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Ideia #082

Doada por Millena Borges

// A Ideia

Ela 16 anos. Ele 23.
Os pais dela super-protetores que deram uma idade máxima de um garoto que ela pode namorar: 18 anos.
Como fazer pra manter esse amor?
Ela toma coragem pra contar para seus pais. Apresenta o namorado que tentou ser o mais educado possível, mas mesmo assim, os pais da menina não acharam ele ser o cara certo.


// Sugestões

O cara pode ser também alguém com muitas tatuagens, com hábito de fumar e beber, para passar a impressão para os pais da menina de mal exemplo.

// Notas

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Jorge Maravilha

Escrito por Marrie Chevalier

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  O sorriso dele era lindo. Era mesmo. Mas o que chamava atenção era mesmo os seus olhos, não verdes e nem mesmo azuis. Eram castanhos, mas eram mais cativantes e brilhantes que quaisquer outro que eu já tivesse visto até então. Era como se aqueles olhos esbanjassem inocência, ao mesmo tempo, seus movimentos demonstravam maturidade. Talvez o Malboro entre seus lábios ajudasse na construção do meu fascínio por aquele cara que passava em frente ao meu colégio, no primeiro dia da primavera. O observei tirar uma pequena garrafa prateada do bolso de seu casaco, tomando um gole longo em seguida.
  - Ele está bebendo em plena terça feira? Às oito da manhã? - pensei em voz alta sem conseguir tirar meus olhos dele.
  - O que você disse, amiga? – Kênia disse ao meu lado enquanto terminava de tomar seu refrigerante.
  - Ela está babando no gostosão do outro lado da rua. - meu primo, Zack, disse me zoando sem ter ideia do estrago que tinha feito.
  - ! - Tafari disse segurando forte em meu braço. Ele me puxava em direção ao corredor dos armários, me prendendo entre ele e a parede, assim que alcançamos o final do corredor. - Estava mesmo babando por aquele babaca drogado?
  - N-Não. Eu só fiquei espantada. – disse, tremendo em sua mão, e quanto mais ele pressionava seu corpo no meu, mais gelada eu ficava. Infelizmente, aquela era uma cena comum para todos, mas eu jamais poderia me acostumar com uma violência desse tipo. Kênia me dizia para denunciá-lo, mas eu me recusava em virar apenas um papel arquivado e esquecido em uma gaveta qualquer por aí, e ainda virar um número em qualquer estatística.
  Ninguém realmente se importava com isso, mas já era de se esperar que, em um país onde grande parte dos homens crescem acreditando que forçar alguém a fazer sexo não é um ato de violência, isso seja tão comum como um bebê que chora com fome. Eu ainda tinha sorte, considerando que a maior parte das garotas que vivem aqui, na África do Sul, são abusadas sexualmente dentro da própria casa.
  - Taf, você está me machucando.
  - Mesmo? Pois saiba que eu nem comecei. - ele disse já me empurrando para dentro de uma sala a qual eu não sabia qual era, já que minha visão estava turva com as lágrimas que se formavam.
  - Taf, por favor… Não.
  - Qual é boneca, você sabe que quanto mais negar, mais excitado eu fico.
  - Tafari, para. Aqui não, por favor. - ele me segurava contra a parede enquanto abria seu cinto. - Podem nos ver.
  - Se nos verem vão saber a safada que você é. Agora fica quieta.

[...]

