I Want You to Stay
Escrito por Bih | Revisado por Thaís
Capítulo único
Fechei a quarta e última mala. Era definitivo: eu iria embora hoje e talvez nunca mais voltaria.
- , você não pode estar falando sério... – praticamente sussurrou. Ela estava encostada no batente da porta, observando-me com os olhos tristes. Seus braços estavam cruzados embaixo dos seios, dando-os certo volume, vestia um moletom branco da Gap e um shorts curto, apesar do frio que fazia e um coque malfeito segurava seus cabelos ruivos, deixando alguns fios caídos. Extremamente linda.
No entanto, sua beleza não a ajudaria a manter-me por perto.
- Eu sinto muito, . Mas eu estou falando sério. – disse, fitando-a nos olhos.
uma vez me falara que gostava que as pessoas a olhassem nos olhos quando queriam dizer algo muito sério. Ela dizia que “os olhos são as janelas da alma" e que podia ver a verdade através deles. E eu apenas dei de ombros, não ligava muito pra que olhassem bem no fundo dos meus olhos para me dizerem a verdade.
Nunca consegui mentir para .
- , por favor...
- , eu já decidi. Não posso mais viver com essa situação, isso está acabando comigo. – falei com firmeza. Ela não faria eu dar um passo para trás.
Imagino que você, caro leitor, esteja um pouco perdido: , como assim você vai embora? Dar um passo para trás?
Eu e somos num casal desde o verão de 2008, mais exatamente dia 21 de Julho. Durante os dois primeiros anos de namoro tudo foi um mar de rosas: ficávamos juntos o tempo inteiro, tínhamos jantares românticos pelo menos uma vez por mês, sempre assistíamos nossa série favorita juntos e nos entendíamos perfeitamente.
Contudo, como diz o ditado “Tudo que é bom dura pouco", as pétalas das rosas viraram espinhos e o mar calmo virou um maremoto. Passamos a brigar diariamente por coisas bobas como “Hoje é o seu dia de lavar a louça e não o meu", “Muda de canal, eu odeio esse programa" ou então “Eu estou afim de jantar pizza hoje". Acabamos por ficar impacientes e incompreensíveis, tornamo-nos incapazes de suportar nem mesmo a voz um do outro, levando-nos de um namoro perfeito a um relacionamento obrigatório. Nossas opiniões divergiam mais e mais a cada dia que se passava. E você deve estar se perguntando: Então por que ainda ficaram por mais três anos juntos? Simplesmente porque imaginávamos que era apenas uma fase ruim. Afinal, todos os casais passam por dificuldades, certo? Tanto eu quanto pensamos que estávamos tendo o nosso tempo ruim. Entretanto, mais três anos se passaram e a coisa apenas ficava pior. As discussões se transformaram em brigas. Tinha dias que eu ao menos conseguia olhar na cara da minha própria namorada, tinha de pegar uma muda de roupas, meus pertences higiênicos e algum passatempo e ir direto para um hotel. Às vezes, ficava por uma semana longe de casa. Estabelecia-me na casa de um amigo ou dos meus pais. Quando achasse que já tinha esfriado minha cabeça, voltava para o meu lar. Eu sempre voltava. E tudo sempre acontecia novamente.
Em suma: eu aguentei pelo resto dos três anos. Mas, como ninguém é de ferro, certo dia eu explodi. E com “certo dia" eu quis dizer “Cinco dias atrás". Gritei com , soltando tudo que estava entalado em minha garganta durante esses anos difíceis. Ela também gritou comigo, porém perdeu o controle: agarrou o vaso que temos na nossa sala de estar e atacou em mim. Como era de vidro, ele se despedaçou ao cair no chão, fazendo alguns pedaços de vidro entrarem em minhas pernas e pés. Nunca fui o cara que se permitia chorar na frente de outras pessoas, mas naquele momento, a dor falava mais alto. Chorei. Agarrei minhas pernas e deixei que todas lágrimas presas dentro de mim rolassem pelo meu rosto. ficou estática. Só depois de alguns minutos, notou o que tinha feito e correu para me ajudar. Afastei-a de mim, fazendo-a chorar também. Não me importei. Se eu fosse uma bomba, com certeza aquele tinha sido o momento em que a faísca chega exatamente no lugar em que tem que chegar para explodir.
