Holiday Inn

Escrito por Zã Nogueira | Revisado por Luma de Souza

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  - Senhores passageiros, informamos que devido à nevasca, todas as partidas e chegadas estão sendo canceladas. Dirijam-se as suas respectivas companhias aéreas para mais informações.
- Era só o que me faltava - Falei sozinha ao ouvir a voz que saía dos alto-falantes anunciarem o óbvio: o mundo estava caindo lá fora em forma de neve e nós estávamos presos ali. Antevéspera de Natal, sozinha no JFK, carregava as minhas malas de mão enquanto me arrastava até o balcão da United Airlines. Todo o meu corpo doía e aquelas doze horas de espera estavam pesando. Posicionei-me no fim da fila paciente, não tinha nenhuma outra coisa para fazer mesmo.
  - Atenção senhores passageiros, vamos acomodá-los no Holiday Inn próximo, vocês só precisam apresentar seu cartão de embarque ao fazer o check-in. Vans farão o translado, por favor, acompanhem-nos - A funcionária parecia estar tão cansada quanto nós, mas sua maquiagem e seu sorriso permaneciam irretocáveis, enquanto ela caminhava até a saída do aeroporto, sendo seguida pelo o que mais parecia o elenco de extras de The Walking Dead.

  Depois de uma curta distância percorrida em uma van lotada, seguida por muitas outras na mesma condição, finalmente chegamos a um dos hotéis que nos hospedaria. O aquecedor estava ligado, o que deixava tudo mais agradável, mas a fila no balcão de check-in era absurdamente longa e o sofá da recepção parecia uma opção bem mais relaxante. Sem hesitar, me arrastei até lá. Tentei prestar atenção no que passava na tevê, a moça do tempo informava que a nevasca continuaria forte nas próximas horas, mas logo em seguida senti meu corpo amolecer e adormeci. Late Night with Jimmy Fallon já estava passando quando um jovem funcionário me acordou.


  Eu não tinha certeza de onde estava, mas então a neve caindo da janela me lembrou. Segui o garoto em silêncio até o balcão e o entreguei meu cartão de embarque enquanto ele preenchia alguns dados. Eu terminei de preencher a ficha de cadastro ainda meio sonolenta. Queria um banho e cair na cama.
  - Certo, você precisa de uma chave. Onde estão aqueles cartões idiotas? - O funcionário falava sozinho - Isto aqui está uma bagunça. Quarto 130 fica no ultimo andar, ao fim do corredor. - Ele sorriu para mim e meu estendeu um cartão. Agradeci e me dirigi ao quarto mencionado.
  O corredor estava silencioso, o barulho dos meus passos contra o carpete fofo era a única coisa que se ouvia. Coloquei o cartão na maçaneta e abri a porta do quarto. A luz já estava acesa e a tevê parecia estar ligada e o aquecedor também. Entrei no quarto e segurei o grito ao ver um rapaz só de cuecas lá dentro. Ele também se assustou ao me ver, mas estava muito mais contido.
  - O que você está fazendo aqui? - Dissemos em uníssono.
  - Esse é meu quarto - Ele disse com um sorriso convencido.
  - Não, é meu quarto - Falei balançando o cartão em minha mão.
  - Temos um problema, porque também tenho um desses.
  - Certo, vou até a recepção resolver isso.
  - Vou com você - Ele disse prontamente.
  - Acho que seria uma boa ideia você colocar... Sabe... Mais peças de roupa.
  - Oh, certo, certo - Ele parecia só agora ter notado toda sua falta de vestimenta e ficou visivelmente envergonhado. Colocou um suéter e teve alguma dificuldade em colocar seu jeans justo. Eu sei que deveria ter ido para o corredor para deixá-lo se vestir ou algo assim, mas não conseguia me mover - Vamos? - Ele disse sorrindo, talvez notando que eu não havia tirado os olhos dele por nem um segundo.
  - Você se importa se eu deixar minhas coisas aqui?
  - Não, esse quarto pode ser seu no fim das contas - Ele deu de ombros e nos dirigimos à recepção.

