Hi, Mommy?
Escrito por Beatriz Romero | Revisado por Natashia Kitamura
Enquanto se aventurava pelas ruas cobertas de neve, Linda tomava seu merecido café para aquecer seu corpo, pois não são todos que conseguem sobreviver sem qualquer bebida quente plena segunda-feira de manhã. Seus ossos eram quase congelados conforme cada brisa fria vinha de encontro com seu corpo magro coberto por agasalhos e mais agasalhos que pareciam ser somente uma única manta fina.
Seu dia havia começado bem, seu carro havia quebrado assim que ela inseriu a chave, e para a sua alegria, a neve fez com que a linha telefônica falhasse quando tentou ligar para um mecânico. Já quando resolveu tomar um metrô, a neve tinha bloqueado quaisquer chances das rodas dos metrôs rodarem por seus trilhos. Então ela optou por sua última, e menos desejada, opção de locomoção para o hospital, ir andando.
Quando pôs os pés com os tênis cobertos de neve dentro do hospital uma enfermeira que tinha o corpo rechonchudo e os cabelos encaracolados presos em um coque de tamanho pequeno se aproximou com uma expressão sonolenta no rosto. Após um bocejo, ela indicou para Linda uma sala que os cirurgiões costumavam ir para colocarem as tão famosas roupas brancas que seriam usadas nas cirurgias.
Assim que foi empurrada para dentro da sala, a enfermeira fechou a porta provocando um som alto. Em passos silênciosos e tímidos, Linda foi andando até o fim da sala para encontrar o seu armário e depositar as suas roupas de frio e recolher as brancas.
Assim que fechou o armário ouviu alguém resmungar algo.
- Maldito armário! Não reformaram isso quando aconselhei a melhoria de substituir o cadeado de números por um com uma simples chave? Seria mais simples e menos trabalhoso de abri-lo, - ouviu alguém se aproximar - quem está aí?
- Er, eu me chamo Linda Russeau. O seu nome seria qual?
- Eu sou Lincon Tissou. Trabalho aqui já faz alguns anos. Nunca te vi por esses corredores, você é nova por aqui, estou certo?
- Sim, hoje posso dizer que este é o meu primeiro dia trabalhando aqui.
- E você pretende fazer o quê? Será enfermeira?
- Não, serei cirurgiã, pretendo não abandonar este local de trabalho porque aqui geralmente são recebidos muitos pacientes - em outras palavras, seu pai falecera neste mesmo hospital.
- Fico feliz em lhe informar que nós iremos nos ver com frequência no decorrer dos dias - disse finalmente conseguindo abrir a tranca do cadeado de seu armário azul.
Por dentro, Lincon estava comemorando por ter conseguido cumprir sua meta de abrir aquele cadeado pouco prestável. Aquele hospital havia sido construído por volta dos anos de 1976. E naquela época os usuários do local não tinham qualquer cuidado ou respeito, em maior destaque de falta de respeito estavam os governadores que insistiam que não era necessária a existência de qualquer edifício que oferecesse cuidados médicos.
Mas os tempos mudaram com o passar das décadas até os dias atuais. Obviamente houve a troca de governadores. Cada novo governador conseguia superar as expectativas da população, cada lei que era imposta chegava a surpreender a população, afinal, era cada absurdo que fora ouvido na época que chegava ser possível sentir vontade de abandonar o domicilio e partir para a cidade mais próxima em busca de melhor qualidade de vida longe de qualquer nova lei.
Porém, o hospital, com algum motivo milagroso, manteve-se em pé, mesmo quando quase fora destruído no momento em que a falta de pacientes e médicos havia se posto em sua rotina diária.
Lincon colocou seus pertences dentro do armário e retirou as roupas brancas deixando-as jogadas por cima do ombro direito.
Se encaminharam até o armário de Linda e ele pressionou o círculo que decidia qual seria o número escolhido para a combinação da senha com o indicador e o polegar.
- Qual é a combinação?
Linda hesitou.
- Não se preocupe, não vou invadir a privacidade do seu armário.
- 12, 08, 03 e 11.
Ele começou a rosquear e quando estava prestes a finalmente selecionar o último número o cadeado travou. Ele levou a outra mão, irritado, ao cadeado e usou um pouco mais de força.
Não obteve qualquer resultado.
Linda acompanhava aquela cena com os braços cruzados na altura do peito dando uma risada curta e baixa; aquilo era completamente hilariante, pois Lincon estava ficando com um leve tom avermelhado na área das maçãs do rosto.
Ele se virou para ela com os dentes cerrados e finalmente conseguiu destrancar o cadeado e abrir o armário.
Linda ofereceu-lhe seu melhor sorriso de gratidão e se aproximou para pegar suas roupas.