Chamei um táxi e pedi para o motorista me levar para o hospital mais próximo, não tinha condições de dirigir. O homem deve ter ficado assustado ao ver minhas pernas jorrando sangue, mas apenas assentiu, dirigindo o mais rápido que podia. tentou ir atrás de mim. Ligou-me desesperadamente várias vezes, mas eu a ignorava. Só voltei a falar com ela ontem, quando liguei avisando que iria pegar minhas coisas na casa. Desliguei rapidamente ao ouvi-la protestar. E hoje, estou aqui, com as malas prontas e com a decisão certa, eu espero, em minha mente.
- Adeus, . – acenei, fechando o porta-malas do carro e entrando no mesmo. Nem ao menos virei meu rosto para observá-la depois de ligar o carro. Assim seria mais fácil. Dei a partida e fui embora, sem olhar para trás.
***
Uma semana depois...
- Ei cara, se anima! Já faz uma semana. Você tem que superar. – bateu em meu ombro, tentando consolar-me. Ofereceu-me um shot de tequila e eu apenas neguei com a cabeça.
Desde que terminei com , vinha me sentindo um pouco vazio. Não sentia vontade de comer, de conversar, de sair, de festejar, de beber e minha única vontade era de ficar em casa, deitado na cama, observando o teto, o céu e muitas vezes, o nada. Meu olhar se perdia o tempo todo. , meu melhor amigo, acolheu-me. Ofereceu sua casa como moradia provisória e sua pessoa como ouvinte e psicólogo. Ele se esforçava para me ajudar o tempo inteiro: insistia que eu comesse algo nas refeições, compreendia quando eu precisava de espaço, convidava-me quando saía, apesar de negar o convite o tempo inteiro.
Entretanto hoje cedi a seu pedido e acompanhei-o até este bar. Prometi a ele que iria me esforçar ao máximo para esquecê-la.
- Desculpa , eu não devia ter aceitado vir com você. Estou apenas te atrapalhando.
- Atrapalhando? Deixou a noção em casa? – encarou-me incrédulo. – Eu te trouxe aqui para te reanimar! Faz dias que eu não vejo um sorriso nesse teu rosto. Aliás, faz meses!
Encarei minhas mãos. Estas estavam mais finas e brancas que o usual, a falta de uma alimentação saudável e algumas horas exposto ao sol eram evidentes. Minhas roupas eram talvez um pouco inadequadas para a situação em que me encontrava, embora eu não estivesse dando a mínima para isso. Sentia-me mal por não me esforçar mais, ou então pelo menos aparentar estar bem por .
- , eu realmente queria... – comecei a falar, mas fui interrompido pelo alto som do microfone sendo batucado.
O homem de bigode e sombreiro, provavelmente o dono do bar, batia e falava “testando 1, 2, 3" no microfone, silenciando todos os presentes aos poucos. Depois de alguns minutos finalmente se pronunciou:
- Olá, boa noite a todos vocês. Hoje temos uma convidada especial que pediu para se apresentar aqui no palco. – levantou a caneca de cerveja que segurava para o alto e anunciou: - Uma salva de palmas para !
Arregalei meus olhos ao ver subir ao palco com um violão. Ela estava elegante: usava um vestido preto simples que era um pouco colado ao corpo, ressaltando suas maravilhosas curvas; uma jaqueta preta de couro cobria seus ombros. Nos pés calçava belíssimos saltos altos, aqueles que parecem pequenas botas... Não lembro o nome. Ankle Boots? Acho que era isso. Não sou muito bom com nomes de roupas e sapatos, então perdoe-me pela minha breve descrição. O que eu descrevi não é nem um quarto do quão bonita ela estava.
No entanto, seus olhos me intrigavam. Não aparentavam felicidade, nem mesmo ansiedade. Os olhos verdes que eu tanto amava e ainda amo estavam tristes, tinham perdido seu brilho usual. Perguntei-me se estavam assim apenas hoje ou se há três anos, quando as brigas começaram.
- Hm, olá. Boa noite a todos. – ouviu-se um coro de “boa noite". – Primeiramente, eu sou a . Essa é a primeira vez que vou cantar na frente de uma plateia de verdade. Digo, acho que shampoos e condicionadores não são exatamente uma plateia. – ela riu envergonhada. Sorri fraco. – Vou cantar uma música chamada “Stay" da cantora Rihanna. Eu dedico-a para uma pessoa que foi muito especial na minha vida e mesmo que ela não saiba, ainda é. E que eu percebi que não posso mais viver do mesmo jeito sem ela.
colocou sua mão em meu ombro e perguntou-me por seus olhos se eu realmente queria ficar e assistir àquilo. Assenti e então voltei a me concentrar em .
