One Day

Escrito por Júlia Oliveira | Revisado por Lelen

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  - E amanhã?
  Passou seus dedos pela lateral do corpo da garota, traçando uma rota de seu pescoço até o quadril, enquanto aspirava o odor adocicado das madeixas da moça. Talvez estivesse levemente encantado com a forma terrivelmente perfeita da qual o corpo da garota se encaixava ao dele.
  - É dia 15 de julho.
  Respondeu, sem descolar os lábios de seu pescoço, com o rosto encaixado entre seu ombro e pescoço, onde o cheiro maravilhoso se mostrava natural, sendo expelido com uma leveza divina. Ela sentiu uma pequena pontada no peito, não esperava uma resposta daquelas.
  - Não foi isso que eu quis dizer. – Disse, virando-se na cama de modo que pudesse encará-lo nos olhos. Ele quase protestara, sendo privado do cheiro da moça, mas lembrou-se que estava banhado nele – eu quis dizer algo como: o que acontece agora? Queria saber o que vai acontecer daqui alguns anos.
   encarou seus olhos levemente inchados de sono, com alguns tons avermelhados. Havia também alguns tons negros, resquícios da maquiagem da noite passada. Continuava a combinar com os lábios – também ligeiramente vermelhos – bem desenhados, o inferior era carnudo e cheio, o superior, mais delicado. Os tons da íris estavam brilhantes desde que conseguia se lembrar. Tinha o rosto ligeiramente quadrado e uma boca cheia de dentes brilhantes e bem alinhados. Talvez as curvas que compunham seu corpo desde o torso até as cochas – espetaculares – fossem sua parte predileta, apenas se o sorriso aterrador estivesse ausente, caso o contrário, ele seria a parte predileta no corpo da garota.
  - É uma boa pergunta – respondeu, ainda a encarando. Talvez procurasse um modo de elogiá-la sem perder a linha.
   levantou-se um pouco, escorando-se em seu braço direito, o cabelo lhe caiu sobre os seios, tampando-lhe os mamilos. apreciou um pouco a cena, desejando emoldurá-la, talvez.
  - É uma pergunta tensa. – Ela corrigiu, passando a escorar-se sobre os dois cotovelos, cruzando os braços e tapando os mamilos – eu quero dizer no quesito: a gente se forma amanhã.
  Encarou o rapaz, aqueles olhos brilhantes e tão misteriosos, tão desejados. Aquilo era realmente real? Afinal, ele era . Um verdadeiro deus grego, o rei da escola, e estava ali: nu em pelo na cama dela, agora sóbrio, e não em alguma cama imunda de líder de torcida. Viu-o desviando o olhar, sendo tomado por uma expressão pensativa. A pele branquíssima foi levemente iluminada pela claridade que escorria pelas cortinas caras de nylon que não serviam para nada, enfeite.
  - Talvez chova amanhã – disse, dando de ombros, enquanto encarava a garrafa de vinho tinto branco, já na metade, deveria estar tão quente quanto xarope.
  - Seria bom. – Ela respondeu, passando o braço pela cintura do rapaz e pegando o maço de cigarros que tinham aberto juntos na noite passada. Aquilo era errado: não tinha mal a idade adequada. Por que o fazia mesmo? Desistiu de divagar sobre o uso da nicotina e a usá-la, apenas.
  - Chover? – juntou as sobrancelhas, mal pôde deleitar-se na expressão fantástica de dúvida que tomou conta de seu rosto, fazendo o movimento contrário ao dela, e pegando no bolso de suas calças o isqueiro. – Na nossa formatura? Isso não seria horrível?
  - Não. – Ela respondeu colocando um deles nos lábios, enquanto o acendia. – Atrai coisas boas. – Viu-o juntando suas sobrancelhas, enquanto dava a primeira tragada, sentindo todo o gosto amargo do cigarro atravessar por entre seu corpo. – Loucura minha – ela deu de ombros, vendo-o pedir o cigarro.
  Entregou-o, prestando atenção a cada mínimo detalhe da cena que se prosseguiu: ele colocando o cigarro delicadamente entre os lábios e olhando para o vazio, com aqueles olhos aterradoramente divinos. Ele parecia ter saído de um clipe de alguma banda de rock progressivo enquanto a fumaça se espalhava pelo quarto. Desejou ter uma máquina fotográfica em mãos. Momentos como aquele mereciam lugar exclusivo em uma parede.
  - Sabe o que cairia bem agora? – ele perguntou, enquanto ela se aninhava em seu peito, passou o braço livre pelos ombros da garota, fazendo com que seu rosto ficasse próximo ao cabelo da moça.
  - Vinho? – ela sugeriu, dando de ombros.