O mural de anotações estava repleto de pequenos quadradinhos coloridos com nomes dos cirurgiões indicando que ficaria com determinado paciente e em qual sala de qual andar ficaria.
Ao que indicava, o papel da cor verde era o que continha o seu nome e ela deveria estar na sala 8 do 14 andar.
Apesar dos pesares, estava animada, seria seu primeiro paciente e aquilo era bom, na realidade, queria poder imaginar como teria sido a vida daquela pessoa antes de vir para o hospital. Possivelmente ela teria uma família, e quem sabe filhos ou filhas, um emprego que a ajude a sustentar a família.
Estava a certa distância do elevador e notara que Lincon estava dentro do mesmo e a porta se fechava.
- Lincon! Segure o elevador!
Ele pousou a mão na lateral da porta do mesmo impedindo a mesma de se fechar. Linda adentrou o elevador com alguns fios caídos de cabelo sobre o rosto. Inspirou por entre os lábios avermelhados devido ao seu batom e falou.
- Obrigada.
- Não há de quê.
- Você estará em qual andar?
- No 13º. E você? - perguntou passando a mão pelos cabelos ainda úmidos e com um pouco de gel.
- Estarei no 14º.
Foi ouviu um bipe que anunciava que o elevador havia parado no andar desejado.
- Até breve... Linda, certo? - disse saindo do elevador.
- Até, Lincon. - ela deu um curto aceno com uma das mãos, enquanto a outra estava dentro de seu jaleco branco gelo, e a porta se fechou.
O elevador possuía uma leve corrente de ar frio que fazia os fios mais curtos da nuca dos longos fios do cabelo de Linda. As paredes do elevador davam um ar de tranquilidade fazendo as pálpebras de seus olhos, que possuíam as íris cinza como o céu em um dia nublado, e suspirar quando apoiava as costas na parede lateral.
Chegando no seu andar ela sai do elevador e caminha até sua sala. Enquanto anda, ajeita os cabelos em um rabo de cavalo mais firme e forte. Ainda é possível destacar as bolsas embaixo de seus olhos.
Ao se deparar com seu paciente ela hesitou por um tempo. Era uma mulher, não, era uma garota que não aparentava ter mais de 18 anos de idade, os fios dos cabelos loiros tom bege 8 estavam amarrados em um coque médio, a pele era pouco mais bronzeada que a da própria Linda, era perfeita, sem quaisquer manchas ou sardas, estava grávida e com os olhos avermelhados devido ao tempo que deve ter ficado chorando. Estava também acompanhada de um garoto que parecia ter 19 anos de idade, possuía os cabelos e os olhos da mesma cor acastanhada; as roupas eram comuns; camisa branca; calças tom de caqui e vans nos pés.
Ele segurava as mãos dela como se não se importasse com mais nada no mundo.
Tirando de seus devaneios ela vai até a mesa próxima á cama da paciente e retira a prancheta com um bloco de folhas brancas que continham informações sobre a garota dos cabelos loiros.
Ao que indicava, ela se chamava Sophie Edwards, possuía 16 anos, não tinha alergia a nada a não ser amêndoas, estava grávida de 9 meses de uma garotinha e não consumia drogas. Se virando para ela falou.
- Você se chama Sophia, certo?
- Sim. - respondeu enquanto fungava.
Se virou para o garoto.
- E você seria...?
- Acompanhante e namorado. Mais precisamente o Logan Petrick.
- Pois bem Sophia, imagino que você deve estar apavorada e em estado de choque. Por isso, irei tentar ser o mais simpática possível. -Sem obter respostas prosseguiu - já decidiu o nome?
- Ainda não.
- Você sabe como vai querer: cirurgia ou parto normal?
- Eu quero fazer a minha filha nascer, como a minha avó sempre dizia para mim, ninguém pode fazer isso melhor do que você mesma.
Linda sai da sala apressada para poder garantir uma sala em bom estado e mais bem cuidada digna de poder ser utilizada para uma mulher, ou no caso, uma garota, poder parir seu bebê com a certeza de que ele poderia ficar bem.
O corredor tinha as paredes azuis extremamente claras e o piso branco tom de mármore era tão limpo que chegava ser possível observar o próprio reflexo nele. Nele, no corredor, havia dezenas de médicos circulando com os prontuários de seus pacientes, mas também havia os médicos nas salas informando o procedimento de determinada cirurgia, ou informando que a cirurgia não teve sucesso, ou até mesmo dando uma boa notícia, como, por exemplo, a cura de um derrame cerebral e um tumor removido.
Quando finalmente selecionou a sala e informou Sophia sobre sua escolha, foi para o refeitório tomar o seu merecido café com leite e canela, Lincon estava em uma mesa azulada sem toalha comendo algum bolinho de chocolate e tomando suco de maçã; haviam migalhas em seu rosto, ao que indicava, ele teria comido sanduíche também.
