Girls Like Girls
Escrita por Aria Müller
07 de Julho, 2016
Querido amigo,
Em um mundo tão cruel como o nosso, me pergunto como ainda há pessoas capazes de boas atitudes e coisas do gênero. Eu costumava achar que crescer, ser adulto seria maravilhoso e eu teria a vida dos meus sonhos. Surprise, I don't! Digo-lhe apenas uma coisa: aproveite sua infância e, principalmente, sua adolescência.
Com esses conselhos, você provavelmente deve achar que já tenho, sei lá, uns 23 ou mais anos? Sinto muito, mas a vossa escritora que tem apenas dezessete - quase dezoito! - anos. Não é preciso ter certa idade para dar conselhos sábios e ser sábio. O saber vem de experiências, e elas acontecem em todas as idades - com um idoso, um bebê recém-nascido, um adolescente ou um adulto -, em todos os momentos - seja uma queda, uma conquista, ou uma situação horrível -.
Não julgue um livro pela capa.
Provavelmente essa frase deve ser seguida frequentemente, pois nem sempre as pessoas são quem imaginamos. E esta oração também se aplicava a mim.
Veja bem, amigo, você diria que neste exato momento minha vida está tão confusa e ao mesmo tempo muito boa? Um pouco de confusão faz bem na nossa vida. E a minha confusão tinha nome e sobrenome. - também conhecida como minha colega de classe e (ex) namorada de um cara próximo.
Não. Eu não sou fura-olho ou algo do tipo, mas quando a “química” acontece, ela simplesmente acontece.
devia ser apenas um nome entre tantos outros (e eu bem disse: devia, no passado mesmo), mas há mais ou menos um ano, tudo mudou. Acho que para entendermos quase toda a história, devemos voltar para aquele tempo.
A garota havia recém chegado à cidade, mas todos já estavam falando sobre ela - não sei se você sabe, mas em cidade pequena, tudo o que acontece é noticiado. A filha da empregada do prefeito ficou grávida? Até dois dias no máximo, todo mundo já sabe sobre isso. Você não pode nem vestir uma roupa diferente que já estão criticando e criando histórias, enfim, é um saco -. Filha mais velha de um bem-sucedido empresário, que resolveu mudar de ares devido a uma doença perigosa (ou pelo menos era o que os boatos acusavam), estava perdida na cidade e é claro que todo mundo queria ajudar a pobre moça sem nenhuma intenção. Ah, há mais uma coisa que você deve saber sobre a maioria das pessoas de cidades pequenas: nem sempre elas serão sinceras mesmo, se forem muito gentis, desconfie.
Mas voltando a nossa história, - Mag para os íntimos - já começava a se enturmar com o pessoal daqui e ao mesmo tempo, as aulas começaram e deixaram todos os estudantes desesperados.
Em Goslar, as opções de escolas eram limitadas, e por isso a maior parte dos estudantes acabava na principal escola, a Karl Bäuer Gymnasium. Basicamente, havia todo tipo de pessoa lá: os playboys, as patricinhas, os John Nobody, os não-notáveis-porém-notáveis e por aí vai. E é claro que fora destinada a estudar conosco. Mais precisamente ainda, ela estudaria comigo, na mesma sala que eu.
No primeiro dia de aula, era uma bagunça infinita, porque por mais que tivessem funcionários da escola dispostos a ajudar os novos – e também antigos – alunos, ninguém acabava dando ouvido a eles, e assim o caos começava.
Não posso dizer que tinha um grupo de muitos amigos, mas com certeza já era o suficiente para mim – porque falar amigos é fácil, o difícil é agir como tal -. Estava na esquina da KarlBä – apelido carinhoso dado a escola – com Leona e Albert, esperando pelo resto do grupo. Ao total éramos seis, o quê às vezes causava alguns problemas – principalmente em trabalhos, quando não sabíamos quais grupos fazer -.
- Vocês escutaram que a filha daquele empresário vai estudar aqui? – Leona disse empolgada.
- ? A filha do senhor ? – Albert perguntou e ela assentiu – Ela é legal, já conversei com ela algumas vezes.
- Só conversou, é?
- Cala a boca, Fischer, você é tão criança – o moreno revirou os olhos, como se já estivesse cansado da atitude da outra.
Eu era uma simples plateia. Prestava atenção ao ambiente, não dizia nada e era ligeiramente calma. Mas meus amigos, ao contrário, pareciam que haviam nascido para chamar atenção.
