It Will Be Alright

Escrito por Jozi Barbosa | Revisado por Mariana

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Remember everything will be alright. We can meet again somewhere... Somewhere far away from here.
(Lembre-se que tudo ficará bem. Podemos nos encontrar de novo em algum lugar... Algum lugar longe daqui).

  A chuva caia com força do céu de Londres quando a porta de entrada de uma das mais simples e pequenas bibliotecas da cidade foi aberta. demorou alguns segundos para fechar a porta atrás de si após ter adentrado o lugar. Ele passou suas mãos pelo tecido de suas roupas tirando dali as gotas de chuva que tinham o molhado no curto caminho que ele fez do carro que parou em frente ao prédio até a porta de entrada do local. tinha esquecido seu guarda-chuva em casa.
  Como era de se esperar o lugar era pequeno, mas acolhedor talvez graças ao aquecedor que estava ligado ou ao cheiro de cafeína que tomava conta do ambiente que apesar de não ser tão grande tinha um balcão com anúncios de vários tipos diferentes de café, sucos, sanduíches naturais e até mesmo sorvete. Este balcão ficava um pouco atrás do que tinha uma mulher sorridente perto de uma tela de computador. entendeu que deveria falar com essa tal mulher antes de sair adentrando o local e se sentar em uma das mesas e cadeiras que haviam por ali.
  Ele teve que fazer um pequeno cadastro com Lindsen, a mulher do computador, antes de ser autorizado para usar tudo que a livraria oferecia. Na verdade, não queria muito dali. Ele não pensava nem em pegar um dos livros das prateleiras nas estantes. Talvez comprasse um café. Só.
  Aquela não era uma das maiores livrarias que tinha pisado em todos os seus vinte e dois anos de idade, mas tinha o que ele precisava no momento; silêncio. só precisava disso. De silêncio. Ninguém o pedindo uma foto, autografo ou vídeo para um parente que ele nem fazia ideia se existia. Aquele lugar pequeno localizado em uma das esquinas de uma das ruas de Londres tinha o que nem sua casa estava tendo ultimamente; paz e tranquilidade.
   caminhou em direção ao balcão da pequena área de lanches ao que decidiu buscar um café antes de procurar por alguma mesa. Pediu por um café americano e se sentou em um dos bancos vagos na frente do balcão de bebidas para esperar até que seu pedido estivesse pronto. Aproveitou esse meio tempo para guardar sua identidade, que usou com Lindsen, de volta na bolsa de lado que carregava consigo desde que saiu de casa naquele dia pela tarde para uma entrevista em uma rádio, e tirou dali de dentro seu pequeno caderno de capa marrom e uma caneta que ficava agarrada ao caderno. Ele pagou ao atendente quando o copo com o liquido quente foi lhe entregue. Sua bebida estava quente o suficiente para aquecer sua mão que segurava o copo.
  Para chegar até a mesa que o agradou assim que a viu quando adentrou o lugar, caminhou por boa parte da biblioteca. Observou os títulos que tinha nas estantes e quase pegou um livro para ele. Quase. Só não pegou o livro grosso de capa dura, pois precisava anotar em seu caderno o que tinha em mente antes que a possível-nova-música saísse de sua cabeça.
  A mesa escolhida foi uma que ficava próxima à janela e bem longe de todo possível barulho que o espaço do café fosse fazer. Ele colocou sua bolsa, seu café e seu caderno em cima da mesa, se sentou no estofado da poltrona que cercava a mesa. Olhou para a janela ao seu lado e sorriu sozinho e para si mesmo vendo a chuva que caia na cidade através do vidro.
   gostava da sensação de se sentir nulo em meio a tantas pessoas. Gostava quando não tinha ninguém o seguindo e se sentia um gênio quando encontrava algum lugar que lhe dava a certeza de que a mídia jamais o procuraria por ali. Ser famoso lhe oferecia coisas boas... Coisas maravilhas. Realizar seu sonho de espalhar suas músicas e seu amor por aí, era uma dessas coisas. Porém, nada supria a sensação de ter privacidade. De não ter pessoas atrás de si com um único interesse: sua atenção por ser um cara famoso.
   bebeu um pouco de seu café vendo as gotas da chuva batendo e deslizando no vidro da janela ao seu lado, ergueu um pouco as mangas de seu casaco que era grande o bastante para cobrir suas mãos, bagunçou seu cabelo do jeito que sempre fazia o jogando de lado e abriu seu caderno marrom. A página aberta fora a que ele marcou dias atrás com a tira de marcações que vinha no próprio caderno. Leu as duas frases que escreveu ali da última vez e segurou sua caneta pronto para começar a anotar todas as outras palavras que estavam em sua mente quando o ato foi interrompido.
  - Boa noite. Com licença, mas você não pode ficar aqui. – Lindsen, a moça que fez seu cadastro e aparentava não ter mais do que quarenta anos parou ao lado da mesa onde estava e o avisou. Ele ergueu sua cabeça com um semblante que transparecia a confusão que aquela afirmação o causou.
  - Não posso? – Questionou a mulher que sorriu fraco para ele e suspirou antes de respondê-lo.
  - Não, essa mesa é reservada. Logo ela estará aqui. Então, por favor, se você puder ir para outra mesa... – A voz da mulher soou de forma suave fazendo com que automaticamente se lembrasse de sua mãe. Elas duas usavam o mesmo tom de voz quando queriam que o menino fizesse algo, e isso o incomodava porque ele não queria sair daquela mesa.
  - Ela? Não tem o nome de ninguém aqui. – Ele argumentou e a mulher continuou o encarando.
  - Eu sei que não colocamos o nome dela aqui, mas... Só, por favor. Desculpe-me por isso, mas eu realmente preciso que você desocupe essa mesa. Eu posso te dar outro café! De graça!
  - Eu não quero um café de graça, só quero ficar aqui. – falou e Lindsen não mudou de postura, apenas fechou os olhos por alguns segundos e os abriu novamente para encara-lo. – Ok, eu saio. – Ele bufou após sua mente o dizer que não atender ao pedido de Lindsen seria o mesmo que não atender a um pedido de sua mãe. E jamais negou ou negaria algo a sua mãe. – Posso ao menos ficar ali? – Perguntou apontando para a mesa que estava ao lado da que ele estava, porém, não tão próxima à janela.
  - Sim, sim. Qualquer outra mesa. – Lindsen garantiu ao que o assistia pegar suas coisas e ir para a mesa do lado. – Obrigada, de verdade.
  Ela o agradeceu e sorriu por educação para a mulher que saiu de perto dele o deixando sozinho. Sozinho e se questionando o porquê de não poder ficar na mesa que estava. Se o lugar estava mesmo reservado, deveria haver um papel avisando. E principalmente; queria saber por que Lindsen estava tão apreensiva com a saída dele da outra mesa. Algo lhe dizia que não era apenas pelo dinheiro que a pequena biblioteca deveria ganhar com o aluguel da mesa.
  Será que teria um ensaio fotográfico ali e queriam a visão da janela? Não, se fosse isso o estabelecimento estaria fechado para o público.
  Tinha algo a mais ali. E ficaria ali até saber do que se tratava.