  - Sinto muito - O jovem garoto que me atendeu, agora com o cabelo totalmente bagunçado, uma xícara de café em mãos e consultava o computador no balcão - Aparentemente eu coloquei vocês dois no mesmo quarto.
  - Certo, James - Falei lendo o nome dele em seu crachá - Percebemos isso. Foi uma confusão aqui hoje, sabemos que não foi sua culpa. Você só precisa me colocar em outro quarto e está tudo resolvido.
  - Não temos mais nenhum quarto disponível.
  Suspirei. Óbvio que aquilo estava acontecendo comigo. Estava presa em Nova York, chegaria atrasada para a ceia de Natal na casa da minha mãe - e acredite, é melhor você ter um bom motivo para se atrasar para a ceia da minha mãe - e não tinha onde dormir.
  - Onde fica o hotel mais próximo?
  - Duas ruas daqui, mas eles já ligaram para cá querendo saber se tínhamos vagas. Todos os hotéis da região estão lotados, devido ao fechamento do aeroporto.
  - Então o que eu devo fazer? - Falei apoiando os cotovelos no balcão.
  - Pelo o que vejo, o quarto 130 é um duplo... Vocês poderiam dividir.
  - Essa é a melhor opção? - Eu disse.
  - Daremos um voucher de um fim de semana com tudo incluso em qualquer hotel da nossa rede no mundo todo - Ele disse estendendo panfletos a nós dois.
  - Paris! - O meu novo colega de quarto disse com satisfação - Legal... Vamos então, rommie?
  - Vamos - Dei de ombros. O que mais poderia acontecer?
  - Você prefere a cama perto da janela ou da parede, rommie?
  - .
  - Como?
  - Eu sou .
  - Ah, prazer - Ele estendeu a mão - John.
  - Janela - Eu disse enquanto ainda apertava a mão dele e ele fez uma careta sem entender o que eu quis dizer. Caminhei até a cama e coloquei uma das minhas bolsas nela, levando a outra até o banheiro comigo, queria tomar um banho e cair na cama.
  Tomei um banho mais curto do que eu gostaria, mas a sensação de que John entraria no banheiro à qualquer momento me impedia de realmente relaxar. Estava enrolada na minha toalha e então lembrei que o meu pijama estava na mala que eu tinha despachado. Perfeito, realmente. Sorte que eu era precavida e tinha mudas de roupa na minha mala de mão. Uma cueca samba-canção - do Batman, mas era melhor que ficar de calcinha, certo? - e uma camisa cinza qualquer, foi isso que eu vesti. Quando voltei para o quarto, John já estava na cama, vendo o fim do Late Night sem parecer que estava realmente prestando atenção. Ele estava com uma camisa branca e o fino lençol creme o cobria da cintura para baixo. Eu também entrei na minha cama, olhando para a tevê.
  - Você está indo para onde? - Ele olhou para mim.
  - Brasil. Sou de lá, vou passar o Natal com minha família. E você?
  - Indo para Phoenix, acabei de chegar da Europa.
  Silêncio. Excetuando pela propaganda de um novo e totalmente inútil aparelho para cozinha que passava na tevê.
  - Você mora aqui há quanto tempo?
  - Dois anos. Na Califórnia, na verdade. Nova York foi só a escala do voo.
  - O que você faz?
  - Sou designer da Random House.
  - Legal.
  - Você sabe o que é a Random House?
  - Não faço ideia - Ele sorriu de um jeito tímido que me fez rir.
  - É a maior editora de livros do mundo e também é uma produtora de filmes.
  - Então você basicamente faz capas de livros?
  - E pôsteres de filmes, basicamente.
  - E você faz de CDs também?
  - Nunca fiz.
  - Uma pena...
  - Por quê? Não vai me dizer que você é um rockstar - Eu ri, mas logo me arrependi. Pelo jeito que ele me olhava, podia dizer que sim. O encarei, tentando me lembrar de onde o conhecia. Não fazia a mínima ideia, nunca esqueceria aquele rosto se já o tivesse visto antes.
  - Quase - Ele falou tímido. Voltei a rir, mas dessa vez ele me acompanhou.
  Mais uma propaganda, agora de um aparelho de ginástica que você poderia guardar embaixo da cama junto com os outros milhares que comprou na esperança de ganhar aquela barriga tanquinho para o verão, porém sem sucesso. Encarávamos a tevê como se aquilo fosse realmente interessante.

