O Beijo do Baile

Escrito por Lia | Revisado por Pepper

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Parte do Projeto Songfics - 6ª Temporada // Música: Christina Perri - A Thousand Years

  Era hoje. O dia que eu mais havia esperado há dois anos estava aí, prestes a acontecer. Já se passava da meia noite e eu não conseguia dormir, me concentrar em algo ou simplesmente descansar. Meu coração batia descompassadamente, na medida em que eu via os minutos se arrastarem no meu relógio de mesa.
  Peguei um caderno velho e comecei a rabisca-lo na tentativa de me distrair, e tentar dormir. Eu estava ansiosa, agitada, animada, enlouquecendo. Depois de mais ou menos trinta minutos assim, resolvi tomar um banho quente. Chovia.
  Coloquei meu pijama favorito, e deixei a janela aberta. Alguns pingos me atingiam e isso me fez sentir leve, à medida que a chuva diminuía sua intensidade. Eram tantas perguntas, tanto tempo e tanta coisa que havia mudado.
   e eu sempre fomos amigos, e bem, eu não diria “amigos” e sim, colegas. Há dois anos ele havia viajado para o outro lado do país, para morar com seus avós, já que seus pais estavam em um processo de separação e acharam melhor não o envolver nisso até que tudo estivesse certo. tinha 16 na época. Até então, nós só nos cumprimentávamos na escola com um “bom dia” ou um “olá”, nada demais.
  Quando partiu, nós começamos a conversar pelas redes sociais. E a nossa amizade surgiu, cresceu e bem, nós éramos bem íntimos agora. E eu sempre havia me sentido confusa em relação a tudo isso, porque ao mesmo tempo em que eu gostava de ser sua amiga, parecia que havia algo a mais. E eu descobri que talvez fosse paixão... No dia em que ele me contou que estava namorando.
  Confesso que fiquei abalada, abatida. Mas bem, ele não sabia, não era sua culpa. E o tempo passou, nós mudamos, crescemos. E hoje ele está aí, prestes a voltar para a casa dos pais. Que se separaram, mas perceberam que o amor não acaba assim, fazendo-os voltar a viver no mesmo teto.
  Logo, adormeci. Acordei com o sol já alto, e quando percebi que dia era meu coração pulou. Eu estava muito ansiosa.
  Tomei café da manhã, me arrumei e fui para a casa dos pais de , que moravam a três quadras da minha casa. Já estava tudo pronto, os balões, a decoração, a comida. adoraria ver a surpresa que havíamos preparado para ele.
  Sentei-me no sofá e comecei a conversar com a irmã mais velha do meu amigo, Kate. Ela era três anos mais velha que , e era casada com Greg. Ela me contava sobre a viagem que ela havia feito para a Califórnia enquanto eu esperava impacientemente o tempo passar. Logo, vi o sinal que eu tanto aguardava. estava chegando.
  Ouvi o barulho da chave abrindo a porta e senti minhas pernas tremerem. Tudo o que eu consegui fazer foi rezar para que eu não estragasse tudo.
  - SURPRESA! – ouvi os gritos e as risadas em seguida. Levantei-me vagarosamente para checar se estava tudo certo e então eu o vi. E sinceramente dizendo, ele era muito diferente na vida real do que na webcam – pra melhor, quero dizer.
  Esperei ele falar com toda a sua família, e aquele sorriso, oh meu Deus aquele sorriso... Como eu nunca havia parado pra reparar nele antes?
  Encostei-me ao batente da porta da cozinha e comecei a retirar algumas plumas inevitáveis na minha blusa preta. Praguejei a máquina de lavar mentalmente enquanto batia a mão sobre o tecido, numa tentativa falha de ao menos disfarçar o inconveniente.
  - Você sabe que isso não vai adiantar né? – ouvi aquela voz. AQUELA VOZ. Tremi na base.
  - Oi... ! – me virei surpresa e sorri, o vendo sorrir também. – Você é bem mais alto agora. Se bem que você era quando nós estudávamos juntos... – eu tentei disfarçar, mas fiquei sem graça na hora. Merda.
  - Você tá uma gracinha, . – ele apertou minha bochecha. – Você não sabe quanto tempo eu esperei pra poder fazer isso. – ele riu e eu fiquei morrendo de vergonha. Cadê um buraco quando a gente precisa?
  - você não tem mais nada pra fazer, não? Não me enche, cara. – eu fingi estar brava e ele soltou uma risada alta. Senti que eu ia sentir esse som ecoar na minha cabeça a noite toda.
  Conversamos bastante, até o entardecer. Era quinta-feira e eu teria que ir buscar o meu vestido pro baile de formatura no outro dia de manhã. Já havíamos nos formado e bem... Isso é estranho.
  - Eu... Te vejo amanhã, né? – ele me puxou pelo braço e perguntou.
  - Claro que não. Eu sou difícil. – disse séria e ele riu.
  - Você é chata demais garota. – ele largou meu braço e eu ri.
  - Depois eu venho aqui. – saí andando... Até que ele me chamou.
  - Isso não é forma de se dizer adeus. – ele veio até mim e me abraçou, logo depois dando um beijo na minha bochecha. Ou ao menos tentando, já que seus lábios atingiram mais o meu cabelo do que meu rosto em si.
  - Mas não é um adeus... É um “até logo”. – eu sorri e ele retribuiu o sorriso. – Te vejo depois.