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  Já tinha se passado quase uma hora que estava ali, e graças à interrupção de Lindsen algumas frases tinham sumido da mente do garoto que ficara todos os minutos desde que trocara de mesa se perguntando o porquê de aquilo parecer ser tão importante para a mulher mais velha. Ele batucava com a caneta na mesa de madeira ao que tinha sua cabeça apoiada em sua outra mão e criando diferentes motivos que explicassem a importância que a mesa próxima à janela tinha para a tal pessoa que Lindsen se referiu.
   escutou a voz de Lindsen e isso fez com que sua postura mudasse e ele ficasse ereto. Lembrou-se das palavras da mulher que falava igual a sua mãe e esperou que quem tivesse chegado fosse a tal pessoa que fora mencionada minutos atrás, caso contrário, ele não saberia mais esperar pela chegada da pessoa que o fizera sair da mesa ao lado da janela.
  Se esperava por uma mulher bem arrumada, com saltos agulhas, um notebook em mãos e com bolsas pesadas que deveria contar vários livros ou contratos importantes de uma empresa renomada, ele se enganou. E se esperava realmente por uma equipe que faria um ensaio fotográfico ali havia se enganado em dobro. Ele franziu as sobrancelhas no exato momento em que uma garota que com certeza não tinha nem o seu tamanho se aproximou da mesa que ele estava. A menina usava calça jeans, tênis pretos, um casaco grosso de moletom com capuz que estava em sua cabeça e tinha uma pequena bolsa de lado pendurada em seu ombro. Ela tinha um copo de café em mãos e não parecia em nada com alguém que precisava daquela mesa só para si a ponto de não conseguir ficar em nenhuma outra caso aquela estivesse ocupada.
  A garota se sentou no assento macio que ocupou minutos atrás, colocou seu copo de café no mesmo lugar que ele havia colocado o seu. Colocou sua bolsa ao seu lado como ele tinha feito e se levantou saindo dali e sumindo do campo de visão de que esperou ela voltar do caminho que fez até as estantes de livros. Ela retornou com um livro grande e de capa dura o colocou e o abriu no mesmo lugar que tinha colocado e aberto o seu caderno. A menina tirou o capuz do casaco e para a surpresa de , os fios de seu cabelo tinham algumas mechas pintadas de azul. Não um azul claro como o céu quando está de dia ou escuro como quando está de noite, mas um azul que era notável e reconhecível.
  Ela segurava as mangas de seu casaco mesmo que elas quase cobrissem suas mãos completamente. Às vezes bebia um pouco de seu café e ficava um bom tempo encarando as páginas abertas na sua frente. já tinha a visto pegar um pequeno caderno de sua bolsa anotar nele alguma coisa usando uma caneta de tubo rosa e continuar a ler o que quer que aquele livro se refira.
   continuou encarando a menina que não o olhou de volta por um longo tempo. Continuou observando ela que tinha toda sua atenção presa ao seu livro de geografia. Oh, sim, tinha esticado seu pescoço o máximo possível em algum momento para ver uma das páginas do livro e se surpreendeu quando encontrou diversos mapas e assuntos que só poderiam ser tratados na matéria geográfica.
  Não era como se o menino tivesse tido seu ego de famoso ferido quando foi expulso da mesa que ela ocupava, mas sua curiosidade em saber o porquê da menina ficar somente naquela mesa o prendia a ela.
  Talvez ela tivesse algum TOC e só pudesse terminar o livro que estava lendo porque foi ali que começou a fazer suas anotações da geografia do mundo. Talvez ela só gostasse de ler naquela mesa por causa da janela e da vista que tinha de Londres. Ou, talvez, algo sério e de valor sentimental tivesse acontecido com ela naquela mesa e por isso ela não poderia sair dali. Seu namorado a pediu em namoro enquanto estavam sentados naquela mesa? Ou seu ex-namorado terminou com ela ali? Ela tinha visto seu ex-namorado a traindo ali? Ou, teria sido naquela mesa que seu pai a ensinou geografia antes de sair de casa e deixa-la sozinha com sua mãe porque ele tinha uma paixão com sua secretária?
  Seja lá o que fosse iria descobrir. Nem que para isso ele tivesse que perguntar diretamente a menina que naquele momento grunhiu baixo por algum erro que cometeu em uma de suas anotações.

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  O barulho da chuva que ainda caída lá fora e batia no vidro da janela era o único som ali dentro. Depois da garota de cabelo com mechas azuis e paixão por livro de geografia, ninguém mais adentrou o local. Lindsen não apareceu mais nenhuma vez. E ainda não tinha conseguido retornar a sua escrita que nem chegou a ser realmente iniciada porque sempre que conseguia se concentrar e lembrar-se do que precisava escrever, a menina ria baixo de alguma coisa e o deixava curioso sobre o que poderia ser engraçado em um livro de mapas.
   acabou desistindo de escrever e decidira que faria isso quando chegasse a sua casa e se trancasse em seu quarto. Ele pedia um táxi por um aplicativo em seu celular quando uma movimentação ao seu lado chamou toda a sua atenção.
  A garota estava se preparando para ir embora.
  Ela tinha fechado seu livro e caderno e estava guardando tudo que era seu em sua bolsa antes de andar até as estantes e voltar sem o livro. Pendurou a alça da bolsa em seu ombro, colocou seu capuz em sua cabeça e ficou alguns segundos olhando para a janela. E tão rápido quanto se levantou e arrumou suas coisas, a garota saiu daquele ambiente.
   se levantou o mais rápido que pôde, colocou a alça de sua bolsa em seu ombro e seguiu a menina com passos largos. Pelo meio do caminho guardou seu caderno e caneta em sua bolsa e por isso quase bateu com a cara em uma das pilastras do lugar. Quase alcançou a menina quando ela jogou o copo descartável do café dentro de uma lixeira, e ele também jogou o seu ali dentro. Viu a menina acenar rapidamente para o mesmo cara que fez o café de e para Lindsen que continuava sentada atrás do balcão do computador de cadastro.
   quase não conseguiu alcança-la quando ela se aproximou da porta de entrada e colocou sua mão na maçaneta. Quase. Por pouco sua mão não conseguiu segurar o pulso dela.
  - Ei! – Ele a pediu não medindo a força que tinha usado ao segurar a menina que se virou completamente assustada para ele.
  A garota tinha os olhos um pouco arregalados, alguns fios de seu cabelo estavam em seu rosto devido à velocidade com que ela se virou para .
   que se sentia sem palavras e completamente sem jeito de perguntar a importância daquela mesa para a garota.
  Os olhos dela o deixaram sem jeito. A falta de brilho neles.
  - O-Oi. – A garota gaguejou e deu dois passos para trás ao que puxou seu pulso da mão de que a soltou e viu quando ela segurou seu pulso com a outra mão e o acariciou.
  - Me desculpe. Eu não quis te machucar e nem te assustar. – Ele se desculpou se sentindo um idiota por tê-la assustado daquele jeito por um assunto que com toda a certeza do mundo não tinha nada a ver com ele. – Eu sou o , prazer.
  A garota olhou para a mão estendida de e pareceu pensar milhões de vezes se deveria ou não deixa-lo no vácuo antes de segurar a mão do rapaz e apertar leve e rapidamente com a sua.
  - . Prazer. – Sua voz foi um sussurro que tinha certeza que não seria capaz de ouvir se estivesse com mais dois passos de distância.
  Ambos ficaram em silêncio e já havia desistido de perguntar sobre a mesa enquanto encarava os olhos da menina que por vezes tentou desviar seus olhares, falhando em todas as vezes. Ele sabia que seria grosseiro se perguntasse sobre a mesa para ela e desnecessário, afinal, ele tinha conseguido outra mesa. Não era como se por causa de e sua mesa ele tivesse sido expulso dali. Não.
  Agora, ele só queria saber o motivo pelo qual os olhos da garota não tinham brilho. Eram castanhos escuros e apenas isso. Nenhum brilho ou qualquer coisa que indicasse que a menina estava feliz.
  Todo mundo sabe que os olhos são os espelhos da alma. queria saber por que a alma de parecia tão escura e triste.
  - E-Eu preciso ir. – Ela murmurou não dando tempo de respondê-la ou segurá-la novamente.
   não acenou em despedida para que ficou alguns segundos parado a vendo abrir a porta e sair da livraria o deixando para trás.
  Uma buzina despertou que parou de olhar para a porta a sua frente. Aquela buzina poderia ser o seu táxi. Era hora de ir embora.
  Ele abriu a porta por onde tinha acabado de passar e viu que seu táxi havia realmente chegado e estava parado em frente à livraria. abriu a porta do veículo após o motorista ter lhe desejado boa noite e quase ter saído de dentro do veículo para abrir a porta para ele.
   falou o endereço de sua casa e quando o carro começou a se mover foi impossível não observar a rua que estava completamente molhada pela chuva e sem ninguém andando por ali. Não encontrar andando por ali o deixou preocupado. Preocupação que durou alguns segundos antes de enxerga-la sentada no banco de trás do carro que passou ao lado do que ele estava.
  A menina estava encolhida no banco de trás do veículo, sua cabeça apoiada no vidro da janela e seus olhos fechados.
   quis saber se ele realmente tinha visto lágrimas deslizarem pelas bochechas de ou se eram as gotas da chuva que batiam no vidro da janela que o rosto da menina estava próximo.
  A preocupação foi substituída por angustia.
  Saber que, talvez, estivesse chorando dentro do carro após parecer tão empolgada lendo seu livro de geografia fez com que se sentisse pequeno.

