Minhas Lembranças
Escrito por Asioleh | Revisado por Natashia Kitamura
Parte do Projeto Sorteio Surpresa - 12ª Temporada // Tema: Jack O' Lantern
Era um dia tranquilo da quinta-feira. Era dia 30 de outubro, consequentemente, amanhã seria Halloween. Eu realmente adorava aquela data. Não sabia o motivo dessa adoração toda, eu apenas... Gostava. Remetia-me a lembranças do passado, as quais não conseguia identificar, mas sei que tinha.
Moro com minha mãe há 13 anos. Não que eu tenha essa idade. Sou adotada. Fui adotada com 4 anos e, desde então, moro com dona Esther. Ela sabe como adoro o dia das bruxas. Já tentei perguntar a ela se lembrava do porquê de sua filha gostar tanto desse dia, mas nem ela sabia.
Saí de casa rapidamente para ir ao mercado. Já eram cinco da tarde e amanhã não teria tempo de sair. Estacionei o carro em uma vaga e caminhei até a entrada. Comprei variados tipos de doces. Amava-os, com toda a paixão do mundo. Não comprei as abóboras para fazer as famosas “Jack O’ Lantern”, pois minha mãe já tinha comprando-as. Nunca quis acreditar nessa lenda, mas acho incrível o efeito que elas dão como enfeite.
Fui para o caixa mais vazio do estabelecimento. Encontrei-o e esperei a moça passar as minhas coisas. Enquanto isso, olhei para trás. Havia um menino no caixa de trás conversando algo com o atendente. Reparei demais no garoto, como se eu o conhecesse. Ele era lindo. Cabelos escuros que precisavam urgentemente de um novo corte. Camiseta larga de cor branca. Vestia uma bermuda simples e tinha um sorriso encantador. Reparei demais nele, e não percebi que o mesmo me fitava com curiosidade. Seu sorriso desapareceu na mesma hora que o encarei. Sua feição antes feliz se transformou em uma cara totalmente fechada.
Paguei minha compra e peguei minhas coisas. Andei em direção ao carro quando ouvi alguém gritando:
- Liz! Espera!
Não dei a mínima atenção e continuei andando. Um braço forte me impediu que eu desse mais um passo.
- Você não me ouviu? – Falou com um pouco de raiva no olhar. – Eu estava te chamando!
- Desculpe, mas você está me assustando – Tentei inutilmente tirar seu braço do meu. – Me solta seu maluco! – Falei e ele parecia estar em transe. – Eu não sou essa tal de Liz!
- Como o seu nome? – O menino de olhos verdes perguntou-me.
- .
- Não pode ser! – Falou soltando meu braço e passando a mão nervosamente nos fios de cabelo.
- Acha que não sei o meu próprio nome? – Perguntei incrédula. Tirei minha identidade da minha bolsa e coloquei em frente ao seu rosto de modo que ele visse meu nome. – Aqui, seu louco. . .
- Me desculpe. Eu realmente achei que era outra pessoa... Realmente me desculpe. – O menino saiu praticamente desesperado e com um olhar vago no rosto. O que foi aquilo meu Deus?
Voltei para casa e decidi que não iria contar o tal acontecimento para minha mãe. Não era algo de tanta importância assim.
[...]
Vesti uma roupa de ginástica normal e fui para a academia logo cedo. De manhã é o horário mais apropriado pra fazer ginástica, em minha opinião. Iria a pé, pois não era muito longe de casa. Andei umas cinco quadras e cheguei ao meu destino. Era um lugar não muito grande, mas gostava de lá.
Comecei a treinar normalmente meus exercícios diários. Ouvindo música e pensando na vida, quando percebo alguém sentando no aparelho ao lado. Virei e encontrei o mesmo garoto do supermercado.
- Tá me seguindo agora? – Falei diminuindo o ritmo da esteira.
- Por qual motivo faria isso? – Falou sem nem dar ao trabalho de olhar pra minha cara. – Essa academia é do meu pai se você não sabe, .
Continuei fazendo o meu exercício. Não podia deixar de notar no corpo perfeito do tal menino ao lado. Era muito lindo mesmo, um tanquinho esculpido perfeitamente naquele físico de fazer qualquer uma babar.
- Quer um paninho pra limpar a baba aí? – O menino perguntou com uma cara maliciosa. Ops, tinha olhado demais.
- Me deixa em paz, garoto. – Falei olhando pra frente.
- A propósito, meu nome é . – Falou e estendeu a mão pra mim.
- Prazer, . – Cumprimentei-o e aumentei a velocidade da minha corrida.
