Fifteen Days
Escrito por Priscila Araujo | Revisado por Mariana
Faltavam quinze dias, apenas quinze dias pra ele chegar. É claro que eu contava, quando se quer muito alguém você faz coisas desse tipo, hoje é quarta-feira, dia de correspondências, às vezes os dias alteram por causa da inconstância que se é a guerra, mas geralmente é na quarta que as cartas chegam. Eu leio um livro enquanto faz uma bagunça com a comida, ele joga as frutas pros lados e fica rindo como um bebê saudável faz. Ele tem dez meses, e tem dez meses que eu não o vejo, não sinto o toque da sua mão, nem o calor do seu abraço, muito menos sinto sua pele na minha... Ah, como ele faz falta.
Caminho até a varanda do apartamento, às vezes penso que não preciso de mais nada, tenho um homem e eu o amo, e tenho um filho com esse homem, mas esse mesmo homem está na guerra, e isso me faz sentir sozinha às vezes. Minha mãe quase nunca vem aqui, meu pai também, minha irmã mais nova acabou de entrar para Yale, então se subentende que ela tem coisas melhores a fazer do que visitar a irmã rebelde que arrumou um filho sem estar casada.
São oito e meia da manhã e minha cabeça já está atordoada com esses pensamentos outra vez, e tem sido assim, desde que ele voltou para o Iraque, geralmente me distraio com uma bagunça ou outra do , fico ali vendo ele rir como o pai e já me vejo num emaranhado de nostalgia e saudade. Isso faz um mal que as pessoas não têm ideia...
Ouço uma batida na porta, caminho lentamente e olho para a mesa a fim de ver ainda bagunçando com as frutas do café, e lá esta ele, amassando o mamão no nariz. Quando abro a porta já reconheço o carteiro, ele me diz uma simples "Bom Dia", e me entrega três envelopes. Dois eu nem olho, mas aquele com papel pardo e caligrafia máscula prende o meu olhar, eu sabia... Era dele.
Me sento na mesa e sorrio para o meu filho que me olha com aqueles olhos grandões e verdes, as vezes eu acho que ele sabe quando as cartas chegam, sempre leio em voz alta e ele fica ali observando. É triste saber que ele não conhece o pai.
"Minha ,
O que a gente sabe a respeito do amor? Que ele acontece de repente? Que ele chega do nada e se torna tudo? Não, o amor é mais do que isso. Amor é acordar cedo e olhar para o lado, e nesse lado encontrar alguém completamente descabelada e com o rosto inchado, e mesmo assim saber que aquela é a mulher mais linda do mundo. A mão dela se encaixa perfeitamente na minha, mas eu sei que era pra ser assim, enquanto eu ligo as sardas da bochecha dela tudo começa a fazer sentido. Ela nunca amou as rugas nos olhos quando sorri, assim como nunca amou sua barriga ou coxas, ou até mesmo aquelas covinhas no fim da coluna, mas eu amo isso loucamente. É engraçado o fato dela não ir pra cama sem uma xícara de chá e depois ir dormir falando. "Azul fica mais legal" ou "Ele latiu até abrir a porta". Eu não sei por que raios eu guardei esse segredo, não faz sentindo faz? Ela simplesmente não gosta da própria voz gravada, e corre de uma balança como o diabo corre da cruz, se espreme toda pra entrar no jeans e quando eu vejo tudo isso eu sei, ela é perfeita pra mim. Ela nunca vai se amar nem a metade do que eu a amo, e eu sei que nunca vai se tratar tão bem quanto eu a trato, embora eu implore de joelhos. Talvez, se eu deixa-la saber que estou aqui por ela, ela me escute, e se ame o quanto eu a amo. Eu deixei todas essas palavras finalmente saírem da minha boca, porque no fim das contas essas palavras formam você, e entenda, minha , eu amo você, e todas essas suas pequenas coisas.
Agora meu amor, antes de partir para a Guerra Cruel, eu preciso perguntar: Quando eu voltar você se casa comigo?
Do seu, somente seu, eternamente seu, .
Ps. Como vai nosso garotão? Ainda brincando com as frutas do café? Diz pra ele que papai ama ele, e que daqui a pouco eu já vou estar aí pra ensina-lo a jogar basebol. ”
E era isso que me fazia suspirar, respirar, transpirar. Eu finalmente ia me casar com o Homem da minha vida.
FIM