  - Exatamente. – Ele sorriu, passando-lhe o cigarro. Começou a erguer-se da cama, fazendo com que levantasse junto, sorriu delicadamente – não se mova. – Pôs a mão em seu rosto, delicadamente, fazendo-lhe um carinho.
   se sentou, encostada na cabeceira da cama, cobrindo os seios expostos enquanto caminhava em direção à cozinha do apartamento, exibindo a escultura grega que era seu corpo. Não conteve seu olhar adolescente e a imaginação, tudo nele parecia esculpido.
  Ele voltou, segundos depois, empunhando uma cerveja. Sem copos, planejava dividi-la no gargalo, afinal, fizeram isso com o vinho e com o cigarro na noite passada: dividiram tudo.
  Sentou-se ao lado dela, sorrindo cordialmente.
  - Acabei encontrando algo melhor. – Explicou, enquanto dava seu primeiro gole. Ela sorriu, despreocupada enquanto o via estender-lhe a garrafa. Tomou um gole, deixando o cigarro de lado.
  - Precisamos é de um café. – comentou, enquanto ele voltava a se esparramar na cama, abraçando-a pela cintura, obrigando-a a se aninhar em seu peito novamente. – Já é de manhã, devemos ter oito horas até a formatura.
   tomou outro gole da bebida, enquanto encarava as paredes no apartamento da garota. Era uma menina, além de lindíssima, resolvida. Morava sozinha, o apartamento havia sido dado pelos pais, como agrado pela aprovação em Oxford – sabia disso por boatos entre os amigos – não era muito grande, mas mais do que o suficiente pra uma garota como ela, dois quartos, uma sala, um projeto de cozinha e um banheiro: ele queria um daqueles.
  Os pais certamente não a visitavam com freqüência ou eram bastante liberais: as paredes brancas eram estampadas por pôsteres de bandas bem variadas. Era notável, pela prateleira, que ela tinha algum problema com Jim Sturgess e Ben Barnes. Bem notável se parasse para reparar que quase todos os DVDs eram de filmes com algum dos dois. Havia também uma coleção de livros, alguns abertos em páginas aleatórias espalhados pela escrivaninha, com um caderno surrado de anotações e CDs.
  - Como deve ser essa coisa de... – hesitou, pensativo – não ser mais um estudante de colegial?
  Ela soltou o ar pela boca, não conseguindo evitar um biquinho.
  - Eu queria saber, – chamou-o pelo apelido – de verdade. Na verdade, quando o verão acabar eu vou pra Oxford, jornalismo. Então ainda tenho muita coisa.
   sentiu algo como se usasse calças, e os bolsos estivessem cheios de pedras: a mesma sensação que sentia enquanto escondia a carta de aprovação da mesma faculdade no bolso da calça, em poucos meses seria um estudante de Artes.
  - Você disse que queria saber o que acontece agora, não é? – ele perguntou, sorrindo levemente. fez que sim com a cabeça, meio confusa. – Sabe guardar um segredo? – perguntou novamente, deixando-a ainda mais confusa. – Fui aprovado em Oxford.
   não soube reagir. Aquilo mudaria algo na vida dela? Não? Sei lá. Era a primeira noite dos dois juntos. Era a primeira vez que conversavam de verdade! Com algumas exceções como algum cumprimento casual nos corredores do colégio, ou quando participaram juntos de algum projeto social que fora obrigado a participar, mas aquela era a primeira. Não sabia se seria a última. Eram paralelos, duas linhas retas que andavam lado a lado e nunca se encontravam. nem sabia explicar ao certo como ele tinha parado em sua cama, na sua casa, fumando os seus cigarros e tomando a sua cerveja.
  - Uau, – sorriu, ainda tendo um milhão de pensamentos. Como reagir? – fico feliz que tenha passado, na verdade...
  - Você nem acredita que eu consegui passar em uma faculdade, não é? – ele perguntou, encarando o teto. Ela virou-se instantaneamente, olhando para os olhos e distantes dele.
  - Eu acredito. – Ela disse – sei que você passaria na faculdade que quisesse, na verdade, tenho certeza que se você quisesse passar para Harvard, teria passado.
  Ela disse aquilo com tanta confiança que fez sorrir involuntariamente, era bom ouvir outra coisa além das reclamações incessantes dos professores. Por que não podiam acreditar no seu potencial como fazia?
  Porque ela era perfeita demais. O modo com que se movia lentamente, seu sorriso delicado e singelo enquanto distribuía os presentes às crianças carentes da cidade – teve a oportunidade de assistir essa cena maravilhosa Natal passado, quando fora obrigado a ajudar a Instituição de caridade que ela era voluntária – e sua impecável educação. Talvez por isso só estivesse ali com ela na, talvez, última vez que se veriam: não queria manchar a reputação de uma princesa como ela. Afinal, ele era um malandro, um bagunceiro, um idiota.