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   voltou a livraria no dia seguinte. Adentrou o local no mesmo horário do que anterior, e mesmo que sua cabeça estivesse doendo devido à noite de sono mal dormida e as tantas horas que ficou dentro do estúdio decidindo melodias para suas músicas já compostas, ele não pensou nem por um segundo ir direto para casa e descansar. precisava ir até ali. Precisava ver mais uma vez.
  Precisava saber mais sobre a garota.
   não sabia o porquê, mas ele precisava saber o que incomodava a ponto de tirar o brilho dos olhos da menina.
  Ele deu boa noite a Lindsen, pediu uma garrafa de água ao invés de café e se sentou à mesa que ficou no dia anterior. Abriu seu caderno e rabiscou algumas palavras se distraindo enquanto disfarçava um olhar e outro em seu relógio de pulso para ver as horas. Procurou pelo livro de geografia que viu com em meio aos tantos livros do mesmo gênero e voltou frustrado para sua mesa quando não o encontrou.
   voltou para casa após ficar quatro horas dentro da livraria esperando por que não apareceu.

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  Os dias seguintes foram cansativos para que estava organizando todo seu álbum novo. O trabalho no estúdio ficou intenso e surgiram diversas reuniões que ocuparam sua mente e dias das duas semanas que se passou desde a última vez em que pisou na livraria. E por isso quase olhou para o céu para agradecer a Deus quando se viu parado em frente à porta de entrada do lugar e concluiu que sim, ele ainda lembrava o caminho até ali.
   entrou na livraria, deu boa noite para Lindsen que o acenou de volta por estar em uma ligação, e foi em direção ao balcão pedir por uma xícara de café forte. Ele precisava se manter concentrado na música que não saia de sua mente e que iria parar nas folhas de seu caderno aquela noite. sabia que aquelas palavras que flutuavam em sua mente quando transformadas em frases poderia lhe dar uma música que poderia, quem sabe, ser o single ainda não defino de seu álbum.
  O que não esperava é que chegaria naquele momento. E por isso ele se assustou quando ouviu a voz de Lindsen desejar boa noite para alguém e se virou para olhar com quem a mulher falava e deu de cara com a menina. não usava o capuz do casaco como da ultima vez, pelo contrário, ela estava com uma touca, um casaco maior que ela, uma calça jeans e um par de all star. Uma mochila e o celular em uma das mãos que tinha a manga do casaco cobrindo boa parte de sua pele.
  Ela parecia adorável com aquela roupa que praticamente a engolia e com aquele pequeno sorriso nos lábios.
   ficou envergonhado quando o cara do café o chamou e colocou seu pedido na sua frente, o pegando no flagra enquanto ele observava a menina que estava há poucos metros de distância ao seu lado.
  - Obrigado. – respondeu ao garoto que sorriu educado e recebeu a nota que tirou da carteira para pagar seu café.
  - Ei, . – O garoto falou e quase se engasgou com o pouco do café que tinha colocado na boca. – Tudo bem?
  - Oi, Brad. Tudo e com você? – Ela o respondeu perguntando de volta com um tom de voz tão baixo que começou a pensar que talvez ela só falasse naquele volume.
  - Tudo ótimo.
   mesmo estando com sua cabeça baixa e com sua xícara de café na frente conseguiu ver a piscada que o tal do Brad deu ao responder . E para foi impossível não revirar os olhos diante da atitude do garoto.
  - Vai querer o mesmo de sempre? Frapuccino com chantilly? – Brad perguntou e tudo que ouviu foi um “uhum” como resposta antes de observar pelo canto do olho o garoto ir fazer a bebida.
   só conseguiu se levantar dali e ir para uma das mesas para começar a tentar escrever em seu caderno quando viu que já tinha saído com seu café dali e provavelmente já estava acomodada em sua mesa próxima a janela.
  E ele não estava errado. estava sentada e muito bem acomodada. Ela tinha um notebook em cima da mesa em meio a um caderno, seu café, celular e o livro de geografia que estava aberto na página, que pelo o que conseguiu ler antes de sentar-se a mesa que escolheu para si tinha o titulo de “Coreia do Sul”.
  Ele ficou curioso sobre o interesse da menina naquele país da Ásia Ocidental. E isso só dificultou ainda mais o seu processo de se concentrar e escrever a música que a cada dia crescia em sua mente. E foi pensando que precisava falar com de uma vez e ter uma resposta para todas as perguntas que circulavam dentro de si sobre a menina, que teve uma ideia.
  Uma ideia que só pareceu bem idiota quando ele estava em pé próximo à mesa da garota, com seu celular em mãos e já a tinha chamado pelo nome de um jeito que até ele achou intimo demais.
  - Oi. – Ela respondeu ao que ainda levantava sua cabeça na direção dele.
  - Oi. Desculpa te incomodar, eu só... Hm... Eu quero tirar uma foto da janela. Não da janela em si! Da vista da janela! Isso! Da vista da janela! – se atrapalhou em algum momento e ele se sentiu um tremendo idiota por isso. Talvez ele não tivesse pensado muito bem na ideia antes de executa-la.
  - Ok. Eu vou só-
  - Não, você pode ficar. Eu me sento aqui. Serei rápido. Prometo.
  Ele interrompeu a garota que começou a se levantar, e depois de impedi-la de sair dali se sentou na poltrona que ficava do outro lado da mesa de , acabando por sentar de frente para ela que o olhou por alguns segundos antes de voltar sua atenção para o livro aberto na mesa.
   tirou algumas fotos com a câmera de seu celular e apesar de achar a vista da rua iluminada de Londres em meio a noite bonita, não era como se ele quisesse de fato milhares de fotos daquele ângulo na memória do aparelho. Quando achou que já tinha enrolado tempo demais ali e ainda não tinha pensado em nada bom o suficiente para falar e puxar um assunto com que ficou quieta durante todo o tempo em que ele ficou ali, começou a ver as fotos que tirou e apagou algumas que saíram tremidas ou fora de foco.
  - Obrigado. – Ele agradeceu após deletar algumas fotos e editar outras. E continuava sem ter o que falar para começar um diálogo com a garota.
  - De nada. – o respondeu e ele sorriu minimamente para ela. se sentia verdadeiramente sem graça e um completo idiota. – A London Eye apareceu?
  - Hã? – se virou para a menina e a olhou não entendendo onde a London Eye deveria ter aparecido.
  - Nas suas fotos... Ela não apareceu? – o perguntou e permaneceu em silêncio ao que abriu sua galeria e viu que a roda gigante não havia aparecido em nenhuma foto. Afinal, nem ele sabia como poderia ter aparecido se ele não a viu da janela.
  - Não. Dá pra ver ela daqui? – Ele perguntou se sentando de volta onde ficou para tirar as fotos e olhando para a janela.
  - Sim. Olha... – se moveu até chegar próxima a janela e encostar seu dedo no vidro. – Se você olhar reto por essa rua vai ver as cabines e a parte debaixo dela. Claro que não dá pra ver ela por inteiro por causa dos prédios da que tem daqui até lá, mas dá pra ver boa parte dela.
   prestou atenção nas palavras da garota e se surpreendeu quando notou a London Eye ao fundo dos prédios da rua. Era realmente uma visão muito bonita e por isso ele não demorou em tirar cinco fotos.
  - Obrigado. – Agradeceu a que ainda olhava a roda gigante pela janela e ficou ainda mais vidrado no rosto da menina quando a viu sorrir. Ele sabia que o sorriso não fora para ele e sim para a roda, mas não conseguiu parar de observa-lo.
  - De nada. – o respondeu quando o fitou e se afastou da janela voltando para frente de seu livro como se nada tivesse acontecido.
  - É por isso que você gosta de ficar aqui? Nessa mesa? Por causa da London Eye?
  Tão rápido quanto ela se afastou da janela, colocou para fora uma das tantas perguntas sobre a menina que rondava sua mente.
  - Você não acha que é uma bela vista? – Ela o respondeu com uma pergunta sem nem erguer sua cabeça para encara-lo.
  - Sim, eu acho. – Ele a respondeu a encarando e vendo a menina anotar algo sobre a Coreia do Sul em seu caderno. – Mas eu acho que você não se senta aqui só pela vista.
  - Não? – o perguntou rindo baixo de um jeito que soou triste para .
  - Não. Eu acho que existe um motivo maior.
  - E qual motivo seria esse? – Ela ergueu o olhar para que não gostou do que viu. Era a segunda vez que ele olhava nos olhos da garota e os via sem brilho.
  - Eu não sei.
  A garota o encarou por mais alguns segundos e não falou e nem perguntou nada depois da resposta de . Ela apenas voltou a sua leitura e o ignorou.
   entendeu isso como um convite para se retirar dali, por isso ele se levantou e foi para sua mesa.
  E foi de sua mesa que ele assistiu guardar suas coisas dentro de sua mochila e devolver o livro da livraria a uma das estantes. Ele assistiu a menina colocar a alça da bolsa no ombro. E a assistiu limpar com a manga do casaco duas lágrimas que molharam suas bochechas ao que ela passou ao lado da mesa dele.
  Foi sentado em sua mesa que ficou encarando o lugar onde ocupava até segundos atrás e se perguntava o que ele tinha feito de errado.
   se odiou por pensar que sua curiosidade foi o que provocou o choro na menina.
   não pôde deixar de lembrar que da primeira vez que a viu ela também chorou. Dentro do carro e longe dele.
  Naquela noite foi para casa sabendo que o motivo que tirava o brilho dos olhos de era algo grande.
  E como na primeira noite que encontrou a menina, não dormiu nada mais do que duas horas.