  - , minha mãe ligou. Disse sobre um tal jantar no sábado. Você sabia disso?
  - Tinha escutado algo parecido, parece que o jantar vai ser em minha casa. Algo sobre meu aniversário. - enquanto conversava com meu primo, Kênia me olhava com pena e eu simplesmente odiava quando fazia isso.
  - Onde está Tafari? - uma das garotas da minha aula de matemática parou ao meu lado e me perguntou, dei de ombros sem forças para responder. Observei ela ir embora.
  - Vamos embora? - meu primo e minha amiga me perguntaram, já descendo as escadas.
  - Vão na frente, eu vou passar no meu armário. Preciso pegar um livro de inglês. - eles apenas continuaram seu caminho pra fora dos portões da escola.
  Estava seguindo o mesmo caminho feito minutos atrás pelos dois, quando fiquei sem ação. Ele estava lá, sentado na calçada do outro lado da rua. Ele parecia distraído olhando fixamente pro chão, conforme me aproximei do portão pude ver que os nós de seus dedos estavam vermelhos, ou ele fazia muita força em seu punho fechado ou tinha ralado de alguma forma. Cruzei os portões e dobrei a direita, indo em direção ao ponto de taxi, não que eu morasse longe da escola, mas não queria andar 20 minutos.
  - Ei, você. Garota! - ouvi sua voz pela primeira vez e diferente da voz de Tafari, que eu já conhecia a anos, aquela voz não me deu vontade de correr.
  - Sim? Posso te ajudar em alguma coisa?
  - Queria conversar com você, se importa se nós formos tomar um café?
  Seguimos em direção ao centro comercial The Promenade em silêncio, algumas vezes eu virava em sua direção e podia ver a expressão séria que se mantinha firme em seu rosto. Assim que paramos em frente ao Café Sofia, ele arranhou a garganta e encostou em minha cintura.
  - Eu não sei seu nome. - aquilo não era uma pergunta.
  - . - disse empurrando a porta e entrando no restaurante.
  - .
  - Só ?
  - Sim, por quê? Minha mãe queria ter uma menina para chamar de Kaylane, que significa filha da coragem e “céu e mar”. Quando eu nasci ela adaptou pra , que significa...
  - Oceano. Eu sei. - uma senhora parou ao nosso lado e nos ofereceu café e água.
  - Pode deixar os dois, por favor? - ele pediu soando gentil. - Você é boa e doce princesa.
  - Como?
  - é boa ou bondosa, e é doce princesa. - ele me olhou como ninguém tinha me olhado antes. - Por que você deixa ele fazer isso com você?
  - Espera, o quê?
  - Eu estava passando em frente a sua escola e vi quando ele praticamente te arrastou pra dentro da sua escola. Você tem roxos por todo o braço, mordidas no pescoço e não duvido que tenha mais marcas pelo resto do corpo.
  - O que você tem com isso? - sentia meus olhos marejarem, nunca falei sobre isso com ninguém. Apenas Kênia sabia, mas não foi por mim que ela soube.
  - Nada! Você tem o quê? 17, 18 anos?
  - Na verdade vou fazer 16 amanhã.
  - Como você pode deixar ele fazer isso com você, sendo tão nova e ainda mais na semana do seu aniversário.
  - Não lembrava de poder ter opção. De poder dizer não.
  - Mas você pode!
  - E pra quê? Pra ele me matar? Matar meu primo? Meu irmão? As pessoas que eu amo? Não, obrigada.
  - Até o dia em que ele vai TE matar. - um soluço saiu forte de minha garganta e só então percebi que estava chorando.
  - E por que VOCÊ se importa? - sua expressão mudou, ficou com algo triste e ele abaixou a cabeça
  - Minha mãe. Ela sofria a mesma coisa que você, mas era o chefe dela. Ela tinha medo dele me matar, e quando ela foi encontrada nua e morta na dispensa do cara, meu pai se culpou.
  - Desculpa eu não sabia…
  - Posso continuar? - Assenti, secando algumas lágrimas. - Eu me importo porque não conseguiria viver com a culpa com que meu pai vive. Ele sabia e não fazia nada, ele também sentia medo então se tornou um bosta para fingir que não se importava. Não quero ser como meu pai, me prometi que se visse isso acontecer, ajudaria quem quer que fosse. Me deixa te ajudar.
  - O que você pode fazer?
  - Se eu não posso fazer ele parar, posso pelo menos te ajudar a se recuperar. Quem sabe esquecer? Fugir? Não sei, o que você quiser. Como eu puder ajudar.
  - Você poderia dar uma surra nele? Só para assustar um pouco?
  - Bem, isso eu já fiz. - ele ergueu seus pulsos fechados em frente ao meu rosto, agora de perto pude ver os machucados de suas mãos. Eram típicas de luta. - Posso te levar pra casa?
  - Hm, antes… Quantos anos você tem?
  - Tenho 23, hm... Sou escritor e moro sozinho aqui mas sou de Moçambique.
  - Então é melhor eu ir sozinha mesmo.
  - Por quê?
  - Meus pais são super protetores.
  - Posso te acompanhar até uma quadra antes, pelo menos?
  - Pode. - respondi suspirando, ele parecia do tipo teimoso. O caminho até minha casa foi preenchido com conversar bobas, sobre o trabalho dele e minha escola. - Aqui já está bom.
  - Mas você disse até uma quadra antes.
  - E nós já estamos na esquina.
  - Sério? Bem, você vai fazer alguma coisa amanhã?
  - Amanha? Não.
  - Não vai comemorar seu aniversário?
  - Não acho que eu tenha motivos.
  - Pois então eu lhe darei motivos. Posso te buscar amanhã na sua escola?
  - Que horas?
  - Que horas começam suas aulas?
  - Às oito e vinte.
  - Dez para as oito estarei te esperando.
  - Pode não ser na frente da minha escola?
  - Onde então?
  - No café Sofia, sim?
  - Tudo bem.
  - Bem, tchau.
  - Tchau, até amanhã. - ele se aproximou me dando um beijo na testa. Aquele gesto tão delicado me derreteu.
  Virei as costas e corri pra dentro de casa me perguntando o porquê de não sentir medo dele, sendo que sentia medo de todos os homens desde que Tafari começou com aquilo.
  - Oi filha, como foi na escola?
  - Tudo bem, mãe.
  - Falou com Tafari sobre o jantar do seu aniversário?
  - Não deu para falar com ele hoje.
  - Mesmo? Algo errado?
  - O que há de errado? - meu pai perguntou entrando pela porta dos fundos na cozinha.
  - Nada amor, apenas se esqueceu de avisar Tafari sobre o jantar.
  - Isso mesmo pai, eu me esqueci.
  - Não esqueça de convidá-lo. Já que estamos falando do assunto, refresque minha memória minha filha, quantos anos ele tem mesmo?
  - Dezessete pai.
  - Menos mal, não quero minha filhinha metida com maiores de idades. Sabe se lá o que eles podem querer contigo.
  - Vai saber não é mesmo, papá? Eu vou pro meu quarto.
  Não podia dizer que não estava assustada. Na verdade acho que a palavra certa era espantada, com a forma que o dia de hoje se apresentou. Milhões de perguntas rodeavam minha cabeça. Aquele tal de , ele poderia ter inventado toda aquela história só pra que eu sentisse pena. Mas ele não tinha cara de quem suplicava por pena. Se bem que, ele poderia ter feito aquilo para que então eu aceitasse sair com ele no dia do meu aniversário. Por mais que a minha vida não fosse exatamente da forma que eu gostaria, eu ainda tinha esperanças. Sonhos e desejos. Eu queria sair da minha cidade, talvez mudar de país, pintar o cabelo, fazer um piercing, me apaixonar por um cantor famoso, talvez ter meu coração partido, casar de véu e grinalda, ver neve, ter uma filha e tornar ela uma bailarina, ou um filho e torna-lo um pianista. Talvez minha sina fosse mesmo me arriscar. Estava decidido, amanhã eu esperaria por , qual era a pior coisa que ele poderia fazer comigo? Me matar? É deveras arriscado, mas quem não tenta não ganha nada.
  - Vamos jantar? - Akinlana, meu irmão mais velho, entrou no quarto tirando minha concentração da música que escutava.
  - Não estou com fome, Akin.
  - Mas precisa comer, vai ficar carne e osso.
  - Já vou, já vou.

E nada como um dia após o outro dia,
pro meu coração.