Quando menos percebi, Olga e Abigail chegaram e contaram tudo o que sabiam sobre os novatos da vez. Elas eram responsáveis por saberem todos os babados e acontecimentos da escola – e às vezes, da cidade -, mas eram as garotas mais doces que você poderia conhecer. Querido amigo, pode ser que você já tenha ouvido falar sobre elas, mas tenha certeza que elas com certeza são ótimas pessoas.
Era exatamente 8h10min quando a Frau* Aigner entrou na sala 107, a qual eu e os outros alunos do último ano do Gymnasium estudávamos. Frau Aigner era a professora de Literatura e Gramática, sendo também o pior pesadelo de alguns alunos. A cumprimentamos e ela começou sua breve introdução sobre como o ano letivo seria e nossos direitos e deveres – a mesma coisa de sempre, resumindo -, deixando um silêncio terrível no ambiente, enquanto anotávamos o que ela escrevia no quadro.
Depois da aula de introdução de Frau Aigner, foi a vez de Frau Erdmann – ou Lisa, como gostava de ser chamava – apresentar-se e dar suas aulas, conseguindo até entreter um pouco os alunos.
Na última aula do dia, todos já estavam querendo ou ir para casa ou que as férias voltassem. Até aquele momento eu ainda não havia tido a chance de conhecer , mas logo tudo mudaria. Herr* Schneider teve a brilhante ideia de sortear duplas para que pudéssemos nos conhecer melhor e fazer um trabalho que valeria como prova – para o desespero de alguns, que logo foram acalmados ao Herr Schneider dizer que teríamos três meses para fazê-lo.
O professor já estava quase terminando de sortear as duplas e, para meu desespero, eu ainda não havia sido chamada. Prestava atenção no sorteio, implorando para que ficasse com alguém que gostasse e conhecesse – como Manuel, meu melhor amigo, que por sinal não tinha ido para a escola -, mas parecia que minhas preces não seriam atendidas. Ao ouvir meu nome, olhei atentamente ansiosa para Schneider, querendo saber logo quem seria minha dupla.
- .
Oh céus, eu iria com a novata.
E algo dentro de mim dizia que alguma coisa definitivamente iria acontecer.
Um mês depois e meu relacionamento com já estava começando a se formar. Eu não era a pessoa mais acessível para conseguir fazer amizade, e embora ela tentasse conversar comigo, eu simplesmente não conseguia fazer o mesmo com ela. provavelmente queria me matar – e não a culpo, pois no momento faria o mesmo comigo -, mas calma como sempre, apenas sorria e dizia seu típico “Até logo!”, voltando para os seus mais novos amigos.
Os dias passavam e a data de entrega do trabalho aproximava-se ainda mais, entretanto e eu não tivéssemos feito praticamente nada. Mais ou menos um mês e meio antes da entrega do trabalho, conversamos e decidimos que nos reuniríamos em sua casa para finalmente concluir o maldito trabalho.
Ao contrário do que se pensava, a moradia dos não era tão luxuosa assim, ela era extremamente arrumada e até mesmo aconchegante, fazendo com que eu quase me sentisse em casa. fora gentil e convidou-me para ir até seu quarto, para que pudéssemos ter privacidade e conseguir fazer tudo direitinho.
Aquela foi a primeira vez – entre muitas outras – que visitei o tão familiar quarto, mas que naquele momento era apenas um lugar desconfortável. Sentamos em sua cama e espalhamos nossos materiais, pegando tudo que achávamos ser útil para o trabalho. O silêncio permanecia na maior parte do tempo, e me deixava agonizada, pois, curiosamente, queria conversar com .
- Então, você estuda há muito tempo lá? – ela perguntou, me surpreendendo.
- Desde que comecei o Gymnasium, pode-se dizer – respondi e resolvi continuar a conversa – Onde você morava antes?
- Augsburg – assobiei e disse:
- É uma grande mudança. De Augsburg pra Goslar, incrível.
- Minha mãe queria novos ares e quando conheceu aqui, ficou louca pra vir pra cá. – riu timidamente, como se lembrasse de algo engraçado – Sempre morou aqui?
- Desde os sete anos. Nasci em Munique, morei lá até os quatro anos e depois fui para Nuremberg, para finalmente parar aqui – e continuei falando, dando um pequeno resumo de minha vida.
