Notebook

Escrito por Brubs Mota | Revisado por Mariana

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  – Ele nunca se atrasa? - Ellie murmurou e quase automaticamente, meu olhar seguiu para a porta de entrada da cafeteria.
  E lá estava ele. Casualmente elegante, como sempre. Cavalheirismo parecia exalar por todos os seus poros. Uma mínima elevação no canto direito de sua boca que, na minha opinião, era fixa. Seus olhos que para mim ainda eram um mistério, visto que eu nunca conseguia identificar uma única coisa por trás deles, vasculhavam o recinto. E em sua mão esquerda, o bendito caderno de couro vermelho que o acompanhava desde o primeiro dia dessa loucura. O mesmo em que estavam escritas todas as perguntas que ele já havia me feito e, consequentemente, todas as respostas que eu já o havia dado.
  Balancei a cabeça rindo sem humor logo em seguida. Bendito dia em que concordei com isso!
  Aposto, caro amigo leitor, que deve estar se perguntando com que diabos eu havia concordado para estar tão arrependida assim. Permita-me explicar: há alguns dias - 13, para ser mais exata -, Mats (também apelidado por Ellie de Sr. Perguntas Infinitas) me propôs a ridícula ideia que aceitei apenas para me livrar dele. Era sua primeira vez na cafeteria onde trabalho e, segundo o próprio, ele não podia ir embora sem falar comigo. O que de forma alguma justifica o fato de ele ter me seguido por todo o estabelecimento, perguntando zilhões de coisas às quais eu dava sempre a mesma resposta, algo como “Está sendo extremamente inconveniente, Sr Hummels”. Não me lembro ao certo. Mas enfim, ele disse que tinha uma proposta para me fazer e, caso eu aceitasse, ele fazia o que eu tanto pedi: me deixaria em paz.
  A princípio, fiquei assustada com a ideia de tirar cinco minutos do meu dia para conversar com um estranho no meu ambiente de trabalho e já até me preparava para responder um grande e sonoro não. Mas então lembrei que se recusasse, aquele irritante cliente continuaria no meu pé sem que ninguém interferisse apenas por ser um dos mais ilustres habitantes de Dortmund.
  Então, cometi o pecado de aceitar.
  Uma vez por dia, sempre no horário da manhã entre 7h e 7h30, Mats Hummels chegaria na cafeteria e tomaria um lugar no balcão, apenas esperando que eu me aproximasse para anotar seu pedido e responder sua pergunta. Sim. Uma única pergunta por dia. Esse era o trato.
  Acontece que, desta vez, ao invés de se dirigir à uma das cadeiras do balcão, Mats se acomodou em uma das mesas da sacada, no primeiro andar. Devo confessar que não sabia ao certo se deveria estar aliviada ou preocupada com tal atitude. De certa forma, era um pouco decepcionante pensar que ele havia perdido o interesse em mim, mas ao mesmo tempo era reconfortante. Como eu não tinha ideia de como agira nessa situação já que ela não fazia parte do combinado, continuei atendendo outros clientes, dando o meu máximo para ignorar a irritante voz dentro de mim que chorava por Mats estar no estabelecimento e não estar comigo.
  – ! - Engel, o gerente, chamou por mim e prontamente eu virei em sua direção para encontrá-lo apontando para o andar de cima. Fiz careta antes mesmo que pudesse impedir, recebendo um olhar de repreensão em resposta.
  – Perdão. - pedi e ele assentiu, rumando para o balcão logo em seguida.
  Respirei fundo antes de seguir ao encontro de Mats que, pela primeira vez desde que passou a frequentar a cafeteria, me parecia extremamente desconfortável com aquela situação. Seus olhos vagavam por tudo o que podiam alcançar e sempre evitavam os meus. Seus dedos tamborilavam inquietamente sobre a mesa enquanto, de forma quase imperceptível, ele mordia seus lábios. Sentei à sua frente com a estranha sensação de querer entrar em seus pensamentos apenas para descobrir o que se passava e, se estivesse ao meu alcance, ajudá-lo. À medida que os segundos passavam e o silêncio se firmava, minha mente aumentava o tamanho da suposta tragédia que estava levando Mats a permanecer calado.
  Não demorou muito para que eu me pegasse pensando que sentia falta da sua voz. Que sentia falta do Mats extremamente irritante que queria saber o máximo possível sobre a minha pessoa. Que sentia falta do homem que parecia se fascinar por cada detalhe insignificante da minha vida, que ouvia com atenção a resposta de cada pergunta irrelevante que fazia.
  – ! - virei ao perceber que meu nome não havia sido dito por Mats, mas sim por Ellie, que não me parecia nada contente. - Estou precisando de ajuda. - eu sabia que seu olhar maligno era direcionado à Mats e me senti mal por isso. Sentimento esse que era praticamente nulo comparado ao que tomava conta de mim. Tudo porque o bendito Hummels não havia me direcionado uma única palavra.
  – Já estou indo. - respondi, voltando meu olhar para Mats logo em seguida. - Eu... Er... Eu preciso ir agora. Nos falamos depois? - arrisquei um sorriso que se foi no instante em que ele se limitou a assentir.
  Sempre que tinha chance, eu procurava saber o que Mats estava fazendo - o que, por sinal, se resumia a escrever naquele bendito caderno - e se, por algum acaso, ele havia dito algo à alguém. Pela primeira vez, eu estava distraída no trabalho, que não exige tanta concentração assim, mas de toda forma... Eu não estava conseguindo me concentrar.
  E foi numa dessas olhadas discretas que eu percebi que Mats não estava mais lá. Ele simplesmente não estava mais lá. Eu adoraria poder definir o que eu senti naquele momento como apenas “aflição”, mas aquilo já havia passado de desespero, o que fez com que eu quisesse me jogar de um penhasco. Foi então que eu percebi o não tão pequeno ponto vermelho sobre a mesa e imediatamente rumei para lá, sem ao menos pensar sobre isso.
  O caderno estava fechado, com uma caneta posta entre algumas das primeiras páginas e, talvez eu esteja ficando louca, mas aquilo era realmente irresistível. Eu não estava conseguindo administrar o interesse repentino seguido de desinteresse também repentino do Hummels e algo me dizia que o conteúdo daquele indiscretíssimo caderno me ajudaria a colocar as ideias no lugar. Apenas me dei ao trabalho de localizar Engel, logo constatando que ele não estava por perto, para então me sentar no lugar que antes era ocupado por Mats.

