Lonely Town
Escrita por Nicole Manjiro | Revisada por Songfics
– Esse é o endereço dela.
Olhei para o papel amassado ao lado do meu teclado. Ele tinha sinais de uso. Foi escrito às pressas, entregue para mim em uma cafeteria e, em seguida, tratei aquele pedaço folha às vezes com descaso, às vezes como se fosse uma joia rara.
Nele, estava o endereço da minha mãe.
Eu não sei porque contratei um detetive. Não sei porque paguei, durante um ano inteiro, 20% do meu salário para que ele me contasse sobre tudo o que ela estava fazendo. Encontrá-la não foi um problema. Eu poderia ter parado aí.
Mas eu estava curioso. E também desesperado.
Sempre senti falta da minha mãe. Fui criado por meu pai e centenas de suas namoradas. Algumas eram legais, outras eram tão ruins, que eu preferia ir para o internato, como algumas sugeriram para o meu pai, a ficar com elas.
Saí de casa cedo, assim que atingi a maioridade. Morei em uma república com outros garotos por mais de 10 anos. Era melhor juntar dinheiro, do que ter a mordomia de viver em um quarto sozinho; tudo pela causa de saber se minha mãe realmente havia fugido com outro cara, ou se ela foi obrigada a ir, pois, convenhamos, meu pai sempre foi um monstro. No entanto, nunca saí de Lonely Town.
Durante os meses até conseguir contratar um detetive, consolei a mim mesmo dizendo que ela não podia me levar. Não era uma vida fácil, a de fugitiva de um relacionamento extremamente abusivo. Também dizia que ela chorou todos os dias durante um ano inteiro, pensando em como eu estava e se eu sentia falta dela. Olhando para a lua, eu lhe dizia:
– Sinto muito a sua falta.
O detetive que contratei era o melhor de Lonely Town. Ele fazia serviços, inclusive, para as cidades vizinhas. Sua genialidade se mostrou verdadeira quando, três dias depois de eu pagar a primeira parte do nosso acordo, ele veio com a informação de que minha mãe continuava em Lonely Town.
“Será que ela não saiu por mim?”
Esse tipo de pensamento me acompanhou desde minha infância, quando eu achava que tudo iria mudar. Mas nada nunca mudou.
Suspirei, cansado de brigar com meus próprios pensamentos.
“Devo ou não devo ir visitá-la?”
Olhei para o computador, onde o trabalho já não rendia mais. Não importa quantas horas eu ficasse sentado ali, nada iria para frente.
– Acabe logo com isso, Mace. – digo a mim mesmo. – Vá vê-la.
Peguei as chaves do carro e, 15 minutos depois, estacionei duas casas antes da que o detetive havia me dado.
A casa é bonita. Um sobrado com um jardim bem cuidado e dois carros bons na garagem. As luzes do primeiro andar estavam todas acesas. Eu podia ver a sombra de algumas pessoas do lado de dentro. Jovens correndo de um lado para o outro; o som que eu ouvia era só de risadas. Me parecia uma família comum, feliz.
E então, eu a vi. Foi como se ela soubesse que eu estava ali; como se nossa ligação de mãe e filho ainda estivesse forte.
Quis sorrir, mas não houve tempo. Quando seus olhos encontraram os meus, o sorriso que ela já tinha nos lábios, sumiram, e rapidamente suas mãos fecharam as cortinas e, segundos depois, ela saiu da casa.
– O que você está fazendo aqui?
– Eu…
Foi o tom de sua voz que me fez calar. Era um tom agressivo, sinal de que eu não era bem-vindo. Quis lhe perguntar se havia me deixado porque não tinha escolha, na esperança, admito, de ouvir que sim. Entretanto, tudo nela me dizia que a resposta seria ‘não’. Seria a resposta também para minhas outras perguntas: “você se arrepende?”, “você chegou a me procurar?”, “você me ama?”.
Seus olhos vazios me encararam, como se estivesse relembrando do passado.
Um passado que, pelo jeito, queria esquecer para sempre.
– Não volte mais – ela pediu, como uma súplica.
Foi o suficiente.
Vi seu corpo me dar as costas e, sem hesitar, fechar a porta.
Ouvi sua voz dizer para sua família que era só um pedinte, e que ela havia resolvido tudo.
Permaneci parado na calçada, calado, cabisbaixo. Percebi que a criança que eu era nunca me deixou. Até o momento, eu continuava com a esperança de que as coisas iriam mudar.
Como sempre, nada mudou.