– que insistiu para que eu a chamasse de Mag – também contou sobre si, e passamos boa parte do tempo contando histórias nossas ou que ouvimos de outros, esquecendo completamente do trabalho.
era a filha mais velha de Emilly e Ernest , criada rigidamente pelo pai e mimada pela mãe, resultando numa mistura no mínimo estranha – segundo ela mesma -. Quando , seu irmão, nasceu, as coisas mudaram um pouco e ela era responsável por si mesma, já que seus pais agora focavam em e suas vidas profissionais. Mag era apenas três anos mais velha que o irmão, mas achava que estava mais para mãe do que irmã, já que, bem, às vezes era responsável por cuidar dele e ajuda-lo, mesmo sob os protestos contra dele.
Aquele dia o primeiro de muitos outros, em que passamos horas conversando sobre todo e qualquer assunto, sem ver a hora passar. Definitivamente, aquela tarde havia sido decisiva, porque foi a partir daí que nos aproximamos e começamos nossa amizade.
Querido amigo, talvez eu não escreva sobre tudo o que aconteceu, mas já é o suficiente para você saber um pouquinho do começo de nossa trajetória.
Queria poder escrever mais sobre os momentos em que e eu ficamos conversando, ou até mesmo observando tudo em silêncio, mas tenho quase certeza que você não quer saber nada sobre isso – porque, bem, eu mesma não iria querer (porém talvez não conte, pois sou a preguiça em pessoa) -. Naquele primeiro mês que mantemos contato direto, foi com certeza uma das melhores memórias que eu teria.
Dois meses já haviam passado desde que viramos amigas – ainda era estranho me referir à Mag como amiga, porque bem, era estranho – e ela começou a sair mais com o seu “pessoal” – que ela havia secretamente confidenciado a mim que apenas andava com eles, pois seu pai meio que exigia, então não podia fazer nada sobre isso.
Em uma das festas de Oscar Wolfgang, acabou exagerando na bebida – não que ela tenha realmente exagerado, mas seu organismo era fraco para bebidas alcoólicas e bem, tudo era uma questão de ação e reação – e precisei cuidar dela, já que aparentemente nenhum de seus amigos estar interessado em ajudar a coitada.
Segurei suas mãos e a guiei até a saída da casa de Oscar, chamando um táxi para nos levar até minha casa – pois tinha certeza que se aparecesse naquele estado em sua casa, seus pais com certeza não gostariam -.
Chegamos a minha casa e como estávamos sozinhas – meus pais haviam ido viajar e minhas irmãs tinham saído com suas amigas -, não me preocupei em deixa-la no sofá e ir a cozinha buscar um copo de água e algo para comermos.
Ao voltar para a sala, deparei-me com de joelhos, olhando as fotos que estavam na estante.
- Você tem muitas irmãs – disse atrapalhada, me olhando assustada.
- Ainda bem, não sei se aguentaria um menino – ri, achando graça de sua surpresa.
- Eu te admiro, mein Freund* - ficou um tempo olhando para as fotos e depois voltou a falar – Sabe, uma vez eu tive uma namorada. Ela era legal. Eu não fazia quase nada da escola, mas ela tinha o cuidado de fazer meus temas e trabalhos, – riu nostálgica – Foi um bom momento. Sétima pra oitava série. Haja paciência.
Aparentemente, gostava de relembrar os velhos tempos quando ficava bêbada, além de ficar falando frases aleatórias e sem sentido, mas que fariam qualquer um rir e ver o quão encantadora e persuasiva ela poderia ser, mesmo estando visivelmente alterada.
Peguei em suas mãos e a ajudei a levantar do chão, decidindo leva-la para dormir em meu quarto, enquanto organizava algumas coisas para ela no dia seguinte.
Ao deitá-la em minha cama, ela me puxou junto e começou a cantar uma música que eu não conhecia. Ri ao observá-la tentar levantar-se, mas ela logo caiu em cima de mim, olhando-me intensamente.
- Gute Nacht*, . Tenha bons sonhos – sussurrou e virou-se para o meu lado, logo depois de me dar um selinho.
Eu não sabia como agir e nem o quê falar, então a arrumei direito na cama e desci para a cozinha, enquanto pensava no acontecimento.
Aquela foi a primeira vez que realmente mexeu com minha cabeça.