  *

  Levantei cedo no dia seguinte e fui buscar meu vestido. Senti que eu ficaria parecendo algum bicho estranho, já que vestidos longos não combinavam muito comigo. Salto alto, muito menos.
  Ouço o telefone tocar, era mais ou menos seis da tarde.
  - Alô? – atendi.
  - ? É o ...
  - Como você conseguiu meu número?
  - Também estou bem, obrigada por perguntar. – ele ironizou. – Tá fazendo alguma coisa?
  - Tô.
  - O quê?
  - Falando com você, ué. – ouvi sua risada baixa.
  - Vem aqui em casa... Quero falar com você. – ele disse e eu sorri comigo mesma. Hoje tem.
  - Tudo bem... Eu só vou tomar um banho, hoje é dia de faxina.
  - Acho bom você ir mesmo, tô sentindo tua catinga daqui.
  - Olha o respeito, .
  - Te vejo depois então, beijo. – desliguei.
  Fiz o que havia dito e então fui para a casa de . Bati na porta e ele veio me atender com os braços abertos e aquele sorriso – sim aquele que me deixava babando – pra me dizer oi.
  - Nossa, isso tudo pra mim? – ele disse surpreso e eu não soube o que responder.
  - Você tem que parar com isso de ficar me deixando envergonhada o tempo todo.
  - Eu não vou parar... Você fica bonitinha.
  - Tá vendo!!! , isso é desconfortável. – eu disse incompreendida e ele só ria. – Cadê seus pais?
  - Foram no supermercado. Casa livre. Sabe o que significa? – ele me olhou e eu continuei sem entender. – , a gente pode fazer o que a gente quiser.
  - Depende do que você quer. – eu disse e ele sorriu malicioso. – Espero que não seja o que a sua cara tá me dizendo.
  - Na verdade eu tenho uma ideia melhor. – ele me puxou para dentro e me levou até o quarto – lê-se ninho de rato – dele. – Me ajuda a desfazer as malas?
  - Eu sirvo de escrava pra minha mãe o dia todo pra você me chamar aqui e tentar me escravizar também? Onde fica a senzala? – eu cruzei os braços.
  - Por favor, ! Você é muito organizada, se eu for fazer isso tudo sozinho eu vou terminar no nosso casamento.
  - Que casamento? Eu hein... Sai fora. – eu disse, meio desconcertada e vi-o ficar sem graça.
  - Pega aquela mala ali, por favor... – ele disse baixo e apontou para uma grande mala no canto do quarto.
  Ficamos calados enquanto eu retirava algumas roupas da mala para colocarmos no armário. Por um momento, pensei no que eu havia dito. Mas bem, não faria sentido se ele estivesse chateado comigo por isso.
  - , acho melhor você cuidar dessa parte... – eu disse meio sem graça e entreguei algumas cuecas pra ele. Ele me olhou e sorriu, suspirando depois.
  - Você não tem jeito. – ele pegou e então me puxou pelo braço, me derrubando na cama.
  - Ei!!! Não é justo. Você é mais forte do que eu. – eu ri alto e ele continuou me segurando pelos braços.
  - Você tá ansiosa pra amanhã?
  - Um pouco. – ele se deitou do meu lado. Senti meu coração disparar. É a hora. – Você... Quer...
  - Acho que você deveria me mostrar seu vestido. Opinião masculina nessas ocasiões é sempre bem vinda, sabia?
  - Na verdade eu ia te perguntar se você...
  - Sim, eu quero muito ir com você. – ele disse rápido e eu ri.
  - Tudo bem então. – me virei na cama, ficando com a barriga para baixo e então fechando os olhos. – Acho que vou tirar uma sonequinha. – respirei fundo e fechei os olhos, o ouvindo rir e então se levantando.
  E no final, acabei dormindo. Acordei com o quarto todo arrumado e sentado na poltrona, me observando.
  - Você tá parecendo um serial killer, sério. Para. – eu disse meio sonolenta e ele riu.
  - E você acha que eu te trouxe aqui pra quê? – ele soltou uma risada sutil e eu ri fraco.
  - Meu Deus, já é noite? – olhei para a janela. – Eu tenho que ir pra casa.
  - É... Eu vou com você. – ele se levantou e eu apenas sorri.
  Fomos caminhando até a porta da minha casa, conversando sobre assuntos aleatórios. Adorava a companhia de , me sentia bem.