  - Você voltou da Europa, certo? - Perguntei somente para quebrar o silêncio - Turnê?
  - Sim. Foi uma coisa pequena, nossa primeira vez lá... Eu fiquei um tempo a mais, precisava me desligar um pouco.
  - E quando você decide voltar para casa, fica preso na maior nevasca da última década do país.
  - Não está sendo tão ruim - Ele disse e me fez sorrir. Quer dizer, ele era extremamente gato e gentil, não era nada mal estar presa naquele hotel com John - Você quer comer alguma coisa?
  - Sim - Foi somente naquele momento que notei que estava desesperadamente faminta.
  - Nachos? - Ele perguntou, já tirando o telefone do gancho. Acenei afirmativamente com a cabeça e ele fez a ligação. Distrai-me vendo algum filme dos anos 80 que passava na tevê enquanto ele falava com o restaurante - Pedi margaritas, tudo bem?
  - Ah, claro - Eu sorri e ele passou a prestar atenção no jovem Patrick Dempsey na tevê. Nenhum de nós dois ficamos realmente assistindo o filme, era só para disfarçar o vazio ali, o silêncio entre a gente. Batidas na porta e um anuncio de que o serviço de quarto estava ali.
  - Você se importa de ir buscar? Estou só de cuecas - Ele disse meio tímido.
  - Eu também - Disse e ele riu. Foi inevitável não rir junto, ao vê-lo mostrando todos aqueles... Dentes. Ele levantou, deixando a mostra o corpo bem definido e com tatuagens estrategicamente colocadas. O acompanhei com os olhos, sem sentir nenhum pingo de vergonha, e ele parecia estar se divertindo, levando o maior tempo possível para cruzar o quarto.
  - Tudo bem, eu posso levar - Ele falou com o funcionário e voltou a entrar no quarto, carregando uma bandeja cheia. Empurrei o criado mudo para deixa-lo entre nossas camas, servindo de mesa. John colocou as coisas ali e começamos a comer - Você não fala?
  - Falo - Ele me olhou e sorriu, me fazendo corar. Aquele garoto lindo só de cuecas ali e eu falando com a boca cheia de taco.
  - Ah, tudo - Falei sem jeito e ele ficou me olhando, como se me desafiasse a puxar algum assunto - Você ficou na Europa sozinho?
  - Só alguns dias. Estava com uma música na cabeça e ela não queria sair. Achei que rodar alguns dias por aí ajudariam.
  - E deu certo?
  - Não - Ele sorriu, mas não parecia muito feliz, para dizer a verdade - Me faltou inspiração.
  - O que te inspira?
  - Várias coisas...
  - Amor?
  - Não ultimamente... Mas vamos falar sobre você agora. Conte sobre como você veio parar aqui nos Estados Unidos - Nada sutilmente, ele mudou de assunto.
  - Vim pra cá terminar a faculdade de Design e consegui um estágio na Random House. Eles me ofereceram um emprego e eu resolvi ficar, nada demais.
  - Só isso?
  - Certo. E uma necessidade gigantesca de sair de casa, conhecer o mundo - Eu disse e ele simplesmente sorriu.
  - Sabia - Ele bebeu da taça dele, que estava quase vazia, exatamente como minha ainda. Me dei conta do quanto havia bebido, aquilo era realmente grande e eu não era forte para me manter sóbria bebendo tanta tequila - Você não é muito diferente de mim...
  - Como assim?
  - Espíritos livres.
  - Espíritos bêbados, isso sim - Falei e ele riu.
  - Talvez, mas o que resta a fazer? Estamos presos num hotel na maior nevasca da década. Isso é só o começo - Ele virou o fim do drink e levantou, precisando de alguns segundos para ter certeza de que não cairia - Beber sentado não foi uma boa ideia.