  Levantei da cama sabendo que era um novo dia. Perdi bastante tempo no banheiro me arrumando naquela manhã. Cheguei a cozinha sendo recepcionada por meu irmão, minha mãe, nossa cozinheira e um belo café da manhã. Sai de casa apressada, já estava atrasada e não queria deixar esperando, mas quando cheguei lá ele já estava sentado na calçada ao lado do carro.
  - Hey, bom dia.
  - Feliz aniversário, princesa. - me aproximei dele, ele beijou minha bochecha dessa vez mexendo no comprimento do meu cabelo, como se o desembaraçasse. Eu apenas o observava sorrir. E ele parecia se divertir. - Gosto do seu cabelo.
  - Obrigada. Então, onde vamos?
  - Vários lugares. E se você quiser adicionar algum lugar a nossa rota é só me pedir para parar, certo?
  - Certo!
  - Primeiro parada, Clifton Beach.
  - Hm, acho que não posso ir para aqueles lados. Como eu moro lá é muito arriscado. E também acho que devemos sair logo das redondezas de Camps Bay porque pode ser algum professor meu passe por aqui. Podemos ir à Table Mountain?
  - Não, eu verifiquei e hoje está fechada. Podemos ir pra Hount Bay e direto pela Chapman’s Peak Drive.
  - Gostei, vamos?
  - É pra já.
  Entramos no carro, saindo em disparada. Não queríamos perder tempo, demoramos vinte minutos até chegar em Hount Bay e mais 10 minutos até parar no pedágio para mudar de distrito.
  - Você fuma? - perguntei depois de observar o carro e pousar meus olhos em seu cigarro descansando no console.
  - Não é óbvio? - ele perguntou pegando o seu maço e tirando um cigarro com os dentes, o ascendendo logo em seguida. - Você aceita?
  - Não obrigada, não gosto do gosto que fica na boca.
  - Mas é de cravo, é bom. - ele disse soltando a fumaça em minha direção como se quisesse comprovar o que dizia.
  - Percebi, ainda assim não gosto.
  - Não vou parar de fumar.
  - Eu sei, não me incomodo. Foi só curiosidade.
  Ele tragou seu cigarro mais uma vez e ficou extremamente bonito fazendo isso. Quando ele sugava seu cigarro seu maxilar se definia mais do que o normal. Suas bochechas ficavam rosadas e ver ele unindo os lábios para soltar a fumaça, era engraçado. Sentia uma espécie esquisita de cocegas no estomago, como uma prisão de ventre. Mas não era dolorido como, era uma sensação… gostosa de se sentir, como se fosse um sinal de boa sorte. Continuando minha perícia pelo carro encontrei óculos embaixo do freio de mão, notei que vestia um par de óculos parecidos, sem questionar ergui os ombros, mesmo sabendo que ninguém veria, e o posicionei em frente dos meus olhos. Olhei pela janela e parecia que algo estava faltando. Música, é claro. Me aproximei do som do carro tentando descobrir onde eu conseguiria ligar aquilo. O homem ao meu lado soltou uma risada fraca, apertando o botão do volume.
  - Amo Freshlyground. - suspirei me ajeitando no banco e abrindo a janela, sentindo o vento embaraçar meu cabelo.
  - Be my love, when the fire is low. - ouvi sua voz cantar baixinha. Era uma voz bem suave e rouca ao mesmo tempo.
  - When the fire is low, when the fire. - ouvi minha voz, mas posso garantir que nem sequer senti minha boca mexer. Foi automático. olhou sorrindo pra mim e continuamos cantando a música. - Não acredito que estou descendo a Chapman’s Peak, ouvindo Fire is low. É o melhor aniversário da minha vida. - eu batia palmas acompanhando o ritmo da música e podia sentir minha cintura se mover como se tivesse vida própria.
  - I feel silence is better enjoyed with an open heart beating next to you. - ele cantou baixinho outra vez. Pude ver que ele mexia seus ombros no ritmo de meus quadris e cintura. Ele sorria conforme acompanhava a letra da música e a paisagem que podia ser vista da onde estávamos era simplesmente magnifica. Era o melhor momento da minha vida. Quando saímos da rodovia, parou em Boulders.
  - AH, não acredito. - ele me olhou com a sobrancelha erguida, deve ser porque eu gritei.
  - O que foi?
  Vamos ver os pinguins? - podia jurar que o brilho dos meus olhos era maior que o das estrelas durante a noite.
  - Achei que você gostaria.
  - Claro, mamãe nunca me deixou ver eles.
  - Por qual motivo? - mexi meus ombros como resposta. - Vem, vamos pela plataforma. Assim ficamos mais perto deles.
  - Você quem manda. - seguimos pela entrada da plataforma e seguimos até o final dela, os pinguins estavam todos espalhados pela praia e eles eram bem maiores do que eu tinha imaginado. - Como eles são fofos.
  - Fica parada, preciso tirar uma foto disso. - só então notei que ele carregava com ele uma pequena bolsa preta, da onde tirou uma câmera de filmes descartável. Me encostei na grade da plataforma e meu maior sorriso apareceu.
  - Sua vez vai, me deixa tirar uma foto sua.
  - Certo, certo. – ele tomou meu lugar anterior e se posicionou para câmera, colocando as mãos na frente dos olhos e abrindo um sorriso lindo.
  - Você tomou café?
  - Na verdade, não.
  - Então vamos lá.
  Não era como se eu pudesse explicar. Nunca na minha vida eu tinha conhecido alguém como , descontraído, inteligente e interessante. Ele sempre sabia o que dizer e as coisas que ele fazia questão de dizer, ele sabia quando o fazer. Ele também era engraçado e me fez rir durante a maior parte do café da manhã, tenho até receio de dizer que jamais acharia uma companhia melhor que a dele.
  - Vamos lá, me deixa tirar só mais uma foto?
  - Só se você sair tirar comigo, não tem graça tirar fotos sozinha.
  - Tudo bem. – ele levantou o braço chamando a atenção da garçonete que nos atendia, pediu a conta e que ela tirasse a nossa foto.
  - Ficou linda, vocês formam um lindo casal. – ela disse entregando a câmera para e trazendo a conta alguns minutos depois. Saímos do restaurante com nossos braços entrelaçados falando como nós formávamos um belo casal.
  - O que acha de ir até o Cape Point?
  - Até a placa do Cabo da boa esperança?
  - Sim, podíamos ir ao farol também. Dizem que é muito bonito lá de cima. Também podemos dar uma volta na reserva natural e aproveitar para almoçarmos lá.
  - Por mim tudo bem.
  - Que horas você tem que estar em casa?
  - Tanto faz, eles não se importam com a hora que eu chego.
   não disse nada, apenas abriu a porta do carro para que eu pudesse entrar e correu para entrar do lado do motorista. Ele parecia animado.

Algumas horas mais tarde...