  - Então eu... Passo aqui às oito?
  - Pode ser. Minha mãe vai nos levar de carro. – eu o abracei e então nos despedimos.
  Mal dormi pensando no dia seguinte. Seria incrível. Quando acordei, comecei a preparar algumas coisas e logo o dia já havia passado.
  Ouço a campainha tocar. Tentei conter o sorriso, mas não consegui.
  Corri para atender à porta, então vi em seu melhor terno.
  - Você... Tá linda.
  - Oi... – eu disse um pouco envergonhada e ele então riu.
  - Vamos? – assenti, então chamando minha mãe.
  Fomos no banco de trás, assim então pude apoiar minha cabeça em seu ombro. Me senti desconfortável... Até ele me aconchegar no seu braço.
  Chegamos ao local da festa e então entramos. Encontrei vários amigos meus, e , alguns amigos da época em que nos conhecemos.
  Conforme o tempo passava, a festa ficava cada vez melhor. Estávamos na pista de dança, até que uma garota, que reconheci ser Elisa, o puxou para o lado. Senti meu coração bater descompassadamente.
  Me sentei em um dos sofás que havia lá. A festa já estava quase no final, e só havia mais algumas poucas pessoas dançando.
  - ? Cê ta bem? – se sentou ao meu lado e então eu o olhei.
  - Onde você estava? – eu estava nervosa.
  - Eu estava no banheiro, foi mal. – ele disse, passando a mão nos cabelos.
  - Ah, tudo bem. – cruzei os braços e abaixei minha cabeça.
  - !! – ele me olhou surpreso e então rimos. Ele se aproximou de mim, e passou o braço sobre meu ombro.
  - Sabe de uma coisa? Vem dançar. – eu me levantei e o puxei pela mão. Não é hora de perder o controle, !
  Coincidentemente ocorreu algo bastante clichê. Começou a tocar música de casal. Revirei os olhos, percebi que se tocava A Thousand Years da Christina Perri. E então parei para a analisar a letra, talvez pela primeira vez em minha vida.
  Às vezes a gente tem que dizer o que temos a dizer.
  - Você tá mais alta. – disse em meu ouvido enquanto dançávamos lentamente.
  - É o salto. – sorri, o olhando fixamente. As luzes giravam e eu sentia uma onda de flashes sobre mim, e tudo isso me deu uma nostalgia, uma coragem, uma vontade de tentar. Respirei fundo e então... Eu o beijei.
  EU O BEIJEI PORRA!!!
  AI MEU DEUS FINALMENTE!!!
  Coloquei minhas mãos em sua nuca e ele me apertou mais contra seu corpo. Não durou muito, mas foi o bastante. Quando abri os olhos e vi o rosto de , levei um susto. Me senti envergonhada, movida pelo impulso, e então pensei na besteira que eu havia feito.
  - Eu... Foi mal. – foi tudo o que eu consegui dizer, até me soltar de .
  - , espera... – ele disse, e então me virei. – A gente pode conversar?
  - Tudo bem. – suspirei me sentindo derrotada.
  Então me puxou até a saída da festa, e ficamos na calçada.
  - O que foi... – ele disse, passando a mão na nuca.
  - Você quer ouvir a verdade? – perguntei e ele fez uma cara de que sim, era meio óbvio que ele queria saber. – Eu acho que eu.. Gosto de você. Talvez eu sempre tenha gostado, sei lá. É só que eu... Não consegui mais me controlar, entende? Eu esperei tanto por isso, pra ter você aqui, pra poder te abraçar que eu não sei de mais nada.
  - ... Eu confesso que eu tô surpreso.
  - É, eu sei, disfarço muito bem. – ri nervosa, e ele também. – Acho que essa é a parte aonde eu vou embora e você fica, né?
  - É... – ele disse meio sem graça, e então eu senti meu coração quebrar. Eita porra, fiz burrada.
  - Então eu vou indo... Tchau. – eu disse, meio desconfortável e dando um beijo na bochecha dele.
  Liguei para minha mãe e em questão de minutos ela já estava lá para me buscar.
  - E aí, como foi? – ela perguntou, animadamente. Pelo menos animadamente demais pra serem três da manhã.
  - Ah, foi legal. – eu disse, cansada.
  - Sei... – ela continuou em silêncio até chegarmos em casa.

