Help me out!

Escrito por Fernanda dos Santos | Revisado por Mariana

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Capítulo Único

"The way you bite your lip
Got my head spinnin’ around"

  Virei mais uma vez o copo, sabendo que por mais que eu tentasse parecer apenas um cara despreocupado que gosta de sair sozinho e beber com os amigos, a verdade de fato estava na minha tentativa de auto consolo a cada gole da bebida amarga. Eu sabia exatamente o quão estúpido estava sendo por minha corriqueira auto piedade, apenas por levar mais um fora de uma garota. É claro que Claire era mais do que apenas uma garota, era a garota por quem estive apaixonado desde o jardim de infância, e que quando finalmente conseguira ter uma aproximação, estragara tudo com a minha habitual idiotice de não tomar a iniciativa quando ainda tenho chance. E também sabia exatamente que encher a cara até ficar caindo e jogando cantadas estúpidas pra todo lado não resolveria a situação, muito pelo contrário, eu provavelmente acrescentaria mais um problema à minha lista infindável de ser o idiota que sou: passar uns bons anos atormentado pela ideia de ser gay, quando acordar na manhã seguinte com uma ressaca maior do que os peitos da Pamela Anderson, mal conseguindo abrir os olhos e com dores estranhas nas minhas partes íntimas.
  Franzi o cenho e fiz uma careta ao pensar na possibilidade, afastando de perto o copo vazio à minha frente que o garçom gentilmente fazia questão de encher sem que eu sequer precisasse pedir. Dito e feito, lá estava ele mantendo meu copo transbordando de solidão. Me vi perguntando se ele sabia o porquê eu estava ali, provavelmente sabia ao julgar pela sua atitude gentil. Talvez ele, assim como tantos outros ali naquele ambiente, pensasse que eu era um completo idiota. Meus amigos com toda certeza sabiam disso e não faziam questão de esconder, ou ao menos o que eu chamo de amigos, e o que as pessoas ocasionalmente chamariam de colegas de trabalho com um ar carrancudo que denotava o quão distante seria daquelas pessoas se pudesse se dar ao luxo, ou se quisessem se dar ao trabalho.
  Bem, lá vem a auto piedade de novo. Novamente, entornei a bebida. No entanto, o fluxo do líquido que escorria ardendo por minha garganta foi interrompido de uma forma absurdamente esdrúxula quando eu a cuspi toda no vestido da garota mais linda que eu já tive a sorte de olhar cara a cara. Minha reação? Olhar pra ela feito um babaca de boca aberta, enquanto ela me olhava com um sorriso sarcástico e pegava o copo que o garçom enchera novamente, bebendo-o em um único gole e então o cuspindo em mim antes de piscar pra mim.
  - Agora estamos quites. - disse roucamente e mordeu os próprios lábios com um ar sedutor que a fez ter maior certeza do babaca que sou, e se afastou em direção à pista de dança. E apesar de provavelmente estar potencialmente aparentando ser mais idiota do que já sou, a única coisa que conseguia pensar era na piscadela que ela lançara para mim e na maneira como ela mordera os lábios carnudos e vermelhos, como se quisesse me provocar propositalmente, embora essa talvez fosse apenas a ilusão de um virgem de vinte e quatro anos, pois no fim das contas, o que uma garota linda como ela poderia querer com um cara como eu? Absolutamente nada.
  E foi aí que eu me enganei. E foi aí que tudo começou a dar absurdamente errado... ou absurdamente certo, dependendo do ponto de vista. Pois aquela garota com ar marrento e baderneiro... aquela que é exatamente o tipo de mulher que só lhe mete em confusão... bem, ela se tornou meu inferno particular na Terra, e com isso eu quero dizer literalmente um inferno... e literalmente particular.