Amigo, eu sei que você provavelmente acha que eu sou uma tola e não devia ter me preocupado com nada do que havia acontecido, mas eu obviamente não consegui fazer isso. Até hoje aquele dia permanece um completo mistério para mim. Não sei se se lembra do que fez, mas de qualquer forma, diria que foi um momento crucial para nós.
Dois meses se passaram e estava, no mínimo, diferente. Havia começado a andar mais comigo na KarlBä, mas também havia feito amizades verdadeiras e novas relações – sendo que a mais nova era seu namoro com Frederik Miller, um dos primos de Albert.
estava comigo na biblioteca, ajudando-me a fazer um trabalho que Frau Aigner havia passado – aliás, um deles, porque ela não se cansava de dar trabalhos e temas para seus alunos -. Ela me contava animada sobre como Fred foi fofo quando levaram os pais de ambos para um jantar.
- Sabe, ele pode parecer meio idiota, mas é bem legal. Mais legal que a maioria dos caras daqui – Mag analisou, enquanto procurava um livro.
Eu realmente não tinha nada para falar sobre ele, então deixei que ela divagasse e contasse tudo o que queria, mas sinceramente? Eu não estava prestando atenção nenhuma.
- ? Você ‘tá me escutando?
- Nein.
- Nem sei porque continuo falando, você tá sempre no mundo da lua e nunca presta atenção – reclamou, fazendo uma careta que a fez parecer com seu pai (e também me fez rir, porque era hilária).
- Porque você me ama, Mag – respondi, olhando-a animada.
- Só em seus sonhos, Marg – revirou os olhos e sentou-se ao meu lado, arrumando os livros.
- Ah, é uma pena que você não aceite a verdade, , pois ela está diante de seus olhos – disse-lhe, teatralmente.
A herdeira podia parecer calma e quieta, mas a verdade é que não calava a boca, estava sempre falando sobre todos os assuntos.
Depois que terminamos nossa pesquisa, fomos para a casa de , já que a senhora e o senhor haviam convidado eu e mais algumas pessoas para jantar em sua casa. Assim que chegamos fomos para o quarto de , para podermos nos arrumar.
- ?
- Fala, liebe*.
- Me empresta uma roupa, eu quero tomar banho aqui e me arrumar, bitte – disse-lhe, fazendo minha melhor cara de gato de botas.
- Sinta-se em casa, lady.
Às vinte horas em ponto, todos estávamos sentados na sala de jantar da família , esperando que servissem a comida. E ao contrário do que imagina-se, eles não eram do tipo que ficava quietos enquanto comiam – até porque Emilly odiava o silêncio -, e não paravam de falar durante o jantar.
E obviamente, eles tinham que falar sobre as mais novas histórias que estavam espalhando-se por Goslar, sendo que a da vez parecia ser que Judie Linch, a filha bastarda do vice-prefeito, havia assumido para a família e todo o mundo que era lésbica – o que não era tão chocante, mas todos pareciam achar que era a novidade do ano e não paravam de falar sobre o assunto.
- A vida é da garota, ela sabe se cuidar – a senhora deu sua opinião, mas é claro que seu marido tinha que contrariá-la.
- É uma vergonha, isso sim. Posso imaginar o quão decepcionado está Herr Klismann, ainda mais por ser sua filha bastarda – ele praticamente cuspiu as palavras, deixando-me surpresa por sua atitude.
- Concordo, Enerst, mulheres foram feitas para casarem-se com homens e cuidar da casa, e não para ficarem agarrando-se com outras mulheres e tentando fazer o que não devem – dessa vez, Frederik disse, mostrando que ele não era aquela Coca-Cola toda.
Novamente, o machismo havia aparecido em nossa sociedade, me deixando muito indignada, pois cada um devia cuidar da sua própria vida, sem ficar julgando os outros. Apesar de toda a bosta que haviam dito, fiquei quieta, não queria criar confusão com eles – e tenho certeza de que se falasse alguma coisa, provavelmente a coisa ficaria feia.
Amigo, até agora não sei se fiz a escolha correta. Acho que devia ter gritado, esperneado e falado tudo o que queria, mas infelizmente não fui capaz. Nos momentos mais decisivos sou uma covarde, queria que tudo fosse diferente.
Foi naquele dia que comecei a não gostar muito de Frederik, que com o passar do tempo se mostrava um completo idiota e preconceituoso, preocupando-se em bajular quem tinha dinheiro e poder – e o escolhido da vez Ernest , seu sogro.