  - Vai estudar o quê? – ela sorriu, vendo que ele ficara em silêncio, com um sorriso estúpido no rosto.
  - Artes. – Ele disse, dando de ombros. Como se não fosse nada importante.
  Então ele não era aquele bruto que pega uma loira por semana. Ele era um artista! Mal conseguiu conter seu sorriso vitorioso no rosto, não tinha em seu apartamento, nu, depois de uma noite a base de sexo, tinha um artista o qual era apaixonada sem nem conhecer o trabalho. Quis suspirar. Ele era um verdadeiro presente.
  - ... – ela sorriu, não contendo os sorrisos estúpidos. – Isso é incrível.
  Seus olhares se cruzaram. Ele conseguia ver a sinceridade, a alegria que se misturavam em meio ao castanho, enquanto ela sorria. Tão honesta. Ela estava feliz por que ele ia estudar Artes? Era mais maravilhosa do que imaginava. tomou uma coragem que não lhe pertencia e laçou-o pelo pescoço, abraçando-o.
  - Não acredito que está feliz por isso.
  - Claro que estou! – ela disse, sem soltá-lo. retribuía o abraço no mesmo grau, enquanto ria encantado. – Quer dizer, é o que você queria fazer, não é?
  Ela o soltou enquanto perguntava. Tinha se lembrado que talvez ele estivesse sendo obrigado a cursar artes, e aquilo não seria um motivo para ficar feliz daquela maneira.
  - É tudo que eu sempre quis – ele suspirou, a abraçando, ainda com as mãos em sua cintura.
  - Sério? – ela sorriu, deixando o brilho infantil voltar a seus olhos – por quê?
  - Sabe aquela história clichê de mudar o mundo? – ele sorriu, puxando-a para mais perto e olhando para o teto, como se temesse confessar aquilo, achava que era coisa de menina, talvez. fez que sim, compreensiva. – Eu quero fazer isso através da arte, talvez.
   deixou com que seus olhos brilhassem novamente, o sorriso apenas aumentou. Ficou ali por algum tempo, abraçada e ele e sentindo o pulsar confortável do coração dele, a respiração leve em seu pescoço, enquanto aproveitavam apenas a presença um do outro. Tinham esperado aquilo por tanto tempo, e agora, finalmente viviam aquilo.
  - Quando eu era pequena... – iniciou, depois que perdeu a paciência com o silêncio. Era ativa demais para aquilo. – Eu tinha uma teoria. A minha teoria era sobre como mudar o mundo - ela sorriu se afastando o suficiente para que pudesse encarar seus olhos -, as pessoas falam o tempo todo disso, mas nunca as vi colocar isso em prática. – Deu de ombros. - Então prometi a mim mesma começar, se você quer mudanças, comece por você. Se tem uma chance, use-a. Faça valer a pena, talvez com uma pequena atitude, você consegue mudar o mundo. – Explicou, vendo-o sorrir maravilhado enquanto ela terminava. – Não é sobre ser uma pessoa incrível com planos incríveis, é sobre uma garota que fez alguma coisa mudar.
   sentiu uma certeza enorme descendo por sua garganta e se encaixando no peito, como se faltasse uma peça do quebra-cabeça, e ela estivesse bem ali, em sua frente: com um tímido sorriso no rosto, enquanto dizia algo que ela julgava ser tão banal.
  - Quando eu era criança - sorriu no mesmo tom –, eu achava que eu podia prever o futuro, sei que isso não tem nada a ver, mas acho que essa habilidade voltou.
   arqueou as sobrancelhas docemente, sem entender.
  - E você disse que queria saber o que vai acontecer agora, não é? – pegou o rosto da menina com as mãos, ela estava confusa, com as sobrancelhas arqueadas, enquanto ele sorria maliciosamente.
  - É. – Ela fez que sim com a cabeça.
  - Então... – ele sorriu – eu vou me casar com você, um dia.
  Foi o que bastou para colar seus lábios ao dela. Nunca teve tanta certeza do que queria, nem nunca mais teria. Beijou-a delicadamente, enquanto acariciava seu rosto e sentia seu coração dar piruetas inusitadas. Parecia se encaixar muito bem na garota, e disso já sabia. Tinha achado que todas aquelas sensações que sentia enquanto estava com ela eram falsas, afinal: estava bêbado. Mas agora tinha certeza que era real, ela era a garota certa. Nunca tinha se sentido daquela forma, era o que lhe bastava pra provar: se casaria com ela, um dia.



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