"I know you’re no good but you’re stuck in my brain
[...]My mind keeps saying
Run as fast as you can"

  Entrei no shopping me sentindo mais babaca do que jamais me sentira em toda minha vida, sentia como se tivesse conseguindo superar Alan Harper, a quem eu achava estar sempre no topo da lista, me dando assim algum tipo de amor próprio, o que é extremamente deprimente quando você para pra pensar que precisa utilizar como referência um personagem de comédia pra sentir-se melhor a respeito de si próprio. Bem, e talvez seja por minha mãe e irmã mais velha que sempre me incutiram respeito em demasiado à todas as mulheres do Universo, mas eu realmente sigo como um dos meus poucos lemas existenciais a frase: 'O que elas pedem chorando que eu não faço sorrindo?' - e isso em relação à todas as mulheres que se deparam no meu caminho, incluindo nessa categoria uns homossexuais mais afeminados e até mesmo um ou outro travesti. E é exatamente esse meu lema tosco que me colocou na situação que me encontro agora, embora se eu for sincero comigo mesmo e com vocês - o que devem ter percebido que sou - esse cenário tivesse mais a ver com ela pedir sorrindo e eu aceitar beijando seus pés como se ela estivesse me fazendo algum favor, o que pode ser considerado como tal, levando em conta minha falta de tato absoluta com mulheres! Pois bem, lá estava indo eu encontrar-me - ou mais facilmente, levar um bolo de três horas e meia - com . Quem diabos é ? Fico contente que ambos nos entendemos sobre a relação do inferno nessa história, pois é a garota que cuspiu em mim na boate ontem. Sim, aquela mesma que só cuspiu em mim como vingança por eu ter cuspido nela primeiro, mesmo que a minha ação tenha servido como um quase elogio colossal, já que eu até mesmo esqueci de como engolir depois de vê-la.
  Enfim, . Esse é o nome da garota. Depois do fatídico momento em que ela cuspiu em mim, que eu não consegui mais parar de pensar na maneira provocativa que ela mordera seus lábios, que eu não parava mais de encará-la dançando na pista de dança como se não tivesse mais ninguém ao redor, depois de vê-la piscando pra mim e me chamando pra dançar com ela, e ficar olhando-a como se não compreendesse um simples gesto e ela provavelmente ter tido certeza nesse instante que eu me tratava de um retardado mental, e depois dela se cansar de apenas dançar e me lançar diversos acenos para que eu me juntasse à ela, acenos estes que era traiçoeiramente vistos por mim e encarados como uma ilusão maluca criada por mim para sanar os meus mais ínfimos desejos, e se aproximar de mim com um ar irritadiço perguntando se teria de cuspir em mim novamente para conseguir chamar minha atenção, nós então iniciamos uma rápida conversa que foi interrompida por seu celular inconveniente, mas que não a impediu de me pedir sorridentemente para que aparecesse em seu serviço no dia seguinte, alegando trabalhar em uma Starbucks no shopping central da cidade. E aqui estou eu! Esperando pelo enorme bolo que provavelmente levarei e me empurrará para um abismo de vergonha e humilhação ainda maior que talvez seja o início de uma depressão que me fará ter coragem pra dar um fim completo a minha ineficiente, idiota e inútil existência.
  Respirei fundo assim que avistei o corredor no qual se encontrava a Starbucks onde ela supostamente trabalhava, mas pude dar apenas alguns poucos passos antes de deparar-me com sua figura apressada caminhando em minha direção e fiquei paralisado ao sentir seus braços me envolverem em um abraço.
  - Credo! Você é o quê, uma tábua? Abraçar não dói, hein? - disse com uma voz levemente ressentida e segurou minha mão, puxando-me rapidamente para qualquer lugar que estivesse em sua mente sem me dar qualquer satisfação.