  O observei caminhar até o frigobar, não sabia se eram passos vacilantes ou se ele dançava discretamente. Abriu a porta e ficou olhando, como se estivesse em uma adega com milhares de opções e não em um hotel três estrelas. Ouvi o barulho de vidros batendo e ele voltou-se sorridente para mim.
  - Vodka, tequila ou uísque?
  - Tanto faz - Eu disse e ele jogou uma das garrafinhas. Abri e entornei o conteúdo. Uísque. Minha garganta queimou, mas era uma sensação boa. O observei enquanto ele também bebia a sua garrafinha, sentado em sua cama. Sentada na minha, notei seus lábios ainda úmidos de sua bebida e não segurei um leve suspiro. Eu queria aquela boca desde o momento em que pisei naquele quarto, só não estava admitindo. Meu olhar foi de sua boca para seus olhos, surpreendentemente, eles me encaravam de volta. John deslizou para frente, fazendo com que inicialmente nossos joelhos se tocassem, e então separou os seus, continuando a se aproximar de mim, deixando minhas pernas entre as suas. Pouco nos separava e ele me olhava como se pedisse permissão antes de cada movimento, que eu encorajava com um sorriso leve nos lábios. Sua mão direita estava no ar, indo até meu rosto, quando o celular no criado mudo ao lado da cama dele tocou. Foi a vez de John suspirar audivelmente e sua mão, tão próxima de mim, ficou novamente distante, passando pelo seu cabelo. Ele levantou e apanhou o telefone.
  - Alô? Oi, querida. Nenhum sinal de trégua. Sim, sim. Espero chegar em casa a tempo. Guarde um pedaço de peru para mim - Ele falava e eu não podia evitar em prestar atenção em cada palavra - Também estou com saudades. Eu amo você - Ele desligou e ficou mexendo no aparelho enquanto eu pensava no que quase havia acontecido. Eu não o conhecia, será que ele havia acabado de falar com sua namorada? Mulher? Ou pior, filha? - Minha mãe - Ele disse como quem podia ouvir meus pensamentos.
  - Ah... - Falei me sentindo melhor.
  - Estou a várias semanas longe de casa e todos os meus amigos já voltaram, ela ficou preocupada.
  - Claro, natural - Então nada me impedia de beijá-lo, certo? Pensei comigo mesma. Ao notar que eu era a única coisa que não permitia que John fosse meu aquela noite, era eu mesma, fiquei de pé e caminhei até ele. O garoto sorriu, talvez por ter notado minhas intenções, e assim que me aproximei sua mão firme estava em minha cintura. Senti um leve gosto de tequila na boca dele, mas havia algo mais, eu queria algo mais. E logo a cueca dele deixou bem claro que eu não era a única.
  Caímos na cama de John, eu sobre ele, e não nos desgrudávamos por um único momento. Uma de suas mãos apertou minha bunda sem cerimônia, me fazendo rir contra seus lábios. A outra se matinha em minha cintura, também me apertando. As minhas mãos ficavam entre dar leves puxões em seus cabelos e acaricia-lo em seu pescoço e ombros.
  - Sabe... Isso não é justo - Ele sussurrou em meu ouvido, fazendo cada pelo de meu corpo se arrepiar.
  - O que? - Respondi ofegante, mal podia acreditar que uma nevasca caia lá fora, de tão quente que o quarto estava.
  - Você cheia de roupas e eu só com essa cueca - Ele deu um sorriso torto e eu levantei meus braços, sorrindo de volta.
  John tirou minha camisa, felizmente estava com um sutiã preto simples e não alguma coisa cheia de cerejinhas e nuvenzinhas que costumava usar. Logo não havia mais nenhuma peça de roupa entre nós e as mãos de John já haviam tocado cada milímetro de pele minha.