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  Naquela noite se completava dois meses que estava indo até a livraria nas quartas-feiras de todas as semanas para encontrar . Depois da noite em que a menina o mostrou a London Eye no final da rua e o ignorou nos próximos minutos, eles dois não se trocaram mais do que “boa noite” ou às vezes nem isso. Eles agiam como verdadeiros estranhos, o que não era de se estranhar já que eles não eram amigos. Mas queria ser. Depois de se sentir culpado por ter feito chorar, seu desejo de curar qualquer dor que a menina poderia estar sentindo só aumentou. queria ser ao menos a pessoa que ouviria e a diria que tudo iria ficar bem. Queria poder lhe pagar um café e ouvir suas histórias e lhe dar um pouco de atenção e carinho. Porque, para , a menina estava com falta disso; atenção e carinho.
  E se não aguentava mais ver de longe e não ter nem um pequeno diálogo com a menina, naquela noite ele desejou não ter ido até a livraria e nem ter conhecido a garota algumas semanas atrás. Porque jamais conseguiria colocar em palavras o aperto grandioso que sentiu em seu coração quando viu a menina andar com pressa até sua mesa próxima a janela enquanto lágrimas grossas molhavam sua face.
   fechou suas mãos em punho e sentiu seus pés se mexerem debaixo da mesa enquanto observava chorar e ir buscar o livro de geografia que parecia ser o amigo inseparável da garota.
  Ele viu a menina passar as mãos por seu rosto o secando por pouco tempo até que novas lágrimas o molhassem de novo. A viu abrir o caderno e pegar uma caneta.
   viu ler sobre a Coreia do Sul enquanto chorava baixinho.
  E pior do que ver a garota chorar era não poder fazer nada porque ele era um estranho para ela.
  Um completo estranho.

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  Depois de ter assistido chorar na última quarta-feira, decidiu que iria começar a se aproximar da garota de um jeito ou de outro. Dessa vez sem história de fotos, ele iria realmente se aproximar dela e ficaria ao seu lado enquanto ela estudasse sobre a Coreia.
  Por isso, assim que chegou à livraria na semana seguinte, foi até o balcão de café e pediu um café americano e um frappuccino com chantilly.
  Enquanto esperava as bebidas ficarem prontas, ele olhou diversas vezes para a porta de entrada do lugar para se certificar de que a garota não chegaria enquanto ele estivesse distraído com alguma coisa. Atendeu a uma ligação de Jeff que avisou ter conseguido uma folga de alguns meses para que eles pudessem viajar. agradeceu a seu agente e encerrou a ligação assim que Brad lhe entregou os cafés. deu ao atendente uma nota que pagaria as duas bebidas antes de se levantar do banco que se sentou e ir em direção à mesa que já estava acostumado a sentar. Saber que seu pedido de uma viagem para conseguir finalizar seu álbum fora de Londres tinha sido aceita e que ele só precisava dizer um destino foi algo que o deixou realmente feliz e mais tranquilo em relação ao seu novo trabalho. Ele sentia que precisava sair de Londres, sair das vistas dos paparazzis que o seguia até quando ele ia apenas à academia (como aconteceu naquele dia pela manhã). precisava parar de se sentir pressionado. Ele precisava de um tempo para si e sua mente. E agora, ele teria.
   foi até a sua mesa com os dois copos de café em mãos, seu celular estava em um de seus bolsos de trás da calça enquanto a carteira estava no outro. Daquela vez ele estava sem bolsa. Sentou-se na poltrona macia colocando os copos na mesa e tirando seu celular do bolso. E então, esperou. Abriu suas mensagens na tela do aparelho para ver se tinha alguma nova e respondeu a sua irmã que lhe mandou uma foto dela com seu novo namorado que fez questão de fazer um interrogatório quando o conheceu na casa de sua mãe há pouco mais de quatro meses. Viu seu twitter e estava pensando se escrevia ou não algo para os seus milhões de seguidores quando viu passar ao seu lado e deixar a bolsa em cima da mesa que ele já tinha entendido que era dela. Ele viu a menina ir até as estantes e sumir por alguns segundos antes de voltar com o livro de geografia e sentar-se no mesmo lugar de sempre. esperou pegar seu caderno, notebook e estojo antes de se levantar e caminhar até a mesa da menina segurando os dois cafés.
  - Frapuccino com chantilly. – descreveu a bebida ao que colocou o copo em cima da mesa próximo ao livro que a garota tinha aberto e estava folheando.
   ergueu seu rosto e quase sorriu quando viu que tinha a atenção da menina em si.
  - Obrigada, ma-
  - Recusar algo dado é falta de educação. E eu tenho certeza que você tem educação. – a respondeu a interrompendo e sentando-se em frente à menina que seguiu seu movimento com os olhos.
  - , eu real-
  - Por favor. – Ele a interrompeu de novo e pediu usando um tom mais manhoso que sempre funcionava quando sua irmã o negava algo que ele queria. – É só um café. E é o seu preferido.
  - Meu preferido? – Ela o perguntou arqueando uma sobrancelha.
  - É... Bom, eu ouvi o Brad te perguntando outro dia se você iria querer o mesmo café de sempre que é esse, e já que você sempre pede esse... Ele deve ser o seu preferido. – explicou a lógica que usou para pedir aquela bebida para a menina que continuou encarando ele. – E eu não vou sair daqui até que você tenha bebido tudo.
  - Eu não vou beber esse café inteiro de uma vez.
  - Não estou com presa. Tenho tempo.
   respondeu a que continuou encarando por mais algum tempo tentando descobrir o que o menino queria ali. E riu quando empurrou o copo do café da menina pra mais próximo dela e ela o pegou e deu um gole na bebida antes de erguê-la como quem dizia “viu, estou bebendo seu café que eu não quero”.
  Ele ficou encarando a menina e a viu voltar à leitura e anotações sobre a Coreia do Sul e mesmo que não tivesse lhe pedido ajuda, se levantou atrás de folhas brancas que encontrou em uma impressora que ficava do lado oposto ao da mesa deles e pediu uma caneta emprestada a que o entregou seu estojo. Ele se levantou novamente voltando para a mesa com um livro de geografia em mãos. Procurou o que queria por algumas páginas e sorriu satisfeito quanto encontrou quase no final do livro o capítulo sobre a Coreia do Sul.
  E mesmo que não tivesse lhe pedido ajuda ou dito o porquê de estar pesquisando coisas sobre o país da Ásia Ocidental, anotou várias coisas sobre o lugar em suas folhas brancas. História, Geografia, Demografia, Política e Governo. Ele anotou tudo isso e entregou para quando ela o avisou que precisava ir embora.

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  Nas outras quartas-feiras que se encontraram na livraria e ficaram na mesa onde Lindsen um dia expulsou , ele e pesquisaram juntos sobre subdivisões, economia, infraestrutura e cultura da Coreia do Sul.

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  Dizer que era amigo de e que a conhecia muito bem era algo forte demais, mas ele sabia que a menina não era de se atrasar mais de uma hora para chegar à livraria. Eles não haviam combinado um horário para se encontrar ali, que sempre aparecia no mesmo horário que chegou ao local no primeiro dia e encontrou . Ele tinha entendido que aquele era o horário da menina ir até a livraria e sempre a encontrava quando chegavam naquele mesmo horário as quartas-feiras. Por isso, ele estava verdadeiramente preocupado enquanto estava pesquisando sobre a Coreia do Sul já tinha quase duas horas e a garota ainda não havia chegado. Ele já tinha olhado para a janela diversas vezes e estava inquieto com a demora da menina. Pensou em parar de ler as palavras do livro, mas sabia que seu nervosismo só iria piorar se ele ficasse parado sem fazer nada enquanto apenas esperava.
   continuou sua pesquisa ficando concentrado e interessado na Coreia do Sul em algum momento. Interessado a ponto de se assustar quando Lindsen o chamou já parada em frente à mesa e o avisando que havia ligado para a livraria e pedido que ela o avisasse que a menina não iria para lá naquela noite.
   sentia e sabia que deveria ficar aliviado em saber que a menina ao menos estava viva.
  Porém, saber que não iria para a livraria para que juntos continuassem a pesquisa que a menina parecia tão empolgada sobre em todas as outras vezes que a viu com o livro de geografia em mãos, o deixou ainda mais preocupado.