  - Hã... você não devia estar... bem... trabalhando? - perguntei confuso, sabendo que eu chegara muito mais cedo do que o horário estipulado por ela, que terminaria o expediente ao fim da tarde.
  - É... eu me demiti... fui demitida, algo assim... - deu de ombros como se não importasse, mas acrescentando ao perceber meu olhar indagador - Eu derrubei café em um cara idiota. - a ênfase na ação que tinha feito não me surpreendeu, mas me deixou assustado com a possibilidade dela ter algum transtorno psicótico.
  - Derrubou? - disse inconscientemente.
  - Bem, ele mereceu. - disse apenas finalizando o assunto e correndo a se sentar em uma mesa, enquanto eu suspirava e a seguia, sentando-me ao seu lado. - E então... Mr. Right, o que posso oferecer a você? - perguntou com um arquear de sobrancelhas sugestivo e mordendo novamente os lábios daquela maneira que me fazia ficar ainda mais lerdo do que o habitual, provavelmente todo o sangue do meu corpo indo se concentrar na área... errada?
  - Hã... bem, eu... eu só... na verdade, tecnicamente foi você quem me mandou vir aqui hoje, portanto você é quem deveria me dizer o que quer de mim. - murmurei um pouco confuso, logo ouvindo sua gargalhada escandalosa e percebendo algumas pessoas nos olhando estranho. Só me faltava chamar tanta atenção!
  - Well... well... vejamos o que quero de você... - ela fez uma careta pensativa e varreu o local com os olhos, observando as pessoas que ali se encontravam e pairando o olhar sobre uma garota que se encontrava algumas mesas à frente, conversando animadamente com uma amiga. Ela era realmente bonita, os olhos escuros contrastavam com os cabelos loiros, e seu corpo parcialmente escondido pela mesa à sua frente parecia ser bonito, o que significava que eu jamais teria coragem de ir conversar com ela. Encarei como se ela estivesse falando algum desvario completo - o que ela estava, se tratando de mim - e ela então suspirou, respondendo ao meu olhar - Ok. Eu vou então, querido. Mas não prometo que serei tão fofa como você provavelmente tentaria ser... - e então com um sorriso animado ela começou a se afastar enquanto falava um pouco alto para que eu ouvisse - Não se preocupe, no máximo ela chamará a polícia!
  Arregalei os olhos e levantei rapidamente, tentando alcançá-la antes que ela fizesse alguma enorme besteira, no entanto quando me aproximei ela já se encontrava abaixada ao lado da garota, rapidamente me precipitei a puxá-la, mas ela se afastou antes, indo pra longe enquanto a garota loira e sua amiga me olhavam curiosas, provavelmente esperando que eu dissesse algo sobre o que acabara de acontecer, mas apenas sorri amarelo sem saber o que fazer, tentando pensar algo antes que minha boca começasse a vomitar palavras idiotas e frases sem sentido, o que foi exatamente o que aconteceu.
  - Desculpe-me, eu... bem... eu não... ela estava, não é verdade... eu não estou a fim de você, eu não poderia... Quero dizer, não que eu não pudesse, porque você é realmente muito linda, mas eu... Não me interesso por estranhas dessa maneira, o que... Quero dizer, ela é uma completa estranha, sabe? Eu não a conheço, de maneira alguma. Então... isso é um grande... grande mal entendido e eu não quero ficar com você. - terminei e respirei fundo, olhando-a e percebendo que ela e a amiga me encaravam irritadas, e antes que eu pudesse abrir a boca novamente senti a ardência de suas mãos em meu rosto, fazendo-me gemer de dor e me afastar rapidamente, sem sequer olhar para trás ou procurar por . Onde mesmo eu estava com a cabeça quando decidi sair com uma garota que mais parece uma psicótica que acaba de receber alta indevidamente de um hospício? Ah é... eu provavelmente estava pensando com a cabeça errada.