  Abri os olhos na manhã seguinte, John e eu dividíamos a minha cama, eu estava de costas para ele, que mantinha seu braço em minha cintura. A campainha do telefone do quarto tocava estridentemente e eu faria qualquer coisa para que ela parasse. Estiquei a mão e peguei o aparelho, colocando-o em minha orelha.
  - Alô? - Disse com a voz embolada de sono e os olhos ainda fechados.
  - Bom dia. Estamos ligando para informar que o aeroporto já tem condições de voo favoráveis e as vans já estão preparadas para levá-los.
  - Obrigada - Respondi já saltando da cama. Estava apenas de roupa intima, mas realmente não havia nada ali que John não tenha visto então não me preocupei, me enfiando em minhas roupas. Dei graças a Deus por poder usar roupas que cobriam meu corpo todo, já que tinha hematomas espalhados por ele. Sorri discretamente, me lembrando da noite anterior, de ouvir a respiração ofegante de John, de sentir seu corpo tombar ao lado do meu e imediatamente pedir por mais, sendo prontamente atendido.
  - Para que tanta pressa? - John falou com os olhos semicerrados e a voz mais arrastada do que o normal. Seu braço estava esticado em minha direção e sua mão me chamava de volta para a cama.
  - Temos que ir, o aeroporto reabriu.
  - Ah, certo - Ele levantou com a maior calma do mundo e também começou a se vestir.
  Eu ainda estava escovando meus dentes e John já estava pronto, carregando nada além de sua mochila. Assim que voltei ao quarto, senti o cheiro do perfume dele em todo o aposento. Senti que havia me distraído por algum momento e logo tratei de jogar minha escova dentro da minha bolsa.
  - Vamos? - Falei, pegando minha mala de mão e ajeitando minha bolsa no ombro.
  - Deixa que eu leve isso para você - John pegou na alça da minha mala.
  - Não é necessário - Eu disse, sem largá-la.
  - Eu insisto - Ele sorriu, puxando a mala para perto de si.
  - Obrigada - Eu disse. Caminhamos em silêncio até o elevador e em poucos instantes voltaríamos a nossa vida normal, onde éramos nada um para o outro. Entramos no elevador e eu apertei o botão que nos levaria ao saguão principal. As portas se fecharam e eu ouvi John respirar profundamente ao meu lado.
  - , escute - Ele começou, provavelmente iria dizer que estava super bêbado na noite anterior e que aquilo tudo tinha sido ótimo, mas ele tinha uma namorada no Arizona ou alguma coisa assim. Quem sabe até me convidasse para o casamento deles. Então eu diria que também havia me divertido e que também estava super bêbada, apesar de que isso era mentira, mas quem ligava? Porém, antes que ele começasse a falar, o elevador parou e a porta voltou a se abrir, e uma família de quatro pessoas entrou sorridente. John olhou para mim e fez uma careta. Tudo o que eu queria era chegar logo ao térreo, mas o elevador parou em todos os doze andares que nos separavam do térreo, mesmo que ninguém conseguisse entrar, já que a lotação máxima havia sido alcançada no décimo andar. Eu estava espremida entre uma senhora que cheirava a bronzeador e John, com nossos braços roçando de tempos em tempos. Agradeci quando finalmente chegamos, apesar da bagunça que era o saguão, com todas aquelas pessoas amontoadas lá.
  De maneira desorganizada, fomos entrando nas vans que partiam assim que ficavam lotadas, em direção ao aeroporto. Ao chegar lá, voltamos ao balcão da empresa área, para refazer o procedimento de check-in. Depois que peguei as minhas informações, aguardei ao lado da fila por John, que ainda estava com minha mala de mão.
  - Meu voo terá embarque em uma hora - Eu disse.
  - O meu está previsto para daqui a duas horas - Ele respondeu - Podemos comer alguma coisa?
  - Hm, pode ser - Eu disse. Tinha uma hora para matar, melhor que fosse acompanhada.