  Eram duas da tarde quando resolvemos voltar para o distrito da Cidade do cabo, fizemos o mesmo caminho de antes, dessa vez parando em V&A WaterFront.
  - E então? Onde vamos? Shopping? Aquário? Jardim botânico?
  - Podemos ir a V&A Craft Market and Wellness? Eles vendem alguns artesanatos bem bonito lá.
  - Certo, e eu aproveito e compro o seu presente.
  - Como assim?
  - É o seu aniversário, preciso te dar um presente.
  - Acho que você não entendeu direito o que esse dia está sendo para mim .
  - Então me diga o que está sendo.
  - Simplesmente o melhor dia dos meus dezesseis anos.
  - Por isso mesmo você merece um presente. Para jamais esquecer.
  - Eu não seria capaz de esquecer. – sorri para ele e pulei para fora do carro, esperando que ele me acompanhasse.
  Fomos andando pelo mercado de artesanatos, aquele era basicamente o mercado principal da cidade. Se você andasse muito para a esquerda sentiria cheiro de peixe, logo que você passava pelos portões você via algumas carnes penduradas, tinha até um leitão. Conforme você andava podia encontrar diversas barracas de frutas. Se fosse pra direita iria encontrar a sessão de doces e queijos. Mais ao fundo eram os vinhos. No segundo andar todo o tipo de artesanato que se pode imaginar encontrar. Andando por ali encontrei um colar curtinho bem bonito, o pingente era de um pinguim, fez questão de pagar para mim, disse que seria a lembrança do dia.
  - O que você acha de procurarmos algo para nós dois?
  - Como o quê? Não vou usar nada espalhafatoso.
  - Quem usa essa palavra?
  - EU uso, sou escritor lembra?
  - E por isso precisa engolir um dicionário de palavras... Como você diria? Ah sim, enfadonhas.
  - Basicamente sim, meu vocabulário precisa ser realmente extenso.
  - Bom saber que você alcançou seu objetivo de vida.
  - Esse não é nem de longe meu objetivo de vida.
  - E qual é?
  - Quero fazer algo maior pelo mundo. Me sinto um idiota dizendo isso, mas quero ser lembrado, quero que alguém me ache importante. Que eu passe um bom tempo sem contato algum com alguém e essa pessoa se lembre de mim por algo bom que eu fiz.
  - E eu quero ir embora daqui, um lugar aonde as mulheres tenham espaço para serem escutadas. Algum lugar onde eu possa construir uma família na hora que eu quiser, e não quando algum cara achar que pode colocar um filho em mim.
  - Foi assim com seus pais?
  - Não, mas meus pais se conheceram em um acampamento na Califórnia.
  - Faz sentido.
  - Sim, faz. – continuamos andando por entre as barracas e lojas que se dividiam ali dentro. – Achei. Vem. - Parei na frente de um serie de anéis, eles eram de coco e vendidos em pares. – Eu costumava ter um desses com meu irmão, mas acho que ele perdeu o dele.
  - Gostei desses aqui. – pegou um par na mão, onde os anéis tinham entalhado um sol e uma lua.
  - Então vão ser esses. Quanto é, moça? – tirei dinheiro de meu bolso, pagando a moça e andando ao lado de até a praça fora do mercado.
  - Vamos tomar um sorvete?
  - Você deve ter me achado gorda para me oferecer comida toda hora.
  - Na verdade, eu sou gordo e esfomeado e fico te oferecendo porque odeio comer sozinho.
  - Você não é gordo, você é bonito.
  - E você é sincera.
  - Eu tento ser, parece que com você é mais fácil que o normal.
  - Fico feliz em ouvir isso. Vai querer sorvete de que?
  - Eu vou com você.
  - Não precisa, pode sentar, eu vou lá buscar.
  - Então qualquer um de fruta.
  - Já volto.
  Quando se virou em direção a sorveteria, eu já parecia querer ver seu sorriso de novo. Ele era exatamente o tipo de cara que deixaria uma adolescente deslumbrada. Ele tinha as sobrancelhas em perfeita harmonia com seus olhos, o seu sorriso parecia brilhar mesmo durante o dia, ele tinha pequenas sardas em suas bochechas, inclusive em sua boca tão rosa. Parecia até que ele tinha passado batom antes de me encontrar aquela manhã, mas devia ser apenas resultado de todas as repetidas mordidas que ele deixava em seus lábios. Ele ficava incrivelmente sexy fazendo isso, e nem parecia a intenção dele, era sutil, como se fosse sem querer. Ele era bonito sem querer, seu cabelo bagunçado jogado pra cima, os lábios rosados, os dentes um pouco tortos, as sardas, os olhos castanhos que observavam tudo, o nariz que se franzia toda vez que era contrariado. Era lógico que eu não estava apaixonada, eu nem o conhecia. Poderia ser apenas uma adolescente, mas jamais seria boba. Aquela relação era mais como se eu estivesse encantada com o meu super herói favorito, bem ali na minha frente, me salvando como se eu fosse uma garotinha indefesa. E talvez eu realmente fosse.
  - Voltei, só tinha de kiwi. Espero que você goste.
  - É meu favorito.
  - Hm, sobre os anéis.
  - O que tem?
  - Qual você vai querer?
  - Me diz você, senhor das palavras enfadonhas.
  - Você parece estar mais feliz pela manhã, então aceito o da lua.
  - Você é tipo uma coruja?
  - O quê?
  - Uma coruja, sábia, calada, pensativa, símbolo da sabedoria.
  - Não sei se devo ficar lisonjeado pelas suas palavras.
  - Provavelmente sim, corujas são bonitas. Eu gostaria de ser uma, e elas aparecem em Harry Potter. – soltou uma risada abafada.
  - Você é como o que então? Um beija flor?
  - Um beija flor? Por que eu seria um beija flor?
  - Beija flor é um pássaro muito gracioso e delicado. Inspira doçura e alegria.
  - Acho que estou mais pra uma andorinha.
  - O que significa?
  - Esperança, pureza.
  - Beija flor.
  - Se você prefere, de qualquer jeito eu fico com o sol.
  - Você fica com o sol! – disse e sorriu pra mim de forma sutil. – Quer ir embora?
  - Podemos ir até o Green Point ver o sol se pôr?
  - Claro, mas acho melhor nós irmos agora.
  - Vamos.
  A volta até Green Point foi silenciosa, músicas de bandas regionais tocavam no rádio do carro. estava sempre sorrindo e sussurrando a letra de algumas das músicas e assim fomos nos aproximando de nosso destino. Quando chegamos lá, o sol estava começando a se esconder nas montanhas.
  - Você tem celular?
  - Tenho, quer o número?
  - Quero. – digitei meu contato no celular. – Vou te mandar uma mensagem, e então qualquer coisa que você precisar, é só me ligar. E se precisar fugir do país, eu conheço um cara que faz ótimas identidades falsas. – Ao olhar pra ele e sorrir, percebi que ele já não me olhava mais, consequentemente não viu o sorriso que dei para ele.
  - Obrigada, .
  - Imagina, esse meu amigo se diverte muito fazendo identidades falsas e ta sempre oferecendo para todo mundo.
  - Não por isso.
  - Pelo quê?
  - Por tudo, pelo passeio, pelo sorvete, pelo colar, por hoje. Foi de longe o melhor aniversario que eu já tive.
  - Você fala isso porque é o seu aniversário de dezesseis, espera até o de dezoito ou o de vinte e um. São bem mais legais.
  - Se você estiver neles aposto que sim.
  - Que horas você tem que chegar em casa mesmo?
  - Em pouco tempo.
  - Não é melhor nós irmos então?
  - Pode ser...