Dias depois, Frederik e havia discutido – e eu torcia para que ela percebesse quem ele realmente era – e eu estava encarregada de conversar com ela e animá-la, o que me deu mais certeza ainda que eu com certeza demoraria para namorar novamente.
- , quer sair um pouco? – perguntei, pensando em leva-la para dar uma volta no parque.
- Nein – disse, suspirando desanimada.
- Quer comer alguma coisa? – assentiu – Bratäpfel? Chocolate? Prezel?
- Tudo.
- Ok, quer mais alguma coisa?
- Dormir.
Senhoras e senhores, esta era quando triste ou desanimada com algo. E ela não era nem de longe parecida com a que todos conheciam.
Depois de comermos, eu iria para casa, mas Mag implorou para que eu ficasse com ela – mesmo que ela já fosse dormir – e a ajudasse com algumas coisas. Não vi outras opções e acabei ficando, para fazê-la companhia.
- , deita comigo.
- Nein, vou deixar você descansar.
- Se eu pedi pra você ficar é porque eu queria ficar contigo, então, bitte, deite um pouco comigo.
certamente era teimosa e sabia argumentar a seu favor – o que provavelmente seu pai deve ter ensinado, porque também era assim -. Deitei-me ao seu lado e ficamos em silêncio, apenas vivendo o momento.
Querido amigo, naquele dia, Mag me beijou pela segunda vez e tenho quase certeza que ela realmente quis isso, ou estava um pouco confusa e aconteceu isso. Sinceramente? Agora não sei nem o que pensar sobre isso. A confusão voltou novamente.
Depois daquele dia, também não falamos mais sobre o assunto, mas a cena não saía de minha cabeça – por mais que tentasse esquecê-la, ela permanecia viva, muito viva mesmo em minha mente.
Passei tanto tempo divagando e criando hipóteses para me beijar que até Abigail preocupou-se, pensando que eu estava doente.
- Está tudo bem, Abby, não precisa se precisa se preocupar tanto – disse-lhe, agradecendo pela preocupação.
- A senhorita anda muito estranha ultimamente, sabia?
- Olha quem tá falando, até porque sou eu mesma que saio gritando pelas ruas por roupas, né?
- Mas é claro! – colocou suas mãos na frente do rosto, começando a rir – Você é doida, !
- Eu também te amo, Abby – pisquei para ela, logo em seguida jogando-me em cima dela.
Se há uma coisa que você precisa saber, é que Abigail Westermann é minha melhor amiga desde os oitos anos, quando vim morar em Goslar e uma vizinha muito estranha fazia caretas na janela, deixando-me curiosa.
Abby era o tipo de pessoa que você podia contar para qualquer coisa mesmo, que ela lhe ajudaria sem hesitar. Foi para ela que, alguns dias depois, contei o que estava acontecendo entre e eu. Ela disse que eu devia falar com Mag, mas não é exatamente uma coisa que eu gostaria – até porque eu nem sabia se ela se lembrava de tudo.
Mas segui o conselho de Abby quando e Frederik resolveram dar um tempo. Não se de onde conseguir tirar tanta coragem, mas sentei com ela em seu quarto e conversamos calmamente, sem nos importar do tempo estar passando ou da vergonha que sentiríamos no instante em que terminássemos de conversar.
era extremamente racional e dificilmente deixava-se ser levada pela emoção, mas no momento ela priorizava mais seus sentimentos, confiando em mim e fazendo revelações.
era bissexual, antes de Frederik havia namorado uma garota por oito meses, seu pai não desconfiava dela, e ela também achava sentir algo por mim. Depois que a garota terminara de falar, fiquei sem fala, não conseguia acreditar no que havia me contado.
Fiquei um tempo em silêncio, mas logo comecei a falar, expondo meus pensamentos e, também, meus sentimentos.
Aquela conversa foi essencial para nós. De uma vez por todas tínhamos nos entendido e sabíamos o que queríamos. Combinamos de seguir com nossas vidas e amizade normalmente, deixando que o momento nos levasse, pois, parafraseando , “o que é para ser, será”.
Amigo, talvez você saiba, ou não, mas eu também achava que possuía sentimentos mais “profundos” por e embora não tenha falado isso explicitamente para ela, ela havia compreendido.