  

  Era o que dizia na primeira folha e, sabe Deus porquê, isso fez o meu coração acelerar.

  - Time: Schalke 04 que Deus a liberte desse mal, amém;
  - Filme: Mamma Mia;
  - Música: Johnny Cash; Elvis Presley; The Robins;
  - Hobby: Ler todas as revistas de moda existentes; Desenhar;
  - Odeia: Ser fotografada o que vai ser um problemão; Flores em tons claros;

  Parei de ler ao perceber que aquilo não estava me satisfazendo - embora eu não conseguisse evitar um sorriso ao ler suas observações. Foi então que virei a página em busca de algo que acabasse com aquela inquietação ridícula dentro de mim. Eu não sabia o que procurava e isso me irritava. Foi então que me deparei com anotações que me chocavam por algum motivo desconhecido. Talvez pelo simples fato de ele ter anotado muito mais que as respostas que eu o dava, talvez porque um sorriso besta estava nos meus lábios agora. Talvez eu deva apenas parar de pensar e somente ler.

  Sempre que fica entediada, cantarola Teddy Bear e isso é lindo.
  Ela tem o hábito de sorrir mais largamente quando um cliente está sendo um tremendo pé no saco.
  Os olhos dela brilham à simples menção da palavra filme.
   tem a mania de tamborilar os dedos quanto está irritada e isso é adorável.

  À medida que eu ia lendo e percebendo coisas sobre mim que nem eu mesma sabia, na caligrafia de Mats, meu sorriso parecia aumentar e um calor inexplicável tomava conta do meu corpo. Eu não poderia descrever tudo o que se passava pela minha mente no momento e, se eu pudesse, você provavelmente me chamaria de louca. Não que eu já não estivesse parecendo uma louca. Quer dizer, eu estava sorrindo como uma idiota pra um caderno. Boa, !
  Folheei, então, lendo apenas de relance cada palavra que encontrava naquele bendito caderno, na esperança de que qualquer coisa ali me fizesse parar de ler. Eu precisava! Eu realmente precisava pensar que Mats era um psicopata, um maluco que ficava me observando, queria pensar em fugir dele, mas parecia que tudo o que eu lia, não importava quão estranho e absurdo fosse, me fazia querer estar perto dele. Droga, eu preciso me tratar. E como!
  Foi então que alcancei a última folha. E, droga, lá estava eu, perdendo o fôlego mais uma fez.