  Fomos andando em silêncio até o carro, mantinha suas mãos dentro do bolso e eu apenas segurava meus dedos com minha própria mão. A ida até em casa, foi bem parecida. Com a diferença que as mãos de meu acompanhante seguravam firmes no volante e não mais em seus bolsos. Eu não sabia o que dizer, nem para onde olhar e nem se era necessário que algo fosse dito. De qualquer forma.
  - Bem, está estregue. Espero que tenha gostado do dia.
  - A pior parte do dia está sendo ter que voltar pra minha vida normal.
  - Por que você não cria um mundo só seu?
  - Como assim?
  - Eu, como escritor, às vezes me canso desse mundo e crio um outro completamente diferente, onde eu sou sedutor e irreverente e faço tudo sem pensar, tenho vários amigos e uma modelo gostosa como namorada.
  - Mas eu não sou escritora.
  - E só por isso você não pode ser criativa e imaginar? Vamos lá, não é tão difícil quanto parece.
  - Como eu faço isso? Não tenho ideia.
  - Feche os olhos. – segui sua instrução, mas continuava focada nele, de uma forma que se eu abrisse meus olhos, eu veria os dele. – Relaxe, não pense que está olhando pra mim. Só relaxe, fique numa posição confortável. – Relaxei no banco do passageiro virando meu rosto para frente. – Agora vamos comigo, se você pudesse estar em algum outro lugar, qualquer um, onde estaria?
  - Acho que em uma praia bem bonita, do caribe talvez. Ou uma cidade grande, tipo New York ou até mesmo Tóquio.
  - Gosto de Tóquio.
  - Então estamos em Tóquio.
  - Eu estou com você?
  - Claro, com quem mais eu estaria? – mesmo com meus olhos fechados e olhando em outra direção, era como se eu pudesse senti-lo sorrindo.
  - E o que você se imagina fazendo em Tóquio?
  - Eu me imagino andando pelas ruas de lá, maravilha com todas aquelas luzes e cores e pessoas andando depressa, como se estivessem sempre atrasadas para estar em algum lugar importante.
  - E você seria uma dessas pessoas?
  - Acho que eu estaria mais para uma dessas pessoas que estaria tão deslumbrada por tudo que meus olhos estariam vendo, que ficaria parada. Sendo uma dessas pessoas que as que estão com pressa sempre esbarram.
  - Você seria diferente no meio da multidão.
  - É o que eu gostaria.
  - E depois?
  - Eu iria em uma dessas lojas que vendem todos os tipos de sorvete.
  - Todos os tipos de sorvete?
  - É, tipo de carne assada e frango a passarinho.
  - Mas eu pensei que você não comesse carne.
  - E não como, mas seria legal poder ter essas opções. Quero dizer, se eu tenho essas opções, imagina quantas outras eu não teria?
  - Está certo, e depois?
  - Eu gostaria de ir em uma balada de lá, que tivesse mais luzes do que do lado de fora.
  - Não foi tão difícil, foi?
  - Não. – disse respirando fundo e abrindo meus olhos. – O ruim é que sempre acaba.
  - Isso é imprescindível, tudo tem um fim, até a nossa vida. Mas não é como se deixássemos de viver só porque vamos morrer, certo? Com nossos sonhos, momentos bons e anseios é a mesma coisa. Não podemos evita-los ou deixar de tê-los só porque sabemos que mais cedo ou mais tarde vai acabar.
  - Da mesma forma que é impossível ser feliz o tempo todo.
  - Exato, e se por acaso fossemos, não apreciaremos da mesma forma que apreciamos. Por isso você valoriza tanto o dia de hoje.
  - O quê?
  - Você valoriza o dia de hoje porque raramente tem outros parecidos, por isso o dia foi importante, porque foi diferente.
  - Obrigada mais uma vez.
  - Não por isso.
  - Posso te pedir uma última coisa antes de ir. – disse cortando o silêncio que começava a se formar dentro do carro. Assenti assentir e engoli em seco sabendo a quão ousada eu estava sendo. – Você me daria um beijo? – franziu o cenho mordendo o lábio logo em seguida. – Deixa pra lá, não devia ter falado nada. – me apressei em pegar minha bolsa do chão e procurar a maçaneta do carro e ir embora o quanto antes.
  - Espera , espera. – Ele segurou sutil em meu pulso, me olhando firme. – Calma, só não entendi bem. Por que você quer um beijo meu?
  - Hm... É que, você sabe, eu nunca beijei ninguém.
  - E o Tafari? – me arrepiei dos pés, até meu último fio de cabelo ao ouvir esse nome.
  - Quando eu gostava de Tafari e queria beijá-lo, ele nunca me olhava. Depois de um tempo quando parei de dar atenção a ele e ouvi histórias sobre o que ele fazia com as meninas, eu só sentia medo. Nunca beijei alguém que eu realmente quisesse.
  - E você quer me beijar? – assenti relaxando meus ombros e vendo desviar seus olhos para minha boca. – Espera ai. – ele se virou e saiu do carro, pude ver ele correr até a minha porta, abrir a mesma e estendendo sua mão, me ajudou a ficar de pé. Senti sua mão segurar minha cintura, me puxando pro lado e me encostando na porta do banco traseiro. Eu sentia minhas bochechas coradas, envergonhada comecei a observar meus pés. Senti suas mãos ficarem mais firmes em minha cintura a medida que seus pés se aproximavam dos meus e o mesmo acontecia com nossos corpos. – Vem cá. – disse colocando uma de suas mãos em meu queixo, sustentando o mesmo para que pudesse encostar seus lábios aos meus.
  A boca dele apenas ficou sobre a minha por algum tempo, sem fazer muita força e nem mexer sequer um músculo. Aos poucos começou a mexer seus lábios e distribuir beijos sobre meus lábios, hora nos superiores, hora nos inferiores. À medida que seus pequenos beijos ficavam mais frequentes e mais firmes, pude sentir sua mão ir para a base de minhas costas, o que me fez abrir minha boca e permitir que encaixasse a sua na minha. Sua outra mão deixou meu queixo para segurar firme em minha nuca. Logo pude sentir sua língua tocar a minha e depois disso, não sei o que aconteceu. Ou melhor, sei. Mas não sei como posso colocar em palavras.
  - Então isso é um beijo de verdade. – disse sem graça, sorrindo ao ver nossos pés intercalados e nossos dedos da mão entrelaçados.
  - Normalmente sim, e eu não sou muito bom nisso e nem nada. Então, minhas sinceras desculpas.
  - De forma alguma iria aceitar suas desculpas, já que nunca tive um beijo de verdade. O seu foi o melhor. – ri completamente envergonhada de ter dito em voz alta. colocou os dois braços ao redor de minha cintura, como se me abraçasse e me levantasse ao mesmo tempo. Senti ele distribuir beijos rápidos sobre minha boca algumas vezes, abrindo os seus lábios em seguida para que pudéssemos nos beijar de novo. Ele terminou nosso beijo com mais alguns beijos rápidos e subiu os mesmos por minha bochecha, parando na minha testa. Algo em tudo que ele fazia, parecia ter cuidado e carinho.
  - Se cuida ok, pequena? E qualquer coisa, já sabe né? Só me ligar.
  - Já cansei de te agradecer por hoje.
  - Não precisa, eu já sei. Foi um ótimo dia para mim também.
  - Acho melhor eu ir, já escureceu. – Sai de seu abraço parar pegar minha bolsa e meus livros.
  - Até breve, pequena. – me deu um último beijo e me soltou, beijando minha testa. Corri atravessando a rua e parando em frente à porta para pegar minhas chaves. Olhei para trás vendo o mesmo encostado onde antes eu me encostava e mordendo os lábios ao mesmo tempo que sorria. Ele soltou uma piscadinha pra mim e antes que pudesse perceber, já tinha soltado uma risada. Respirei fundo e girei a maçaneta entrando em casa.