Já tinham se passado quase uma hora desde que estava na academia. Decidi ir embora, já tinha dado o meu tempo. Recolhi minha garrafa de água e estava a caminho da porta quando alguém me parou.
- Posso te acompanhar até sua casa? – falou. – Não me ache um louco, é que minha casa é perto da sua.
- Como sabe onde é minha casa?
- As notícias circulam rápido, . – O menino fixou o olhar nela. – Basta algumas perguntas naquele bairro que todos respondem.
- Você não é algum tipo de sequestrador ou estuprador, né? – Falei fingindo medo. – Realmente espero que não.
- Se eu fosse isso, já teria te agarrado faz tempo quando foi fazer aquele segundo exercício. – Falou olhando com um sorriso encantador de lado. – Posso ir com você?
- Ok, ok. Vamos.
Começamos a caminhar rumo a minha casa. Descobri que ele morava na mesma rua que a minha.
- Vai à festa de Halloween hoje?
- Não. Ninguém me convidou.
- Por isso que estou te convidando. – Deu de ombros como se fosse a coisa mais obvia do mundo. – Vai ser na casa de um amigo ao lado da minha. Passo pra te buscar as sete. Pode ser?
- Claro. Vou ver com a minha mãe.
[...]
Cheguei em minha casa exausta e suada. Tomei uma ducha, meu corpo estava gritando de vontade.
Tarde inteira passei embalando docinhos para entregar em troca das travessuras nada agradáveis por aqui. Minha mãe me ajudou nesse quesito.
- Mãe, um amigo me convidou para uma festa de Halloween que vai ter aqui na rua. Posso ir?
- Quem é esse amigo? – Mamãe perguntou.
- Conheci ele na academia – Comecei. – Ele mora aqui na rua. Falou que ia ter uma festa na cada ao lado da dele.
- Pode ir sim, querida. Não quero você depois das três aqui em casa.
- Tudo bem. Obrigada. – Falei abraçando-a de lado.
Mamãe nunca foi tão preocupada na questão horário pra voltar pra casa. Desde que eu estivesse com meu celular em ordem, estava tudo bem. Ela confiava em mim.
Terminamos tudo final da tarde. Me levantei e fui para o meu quarto logo em seguida. Tinha que decidir qual roupa usaria hoje.
Decidi não usar fantasia. Iria com uma roupa simples. Deitei-me na cama e resolvi dormir um pouquinho antes das sete da noite.
Treze anos atrás...
Era dia de Halloween. A rua inteira se movimentava para preparar uma festa, principalmente as crianças, exceto uma. estava sentada no meio fio, chorando baixinho, pois não gostava que as pessoas a vissem chorando. Estava imensamente triste por ter que se mudar para outro país e abandonar seus amigos.
- Por que está chorando? – Um menino aparentando ser da mesma idade que a garota, perguntou. – Tá tudo bem, Liz?
- Não, não está. – A menina disse embaralhando-se nas próprias palavras. – Eu não quero ir embora daqui.
- Eu também não quero que você vá – O menino disse sentando-se ao lado da garota. – Gosto de você aqui. É minha melhor amiga. Sabe disso, né?
- Claro que eu sei. – A menina falou sentindo-se um pouco envergonhada.
- Toma, um presente – O menino tirou do bolso um lindo cordão com um pingente daquelas típicas abóboras de Halloween. – Pedi pra mamãe comprar algo para lhe dar. Eu que escolhi.
- É lindo! – A menina tinha ficado encantada com o simples gesto do garoto.
Levantou-se, deu um beijo no rosto do rapaz e saiu correndo para dentro de casa.
[...]
Nunca perdi o presente que ganhara há alguns anos. Não lembrava ao certo quem que tinha me dado, pois não me recordava muito bem de minha infância.
Decidi ir me arrumar. Coloquei roupa simples, maquiagem quase nula e optei por usar minha corrente de “Jack O’ Lantern” que não colocava há muito tempo. Desci as escadas, encontrando minha mãe lendo alguma coisa qualquer na sua revista.
- Mamãe, já estou indo. – Falei pulando o último degrau. – Meu celular tá tudo certo, e a festa é nessa rua, então não se preocupe.
- Tudo bem, . Boa festa.
- Obrigada. – Dei-lhe um beijo estalado na bochecha. Peguei meu casaco e saí de casa.
Estava esperando , faltavam apenas alguns minutos para dar o horário combinado. Vi ele de longe vestindo algo simples como eu. Blusa escura com uma calça jeans de lavagem clara, os cabelos desarrumados propositalmente. Estava lindo, não poderia negar.
- Vamos então, senhorita? – aproximou-se de mim, estendendo a mão como se eu fosse uma princesa. Uma brincadeira, óbvio.