  Caminhamos calmamente pelo aeroporto, alheios ao caos presente ali. Tínhamos mais uma hora e então, tudo estaria acabado. Sentamos em um dos poucos cafés que ainda tinha mesas disponíveis e fizemos nossos pedidos.

  - Então - Ele disse. Já tínhamos perdido quarenta minutos andando pelo aeroporto, achando um lugar, fazendo nosso pedido, conversando sobre o tempo, sobre a qualidade da comida, sobre a conta não paga do consumo que havíamos feito no hotel, mas nada do outro tipo de atividade realizada naquele mesmo quarto. Pressentia que aquela era a hora. John me olhou, passou a mão pelos cabelos e sorriu sem graça. Então era agora que o papo de como nós bebemos na noite passada deveria começar - Sobre ontem a noite...
  - Você se arrependeu?
  - Não! Do que você está falando? - Ele fez uma careta engraçada, um misto de surpresa com ofensa - Você se arrependeu?
  - Não, não, foi divertido.
  - Também achei... Era isso que queria falar. Você foi incrível - Ele deu um sorriso mais aberto, ligeiramente sacana - E eu realmente queria te levar para o Arizona comigo. Não só pelo sexo. Você me fez rir e pensar antes de falar, mas não assim, com uma necessidade incrível de te impressionar, eu pude ser eu mesmo, sem me preocupar se você ia achar tudo idiota, porque nós somos iguais, sabe?
  - Espíritos livres? - Eu disse rindo.
  - E ligeiramente bêbados e bem flexíveis e com ótimo senso de humor.
  - Para falar a verdade, eu não estava bêbada - Falei dando de ombros.
  - Nem eu - Ele disse, me encarando com aqueles olhos penetrantes - Me odiaria se esquecesse de um único segundo dessa noite.
  Voltamos a ficar em silêncio, mas sorriamos um para o outro. Tudo aquilo tinha sido como fogos de artificio, brilhante e intenso - sem mencionar barulhento - por um instante, mas logo depois desaparecia. Abri minha bolsa e peguei um dos meus cartões, entregando a John.
  - Voltarei no fim de Janeiro.
  - Em Janeiro estarei turnê, será que você pode ir até mim?
  - Quem sabe durante um fim de semana - Falei tentando manter a empolgação de um possível reencontro. John abriu sua mochila e de lá caiu o catálogo que o funcionário do hotel tinha nos dado.
  - Qual a próxima data comemorativa depois de Janeiro? - John perguntou.
  - Dia dos namorados, em fevereiro - Disse a atendente do café, recolhendo nossos utensílios usados. Eu olhei para John sem entender o que ele queria.
  - Certo, Paris, neste aqui - Ele apontou no catálogo - Dia dos namorados. Faça a reserva por nós dois. Com uma cama de casal dessa vez - John falou e eu dei risada. Olhei para o painel de embarques e desembarques, já deveria ter saído de lá ou não chegaria ao meu portão a tempo. Ele também olhou e se levantou - Vou te acompanhar até lá.
  Caminhamos, por mais que eu quisesse segurar sua mão, ou algo assim, não sentia que era apropriado. Ele foi até a porta da segurança, o máximo que ele poderia ir. Devolveu-me minha mala e sorriu de lado, e eu sabia que em todo momento que pensasse nele, seria daquele jeito, com os cabelos bagunçados, olhos em mim e sorriso de canto, como se só eu soubesse do seu segredo. Nos beijamos pela última vez e eu sabia que Fevereiro demoraria a chegar, por isso só o soltei quando fiquei sem ar.
  - Tem alguma coisa sobre você, - Ele falou - Não faço ideia do que é, mas Paris parece um bom lugar para descobrir...
  - Esteja lá - Eu disse, olhando para ele por um ultima vez, como na tentativa de gravar algum detalhe que tenha passado em branco nas horas que havíamos passado juntos - Certo. Boa viagem - O abracei e ele desejou o mesmo para mim e eu parti. Sentada na minha poltrona, lia o catálogo sobre o hotel em Paris, nunca desejei tanto que minhas férias terminassem.

FIM



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