Se ela pudesse, morderia quem aparecesse na sua frente, mas sabia que ninguém tinha culpa da sua raiva a não ser o seu noivo, que parecia se divertir ao ter uma estaca em seu pescoço.

  %Blake% e %Beatrice% se conheceram quando eram jovens vampiros, e desde que souberam que suas famílias queriam um casamento arranjado entre eles, os dois entraram em uma competição incessante, basicamente visando eliminar um ao outro para que o casamento não acontecesse; de acordo com %Beatrice%, a culpa do casório existir era de %Blake%, e para o rapaz, a garota era uma ameaça para a sua liberdade, então, ambos deram início à uma inimizade que sempre acabava com nenhum deles sorrindo.

  Os jovens seriam os próximos líderes do clã Vatore, já que a liderança sempre muda a cada 500 anos, e não havia pessoas melhores para isso, além de uma terceira pessoa também indicada: %Cain%. O rapaz era médico e da mesma idade de %Blake% e %Beatrice%, e ninguém sabia como ele aguentava ficar no meio da briga dos dois, no entanto, %Cain% não tinha muito pra onde correr.

  Ele namorava tanto %Beatrice% quanto %Blake%.

  O namoro começou antes deles saberem da ideia de casório, e até então, %Beatrice% e %Blake% não possuíam problemas entre si, mesmo que tivessem que passar um bom tempo juntos por causa de %Cain%. Os dois até conseguiam se suportar melhor do que o médico pensava, no entanto, a partir do segundo que o casamento foi imposto, a relação cordial se tornou em uma saga mortal, e %Cain% estava de saco cheio dos dois brigando o tempo todo. Foram inúmeras vezes que ele quase tomou algo contendo alho, teve que desviar de estacas pontudas e precisou entrar pelo terraço da mansão – que era muito alto – porque, magicamente, todas as entradas do lugar estavam fechadas e encantadas, impossibilitando quem estava de fora entrar; por mais que tentasse conversar com eles, todas as tentativas eram em vão, e a sua única decisão foi sumir, deixando os seus namorados à beira da loucura.

  — A culpa disso é sua — %Beatrice% rolou os olhos ao ver que o outro quase bebeu o seu vinho batizado, e ela fez a garrafa quebrar, na esperança que acertasse sua presa.

  — Minha? — Sorriu sarcástico ao desviar da garrafa, lançando algumas pequenas estacas como quem não queria nada. — Se está tão incomodada, pode ir embora. Ninguém se importa.

  — Será mesmo? Você não consegue tirar o meu nome da boca, acho que sentiria saudades de falar “%Beatrice%” todos os dias — a vampira se sentou e cruzou as pernas, apoiando a cabeça na mão —, talvez você até esteja apaixonado por mim.

  — A única pessoa que me chama pelo nome de uma forma diferente é você, %Beatrice% — se aproximou, segurando o queixo dela com firmeza e abaixando o tom da voz: — Será que o apaixonado aqui sou eu?

  Não era a primeira vez que eles ficavam tão perto assim, apesar da maioria das vezes ser por causa das batalhas que envolviam objetos cortantes. Por mais que os dois negassem veementemente, existia uma enorme e densa tensão – que Lilith alegava ser o famigerado “tesão” – que envolvia ambos e fazia com que eles sempre acabassem assim, perto demais um do outro e com um delicioso arrepio correndo por seus corpos gélidos. Suas respirações começavam a se misturar conforme a distância ia diminuindo, e o olhar de ódio se entrelaçava com o de desejo, fazendo com que seus corpos reagissem ao beijo de maneira contrária a que queriam. Suas línguas exploravam a boca um do outro com urgência, como se estivessem sedentas por aquele ato há anos. %Blake% deslizou sua mão para a nuca de %Beatrice%, enrolando o seu cabelo em seus dedos e o puxou, escutando-a arfar com a sua ação; ele nunca pensou que ficaria hipnotizado por uma cena como essa, mas, %Beatrice% estava tão apetitosa que ele poderia passar horas e horas a beijando, preso naquele momento tão delicioso. A vampira mordeu os lábios dele com certa força, voltando a beijá-lo de maneira feroz assim que escutou o seu gemido baixo, como se a sua existência dependesse disso; ela não imaginava que seu corpo agiria como se estivesse em abstinência ao sentir o gosto de %Blake%, e era nítido como %Beatrice% queria mais e mais, a ponto de cogitar ficar naquele momento por mais tempo.