"There must be poison in those finger tips of yours
Cause I keep comin’ back again for more"

  Droga! Observei novamente o número em meu celular, me questionando pela milésima vez se deveria ou não apertar a tecla que me possibilitaria ouvir a voz dela. É claro que depois do fiasco do encontro em que eu levei um ardente tapa na cara e que sequer foi da garota com a qual eu saíra, não desapareceu completamente, como ela poderia? A garota parecia um fantasma...aparecendo e desaparecendo do nada.
  Eu estava começando a ter sérias dúvidas sobre minha sanidade, pois parecia que ela estava em todo lugar, aonde eu ia... para onde eu olhava... ela parecia estar ali, impregnando minha mente. Até nos momentos mais constrangedores - ou principalmente nesses - ela vinha à minha mente, tão claramente como se fosse real. Que merda é isso? Só o inferno deve saber, pois foi de lá que essa garota veio. E você pode tentar defendê-la, eu juro que também tentei fazer isso às vezes, defendendo-a contra mim mesmo, no entanto assim que eu apertei o botão verde, eu percebi que não havia volta, não havia desculpas, não havia justificativas pra uma psicótica desvairada como ela!
   e eu havíamos feito as pazes, ou ela meio que impôs isso, alegando que eu não deveria ser tão precipitado, pois ela poderia simplesmente estar elogiando a garota e não realmente dizendo algo pervertido a meu respeito. E ainda me disse que eu deveria confiar mais nas pessoas, e que ela se sentia extremamente ofendida com a visão horrível que eu tinha dela, ainda mais quando ela apenas tentava me ajudar. Ou seja, eu tive de me calar e ouvi-la chorar interminavelmente até que ela me desse seu telefone e dissesse que tinha de correr, estava cheia de afazeres, mas que eu devia ligar para ela qualquer hora. Qualquer hora! Isso é tão indefinido que me irrita! O que isso quer dizer... que eu devo colocá-la na lista de amigos confiáveis, que posso contar em qualquer momento? Ou que ela estava tão interessada em mim que eu definitivamente teria toda a atenção que dela? Quer saber de uma coisa? Eu odeio coisas indefinidas! E enquanto não decidia ligar, estava propenso a odiar aquela garota! Mas quando liguei, tive total certeza de que a odiava profundamente.
  Ela atendeu ao primeiro toque, mal me dando tempo de torcer para que ela estivesse ocupada ou pudesse pensar no que poderia falar caso ela atendesse, mas ela atendeu, e repetiu diversas vezes seu 'alô' antes que eu conseguisse abrir a boca e não espantá-la mais com a minha respiração e meu silêncio.
  - Hum... Oi. É... você... você disse para eu ligar a qualquer hora... essa é qualquer hora? - disse e ouvi a risada escandalosa dela do outro lado da linha.
  - É, pode-se dizer que sim. O que está fazendo? - perguntou parecendo realmente interessada.
  - Nada demais. Bem... nada mesmo, na verdade. - respondi um tanto quanto envergonhado, o que raios eu estava esperando com aquela ligação?
  - Hum... eu também. Que tal jogarmos um pouco? - sugeriu animada, eu quase podia ver o sorriso que provavelmente estava estampado em seu rosto.
  - Pelo telefone...? - eu estava relutante, ela não parecia ter as melhores ideias.
  - Sim... vamos nos distrair um pouco, nada demais... eu começo! - comentou rapidamente e logo começou a falar, a voz parecendo mais rouca de repente - Eu estou vestindo apenas uma lingerie de renda vermelha agora... embora, eu esteja sentindo tanto calor... que talvez eu deva tirar um pouco mais... o que acha? - perdi a fala no mesmo instante. Que espécie de brincadeira era aquela? Será que ela...? Oh não! Eu custava a acreditar que a mesma mulher que me lançava a pagar mico em qualquer lugar e que não parecia ter especificamente um interesse amoroso em mim desejava de fato praticar