E não vale a pena ficar, apenas ficar, chorando resmungando.

  - Até amanhã, prima.
  - Até, Zack.
  Naquela semana foi como se quinta feira não tivesse existido, nem mesmo senti a presença dela. Passei tempo demais criando mundos diferentes para mim, que nem mesmo senti a sexta-feira passar. Não sei o motivo, mas estava aliviada de não encontrar Tafari no meio de minha criação de meus mundos, assim ele não atrapalharia minha imaginação e criatividade. Não consegui convidá-lo para o jantar de meu aniversário na noite seguinte, mas isso não significava que ele não apareceria. Minha mãe com certeza arranjaria um jeito de convida-lo, ela mesma. Durante o jantar daquela noite, enquanto me imaginava em Paris conversando com algum estrangeiro em um café perto da Torre Eiffel, minha mãe confirmou minhas suspeitas e ainda me questionou do porquê de eu não ter o convidado. Apenas disse que não o tive tempo durante aquela semana, o que eu desejava que fosse verdade.
  Na manhã seguinte fomos para casa de minha avó passar o dia, voltando no final da tarde para que minha mãe pudesse supervisionar nossa cozinheira e me forçar a usar um vestido verde musgo horroroso, que fiz questão de usar um short jeans por baixo. Aos poucos a casa ficou cheia de parentes e a família de Tafari. Eu me sentia completamente sufocada.
  - Filha, quero que cumprimente uma pessoa.
  - Só um segundo, mãe. Preciso ir ao banheiro.
  - Certo, filha.
  - Alô? – escutei uma voz cansada da pessoa que me atendeu.
  - , posso falar com o ?
  - Sou eu, quem fala?
  - É a .
  - Ah sim, . Tudo bem com você?
  - Na medida do possível, e você?
  - Estou cansado.
  - , er... Você não poderia vir até a minha casa?
  - Algo errado, pequena?
   - NÃO! Na verdade, sim. É aquele jantar que lhe falei lembra? Minha mãe me colocou em um vestido horrível e Tafari não para de me perguntar onde eu estava na quarta-feira e passar a mão em mim.
  - Certo, chego ai em 15 minutos.
  - Vamos filha, quero que o conheça e vamos servir o jantar em 10 minutos.
  - Tudo bem mãe. – disse abrindo a porta do banheiro e seguindo minha mãe até o quintal.
  - Querida, esse é Jared, ele é americano, dos Estados Unidos, é o novo sócio de seu pai.
  - Prazer Sr. Jared, sou .
  - Eu bem sei, seu pai fala muito de você, com orgulho.
  - É o novo sócio em quê?
  - Estou abrindo uma editora com seu pai em Johanesburgo. – após alguns minutos conversando com o futuro sócio do meu pai, sem saber o porquê estava sendo apresentada a ele, fomos interrompidos por nossa governanta dizendo que o jantar estava sendo servido. Enquanto seguimos até a sala de jantar a campainha tocou. – Deixe, vão na frente que eu abro. – observei os dois se encaminharem para a sala de jantar e corri para atender a visita. - Chegou cedo. – disse assim que abri a porta.
  - Vim o mais rápido que pude.
  - Chegou bem na hora do jantar, vamos? – segui com em me enlaço adentrando a sala que todos estavam reunidos e observando diferentes expressões nos convidados. – Esse é meu amigo, , ele vai se juntar a nós para o jantar. – Nesse momento as expressões de todos ali ganhavam mais força, enquanto meu pai e minha mãe tinham rostos em dúvida entre raiva e apreensão, Zack e Kênia dividiam um olhar de que sabiam exatamente o que acontecia. Jared apenas observava tudo com atenção enquanto meu irmão e Tafari mostravam grandes sorrisos, porem de natureza e origem diferente, uma vez que o de Tafari era completamente irônico. Enquanto isso Adelaide, a governanta, apenas se apressava em colocar mais um lugar na mesa.
  - Você o convidou? Pensei que tivéssemos feito a lista antes, como o combinado. – minha mãe se pronuncio quando nos sentamos e o jantar era servido.
  - Pensei que sendo meu aniversário, poderia convidar quem bem entendesse.
  - Pensou tanto desse modo, que convidou seu “amigo” e se esqueceu de seu próprio namorado.
  - Não namoro mais Tafari. – observei seu rosto perder o sorriso e ficar atônito, apenas tempo suficiente para que pudesse redobrar a ironia em seu sorriso.
  - Que história é essa, ? – meu pai levantou sua voz, fazendo todos ficarem apreensivos.
  - Filha, você não me disse que passou a tarde de seu aniversário com Tafari? Como pode ter terminado com ele? – olhei para que tentava parecer calmo.
  - Tem algo errado, não me lembro de ter visto nem sequer na escola durante seu aniversário. – pedi ajuda com olhos suplicantes para Zack e Kênia.
  - Como poderia, não é mesmo, Taf? Você sumiu da escola depois do almoço de terça-feira. Não seria possível ver na quarta e nem saber que fomos ao restaurante na terceira avenida para comemorar seu aniversário. – meu primo me salvou.
  - Eu tinha alguns problemas e precisei ficar em casa.
  - Mesmo, querido? não me conta mais nada. Foi muito grave?
  - Apenas um marginal que veio para cima de mim me bater, como sou pacifico e não gosto desse tipo de coisa, preferi apanhar e somente me defender. – cerrava os punhos e mastiga a comida com mais força do que o necessário para poder triturar arroz.
  - Tem uma coisa que ainda não entendi, com quem estava na tarde de seu aniversário minha filha? – meu pai me perguntou bravo.
  - Com .
  - Não só durante a tarde não é mesmo, boneca?
  - Como, Tafari? O que quer dizer? – minha mãe.
  - Precisei ir à escola quarta de manhã, antes do período começar e quando estava indo embora, vi entrar no carro de .
  - Matou aula? Com um estranho? – minha mãe continuava, ficando cada vez mais alterada.
  - não é um estranho, é um amigo que me conhecesse melhor que qualquer um sentado a essa mesa.
  - Isso é um abuso, te dou liberdade e é assim que a utiliza. Saindo com um estranho, matando aula e fazendo seu primo mentir por você. O que está acontecendo?
  - Aposto que tudo isso começou quando ela conheceu esse tal de . – Tafari disse ainda sorrindo.
  - Quem, afinal de contas, é esse rapaz que esta deturpando a cabeça de minha menina? – meu pai perguntou, assisti se levantar rezando para que não falasse além da conta.
  - Sou , nasci em Moçambique mas fui criado em Johanesburgo. Tenho vinte e três anos, sou escritor, pago minhas contas e cuido de meu pai. Sou eu o marginal que bateu em Tafari, e o faria de novo em vista que estava apenas defendendo sua preciosa filha. Se sua filha matou aula comigo, foi para tirá-la de uma rotina triste e sofrida a qual estava presa, não me arrependo de nada. Repetiria tudo isso e se sou eu o responsável pelo término de e Tafari, faço-me ainda mais feliz por saber que fui eu quem a deu o seu primeiro beijo verdadeiro e não esse verme a qual vocês tratam com tanto zelo e carinho. Desculpe-me, pequena, mas não posso ficar mais sentado em uma mesa a qual não sou bem visto. Recuso-me a ser persona non grata. Feliz aniversário e aos demais, uma ótima noite. Eu sei onde é a porta. – ele apenas se virou e saiu rápido, tão rápido quanto já estava no jardim, meu pai o alcançou e assim que olhou em seus olhos o acertou um soco.
  - Como ousas dizer tudo isso. Sabe que minha filha tem recém dezesseis anos? É sete anos mais velho que ela, quem pensa que é para deflorá-la? Desvirtuá-la. Fê-la matar aula para passar o dia com um total desconhecido. E ainda agredir fisicamente o filho de um dos donos desse lugar?
  - Sinto em dizer que não sou eu o marginal que está a estuprar sua filha constantemente, eu apenas lhe proporcionei felicidade e bons momentos e durante meu único beijo com ela, nem sequer me permiti usar de algum artificio que ultrapasse os limites de um beijo inocente. Quem está a deturpá-la, usá-la, não sou eu.
  - Para pai, não devia estar batendo nele. Ele não fez nada.
  - Não vê que está apenas te seduzindo? Que vai te usar, transar com você e te jogar no lixo? Ele tem vinte e três anos, o que poderia querer com você?
  - Pai, quem vem não me seduzindo para transar comigo, mas abusando de mim, não é . – corri para ficar ao lado do mesmo, e o puxei pelo braço. – Não quero ficar em um lugar onde a pessoa que me proporcionou o melhor aniversário é non grata. Passar bem. – puxei pelo braço para que pudéssemos entrar em seu carro.
  - Sabia que você era apenas uma vadia de quinta, não aguentou um homem de verdade, encantada com seus contos de fada, precisou ir atrás de um príncipe. – da mesma forma que eu segurava em um segundo, no outro ele tinha se escapado de meu braço, correu em direção a Tafari e lhe desferiu um soco em seu maxilar que o fez cair no chão. Corri em direção ao garoto caído no chão.
  - Você nunca será um homem de verdade enquanto continuar abusando de alguém. – desferi o chute mais forte que poderia dar entre suas pernas, o assenti se contorcer. Meu pai olhava tudo atônito e sorriso orgulhoso que dançava no rosto de meu irmão só significa uma coisa. Ele sabia de tudo desde o princípio e estava feliz de me ver abrir a boca. Corri para o carro de aproveitando que todos estavam surpresos demais para me impedir.
  - Pra onde vamos pequena?
  - Para qualquer lugar longe daqui.
  - É pra já. – ligou o som do carro e logo estávamos andando em alta velocidade. Lá estávamos nos outra vez, fugindo da minha realidade. Mas dessa vez, sem ser apenas minha imaginação. Não sei quanto tempo passou e nem onde estávamos, acabei me acomodando em uma jaqueta de e pegando no sono. – Chegamos.
  - Uma praia?
  - O primeiro lugar que você falou quando pedi para imaginar qualquer outro lugar, foi uma praia bem bonita no caribe. Bem, não é no caribe, mas é uma praia bem bonita.
  - É realmente linda.
  - Você surfa? – ele disse enquanto tirava sua camisa ao lado da caçamba de sua caminhonete.
  - Meu irmão me ensinou, mas não é algo que faço sempre. Nem sei se me lembro como é. – respondi enquanto ele tirava sua bermuda e ficava apenas de boxers.
  - Posso tentar te lembrar. – ele disse pegando sua roupa de borracha e logo em seguida abaixando a porta da caçamba. - Vai ficar de vestido?
  - Como sugere que eu fique? – o garoto que antes mexia em algo barulhento, se virou pra mim com um sorriso no rosto.
  - Posso. – disse depois de se aproximar do meu corpo, apontando para a barra de meu vestido. Apenas assenti observando seu maxilar travado. Ele segurou a barra de meu vestido, puxando o mesmo para cima. – Vai ser mais fácil se você levantar os braços, pequena. – levantei os mesmos sentindo o vestido sair de meu corpo. – É realmente um vestido muito horrendo. Veste isso. – me estendeu uma camiseta de borracha observando meu tórax e meu colo recém descoberto. Ele podia ver a vergonha que irradiava de mim, principalmente de minhas bochechas, e também a forma como eu mantinha meus braços em frente ao meu corpo. virou de costas, pegando outra peça de roupa e apontando dessa vez meu short. – Licença. – ele disse desabotoando meu short e fazendo força para que o mesmo deslizasse por minhas pernas. Ele encarou minhas pernas e agachou em minha frente, me estendendo uma peça preta, mas que não era de borracha. Era só um short comum de malha preta. – Melhor?
  - Uhum. – disse com meus olhos fixos em seu abdômen que continuava desnudo, já que ele ainda não tinha vestido seus braços em seu macacão de borracha.
  - Então vamos, leva essa pra mim? – me entregou uma prancha e segurou outra em seus braços, maior do que a que eu segurava. Caminhamos lado a lado até a areia em que pisávamos já estar molhada. Colocou a prancha na areia com força e todos os músculos de suas costas se enrijeceram. Ele terminou de vestir a roupa, fechando o zíper logo em seguida, pegou a prancha que carregava e me chamou para ir com ele. Não sei quanto tempo passamos dentro do mar, mas em algum lugar entre ele se exibindo com pequenas ondas e correndo atrás de mim pela areia, eu me senti em uma felicidade extrema. Era como se uma esperança ganhasse força dentro de mim e algo me dizia que os ventos, definitivamente, haviam mudado de direção.