Passamos tardes, noites e manhãs juntas, aproveitando a companhia uma da outra e deixando que as coisas acontecessem. Beijos roubados, abraços planejados, conversas surpreendentes. Tudo podia acontecer enquanto estávamos juntas, pois éramos e , e , a dupla inesperada.
Mag ainda estava separada de Frederik, mas isso não duraria muito tempo, pois seu pai estava começando a desconfiar que alguma coisa, no mínimo diferente, acontecia com sua filha. Fred e ela retornaram o namoro e embora proibido, ela continuava se encontrando comigo.
O perigo estava cada vez mais perto e eu não podia negar que gostava dele, da emoção que ele proporcionava, da adrenalina que sentia em mim toda vez que nos encontrávamos.
Talvez fosse aí que estivesse um problema, pois nós quase fomos pegas diversas vezes, mas sempre conseguíamos reverter a situação. Numa tarde qualquer, estávamos no quarto de , comendo – como quase sempre – e conversando. Quando quase nos beijamos, a porta abriu-se e eu fingi que estava rolando pelo chão. Patético, .
Era Frederik e ele não parecia muito feliz ao nos ver juntas – o que era típico, pois seu desprezo por mim estava quase tão claro quanto o meu por ele – e nos fez uma série de perguntas.
- O que vocês estavam fazendo? – perguntou desconfiado, rondando o quarto como um gavião.
- Comendo – Mag respondeu – E conversando.
- Tem certeza?
- também estava um pouco doida, mas já é normal. Nada de novo sob o pôr-do-sol.
- Escute sua namorada, Fred, ela sabe o que fala na maioria das vezes – intrometi-me, involuntariamente.
- Não foi isso o que me disseram, – oh, a coisa iria ficar séria.
Não gosto de lembrar aquele momento, pois foi quando a situação realmente ficou feia. Frederik nos fazia diversas acusações, pois alguém tinha dito a ele que fazíamos mais que simplesmente conversar.
Todos gritavam e falavam o que achávamos, com e eu escondendo o que não precisava ser dito, e Frederik tentando avançar cada vez mais contra mim. Irritada, saí da residência dos , falando para o casal que eles que se resolvessem, porque já estavam cheia de acusações sem sentido.
Fui caminhando para casa e encontrei com , irmão de , no caminho. Ao me ver, pareceu preocupado – provavelmente por causa de minha cara de poucos amigos e algumas lágrimas que insistiam cair de meus olhos.
- , espera! – gritou, correndo atrás de mim e me alcançando – ‘Tá tudo bem?
- Hallo, . Talvez, estaria melhor se Frederik desaparecesse – disse sincera, sabendo que podia confiar nele.
- O que aconteceu? – e agora sim ele parecia mais preocupado, provavelmente tentando adivinhar o que seu cunhado havia aprontado agora – Frederik descobriu sobre vocês duas?
O quê? Ele sabia?
- Talvez. Como você sabe? – perguntei desconfiada, pensando na possibilidade de ele ter falado com Frederik, mas ele não faria isso com a própria irmã.
- Eu apenas sei. – deu de ombros, sorrindo tímido – Agora, que tal você me contar o que está acontecendo?
Fomos para o parque que tinha perto de minha casa e sentamos na grama, com eu lhe contando tudo o que aconteceu – desde o dia que cuidei de uma bêbada até o fatídico momento em que Frederik quase nos flagrara na casa do -. Chorei quando terminei de falar, e me abraçou, fazendo-me sentir como se, ao menos, nem tudo estivesse perdido. Ele disse o que achava e que me apoiaria, independente de tudo, porque Frederik era um imbecil e e eu não merecíamos mal algum.
Querido amigo, devo admitir que foi de extrema importância para mim e nunca vou me esquecer dele. Foi com ele também, que fiz uma loucura que com certeza ficaria marcada em nossas memórias.
Três dias haviam se passado e eu ainda não havia tido a chance de falar com – ela não fora para a escola desde o incidente em sua casa -. falava comigo de vez em quando, e naquele dia decidimos passar a tarde juntos.
- Minha cara , tenho uma proposta irrecusável para a senhorita – ele disse, animado.
- Diga-me, .
- Está a fim de relaxar um pouco? – assenti – A casa de Frederik Klaus está precisando de uns retoques, não acha? Que tal ajuda-lo a pintar um pouco?
Aquela era uma clara proposta para vandalizar um pouco a casa de Frederik e no calor do momento, acabei aceitando – provavelmente devia estar louca, mas mesmo assim fui, e acabei me divertindo.