sexo por telefone naquele momento. - E então...? Estamos mais lerdos do que o habitual hoje? Prefere que só eu fale...? - continuou com a voz rouca parecendo cada vez mais sedutora, eu podia vê-la mordendo os próprios lábios daquela maneira tão provocante e característica, eu podia quase sentir a textura dos lábios dela. E meu corpo começava a demonstrar que gostava muito disso. - Bem, isso parece um sim... Acho que se eu estivesse aí... eu desfilaria até você... rebolando atrevida, o movimento do meu quadril lhe pareceria convidativo e eles seriam de fato um convite... eu subiria na cama... engatinhando até você... e lhe daria um beijo... breve, mas repleto de desejo... um prenúncio do que estaria por vir... - ela pausou e eu percebi que minha respiração estava mais pesada, a calça jeans começava a incomodar quanto mais excitado eu ficava com sua 'história de ninar'. - Humm... eu olharia em seus olhos e morderia meus lábios de forma bem provocativa... pegaria suas mãos e as levaria ao meu quadril... guiando-a por meu corpo... até chegar à minha calcinha, levando seus dedos à minha intimidade, ainda sobre a calcinha, lhe deixaria me acariciar... como quisesse... você gosta disso? - perguntou e silenciou-se novamente, enquanto eu acenava com a cabeça em concordância, com os olhos fechados eu conseguia ver exatamente toda a cena se desenrolando à minha frente. - Eu sei que sim... - ouvi sua voz mais próxima e arregalei os olhos assustado, me perguntando se minha mente já se encontrava tão potente ou se eu de fato enlouquecera quando a vi inclinada sobre mim exatamente como ela descrevera ao telefone. Abri a boca pra dizer algo, mas logo a fechei novamente, sentindo os lábios dela sobre os meus por alguns instantes e então vendo sua mordida habitual nos lábios como eu já gravara tão bem, percebendo que minha mão era guiada até sua calcinha e que logo em seguida ela começava a desabotoar minha calça, abaixando-a um pouco e livrando meu membro rijo do aperto em que se encontrava, aliviando-me ainda mais quando seus dedos o tocaram delicadamente, acariciando-o e então suas mãos passaram a desabotoar minha camisa. Antes que eu sequer pudesse me dar conta, eu já estava empurrando sua calcinha para o lado e tocando seu clitóris timidamente, quando percebi sua língua começar a percorrer meu corpo lentamente, me levando a fechar os olhos e mover os dedos com mais firmeza, pedindo a todos os santos que aquela fosse minha noite de sorte enquanto seus lábios se aproximavam cada vez mais de meu pênis.
  Quando ela por fim chegou exatamente onde eu queria, minhas mãos encaminharam diretamente para os cabelos dela, acariciando-os levemente enquanto um enorme sorriso preenchia meu rosto, sorriso este desfeito assim que ela levantou a cabeça, afastando-se.
  - O quê? - perguntei confuso, sentindo como se tivesse sendo jogado pra fora da brincadeira.
  - O quê, meu amigo, é que nada na vida vem tão facilmente. Qual esforço você fez para que conseguisse um sexo oral? Ou uma noite de sexo selvagem comigo? Qual esforço você já fez algum dia para ter isso de qualquer garota? - ela disse ainda animada, inclinando-se e se aproximando do meu rosto, os lábios próximos demais dos meus para que eu não desejasse puxá-la e beijá-la avidamente - Pois bem, absolutamente nenhum. A vida não é assim tão fácil, e se você quiser algo, tem de ir lá e pegar. Portanto, na próxima vez que tiver uma garota que possa estar interessada em você... aproveite a oportunidade e mostre à ela que você vale à pena, benzinho. - disse então, me dando um ultimo selinho rapidamente, saindo da cama e indo embora em seguida, deixando-me literalmente na mão. E mais do que isso, deixando-me indagações desnecessárias do por que eu ainda sou virgem.