Horas depois...

  - Vou te emprestas minha blusa favorita porque ela é que vai ficar “menos grande” em você ok? Mas já aviso que quero de volta.
  - Isso é um pretexto para me ver de novo?
  - Talvez, algum dia. – estávamos no apartamento de e após eu tomar um banho, vestir meu short, precisou me emprestar uma camiseta alegando que não deixaria aquele vestido de mal gosto entrar em seu apartamento. – Vem, acho que a pipoca tá pronta.
  - Vamos só comer pipoca enquanto jogamos baralho?
  - O que quer dizer?
  - Que temos que ver alguma coisa.
  - O que sugere?
  - Dr. House?

Ela gosta do tango, do dengo,
do mengo, domingo e de cócegas.
Ela pega e me pisca, belisca,
petisca, me arrisca e me enrosca.

**

  - , acho que tudo bem se hoje você me deixar na porta de casa.
  - Certo, estamos chegando já. – Depois de passar a noite na casa de precisava voltar pra casa encarar meu pai e o castigo que ele me daria. – Parece que seu pai está te esperando.
  - Já esperava por isso. – assim que ele estacionou o carro, meu pai começou a se aproximar do carro.
  - Será que os dois podem entrar? – encarei esperando uma resposta.
  - Tudo bem. – seguimos para dentro de casa e nos sentamos no sofá da sala, minha mãe me abraçou chorando e se sentou ao meu lado.
  - Minha filha, por que você não disse nada antes?
  - Ele me ameaçou e por mais calma que pareço estar, por dentro estou apavorada de medo que ele faça alguma coisa, com vocês.
  - Não precisa se preocupar, filha. – meu pai sentou na mesa de centro, de frente para mim, minha mãe e . – O pai de Tafari lhe deu uma surra depois que vocês saíram e ele irá para o colégio militar só para meninos.
  - Mas pai, isso só vai deixá-lo mais forte. Ele vai voltar e acabar comigo.
  - Muito pelo contrário, lá ele ia aprender a ter disciplina e respeito. Será um homem melhor e de qualquer forma ele estará muito longe daqui.
  - Onde?
  - Uganda. Ele ficará bem, você também. Tudo que você precisar, é só me pedir.
  - Certo papá, agora eu queria mesmo era tomar café da manhã.
  - A mesa está posta na cozinha, imaginei que fosse chegar com fome. Sua mãe lhe fará companhia.
  - Vem , vamos tomar café.
  - Não! Ele fica, preciso ter uma conversa com ele... Em particular. Estaremos em meu escritório.
  - Mas pai...
  - Nem mais pai, nem menos pai. Sua mãe está te esperando na cozinha. – assenti vendo se levantar e sorrir me tranquilizando, corri até ele segurando em sua nuca e lhe dando um beijo rápido. Olhei para o meu pai e seu rosto estava fechado enquanto tinha uma risada brincalhona no rosto.
  - Você não gosta de mim, mas sua filha gosta. – isso foi a última coisa que ouvi antes de correr para a cozinha e depois daquilo, não vi de novo, nem ouvi sua voz.