Linda se aproximou da mesa com um copo completo com o amável líquido quente que a manteria com as pálpebras abertas.
Lincon levantou as íris de seus olhos castanhos quando ela se sentou e apoiou os cotovelos na mesa.
- Como é o caso do seu paciente?
Ele terminou de comer seu último bolinho e juntou o lixo que havia sobrado, passou a mão no queixo e deixou o mesmo apoiado sobre as duas mãos (os cotovelos também estavam apoiados flexionados sobre a mesa).
- Ela é uma adolescente que está no último mês da gestação. Acho que ela está com medo da reação dos pais, pois quando cheguei na sala ela estava chorando ao lado do namorado.
- Mas como os pais dela não sabem que ela está no último mês da gestação? Pois sejamos diretos, não é possível esconder que há uma criança dentro dela.
- Acho que ela deve ter mudado de cidade, deixado os pais, e está em uma casa para estudantes.
- Certo...
Linda olha para o relógio do pulso e levanta ás pressas deixando Lincon falando com os ventos.
Precisava cuidar da sua paciente, ela era a sua primeira, então com toda a certeza ficaria com aquilo se repassando e repassando em sua mente sempre que estivesse em algum momento de lazer ou quando a guardasse por algo, ou alguém, em algum lugar, seja qual ele fosse.
Assim que chegou na sala os enfermeiros já haviam preparado a sala em que Sophie teria sua amada criança. E Sophie já estava pronta, com o namorado do lado acariciando os nós de seus dedos sussurrando que tudo ficaria bem e que eles seriam uma família feliz e maravilhosa como sempre viam nos filmes de romance.
Linda foi lavar as mãos e em seguida colocar as luvas emborrachadas.
Quando se aproximou, Sophie colocou as pernas afastadas e inspirou todo o ar que seus pulmões conseguiam suportar.
- Vamos lá Sophie, quero que use toda a sua força nisso. Agora!
Ela apertou a mão de seu namorado e fez toda a força que conseguia permitindo que uma lágrima saísse de seu olho.
- Quase, falta pouco! Mais força!
Sophie aplicou toda a força e mais um pouco. Começou a gritar, chorar, transpirar e se cansar. Aquilo era mais doloroso que pensara.
- Peço que continue. Está quase. Um último esforço, Sophie.
Até que foi ouvido um choro de um bebê.
Ela viu seu pequeno bebê nos braços magros de Linda e sorriu. Todo aquele sofrimento valeu cada gota de suor que havia derramado. Queria poder carregar seu bebê, mas o cansaço a dominou por completo fazendo-a fechar os olhos e repousar a cabeça no travesseiro. Adormeceu.
Quando acordou Logan entrou com seu bebê e se sentou na ponta de sua cama.
- Ela é linda.
- Ela?
- Sim, ela.
Sophie imediatamente sorriu.
Linda entrou na sala sorrindo timidamente com as mangas arregaçadas até a altura doa cotovelos e com as mãos dentro dos bolsos. Seus cabelos estavam soltos e atingiram até abaixo da localização das mangas.
Ficou de pé ao lado da mesa de metal que sustentava um aparelho que era ligado aos batimentos da paciente e cruzou os braços.
- Obrigada. - disse Sophie com extrema gratidão vinda do fundo de seu coração.
- Eu que agradeço. Como ela, sua filha, se chama?
- Ainda não decidimos. - disse Logan.
- Eu já sei como - levou suas mãos na altura do local onde os cabelos de Linda tampavam seu crachá e afastou os mesmos - Linda, ela se chamará Linda.
Naquele momento a felicidade tomou conta do corpo e do espírito de Linda, ninguém nunca fez tamanha homenagem para si, aquele com certeza fora o melhor momento de sua vida.
Sophie se virou para a porta e avistou uma mulher não muito mais alta que ela própria, com uma caixa nas mãos. Começou a chorar.
- Mãe?
A mulher se aproximou da cama e Linda se retirou, sabia que aquele era um momento particular de mãe e filha.
- Feliz dia das mães, querida. - falou estendendo a caixa para a filha.
Já era noite e Linda e Lincoln estavam sentados nos bancos de um bar qualquer tomando cada um sua bebida, uísque e tequila. Estavam conversando sobre como haviam sido seus dias no hospital. Ele contou que conseguiu remover um tumor e ela que havia conseguido realizar o parto sem danos emocionais e físicos.
Fizeram um brinde àquilo, aos seus pacientes e o dia triunfante.
Quando cada um pagou sua conta eles deram um abraço aconchegante e quente.
- Boa noite, Lincon.
- Boa noite, Linda.
Seguiram cada um para seu lado, assim que chegassem em casa iriam ter sua boa noite de sono e poderiam se preparar para o próximo dia no hospital.