++++

  Na quarta-feira seguinte apareceu. Sentou-se na poltrona da mesma mesa de sempre. Agradeceu a quando o menino lhe estendeu um copo de seu café preferido e leu todas as anotações que ele havia feito na semana anterior sobre o país que ela pesquisava. Agradeceu a ele por tudo que ele tinha descoberto e o ouviu dizer que eles, provavelmente, ainda não tinham descoberto tudo sobre a Coreia do Sul. E que talvez, naquela noite, ele poderia se aprofundar nos pontos turísticos.
  Eles se aprofundaram nos pontos turísticos. E em tantos outros aspectos da Coreia que não sentiram e nem viram a hora passar. Só descobriram que a hora de ir embora havia chegado quando Lindsen os avisou que a livraria precisava ser fechada.
   e se despediram na porta da livraria. Cada um esperou seu táxi e a menina prometeu a que iria na próxima quarta-feira quando ele a perguntou se ela iria.
  Ele disse a ela que estava ali caso ela precisasse de alguma coisa.
   o agradeceu e desejou boa noite antes de entrar em seu taxi que chegou primeiro que o de .
  E desejou que tivesse entendido que ele não se referia somente a ajuda-la em pesquisas sobre países. Mas, que ele se referia a ajuda-la na vida.

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  - Soletra o nome da cidade, por favor.
  - S, e, u, l. Seul. É a capital e maior metrópole da Coreia do Sul. – respondeu ao menino que digitou as letras no teclado do notebook da garota que estava fora de suas vistas porque estava com a tela do computador na frente de seu rosto.
  - Lá é lindo. – suspirou impressionado com a beleza das fotos de pontos da cidade Seul.
  - Sim, eu sei.
   se aproximou de e virou um pouco a tela do notebook para que ela pudesse ver as imagens da capital da Coreia do Sul com mais clareza.
  Ambos ficaram minutos e mais minutos navegando nas imagens da metrópole onde arranha-céus, metrôs de alta tecnologia e a cultura pop se misturam com templos budistas, palácios e mercados de rua. Ficaram boquiabertos quando viram fotos do futurista Dongdaemun Design Plaza, um salão de convenções com arquitetura curvada que tem um parque no telhado, o Palácio Gyeongbokgung que já teve mais de sete mil quartos e o templo Jogyesa local que abriga: leguminosas e pinheiros antigos. Eles usaram a impressora da livraria para imprimir fotos de cada um desses lugares e do Museu Nacional da Coreia, o memorial de guerra Jeonjaeng Ginyeomgwan, que são dedicados à história e à arte do país. Imprimiram também do Lotte World, um gigante parque de diversão localizado próximo do enorme arranha-céu Lotte Word Tower. Pesquisaram por alguns bairros do local e se surpreenderam com as imagens do Gangnam; o badalado Hongdae, com foco na vida noturna; Itaewon, voltado para expatriados; e Insa-dong, que parece um vilarejo e é repleto de locais que vendem churrasco coreano, casas de chá e restaurantes de lámen.
   tinha entendido que todo aquele interesse de pela Coreia era maior do que uma provável pesquisa para a faculdade que ele supunha que a menina cursava. Por isso, ele esperou que voltasse para a mesa com as últimas imagens impressas para lhe perguntar:
  - Você vai viajar pra lá? – Questionou a menina que continuou a juntar as folhas e guarda-las com cuidado em um envelope que tirou de dentro de sua mochila.
  - Sim.
  - Quando? – desligou o notebook da menina e esperou a máquina desligar completamente para que pudesse fecha-lo e entregar a ela.
  - Ainda não sei. Acho que daqui uns sete ou oito meses... Vai ter o show de uma banda lá. A volta deles. – respondeu e sorriu para que sentiu saudades de seus companheiros de banda. Era difícil estar em pausa com a banda que o mostrou ao sucesso. Mas ao mesmo tempo era libertador e revelador. – E eu já comprei as entradas.
  - As entradas? Você não vai sozinha? – Ele a questionou e se levantou da poltrona ao observar pronta para ir embora.
  - Não. Eu vou com a minha melhor amiga.
  Essa foi a primeira vez que viu algum brilho nos olhos da garota. E também foi a primeira vez que ela sorriu de um jeito que não lhe pareceu forçado ou simpático.
  E sabia que jamais será capaz de esquecer aquele sorriso espontâneo e aquele brilho que continha tantos sentimentos bons.
  Ele desejou que e sua melhor amiga tivessem uma excelente viagem até a Coreia do Sul. Porque mesmo que ele tivesse se interessado pelo lugar e pensado em algum momento que eles dois poderiam conhecer o país, ele sentiu que aquela viagem era muito importante para e sua melhor amiga.
  E jamais quis ficar entre elas duas.

