. - Eu não quero perder tempo. Eu não quero esperar a noite toda pra me entregar pra você. Eu já esperei anos. Há anos que eu quero te sentir. - ele chegou mais perto de mim. - Há anos que eu queria saber se essa sua boca, combina com a minha. - ele sorriu de canto e chegou mais perto. - Fica comigo. Por uns dias? - não disse nada mas sorri. - Acho que isso foi um sim. - e me beijou. O beijo foi inesquecível. Não queria que o tempo corresse. Não queria que aquilo acabasse. Eu... Nunca tinha parado de amar ele. O nosso amor, era recíproco. Sempre foi. Ele dizia isso pra mim antigamente. "Eu te amo, muito", eu dizia. E ele respondia, "É recíproco, meu bem". Não há como descrever o sentimento que eu tive quando finalmente senti sua boca na minha. A sua pegada. Sua respiração frágil como a minha, super ofegante. Por todo esse tempo, eu gostava de ter meu espaço. Tendia a excluir algumas pessoas da minha vida. Mas agora... Eu só quero dividir esse espaço com ele. Eu só queria ter mais e mais daquilo. Eu quero ter o amor da minha vida. Eu quero ter a minha alma gêmea. Não precisava de mais nada. Aquela noite, foi A noite. Ele se declarou pra mim. Eu me declarei pra ele. Finalmente sentimos nossos corpos, nosso toque. Eu finalmente encontrei ele. Eu finalmente me juntei a ele! Tamanha felicidade que senti, que meses depois, resolvi fazer um projeto pra revista. Convidei vários casais, casados por anos, a contarem a história deles. 2 das 10 histórias que coloquei me chamaram mais atenção. Havia um casal, Nádia e Marcio. Eram super parceiros, o namoro durou 9 anos. Viviam juntos, eram engraçados, os dois muito simpáticos. Nádia contou que se casou nua sexta feira, 9 horas. Bem diferente da maioria dos casamentos. Estava tão ansiosa, que ficou mascando chiclete antes de entrar na igreja, mas quando entrou, nem lembrou de jogar fora. Casou mascando chiclete. Sempre ria quando contava algo do casório. Disse que a festa foi só bolo e champagne e refrigerante para as crianças, claro. Também disse que o salão lotou e ela nem acreditava. Estão há 20 anos juntos já. O outro casal era Nanci e João, ela ficou noiva de um outro cara, ante de conhecer ele. Não chegou a casar, se divorciou, não gostava mais dele. Um tempo depois, foi para um baile de samba, disse que a intenção dela era pegar todo mundo. Conheceu um cara lá, ele era muito alto mas chamou atenção da baixinha. Trocaram telefones, no primeiro encontro que marcaram, ela furou, mas não de propósito. Entretanto, a história ainda rolou. São casado há 25 anos, 2 filhos, um menino e uma menino. Fiquei inspirada. Queria um amor daquele. E agora tenho. Adivinhe só? Durante o projeto que durou 7 meses, Matheus me pediu em casamento Aceitei, estamos morando juntos agora. Mais felizes que nunca. E numa vida como a que eu tenho agora, que nunca imaginei que teria. O nome é "Projeto Reciprocidade", a revista elogiou muito. Foi muito compartilhado nas redes sociais, um sucesso. Agora espero ser feliz com Matheus. Viver o meu sonho, que era ter um amor como esse. E espero que você também tenha. A sensação é tão genuína, que eu nunca teria como te explicar. Boa sorte.

Com carinho, Carmen Elizabeth.
Tentando viver um "felizes para sempre".

FIM



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