"I say I’m done but then pull me back
I swear you’re giving me a heart attack..."

  Caminhei apressado pelas ruas movimentadas daquela tarde, estava atrasado pra encontrar-me com ! Ela não parecia ser exatamente o tipo de garota que gostava de esperar, e eu já temia pelo que ela poderia estar fazendo enquanto eu ainda estava na metade do caminho de onde eu deveria encontrá-la. Tentei apressar o passo pra atravessar a rua antes que o sinal fechasse, mas fui mal sucedido, quando quase pisei na faixa no momento exato em que um carro acelerava. Parei então com um suspiro resignado, olhando para todos os lados à procura de distração de modo que não me estressasse com o sinal vermelho - que embora não tão lento, pareceria assim para a minha mente ansiosa com o atraso. Logo fixei o olhar em um ponto do outro lado da rua, onde uma garota que se assemelhava muito à parecia enfiar a cara na vitrine de uma cafeteria/livraria, observando com uma atenção bem evidente algo coisa que havia ali dentro. Fiquei me questionando o quanto poderia conhecer de , uma vez que jamais imaginaria que ela poderia ser o tipo de garota realmente interessada em livros, mas de qualquer maneira não imaginava que pudesse de fato ser ela. Não acreditava até o momento em que ela virou-se e começou a caminhar para dentro da livraria, pude então ver seu rosto de perfil e não teve como negar que aquela era ! Mas qual seria a probabilidade? Talvez eu estivesse tão obcecado por ela que mal conseguia distinguir a realidade da ilusão.
  Caminhei apressado pro outro lado da rua quando o sinal abriu e fui até a vitrine a qual ela estava encostada há poucos, observando a mancha de batom vermelho que ela fizera começar a sumir aos poucos intrigando-me profundamente. Mas o que de fato prendeu minha atenção foram os passos lentos que deu até um rapaz que parecia compenetrado em sua leitura sentado displicentemente sobre uma poltrona. Ele tinha uma aparência parecida com a minha, não exatamente por qualquer atributo físico, mas a postura empertigada que ainda parecia presa nele era bem característica e eu devo admitir que a reconheceria em mim se me olhasse mais vezes no espelho.
abaixou ao seu lado e ficou olhando-o admirada como se estivesse vendo alguma obra prima, um sorriso largo e extremamente meigo que eu nunca percebi se encontrava iluminando seu rosto, embora ele parecesse não notar a esplendorosa mulher que se inclinava sobre ele para tocar seu rosto. tinha os dedos muito próximos da face do rapaz - e eu pude perceber de relance que algumas lágrimas caíam de seu rosto - quando uma mulher alta apareceu de repente, caminhando rapidamente até ele e se inclinando para beijá-lo apaixonadamente, interrompendo a leitura que ele deixava de lado, e interrompendo que apressou-se em sair dali.
  Seus olhos se arregalaram em espanto quando me viu e ela secou rapidamente as lágrimas, apontando o dedo na minha cara e me questionando sobre o que eu fazia ali.   - Estava indo me encontrar com você! O que diabos foi isso? O que estava fazendo? Como é que eles pareciam não...? - deixei a frase no ar quando alguns flashs de lembrança percorreram minha mente, momentos com ela em que de fato eu parecia ser o único a percebê-la. Abri os lábios arfando em surpresa e olhei para ela questionando-a.
  - Não há o que explicar... hã... qual o seu nome mesmo? - Ah sim, só agora ela se preocupara em perguntar o meu nome! Ou devo dizer, finalmente ela decidira fazer isso? Por mais que eu tentasse muito dizer à ela qual era.
  - .
  - Sim... . Bonito. Bem... não há o que explicar, sabe? Você precisava de ajuda, eu apareci, e estou ajudando. Vamos seguir em frente.
  - O quê? Do que raios você...? - novamente as palavras sumiram quando novas lembranças ecoaram em minha mente, todas as ações que ela habitualmente fazia... os micos pagados. Droga! Ali estava a origem de todas as confusões... suas tentativas falhas de... - Oh não! Então você é como... meu guru do amor?
  - Ninguém nunca me chamou assim! - ela arqueou a sobrancelha antes de dizer isso, parecendo irritada. - Eu gostei. - pronunciou por fim e tomou minha mão entre as suas, puxando-me para sabe lá Deus que raios de confusão nova em busca de alguma forma de me fazer um cara que consegue deixar de ser virgem com a ajuda de uma guru maluca que só sabe causar encrencas.