- Vamos, senhor.
[...]
A festa estava muito bem elaborada e decorada. Muita gente que eu nem sequer conhecia, mas por outro lado, alguns rostos conhecidos.
- O que acha de vir dançar comigo? – perguntou do nada quando estávamos bebendo algo de cor azul.
- Não sei não , é que eu não sei danç... – Fui interrompida.
- O que é isso no seu pescoço? – mudou sua expressão eu seu jeito rapidamente comigo. Estava estampando nervosismo e tristeza no seu rosto. – Onde achou isso? COMO CONSEGUIU ISSO?
- Você está me assustando. – Falei me afastando um pouco dele. – Eu tenho isso já faz um tempo, eu ganhei.
- Não pode ser, não pode ser... – repetia isso pra si mesmo. Depois disso, saiu em passos largos da festa, me deixando com cara de bunda lá no meio.
[...]
Acordei cedinho no próximo dia para ir à academia. Vesti minhas roupas de ginástica e caminhei até lá.
Não queria admitir, mas estava procurando sim . Tentativa falha. Ele não estava ali quando cheguei. Suspirei tranquila, pois iria me livrar de ter que encarar ele hoje. Coloquei minhas coisas em um canto, conectei os fones de ouvido no celular e subi na esteira ligando-a.
Tentei de tudo para não lembrar o ocorrido de ontem, mas minha tentativa foi totalmente falha. Por que ele tinha ficado tão irritado com tão pouca coisa? Era apenas um colar! E outra, qual era o problema dele? Me conhece não faz nem uma semana, e já faz esse escândalo todo?
Tentei afastar esses pensamentos da minha cabeça. Prestei atenção na minha música, cantarolando-a e batendo os dedos no ritmo. Fechei os olhos por um tempo, sentindo o que estava ouvindo. Foi quando alguém parou minha esteira, assim, do nada. Olhei para o lado e lá se encontrava o garoto que me deixou em uma festa sozinha.
- Qual é, garoto? – Falei me virando para ele e colocando as mãos na cintura.
- Tenho que admitir que fica linda brava assim. – Ele falou encarando demais a parte exposta da minha barriga, devido ao top de ginástica que eu usava. – Quero conversar com você por ontem.
- Não temos nada pra conversar, – Falei ligando minha esteira novamente. – Apenas me deixou sozinha em uma festa que você mesmo me convidou, e olha, eu fiquei super feliz. – Usei o meu tom mais sarcástico possível.
- Desculpe-me, . – Falou parando novamente e meu aparelho. – Só confundi algumas coisas e não estava passando tão bem assim. – Ele me olhou com cara estilo de Gato de Botas do Shrek. – Pra compensar, te convido para almoçar hoje em casa. Topa? Meus pais não estão em casa mesmo, eu vou cozinhar.
- Não sei se devo aceitar. – Falei para ver sua reação. – Vai que você foge da própria casa também, não é?
- Po, larga de ser chata! – Falou em tom de brincadeira.
- Tudo bem, eu aceito. Estou indo pra casa, posso ir para a sua meio dia? – Perguntei-lhe.
- Hora que você quiser!
- Tudo bem, estou indo. Até mais, . – Falei acenando e pegando minhas coisas. Surpreendentemente ele me virou e me deu um beijo demorado na bochecha.
- Até mais, .
[...]
Mamãe queria saber tudo sobre meu novo amigo. Custou a me deixar ir almoçar lá, mas no fim das contas ela deu-se por vencida. Depois que voltei da caminhada, tomei um banho e coloquei um vestido leve.
Fui à casa de a pé. Não era longe, então logo cheguei. Hesitei em tocar a campainha. Estava nervosa sem motivos. Levantei o braço e apertei o botão, fazendo soar um barulho dentro da casa. Não passou ao menos 1 minuto, que alguém abriu a porta.
- Você veio. – falou dando passagem para eu entrar.
- Não costumo deixar as pessoas na mão. – Falei e vi a reação de arrependida. – Eu estou brincando, bobo. Vem aqui. – Contornei meus braços em sua cintura em um abraço. Eu era mais baixa que ele, batia mais ou menos um pouco acima de seu ombro. Ele por sua vez, me abraçou pelos ombros e depositando um beijo em minha cabeça.
- Tudo bem com você? – me perguntou.
- Tudo ótimo, e com você?
- Melhor agora. – Piscou pra mim e saiu em direção à cozinha. O segui.
cozinhava muito bem, não poderia negar. O almoço estava realmente muito bom. Descobri muitas coisas em relação a . Contei também muitas coisas sobre a minha vida, parecia que nos conhecíamos desde criança. Depois do almoço, me convidou para conhecer a casa.