Compramos alguns sprays de grafite e fomos para a casa de Klaus, deixando uma de suas paredes adorável, com maravilhosos desenhos e algumas frases bem curiosas, mas com certeza o “Not sorry” se destacava bem entre os outros.
Ao terminarmos nosso trabalho, sorrimos como cúmplices. Aquilo não chegava nem na metade do que queria fazer Frederik Klaus, mas por hora bastava.
Tomamos máximo cuidado para que ninguém nos visse fazendo o “grafite”, mas é claro que pelos menos uma pessoa nos viria e falaria para todo mundo, mas em Goslar, boatos são o que mais se tem.
Amigo, no dia seguinte, Frederik já estava me acusando de ter vandalizado sua casa, mas fiz um ótimo papel e fingi não saber de nada, mas disse em alta e boa voz que agradeceria pessoalmente quem fora o responsável. Fingida.
Naquele mesmo dia, me procurou, falando que era melhor que parássemos de nos ver e dar um tempo, para que a poeira se abaixasse. A meu ver, não tinha nada de mal – na verdade, eu até estava cogitando em falar o mesmo, antes de conversarmos – e aceitei sem ressentimento nenhum, mas no fundo, bem no fundo mesmo, estava angustiada e com medo. E se durante esse tempo, tudo o que tivemos desaparecer? E se tudo for nada mais nada menos que uma ilusão? Odiava pensar isso, mas em minha medrosa e criativa mente, tudo poderia acontecer.
Querido amigo, já faz dois meses desde a última vez que falei com , e embora nenhuma palavra a mais tenha sido dita, de vez em quando flagrávamos olhares. continuou falando normalmente comigo, contando o que acontecia na residência e também sobre Mag, que parecia estar melhorando de pouco em pouco.
Enquanto isso, eu continuava no mesmo grupo de amigos, como sempre fora. Eles não questionaram o que havia acontecido entre e eu, mas nos respeitavam. Os únicos que tive coragem de contar o que realmente aconteceu, foram Abby e Manuel, que me ajudavam cada vez mais. Com amigos, é tudo mais fácil – mesmo que você tenha apenas um, ele irá fazer de tudo por você.
Estava sentada num banco quando surgiu, entregando-me um papel dobrado, sussurrando um “É dela” e saindo, deixando-me curiosa para ver o que tinha no papel.
Com as mãos trêmulas, desdobrei o papel e murmurei o que estava escrito.
“Sinto muito. Estou indo para Dortmund.
Até algum dia, liebe.
M.Z.”
Meus olhos encheram-se de lágrimas, tentando aceitar o que Mag havia dito. Não, ela não podia fazer isso. Nada disso era necessário!
Manuel não perguntou o que estava escrito, apenas me abraçou e dizia repetidamente que tudo ficaria bem, que logo passaria e eu não teria de me preocupar mais com isso. Tola , fora abandonada por sua própria confusão.
Eu, , estou escrevendo-lhes para dizer que todo mundo tem sua própria confusão, você só precisa esperar que ela aparecerá e bem, tudo irá acontecer. Alguns aceitam sua confusão, outros não. Só dependerá de você.
No caso, e eu não estávamos mais juntas, mas apenas por enquanto, porque a qualquer momento, poderá mudar. Podemos esquecer uma da outra, envolver-nos com outras pessoas e etc, mas nada do que vivemos juntas será em vão.
Ah, e uma última coisa: sim, eu sou uma garota. Sim, eu gosto de outra garota. Não, eu não me sinto como um garoto ou quero ser um apenas pelo fato de gostar de uma menina. Se eu sou lésbica? Talvez, mas acho que no momento, o termo mais aplicado a mim seria bissexual – não julgue a pessoa por apenas por um momento, ou pela primeira impressão que você teve.
Acredito que em Goslar, quando lerem esta carta inteira, ficarão chocados e os boatos novamente começarão, mas quero que saibam que a verdade eu contei, o resto é história.
Sinto-me melhor ao escrever isso, amigo, e embora você não me conheça – e nem eu o conheça -, espero que me entenda, é só isso que o peço.
Auf Wiedersehen*,
.
*Frau: senhora.
*Herr: senhor.
*Mein Freund: minha amiga.
*Gute Nacht: boa noite.
*Liebe: querida.
*Auf Wiedersehen: adeus, até logo.