++++

  O dia não tinha sido chuvoso em Londres, mas as nuvens cinza e o céu escuro anunciavam uma chuva forte junto com um vento que estava ainda mais frio que o normal, e foi por isso que foi para a livraria o mais agasalhado possível. E com um guarda-chuva em mãos.
   também estava bem agasalhada quando a encontrou sentada ao redor da mesa que ele usava junto com ela. E para a surpresa de , a menina empurrou um copo de café para frente dele.
  - É seu. – Ela o avisou e deu um gole em seu copo de café que estava entre suas mãos.
  - Obrigado. – Ele agradeceu se sentando de frente para a menina e pegando o copo descartável que continha o líquido quente capaz de aquecer suas mãos.
  Café americano.
  - O que iremos pesquisar hoje? – perguntou e deixou seu copo em cima da mesa e começou a mexer em sua mochila até que tirou dali de dentro o notebook, seu caderno e o estojo.
  - Você pode me ajudar com os hotéis? Eu tentei pesquisar sozinha em casa, mas... Acho que não sou a melhor pessoa para saber sobre hotéis. Da última vez que viajei com a , eu escolhi um hotel que o banheiro era do lado de fora do quarto. E isso não é muito bom quando se tem um problema com sua barriga por ter comido chocolate demais. – Ela explicou parecendo lembrar perfeitamente da tal viagem e rindo. riu junto com ela e sorriu quando acenou positivamente com a cabeça.
   não sorriu por ter seu ego massageado, ele sorriu porque ter a menina lhe pedindo ajuda fazia com que ele se sentisse verdadeiramente útil para ela.
  - Claro. Vamos encontrar os melhores hotéis da Coreia do Sul! E com um banheiro dentro do quarto.
   se mostrou tão empolgado em ajudar a menina a encontrar um hotel ideal para ficar quando ela fosse para o país asiático, que fez um movimento negativo com a cabeça enquanto ria dele.
  Eles dois não apenas pesquisaram sobre diversos hotéis na Coreia do Sul como também imprimiram imagens de cada um deles, com detalhes dos quartos e de todas as áreas a disposição dos hospedes. E em determinado momento desafiou a falar algumas palavras em coreano com a ajuda do Google tradutor, o que resultou em algumas gargalhadas e tapas que a menina dava no braço dele que ria alto quando ela errava grosseiramente a pronuncia de uma palavra e ele nem ao menos sabia como começar a falar igual a voz de mulher do tradutor.
  Quando o celular de começou a tocar e ela disse que precisava atender, antes de a menina pedir licença e sair dali, se levantou dizendo que estava indo comprar alguns cookies com Brad e que ela poderia ficar a vontade.
  E ele foi. nem se sentou em um dos bancos em frente ao balcão, esperou em pé enquanto o garoto do outro lado do pequeno muro colocava seis cookies simples com gotas de chocolates divididos em dois pratos. pediu por mais dois cafés e enquanto esperava, olhou para a porta de entrada que tinha um vidro na parte superior e viu a chuva começar a cair. Chuva que começou fina e que em questão de segundos ficou forte, grossa e barulhenta. Ele conseguia ver a folhagem da arvore que ficava em frente à livraria balançando. A natureza estava realmente revoltada ou triste com alguma coisa. Após pagar Brad, equilibrou os pratos com os cookies e os dois copos de café em seus braços e mãos. Caminhou devagar até a mesa onde estava com e paralisou com a cena que viu.
  Por ter ido comprar cookies, café e ver a chuva começar a cair e o vento balançar as folhas da arvore, não estava lá quando atendeu a ligação que tirou o mundo debaixo de seus pés e o jogou em cima de sua cabeça de uma vez. Ele não estava lá quando ela ouviu as duas palavras que congelou o sangue da garota e quebrou seu coração em milhões de pedaços.
   não estava lá quando soube que seus planos não seriam concluídos.
  Ele não esteve lá quando ela desejou não estar ali. Ele não estava lá quando desejou não estar mais viva.
  - Ei. – voltou a andar parando ao lado da mesa e colocando os copos e pratos em cima da madeira. Ele se sentou de frente para a menina, esticou suas mãos tocando nos braços de que tinha o rosto coberto com suas mãos e seus cotovelos apoiados na mesa. – O que aconteceu? ?
  O coração de errou diversas batidas quando ergueu a cabeça olhando para o teto como quem quer parar de chorar e não consegue. Ver o rosto da menina molhado de lágrimas já derramadas e por outras lágrimas que não paravam de sair de seus olhos fez com que mordesse seu lábio inferior e acariciasse a pele da menina. Chamá-la pela primeira vez com um apelido, piorou ainda mais a situação para ele que esperava por esse momento de intimidade maior com a menina. Não intimidade sexual, mas intimidade sentimental. E sempre achou que chamar outra pessoa de apelido significava muito mais do que os outros pensavam. Significava afeto e companheirismo, por isso ele nunca chama quem ele acaba de conhecer pelo apelido mesmo que a pessoa diga que está tudo bem com isso.
  - Não precisamos mais pesquisar sobre a Coreia do Sul. Nós n-não...
   não conseguia falar com clareza e foi praticamente impossível para entender essas palavras. E ver essa dor tão agressiva na menina, fez com que ele se arrastasse pela poltrona até parar ao lado dela.
  Ver soluçar enquanto chorava e cobria seu rosto sempre que falhava em secá-lo completamente de suas lágrimas, fez com que passasse seu braço em volta do corpo da menina e a puxasse para um abraço que deveria protegê-la do mundo e de todo o mal. a apertou contra seu corpo e colocou sua mão na cabeça de quando ela a encaixou perfeitamente no vão entre seu pescoço e ombro. Ele sentia as lágrimas da menina molhando sua pele que apareceu com o leve puxar que seu casaco levou para baixo quando a menina se virou, mas ele não se importava com o molhado. se importava com a dor. A dor que fazia tremer em seus braços ao que tentava formar frases que nunca eram finalizadas.
  - Você precisa se acalmar um pouco, . Você precisa se lembrar de respirar. Por favor.
  Ele pediu se balançando levemente de um lado para o outro, deixando um beijo na cabeça da menina e fechando os olhos ao que perguntava ao mundo o porquê de tanta dor ter sido colocada em cima da garota. não merecia aquilo e tinha a certeza disso.
  - E-eu não quero me acalmar. Eu a quero de volta! Eu quero ela! Ela! – A voz da menina saiu totalmente embargada e dolorida ao que ela virou seu rosto de frente para a pele de e gritou. sentiu a dor na voz da menina assim como sentiu a mão dela agarrar com força seu casaco. – Eu não quero respirar, eu quero a ! Quero a minha melhor amiga de volta! Quero a única pessoa que me entendia nesse mundo! A única pessoa que ficava! Eu quero que o infeliz que bateu no carro dela apodreça na cadeia! Eu quero que ele sofra como a minha garota sofreu! Eu quero que o mundo pare de rodar! Eu quero parar de respirar! Eu quero ela de volta! Ela, ! ELA! Eu quero ter sido capaz de convencê-la a não ir aquela festa! Eu quero a , . Eu não quero nada... Eu só quero a de volta. Por favor, me traz ela. Traz a de volta pra mim.
   não se movimentou para soltar a menina mesmo sentindo socos sendo dados em seu peitoral ao que ela desabafou coisas que aos poucos se encaixavam e fizeram sentido para . A melhor amiga da menina havia morrido após um acidente de carro. E pelo jeito que falou ela deveria ter ficado internada algum tempo depois do acidente e antes de seu falecimento.
  E mesmo sem conhecer , desejou que a menina não tivesse morrido. Que ela tivesse sido forte e sobrevivido ao acidente e a todas as complicações que ele de certo trouxe para sua saúde. pediu, mesmo que baixinho sem que ouvisse, que tudo aquilo não passasse de um mal-entendido. Mesmo sabendo que mal-entendido é raro em noticias como essa.
  Ele continuou abraçado a menina e dando beijos na cabeça dela de segundo em segundo, cantarolando baixinho uma música que sua mente inventava na hora e que tinha como objetivo acalmar a garota que continuava a chorar contra sua pele. Sua mão descia e subia pelas costas de que estava encolhida como se o mundo fosse pesado demais para aguenta-lo em posição ereta.
  A chuva ainda caia lá fora, as arvores balançavam seus galhos com o vento e não viu as luzes da London Eye acessas quando olhou para a grande estrutura de ferro como um dia o ensinou. talvez não fosse a única triste com a notícia da morte de .
   se concentrou tanto em passar calma para e mostrar a ela que não estava sozinha que não ouviu quando uma buzina soou do lado de fora em frente à livraria. Mas ouviu. E foi por isso que ela se afastou do corpo de tão rapidamente e pegou seu celular de cima da mesa.
  - . – Ele a chamou vendo a menina guardar o aparelho apressada em seu bolso de trás, colocar o capuz do casaco em sua cabeça e pegar sua mochila colocando uma das alças em seu ombro. – Espera.
  - Eu preciso ir. Eu não posso mais ficar aqui... Não... Aqui. Olhar para essa mesa e saber que nunca mais vai estar aqui comigo, dói como nunca doeu antes. Olhar para essa janela e saber que não terei mais as suas explicações sobre como a vida fica melhor quando olhamos os pequenos detalhes e as coisas ou pessoas que estão um pouco mais distante de nós... Dói de um jeito que eu espero que você nunca saiba como é. Eu preciso ir porque eu não posso mais ficar aqui sem a minha melhor amiga. Sem a pessoa que era a minha luz nesse mundo. – passou a manga do casaco pelo rosto e respirou fundo antes de continuar: - Me desculpa por qualquer coisa e obrigada por tudo, mas eu preciso ir. Eu preciso me despedir da minha melhor amiga que... – Ela deu uma risada seca, sem graça, sem vida ou humor. O que fez com que tivesse sua visão turva pelas lágrimas que surgiram em seus olhos. – Já se foi.
   assistiu correr para fora da livraria e pela janela ao lado da mesa ele viu a menina entrando no carro que saiu acelerado dali.
  Saber a história por detrás da falta de brilho nos olhos de foi completamente diferente do que esperava. Ele sabia que era algo sério, só não imaginou que fosse uma coisa tão dolorosa e com um final tão trágico.
   permaneceu sentado na mesa olhando para o lado de fora da janela esperando alguma coisa que nem ele mesmo sabia o que era. Talvez uma explicação da vida, do destino ou de Deus. Uma explicação coerente sobre a partida de . queria saber por que as pessoas boas tinham que ir embora tão depressa desse mundo.
  E porque a vida é realmente um sopro quando ela pode ser um arco-íris que sempre nos leva a finais felizes com um pote de ouro.
   olhou para os pratos de cookies e os copos de café quando sentiu seu celular vibrar em seu bolso e a tocar. Ele pegou o aparelho e viu na tela o nome de seu agente, o que o deixou com vontade de ignorar a ligação e retornar, quem sabe, somente no dia seguinte. Ou nos dias seguintes. Mas, sabia que não podia deixar de falar com Jeff. Afinal, deveria ser algo importante sobre sua carreira. E mesmo sentindo um vazio, que não sabia explicar com palavras, em seu peito, sabia das responsabilidades que possuía. Por isso, somente por isso, que ele atendeu a chamada de Jeff e deixou que o homem sete anos mais velho que ele o contasse que a viagem que pediu havia sido agendada para dali duas semanas. Jamaica. Eles iriam para a Jamaica. Um lugar que sempre quis conhecer. Um lugar onde a mídia não o encontraria e nem o perturbaria, onde suas fãs jamais desconfiariam que ele estaria por lá e onde a paz finalmente seria vivida.
  Paz.
   riu ao ouvir essa palavra. O mundo não parecia em paz naquele momento. Pelo contrário, parecia um ambiente onde foi uma imensa e importante baralha fora perdida. Uma batalha extremamente dolorosa e desnecessária em sua humilde opinião.
  Depois de horas sentado naquela poltrona sem tocar no cookie ou no café que comprou, se levantou para ir embora e viu o notebook de aberto em cima da mesa. A menina havia esquecido o aparelho ali. E quando ele foi fechar o computador, sentiu seu coração apertar quando viu o site do Google tradutor aberto com algumas palavras escritas no espaço de texto para tradução. Ele se sentou de novo e clicou no botão que fazia a mulher falar, e nunca se sentiu tão mal por ouvir uma palavra em coreano.
  Doeu. Doeu lá no fundo do coração e da alma de .
   então fechou o site e pela primeira vez, viu a foto de fundo da tela do computador da menina que sempre lhe era entregue com a janela da internet aberta.
  Era uma foto de com uma menina que com certeza tinha a idade da menina. A garota ao lado de sorria olhando fixamente para a foto, enquanto sorria olhando para a menina de cabelos de cor roxo escuro ao seu lado.
  . A menina ao lado de era , sentiu isso. Assim como ele também sentiu o amor e admiração que tinha pela menina através daquela imagem delas duas juntas.
  A vida seria realmente mais fácil se ao invés de um sopro fosse um arco-íris.
   viu perto da barra de tarefas do computador um documento chamado “Coreia do Sul – viagem”, sua curiosidade e certeza do que se tratava o incentivou a abrir o documento que de certa forma o pertencia. E ele não se surpreendeu quando viu todas as anotações que ele havia feito junto com que organizara tudo tão perfeitamente que o deixou boquiaberto com o jeito com que as imagens, textos e dicas estavam em ordem. leu tudo mesmo já sabendo de tudo, observou as fotos com cuidado e sentiu um vazio quando viu um pedido escrito por no final de tudo:

“Fica bem logo.
Precisamos conhecer todos esses lugares. Inclusive a trilha que não coloquei pra não assustar seu sedentarismo.
Eu sei que você ficará surpresa quando conhecer o garoto que me ajudou com toda essa pesquisa. Ele é bem legal. Então acorda logo e venha na livraria para conhecê-lo, e para termos nossa vida de novo.
O mundo está escuro sem você aqui fora. Sinto sua falta todos os segundos de todos os dias. Eu te amo. Amo com tudo que há em mim.
Com amor,
. xx”

   fechou o documento da Coreia e abriu um novo assim que terminou de ler o pequeno pedido que fez a sua melhor amiga. Colocou a fonte no tamanho e formato que julgava ser o melhor, e então, começou a escrever.
  “Às vezes a vida nos dá uma rasteira que parece ser um sinal dos tempos, nós pensamos que não vamos suportar tamanho buraco que se cria em nosso peito e o peso do mundo que é jogado em cima de nós. A vida gosta de testar a força que nem sabemos que possuímos. Então, ela nos olha como quem diz bem vindo ao show final, espero que esteja usando suas melhores roupas. O problema é que nunca estamos preparados para o show final. Nunca. Parecemos tão bem aqui embaixo, tão donos de nós mesmos e do nosso tempo que esquecemos que não somos donos de nada. Nunca fomos e nem nunca seremos.
  E não importam quantas perdas tenhamos ao longo da vida, nunca estaremos acostumados a perder alguém que amamos. Mesmo que já tenhamos passado por isso algumas outras vezes. Então, só pensamos em fugir. Fugir do mundo e de nós mesmos. Da dor que é esmagadora. ”Temos que fugir daqui” para um novo mundo, onde as pessoas boas ficam e as ruins se vão. Onde não perdemos quem amamos, onde não precisamos fugir de nada. Onde a vida é um arco-íris com um belo final feliz e não um sopro com dor. Os mais velhos dizem que tudo vai ficar bem e que o fim está próximo para todos nós, e que um dia nos encontraremos com as pessoas queridas em algum mundo muito melhor que este. Então, eles dizem “aproveite o tempo da sua vida” como se fosse fácil viver depois de ter um buraco cavado em nosso peito, mas eles entendem mais da vida do que nós, não é verdade? Os anos de experiência contam nessa hora.
  Eu sinto muito, . Eu sinto muito. Mas, algumas pessoas foram feitas com porções de bondade em excesso e por isso não podem permanecer a este mundo por tanto tempo. Infelizmente, nós, os meros mortais ignorantes, não possuímos uma sabedoria grande o suficiente para lidar com anjos que caíram aqui por engano. E eu sinto muito pela partida da e por saber que logo não terei mais você neste mundo. E eu já sinto a sua falta. Eu espero que... Antes da sua partida, nós possamos nos encontrar novamente em algum lugar... Algum lugar longe daqui. Porque eu quero ver o brilho que eu sei que seus olhos têm, quero ver seu sorriso e ouvir sua risada mais uma vez. Eu quero poder estar novamente ao lado de quem me aceitou ao seu lado em momentos que não usei minha fama. Você foi o meu ponto de lucidez em meio a esse meio a essa vida que vivo. Você me fez lembrar como é ser uma pessoa comum e alcançável. Você trouxe de volta o verdadeiro . Fazendo-me esquecer de quem é . Você foi o meu ponto de luz verdadeira em meio a tantos flashes de câmeras fotográficas.
  Se você quiser, eu posso fugir com você. Eu seguro a sua mão, faço sua dor passar e te faço feliz como eu sei que queria que você fosse. Porque assim como eu, tenho certeza de que a sua garota sabia que a melhor e mais incrível amiga dela merecia toda a felicidade do mundo.
  Vou deixar meu numero de celular aqui no final. Não pense sobre o que vai me dizer quando me ligar ou escrever quando for me mandar mensagem. Mande-me duas frases que eu vou até você em um segundo:
  Temos que correr... Temos que fugir.
  Fica bem. Eu sempre vou estar aqui para você, não importa para onde a música ou a vida me leve. Um pedaço do meu coração sempre vai estar com você.
  .”

++++

  A Olympic Gymnastics Arena estava completamente lotada. Todos os ingressos haviam sido vendidos e sabia disso desde o dia em que foi comprar as duas entradas para o show e teve que ficar horas na frente do computador tentando acessar ao site de compras. Um mar de fãs coloria o lugar com objetos que acendiam e emitiam a cor azul perolada. Era algo lindo de se ver de onde estava com seu braço erguido ao que levantava o objeto de luz que ela comprara antes de entrar no lugar do show que acontecia há cerca de trinta minutos.
  Há oito meses jamais pensaria em ir aquele show. Não sem sua melhor amiga que havia se transformado em seu melhor anjo da guarda e tinha lhe apresentado ao grupo de cantores coreanos. Por isso, era tão difícil para si estar ali sem a garota que fora embora deste mundo de forma tão brutal e sem sentido. Se não fosse por um homem bêbado, estaria ali, ao seu lado, segurando sua mão e gritando todas as músicas do grupo que agitava todas aquelas pessoas.
  Mas não estava com sua melhor amiga. Estava sozinha. E isso apertava seu coração um pouco mais desde que chegara à Coreia do Sul, país que combinou de visitar com . Mas que agora o visitava sozinha porque ela havia prometido a menina quando ela estava viva que iriam conhecer o lugar não importasse o que acontecesse. E sendo a pessoa que mais conheceu , sabia que a menina brigaria com ela se soubesse que ela deixou de ir até a Coreia depois da imensa pesquisa que ela fez do lugar só porque não pôde ir.
  Mas sentia a presença de naquele show. Ela sentia a menina ali consigo, mesmo que não estivesse fisicamente. Na verdade, sentia consigo desde a semana após a morte da menina; desde que ela tivera um sonho com a sua melhor amiga que lhe disse que estava tudo bem e que ela jamais estaria sozinha naquele mundo. Afinal, agora poderia acompanha-la a qualquer lugar que fosse, porque anjos não possuem limites de viagens.
  Quando o grupo começou a cantar a música preferida de , riu sozinha ao lembrar-se do dia em que apresentou aquele grupo a com aquela música, e a menina gritou a letra da canção com todo o ar que havia em seu pulmão. nunca foi uma ótima cantora.
  E cantou. Cantou porque a voz de soou em seu ouvido a lembrando da promessa que a fez; que ela cantaria com todo o ar que existia em seu pulmão quando fossem ao show de volta do grupo.