"And I can’t even explain why
Why does it feel so good but hurt so bad"

  Caminhei sonolento enquanto bebericava o café no copo descartável que acabáramos de comprar na Starbucks, ou melhor, acabáramos de roubar, já que ela me fizera alegar ter sido mal atendido pelo gerente, apenas por ser homossexual. Uma mentira deslava, que segundo ela era bem justificada, pois ele merecia! Quando ela era viva, trabalhou para ele e ele sempre fora um ingrato e um homofóbico evidente, ainda por cima!
   me contara mais sobre si mesma, ela já fora um ser humano como outro qualquer, mas depois de morrer seu espírito ficou preso na terra por não conseguir se desprender dos sentimentos mundanos, ou mais precisamente dos sentimentos por seu namorado - o cara da cafeteria/livraria - o que a fez ter como missão ajudar jovens perdidos como seu namorado um dia fora a encontrar seu verdadeiro amor, exatamente como ela fizera com ele. Quando ela conseguisse atingir seu nível de desapego a esse plano, poderia continuar sua jornada e seguir em frente, enquanto isso - o que eu chamava de penalidade máxima - ela perdia seu tempo de não vida com caras idiotas como eu em vão. Em vão, porque por mais que estivéssemos há quase uma semana 'juntos', eu definitivamente não me sentia nem um pouco perto de encontrar meu verdadeiro amor ou qualquer coisa parecida.
   algumas vezes parecia mais meiga - como quando ela encontrara o ex namorado - mas na maioria das vezes só me fazia meter os pés pelas mãos e levar socos na cara de namorados ciumentos ao me jogar pra cima de qualquer garota que ela considere certa pra mim. Ainda não me recuperara do olho roxo que estava escondido pelos óculos escuro.
  - Venha! - ouvi ela gritar imprudente e a olhei confuso, arqueando uma sobrancelha entediado, meu sono me impedia de compreender as coisas como habitual, embora meu habitual já pudesse ser considerado lerdo até demais. - Está bem. Eu vou fazer uma loucura muito grande agora, você vai me acompanhar!
  - O quê? O que você... - antes que eu pudesse terminar de perguntar ela já tinha começado a correr feito maluca, e embora uma careta incerta surgisse em meu rosto, expondo minha enorme relutância em mover-me sequer um passo quanto mais correr, eu suspirei resignado e comecei a correr atrás dela rapidamente, conseguindo avistá-la ao longe. Sequer prestava atenção em qualquer coisa, e o café em minha mão chacoalhava espalhando alguns pingos em minha camisa, mas apenas mantinha meu olhar fixo no ponto cada vez mais distante em que ela estava. Tão distraído estava que não percebi o carrinho à minha frente e a mulher que o dirigia, me chocando diretamente com o objeto e voando longe de cara no chão.
  - Oh meu Deus! Oh meu Deus! Você está bem? - ouvi uma voz doce penetrar meus ouvidos, enquanto minha vista parecia meio embaçada, embora eu demorasse a perceber que era apenas meu olho inchado pelo soco mesmo que dificultava que eu visse as coisas corretamente.
  - Não foi nada, me desculpa. - respondi sentindo-me um pouco confuso.
  - Oh! Você não acha melhor ir ao médico? Eu posso levar você, por favor, eu faço questão! Seu olho! Ai, senhor, que terrível eu sou!
  Finalmente consegui focar meus olhos no lugar de onde vinha a voz e reparei na linda garota à minha frente. Ela tinha os cabelos negros e ondulados soltos e seus olhos verdes me encaravam preocupados. Pensei imediatamente em tranquilizá-la e lhe dizer que eu ficaria bem, mas logo reparei que acenava do outro lado da rua, apontando para a garota com muita convicção e fazendo gestos esdrúxulos que com toda certeza me fariam rir se eu não tivesse entre a maldita sonolência e a confusão da batida, mas ainda assim compreendi os códigos vindos de .
  - Bem, eu habitualmente diria que não... mas acho que talvez eu esteja precisando de um medico. Nem que seja pra dizer a ele que me dê algo mais potente que pó de guaraná para que eu não ande zumbizando pela rua e seja atropelado novamente. - brinquei com um sorriso, tateando em busca dos meus óculos e ouvindo sua risada graciosa, segurando a mão que ela me estendia solicitamente.
  - Lorenne, prazer conhecê-lo. Embora, as circunstâncias não sejam das melhores.
  - , e o prazer é todo meu. - respondi, caminhando ao seu lado até o carro e adentrando o mesmo, não sem antes observar o enorme sorriso de e o sinal afirmativo que ela fazia, me lançando uma piscadela que parecia ser o nosso adeus, e mordiscando os próprios lábios daquela maneira que por tanto tempo se prendera em meu cérebro. Ri levemente e adentrei por fim no carro, conseguindo por fim entabular ao menos uma conversa decente com um ser do sexo oposto, e percebendo que mais do que isso, conseguia também conquistar uma garota, e fazê-la minha namorada, e perder a virgindade com ela enquanto ela também se encontrava na mesma situação.

Epílogo

  Certa vez eu e minha namorada decidimos ir juntos à boate onde eu conhecera , eu contara absolutamente tudo à Lorenne, e ela sequer me achara um doido completo. Ou talvez ela realmente me achara um doido completo, pois acrescentou em certo ponto da conversa, que adorava os loucos...
  Acreditei sinceramente que nunca mais encontraria em minha vida, mas surprendeentemente ela estava lá quando chegamos na boate, na verdade ela se encontrava causando mais uma de suas inúmeras confusões. Um cara muito parecido com um antigo eu ou algo assim - aquela postura empertigada que me recuso a ter - se encolhia assustado de um enorme cara que o questionava sobre seus olhares à sua namorada, enquanto ele observava sem saber o que fazer, percebendo para seu próprio desespero maior, que ela também não fazia a mínima ideia.
  Lorenne não gostou do lugar e logo fomos embora, e quando tentei ao menos correr até para agradecê-la pelo que fez por mim não pude encontra-la em local algum, e soube que essa provavelmente era sua intenção, então entendi que não havia mais nada para existir entre nós, exceto pela enorme sabedoria que ela me concedera, e o degrau a mais para a porta do céu que eu concedera à ela. Respirei fundo mais uma vez olhando ao redor e encontrando com o seu olhar e sua mordida nos lábios, que logo se dissiparam em meio à fumaça da boate, antes de dar as mãos à Lorenne e sair dali para curtir o resto da noite com o amor de minha vida, que finalmente conseguira encontrar, mesmo que com a ajuda de uma guru nada ortodoxa, e muito da encrenqueira!

FIM



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