Dois anos depois...

  - Vamos , só temos que voltar no pôr do sol. – essa era minha amiga Alexis, ela era um intercambista da França, e por estar morando em minha casa a quase um ano, acabamos virando grandes amigas.
  Agora que estávamos com 18 anos, meu pai havia nos mandando para Johanesburgo para que pudéssemos ter nossa primeira viagem como formandas. Estávamos na cidade há 2 dias e hoje iriamos visitar o Zoológico.
  - Quero ir até a parte em que podemos interagir com os animais.
  - Ah, então é para a esquerda, você está voltando pra entrada.
  - Desculpa se é você quem está olhando o mapa.
  - Vamos logo. – Alexis era bem hiperativa e sempre me arrastava pra todos os lados. – Olha que gato, será que ele trabalha aqui?
  - Lógico que ele trabalha, ele está com um colete do zoológico.
  - Então ele é meu, vi primeiro. – o instrutor estava dando explicações para algumas crianças com um filhote de macaco no colo e conforme nos aproximávamos, eu podia ver o sorriso dele, um sorriso que eu jamais esqueceria.
  - Acho que fui quem vi ele primeiro Alexis, mas eu deixo você ficar com o Zack.
  - Falando nele, onde será que ele está?
  - Deve estar... Olha ele ali.
  - Zack, oi! – Alexis disse indo em direção a meu primo enquanto eu era movida pelo sorriso que eu não via a tanto tempo.
  - Licença, é com você que eu tenho que falar para poder dar mamadeira pros filhotes?
  - É comigo mesmo. – ele disse se virando para mim. – Qual dos filhotes?
  - Algum felino?
  - Vem cá. – ele disse apontando com a cabeça uma jaula um pouco a frente, seguimos para lá em silêncio. Algo me dizia que ele não me reconhecia. – Aqui. – segurei aquele filhote de tigre em mãos e fiquei fazendo carinho atrás de sua orelha.
  - Sabe , eu tenho todos os seus livros, eles são muito bons. – ele se virou para mim, estendendo a mamadeira e ficando ao meu lado.
  - Agora que já tem dezoito anos pode falar com um cara de vinte e cinco?
  - Eu te abraçaria agora, mas não quero soltar essa coisa fofa.
  - Kenan, o nome dele.
  - Oi Kenan, você é lindo e muito fofo. Se eu pudesse te levava pra casa.
  - Acho que seu pai não ia gostar. – depois disso ficamos em silêncio, quando o pequeno Kenan acabou com o leite da mamadeira, pegou ele e colocou de volta na jaula. – Podemos dar uma volta?
  - Claro, mas não vai te atrapalhar?
  - É meu horário de almoço.
  - Achei que não se lembraria de mim depois de todo esse tempo.
  - Eu nunca esqueceria. Foi isso que você me disse no seu aniversário de dezesseis anos.
  - E eu não esqueci. Foi realmente o meu melhor aniversário.
  - O que você faz aqui?
  - Meu pai achou que seria bom eu ter umas férias antes da faculdade.
  - E ele te mandou pra cá? – ele soltou um riso irônico.
  - Não entendi qual o problema.
  - Por que você nunca mais me ligou?
  - Porque você disse que me ajudaria quando eu precisasse e depois daquele dia eu nunca mais precisei e nem consegui pensar em uma desculpa para ir atrás de você.
  - Agora sabe porque EU sumi?
  - Porque meu pai te disse alguma coisa, óbvio. Você subiu para conversar com ele depois que eu te beijei e depois não te vi e nem nunca mais ouvi falar de você.
  - Quando eu entrei no escritório de seu pai, ele me abraçou e me agradeceu, mas disse que me queria longe de você. Que eu era muito velho. Como foi que ele disse? Ah sim, “pessoa certa, momento errado”.
  - Só eu que não entendi?
  - Eu também não tinha entendido e então ele começou a falar muito rápido. Disse que por mais que eu fosse o cara certo, o momento não era para ficarmos juntos porque queríamos coisas diferentes e ele tinha medo que eu quisesse fugir com você.
  - Não que fosse uma má ideia.
  - Também acho, mas não morda seu lábio de novo. – ele disse sério. – Eu não estava entendendo o que ele queria dizer, como eu poderia me afastar de você assim, sem mais nem menos? Por favor não fique brava comigo. Ele me ofereceu um contrato, onde todos os livros que eu conseguisse escrever iriam ser publicados. Eu aceitei na hora, mas haviam algumas consequências.
  - Uma delas era que você deveria parar de me ver.
  - Basicamente sim, ele me ofereceu um apartamento aqui e um emprego fixo onde eu pudesse trabalhar minha criatividade. Acontece que o contrato tinha prazo de dois anos.
  - Deixa eu adivinhar, seu contrato acabou no dia do meu aniversário de dezoito anos.
  - Bem, sim. Mas eu mandei um último livro e eu espero que ele seja bom o suficiente para ser publicado, apesar do meu contrato ter expirado.
  - Tenho certeza que vai ser.
  - Você não ouse mexer um pauzinho sequer para que isso aconteça.
  - Não iria fazer isso, mas mesmo que ele não seja publicado, você já tem certo nome se quer saber e mesmo se a editora do meu pai não te aceitar, não acho difícil que outro aceite.
  - Certo, mas chega de falar de mim. E você?
  - Minha vida ficou chata depois que você passou por ela. Eu fiquei mais livre e agora me imponho mais. Não arranjei outro namorado. Tenho uma amiga nova que veio da França para fazer intercâmbio aqui. E bem, eu passei na Universidade de Tóquio.
  - Sério? – perguntou surpreso e assim que me viu assentir, me abraçou me levantando no ar. – Você vai fazer o quê?
  - Artes e ciências.
  - Não acredito, você não faz ideia de como fico feliz por você.
  - Consegui perceber.
  - Foi tudo que você sempre quis.
  - Nem tudo.
  - O quê?
  - Seu contrato acabou, não é?
  - Sim.
  - E eu já sou maior de idade.
  - Isso eu sei.
  - Você tem mais alguma coisa que te prenda aqui?
  - Não. - falou desconfiado.
  - Vem comigo pra Tóquio? – perguntei mordendo o lábio e vendo abrir o sorriso que eu tanto gostei, desde a primeira vez que o vi.
  - Só com uma condição.
  - Qualquer coisa.
  - Não pare de morder sua boca nunca mais.

  Mais vale uma filha na mão,
  Do que dois pais sobrevoando.