++++

  Aquele foi o melhor show da vida de . Ela sabia que poderia ter sido melhor. Porém, também já havia entendido que não era capaz de mudar o que a vida já tinha feito.
  Voltando para o hotel onde tinha reservado um quarto, dessa vez com banheiro dentro, resolveu mudar de caminho e ir até o Myeongdong comer alguma coisa que fosse diferente da comida do restaurante do hotel que já estava hospedada há uma semana.
  Caminhou pelo lugar que estava lotado por pessoas que falavam diferentes idiomas. Ouvia um idioma diferente cada vez que pedia licença a alguém ou que passava entre uma pessoa e outra. Comprou um waffle de chocolate e um chá. E enquanto esperava que o senhor simpático lhe entregasse seu troco, olhou ao seu redor e pensou em ficar por ali algum tempo, mas acabou desistindo da ideia tão rápido quanto ela veio. não era boa em fazer novas amizades e sua cabeça estava começando a doer.
  Foi para o hotel comendo seu pequeno lanche nada saudável pelo caminho. Brincou com um menininho que não deveria ter mais de três anos que sorriu para ela quando passou em sua frente no colo da mãe.
  Quando chegou ao quarto do hotel, tirou os sapatos e as peças de roupas deixando tudo espalhado pelo quarto antes mesmo de entrar no banheiro. Ligou o registro de água quente do banheiro e respirou fundo.
  E chorou.
  Chorou porque era de noite que a saudade apertava mais que o normal.
  Chorou porque tinha dias em que a morte de parecia um pesadelo que logo chegaria ao fim e em outros parecia que a menina estava fazendo uma viagem e que logo voltaria. Chorou porque queria sua melhor amiga ali com ela, fisicamente. Queria tocar na garota e dizer mais uma vez o quanto lhe amava. E o quanto ela fazia falta.
   chorou porque é isso que se faz quando a dor é demais para se aguentar dentro de si... Ela transborda pelos olhos.

++++

  No dia seguinte, acordou tarde e ficou enrolando na cama até o horário do almoço que foi quando teve que levantar para se arrumar e foi almoçar no restaurante do hotel. Voltou para o quarto depois de comer a arrumou a pequena bagunça que fez na noite anterior.
  Tomou banho quando viu que estava anoitecendo e decidiu que seria hora de ir para o lugar que estava mais empolgada de conhecer e que seria o último que ela iria antes de voltar para Londres na tarde do dia anterior. Colocou uma calça jeans com um rasgo em cada joelho, um par de botas de saltos grossos e baixos, um suéter preto que era maior que o seu tamanho ideal. Penteou seu cabelo o deixando solto e admirando novamente a franja que tinha cortado mês passado em um ato que julgou ser de coragem. Passou os dedos dentre os fios que estavam todos no tom castanho escuro e fez uma maquiagem tão leve que mais parecia que estava sem nada no rosto. Pegou sua bolsa, guardou o cartão da porta do quarto dentro da bolsa e colocou seu celular no bolso detrás da calça.
   andou até o Dongdaemun Design Plaza que não ficava tão longe do hotel onde estava. Aproveitou para admirar o lugar e as pessoas com traços que ela julgava tão lindos e delicados.
  Chegou ao seu destino cerca de vinte minutos depois, e não se sentia cansada e nem com sono e mesmo se estivesse, sabia que tudo isso desapareceria no momento em que colocou seus olhos no grande Dongdaemun Design Plaza e admirou a beleza do lugar. Era ainda mais lindo e fascinante pessoalmente do que nas imagens que encontrou na internet.
   não se arrependeu de ter escolhido deixar o local como último lugar da Coreia que ela conheceria durante a viagem.
  Tirou algumas fotos do monumento que era imenso diante de seus olhos. E como boa turista queria tirar uma foto em frente a gigante arquitetura que ela sabia que tinha um parque no teto e mal podia esperar para conhecer. tirou algumas selfies e criou coragem para pedir que alguém tirasse uma foto dela de corpo inteiro em frente ao lugar.
  Olhou ao seu redor procurando por alguém que lhe parecesse disposto a tirar uma foto de uma turista boba e optou pelo cara que estava de costas para si com as mãos na frente do corpo.
   se aproximou devagar para não assustar ao homem mais alto que ela e tocou lentamente no ombro dele ao que o chamou:
  - Ei, boa noite. Você pode tirar uma foto minha, por favor?
  Perguntou rezando para que ele soubesse falar inglês e não a achasse inconveniente.
  O que não esperava era ver um rosto tão conhecido quando o homem se virou de frente para ela e olhou em seus olhos.
   teve a respiração perdida quando o viu ali, na sua frente.
   estava ainda mais bonito do que da ultima vez em que se viram. Seu cabelo estava escondido em uma touca o que deixava mais a mostra os traços de sua face. Sua roupa lhe deixava absurdamente elegante e despojado. O garoto tinha uma barba rala no rosto o que despertou em uma vontade de tocar nele e perguntar se ele estava mesmo ali.
  Fazia meses que eles não se viam ou tinham qualquer contato. tinha parado de ir à livraria que ficava há três ruas de sua casa. Da ultima vez que fora lá foi para buscar seu notebook que esqueceu na noite que soube da partida de . E um mês depois de ter buscado seu notebook ela leu a carta que a escreveu em um documento do Word. A carta que a fez chorar e sentir um pouco de paz por saber que mesmo com a morte de , ela não estava sozinha de um todo. Que tinha alguém consigo. E que o menino não tinha ficado ao seu lado todo aquele tempo somente porque queria algo para fazer enquanto não estava recebendo atenção da mídia.
  Ela sentiu a falta de todos esses meses. Não sabia quando, mas tinha se acostumado a encontrar o menino uma vez na semana em todas as semanas desde que se conheceram.
  E agora tê-lo na sua frente, era demais para suportar sem chorar.
  Ela estava vendo . Ele que estava há pouquíssimos passos de distancia dela. Ele que a viu em um dos momentos mais frágeis de sua vida. Ele que a abraçou, beijou sua cabeça diversas vezes, a fez carinho e cantarolou uma música que parecia canção de ninar em seu ouvido. estava de frente para . que mesmo sem saber a distraia todas as quartas-feiras quando ela ia para a livraria após passar o dia inteiro no hospital com .
   pensara nele desde que leu a carta e, principalmente, desde que pisou na Coreia do Sul.
  E sempre pensava em ligar para ele ou lhe mandar uma mensagem, mas, nunca tendo coragem o suficiente.
  A menina estava tão sem reação diante da aparição de que não sabia o que fazer ou como reagir. Encarar lhe parecia o certo.
  Mas não para .
  Por isso, ele quebrou a distância entre os dois corpos e a puxou para um abraço que lembrou a qual era a sensação de estar protegida da maldade do mundo.
  Sensação essa que só sentiu todas as vezes que abraçou . E quando foi abraçada por dentro da livraria.
  Eram sensações diferentes.
  Com , se sentia acolhida e entendida. Com , ela sentia que não precisava carregar sua dor sozinha porque ela não estava sozinha. E a prova disso era o coração do garoto que batia tão acelerado quanto o seu.
  - Eu te encontrei. Meu Deus, eu te encontrei. – Ele sussurrou e suspirou de um jeito que entendeu sendo de alivio.
  - C-Como você... .
  A menina queria perguntar como ele havia chegado até justamente na mesma época que ela, mas as palavras não saiam dos lábios de que sentia as mãos e os braços de a apertando contra o corpo do garoto que sempre fora mais alto que ela e que estava incrivelmente cheiroso. Ela apertou o tecido do suéter que ele usava, como da última vez que se viram. Respirou fundo e ficou de olhos fechados sentindo a presença do garoto.
  - Você disse que viria em oito ou nove meses... Pesquisei a data de algum show de retorno de banda e encontrei o show de ontem. Eu estou aqui há um mês, venho aqui todos os dias porque sempre soube que você não conseguiria vir até a Coreia e não visitar este lugar.
  - Mas, e se eu não viesse? E se eu tivesse desistido de vir?
  - Eu continuaria a te esperar... A te procurar. Eu não vou te deixar ir embora de novo, ... Eu vou com você. Pra onde você for... Eu vou com você.
   respondeu a menina ao que a apertou ainda mais contra si. sentiu lágrimas se formarem em seus olhos. Ela respirou fundo e continuou abraçada a ele.
  E jura a quem quer que seja que ela ouviu a voz de lhe sussurrar no mesmo tom de voz que ela usava quando contava algo sorrindo: “eu te cuido daqui, e ele te cuida daí”.
  E pelos próximos meses deixou que a cuidasse do céu e a cuidasse na terra.



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