Passamos por vários cômodos. A casa de não era nenhuma mansão, era parecida com a minha. Dois andares, três quartos. Chegamos ao quarto de . Era tudo branco, exceto uma parede de cor azul e os móveis. Livros, computador, revistas e alguns pôsteres espalhados pelo quarto. Vi uma bancada onde tinha vários porta-retratos ali. Vi cada uma das fotos. com a mãe, com o pai, com a família, com amigos. Uma me chamou especialmente atenção. Nessa foto ele era pequeno e estava abraçado com uma menina da mesma idade que ele. Ela era muito parecida comigo quando tinha aquela idade. Ela usava um pingente no pescoço, igual o que eu tinha. Essa menina era eu.
- , o que faz com uma foto minha aqui? – Perguntei e ele se virou. Arregalou os olhos, abriu e fechou a boca várias vezes numa tentativa de proferir algo. – Essa sou eu! Você me conhece? Como? Por que não me disse?
- , me deixe explicar.
- Por que não me contou que nós nos conhecíamos desde pequenos? – Falei com lágrimas nos olhos. – Mas é claro! – Falei mais pra mim do que pra ele. – Por isso que ficou daquele jeito quando viu meu colar. Por isso que me chamou de Liz quando estávamos no mercado. Esse era meu nome antes de ser adotada, não era?
Ele ficou calado. Não tinha o que discordar.
- Eu vou pra casa. Preciso falar com a minha mãe.
- Não , espere. – Falou segurando meu braço.
- NÃO TOCA EM MIM! – Falei elevando minha voz. – Não fale mais comigo.
Saí correndo da casa dele. O pior de tudo, não era ele ter omitido isso de mim. O pior de tudo é que eu estava apaixonada por ele.
[...]
Há duas horas tinha chegado em casa aos prantos. Minha mãe tinha me explicado a minha história. Contara-me que eu tinha sido adotada por ela. Minha família antiga não cuidava nem um pouco bem de mim. Vivia em festas, baladas e esqueciam-se que tinham uma filha. Meu nome era Liz. Ela mudou para assim que me adotou, pois achou mais apropriado. Não tinha motivos para ficar brava com a minha mãe. Isso era o de menos, o que ela tinha falado. Contei tudo o que vi na casa de e ela ficou de boca aberta. Ela sequer sabia da existência dele naquela época.
Estava deitada na minha cama, pensando em tudo que tinha acontecido. Eu tinha conhecido-o fazia menos de uma semana, mas sabia que estava apaixonada por ele.
[...]
Fazia uma semana desde que não nos víamos. Eu saia pra academia bem cedinho, e ele pareceu ter mudado de horário. Isso me incomodava de certa forma. Ao mesmo tempo em que eu queria matá-lo, eu queria beijá-lo.
Era bem cedinho quando fui pra academia. Sempre ia esse horário porque tinha escola depois. Cheguei ao local e comecei a fazer abdominais. Estava numa série de exercícios quando alguém me puxa bruscamente fazendo-me sair do chão e ficar em pé.
- Mas o qu... – Fui cortada por um beijo. Um beijo sem aviso, um beijo roubado.
Tentei me afastar, mas desisti quando percebi que ele não me soltaria. Sabia muito bem que era ali. Fiquei feliz por isso, muito feliz.
- O que você pensa que está fazendo? – Falei quando ele me soltou.
- Algo que eu queria fazer há muito tempo. – Falou e tampou minha boca com um dedo quando viu que eu tinha aberto a boca pra falar algo. – Me desculpe mesmo por tudo, . Eu ia te contar, ia mesmo. Eu sei que estou errado. Esses dias passei pensando apenas em você. Você não imagina o quanto eu estou gostando de você e cara, eu realmente espero que você esteja sentindo o mesmo, porque eu vou parecer o maior idiota aqui a frente de todo mundo.
Eu não sabia o que dizer. Por um lado ele está certo. Não adiantaria de nada eu ficar brava com ele. O que passou, passou. Agora seguiríamos em frente sem se preocupar com o passado.
Não respondi nada de imediato. Dei alguns passos, pulei em seu colo e o beijei. Senti-o sorrindo entre o beijo, o que me fez mais feliz ainda.
- Obrigada por isso. – Falou e grudou nossos lábios novamente.
Ouvi os presentes na academia aplaudindo. Fiquei com vergonha, mas não estava nem aí. Podia ter conhecido ele há apenas uma semana, mas na verdade, eu o amava desde sempre. Eu o procurava, mas não sabia. Mas agora sabia que eu estava completa e, é claro, que as minhas lembranças, me ajudariam a amar um pouco mais .

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