  ***

  Eram oito e meia da manhã quando ouvi meu celular tocar. Era . E eu sinceramente não estava a fim de falar com ele.
  Acordei às onze horas e havia somente umas dez ligações perdidas. Todas de .
  - , telefone pra você. – minha mãe disse, trazendo nosso aparelho fixo.
  - Alô? – eu disse calmamente.
  - Por que você não me atendeu? – reconheci a voz. .
  - Ah, foi mal . Eu estava dormindo, só acordei agora. – eu disse.
  - Você quer sair hoje? Preciso falar com você.
  - Hoje? Ah, não dá, eu tenho uns trabalhos pra fazer...
  - , a escola acabou. – ele disse, com uma voz firme.
  - Desculpa, eu realmente não to a fim de sair hoje. – eu suspirei alto e me senti triste. Poxa, o cara nem me deixa curtir a fossa.
  - É sério. É importante. – disse.
  - Eu odeio você. – ri fraco e sabia que ele estava sorrindo do outro lado. Ele sempre conseguia o que queria de mim. – Onde?
  - No píer. Às seis. – ele disse e eu apenas murmurei um “ok”.
  Desliguei o telefone um pouco preocupada.
  É...
  Fodeu.

  *

  Tentei não pensar em nada que me levasse ao o dia todo, mas é um pouco difícil. Já eram cinco da tarde e eu estava me aprontando para encontra-lo.
  - Vai sair com quem? – minha mãe apareceu na porta.
  - . – eu disse, vestindo a blusa.
  - Ultimamente vocês andam saindo muito... Você gosta dele? – ela perguntou. Não tive coragem de responder, então logo ela saiu do quarto sem sua resposta.
  Alguns minutos depois, eu estava no píer, esperando por .
  - Você realmente é pontual. – ele disse, vindo atrás de mim.
  - Ah... Oi. – eu disse, sorrindo fraco.
  - Quer sorvete? – ele perguntou, apontando para um quiosque que havia ali perto.
  - Não, eu... Não posso demorar.
  - Você ta estranha. – ele disse, se se encostando a uma das grades que havia.
  - Eu só não to muito bem hoje. Acho que estou cansada.
  - Não, você ta assim por causa de ontem. Ou hoje, sei lá. – ele pegou minha mão e ficou observando-a.
  Respirei, derrotada. Não havia resposta.
  - Eu só queria te dizer que eu... Eu fiquei surpreso. Eu não imaginava aquela atitude vinda de você. Primeiro porque você é a garota mais medrosa que eu conheço. – ele disse e eu ri. Então ele me puxou pra perto. – E segundo porque eu não imaginava que você goste de mim do jeito que eu gosto de você. – ele passou uma das mãos em meu rosto e me olhou no fundo dos olhos. Senti uma paz, uma alegria e um medo tão grande... Mas ele... Ele me acalma.
  - Ok, isso é definitivamente constrangedor. – eu disse e ri nervosa. – Eu digo, é uma situação um tanto quanto desconfortável, porque eu não sei o que fazer agora. – eu fui sincera e vi-o rir. Já devo ter mencionado algo sobre o sorriso dele poder parar o meu trânsito.
  - Acho que eu sei o que fazer. – ele me abraçou, e eu fiquei imersa em seu perfume. Poderia ficar assim por dias. – Eu gosto de você. - então ele colocou a mão em meu rosto e me beijou.
  E eu tive certeza de que bem... Tentativas nem sempre falham.



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