  Oi, curiosa. Digo, olá . Ok, talvez eu tenha sido prepotente demais por ter absoluta certeza de que você chegaria até aqui e peço perdão por isso. Peço perdão também por não ter sido homem o suficiente, por não ter a coragem de ficar e te perguntar isso cara a cara, mas... Nossa, você não faz a mínima ideia do quão assustado eu estou e que eu realmente, realmente, realmente não tenho ideia do que fazer caso eu escute uma negativa. Ok, vamos lá.
  Gostaria de deixar claro que não quero que você saia comigo, muito menos que desperdice seu tempo num restaurante chique, comendo algo que muito provavelmente você nem ao menos gosta. Também não quero que use qualquer tipo de roupa que te incomode ou que se preocupe mais com sua aparência do que com seu bem estar. Tudo o que eu, réles mortal que você sabe que sou, te peço é que me dê a chance de te retribuir. Só gostaria de ter a oportunidade de te fazer sentir como você me faz sentir. Tudo o que eu te peço, , tudo o que eu quero, é que você me deixe tentar, me deixe te fazer feliz. Você foi a primeira pessoa em muito tempo que não me viu como o Mats Hummels. Você, desde o primeiro instante, me viu como Mats, somente o Mats e até mesmo como o inconveniente Sr. Hummels, e eu não poderia estar mais grato. Por isso, quero te retribuir. Por me fazer feliz, por me fazer preferir ser o seu mero cliente irritante do que a estrela tratada à pão de ló. Por me fazer estar satisfeito de ser quem eu sou, e apenas isso, quando estou com você, mesmo que muito provavelmente eu aparente ser um louco desesperado por sua atenção o que, não posso negar, estou nesse estado nos últimos dias.
  Só lhe peço uma chance e uma chance apenas. Sei que você odeia enrolação e fantasias, então vou conter minha vontade de dizer que será nosso primeiro encontro de muitos para apenas deixar bem claro que tudo cabe à você. Prometo não te procurar mais, se esse for o seu desejo. Caso o contrário, bom... Prepare-se para conhecer meu lado mais insuportável. E não negue, sei bem que é o que mais gosta em mim!
  Antes de sair por essa porta e me dizer se me quer na sua vida ou do outro lado do universo, só quero que saiba que não me importo em ser apenas o cara irritante que te persegue com perguntas toscas, mas se eu puder ser alguém cujo nome você associa à felicidade, eu estaria bastante realizado.
  Minha pergunta hoje é: , você me permite tentar ser sua felicidade?

  Eu tentava de todas as maneiras possíveis fazer algo além de respirar e sentir raiva. Sim, raiva. Raiva por nem pensar em recusar isso a ele. Raiva por querer encontrar Mats o mais rápido possível e dizer que ele aparecesse na minha casa para uma sessão de musicais ainda naquela noite. Raiva porque queria aquele cara irritante por perto o máximo que ele pudesse estar... Foi então que me vi curiosa. Curiosa por saber do tal cara que se deu o trabalho de não apenas identificar, mas também tomar nota de cada detalhe insignificante sobre mim. Curiosa para saber mais do que diziam os jornais, mais do que eu podia perceber. Curiosa para saber se realmente ele podia me fazer sentir a tão dita felicidade. Sorri para o caderno, não tardando em escrever ali minha resposta. De mim ele não ouviria nada, uma pequena punição por ter quase me causado um ataque cardíaco mais cedo, não que ele precisasse saber disso.

  Apareça às 6:30. Você sabe o que eu penso sobre atrasos.

  Meu sorriso agora estava oficialmente com ar de pré adolescente apaixonada e eu não podia permitir que ele me visse dessa forma. Talvez eu devesse deixar que ele voltasse para pegar o caderno, talvez isso fosse cruel demais. Mas talvez, houvesse algo que fosse capaz de deixá-lo confuso e talvez tão aflito quanto eu havia ficado e bom, isso era tentador demais. Tão tentador que cedi. E logo, já estava convencendo Ellie - o que só foi possível depois de prometer algumas caixas de chocolate - a entregar o caderno ao seu dono, que estava na frente da cafeteria, com um nervosismo mais que perceptível. Assisti divertidamente, de uma das janelas da cafeteria, sua confusão com tal ato. Ellie havia sido fria e não havia demonstrado emoção nenhuma, o que era exatamente o que deveria ter feito.
  Mas ver a aflição de Mats e a forma como ele parecia desapontado ao que Ellie se afastava enquanto ele estava, aparentemente, sem resposta alguma, fez meu coração apertar. Engel entrou por mim no exato instante em que Mats começou a folhear o caderno, seu cenho enrugado precedendo uma expressão de felicidade que fez com que meu coração disparasse. Talvez por saber que eu estaria ali, observando-o, Mats olhou oara cada janela do estabelecimento, não tardando em me encontrar.
  – Espero que goste de churros! - gritou, piscando para mim antes de sair sorridente, a caminhar pela calçada, me deixando a risos frouxos e suspiros.
  Eu queria aquele ser insuportável e logo eu não seria capaz de imaginar meus sem sua inconveniência. Disso, eu não tinha dúvidas.

FIM



Comentários da autora


Hallo, leute! Mais uma fic com um jogador de futebol de um time rival e eu preciso dizer que Notebook meio que virou meu xodozinho. Adorei escrevê-la e espero que vocês tenham gostado. Vida longa e próspera e que a Força esteja sempre com vocês \V/
@ohmymota