All along it was a fever
A cold sweat hot-headed believer
I threw my hands in the air, I said “show me something"
He said “if you dare come a little closer"
Ela cantava com os olhos fechados, dedilhando os acordes do violão levemente. Sorri. sempre quisera ser cantora profissional, mas tinha medo de palco e eu mesmo a incentivara inúmeras vezes, mas nunca tivemos resultados positivos. Agora ela estava lá, sentada em um palco mesmo que pequeno e improvisado, fazendo uma das coisas que mais amava.
Round and around and around and around we go
Ohh, now tell me now tell me now tell me now you know
finalmente abriu seus olhos, mas direcionou-os para o teto. Quando olhou para frente, sua vista encontrou a minha. Tentei sorrir, mas foi uma tentativa em vão. Percebi, mesmo de longe, que ela segurou todo o ar que tinha. Voltou a cantar, mas seu olhar não desviava do meu.
Not really sure how to feel about it
Something in the way you move
Makes me feel like I can’t live without you
It takes me all the way
I want you to stay
Senti minha garganta queimar e queria gritar, mas não podia. Afinal, fui eu quem foi embora, não é mesmo?
Ohh the reason I hold on
Ohh ‘cause I need this hole gone
Funny you’re the broken one but I’m the only one needed saving
‘Cause when you never see the lights it’s hard to know which one of us is caving
Uma parte de mim dizia para sair correndo e voltar para ela. Outra, para continuar seguindo em frente.
Pensei em como os três últimos anos tinham sido difíceis e como tinham me estragado por dentro. Por outro lado, se aguentamos todas as brigas por muito mais tempo que o normal, então significa que nos amamos de verdade. Certo?
Balancei a cabeça, tentando afastar os pensamentos que me rodeavam. Disse a mim mesmo que tinha feito a escolha certa: acabar com o relacionamento.
Not really sure how to feel about it
Something in the way you move
Makes me feel like I can’t live without you
It takes me all the way
I want you to stay
segurava-se para não chorar. Seu nariz estava vermelho e lágrimas teimavam em cair, sua voz ficava mais fraca conforme cantava. Senti um aperto no meu coração.
Antes que eu pudesse reagir, derrubou o violão chamando atenção de todos, e saiu correndo do palco. Não pensei duas vezes e corri atrás dela, deixando para trás.
Encontrei-a na calçada, sentada no chão e chorando desesperadamente. Agachei-me ao seu lado e passei o braço pelos seus ombros, puxando-a para um abraço. Entretanto, sua reação não foi a que eu esperava:
- ME SOLTA, ! – empurrou-me e gritou, ao mesmo tempo em que se afastava de perto de mim. Primeiramente fiquei sem reação, então continuei sentado no meu lugar, só depois voltei ao mundo real e então me levantei, aproximando-me dela.
- , calma, eu... – tentei dizer algo, mas ela me afastou novamente. Bufei.
- , desde o dia que você me deixou, eu tenho estado na fossa. Chorava todos os dias e todas as noites, pensando em nós. – apontou o dedo para o meu rosto. – Perdi no mínimo 5kg e toda minha vontade de viver se esvaiu. Você me deixou pensando apenas em você. Eu nunca mais quero te ver.
Ela andava de costas, sem olhar para trás. Ia protestar quando ouvi uma buzina alta e fui cegado por luzes amarelas fortes. Gritei para , porém já era tarde demais.
***
Dois meses depois...
Hoje faz exatamente dois meses que fora atropelada pelo carro em alta velocidade. Lembro-me como se tivesse acontecido ontem. Ainda acordo no meio da noite suado e gritando para ela correr.
O acidente paralisou-a não apenas nos movimentos, mas também na vida. Ela entrou em estado de coma e desde então, nunca mais acordou. Visito-a todos os dias, carregando um buquê de flores junto à mim. Sempre faço carinho em sua testa, digo que sinto sua falta e canto sua parte preferida da última música que apresentou antes do acontecimento: I want you to stay.
FIM
n/a: Olá, caras leitoras! Primeira songfic no atf para o Projeto Songfic! Espero que tenham gostado porque eu, sinceramente, achei que esta foi a melhor songfic que escrevi até agora. Anyway, deixem suas opiniões nos comentários! É sempre bom saber quem gostou e quem não gostou do seu trabalho.
Xx, Bih.