  Mesmo tendo perdido a noção do tempo, ambos não conseguiam parar, e eles sabiam que seus corpos estavam implorando por mais. Mas, assim que se separaram por breves segundos, %Beatrice% fincou uma estaca na barriga do rapaz, abrindo um belo sorriso malicioso. %Blake% suspirou e tirou a madeira, não impressionado com o repentino ataque da vampira, e ao olhá-la, sorriu, gostando de ver a sua reação claramente irritada.

  — Vejo que o joguinho mortal de vocês acabou... ou quase.

  Lilith Morningstar surgiu na porta da cozinha, com o seu vestido longo vinho e os lábios avermelhados. A nova rainha do inferno era a melhor amiga de %Beatrice%, e elas sempre iam na casa uma da outra para fofocarem e conversarem sobre os seres sobrenaturais.

  — Ainda bem que %Blake% se regenera rápido, mas a brincadeira masoquista de vocês terá que continuar em uma outra hora. — Ela cruzou os braços ao se aproximar e sorriu, olhando fixamente para os dois: — Acho melhor vocês se unirem e buscarem o homem de vocês lá no meu castelo, a menos que queiram dar ele para mim.

  Os vampiros ajeitaram a postura imediatamente, buscando o que precisavam para seguirem ao submundo, ignorando completamente o que havia acabado de acontecer.

  — Ah, só tem uma coisa: vocês vão pelo caminho normal para estreitarem esse laço mortal que tanto gostam. Nada de portal para ambos.

  E com isso, Lilith desapareceu dentro de um, ansiosa para contar a %Cain% e Lúcifer o que acabara de presenciar. %Blake% e %Beatrice% se entreolharam, não sabendo muito bem como reagir com a ida da rainha, no entanto, eles não tinham tempo a perder, afinal, estavam loucos para encontrar %Cain%.

  O caminho para o submundo foi um tanto estranho.

  Pela primeira vez em anos, %Blake% e %Beatrice% ficaram em completo silêncio durante todo o trajeto, sem ousarem trocar uma provocação sequer. O acontecimento anterior mexeu com ambos, e eles estavam totalmente perdidos em como deveriam agir, ainda mais por estarem sentindo sentimentos conflitantes. Era só uma atração falando mais alto ou talvez depois de anos de ódio e provocações, eles passaram a nutrir algo um pelo outro? Às vezes os dois trocavam olhares rápidos, visivelmente desconcertados e envergonhados, e até quem passava por eles conseguia perceber que havia algo de errado com os jovens. Felizmente, depois de mais de uma hora, ambos encontraram uma das entradas do inferno, porém, ao entrarem, se deram conta que haviam ido pela entrada mais caótica, e se não quisessem entrar em alguma briga desnecessária, eles precisavam correr.

  E muito mais rápido do que já corriam.

  %Blake% segurou a mão de %Beatrice% em um ato impulsivo e começou a correr como se a vida deles dependesse disso – bom, meio que dependia – e após estarem completamente sem fôlego, os dois chegaram nos portões do castelo, onde suas entradas foram liberadas assim que os guardas os reconheceram. Não demorou muito para encontrá-lo, e no momento que viram %Cain%, tanto %Blake% quanto %Beatrice% começaram a chorar, fazendo com que o outro ficasse confuso.

  — Sabe como ficamos preocupados com você? Por que não nos disse nada? — Era perceptível como a mulher estava irritada.

  — Nós corremos pelas nossas vidas para chegar aqui e você estava simplesmente lendo? Não passou pela sua cabeça que ficaríamos loucos sem você? — %Blake% o encarou com uma feição chateada.

  — Que bom que eu sumi — %Cain% sorriu bobo, achando os dois extremamente adoráveis. — Vocês não perceberam que ainda estão de mãos dadas?

  Os vampiros se afastaram na mesma velocidade que seus rostos ficaram corados, e nenhum dos dois ousou a levar o olhar para o namorado, que os encarava aos risos.

  — Vocês fizeram muito mais do que segurarem as mãos e é isso que está deixando vocês sem graça? — Perguntou ao parar na frente deles, os puxando pela cintura e os obrigando a ficarem perto.

  — %Cain%! — Falaram juntos.

  — Sim? — Beijou a testa dos dois, sorrindo.

  — Você é o pior — %Blake% revirou os olhos.

  — Por mais que eu odeie concordar com esse aí, ele tem razão — %Beatrice% o cutucou com o ombro, rindo baixinho da sua feição irritada.

  — Não é tão difícil me dar a razão, eu sempre estou certo.

  — Só se for nos seus sonhos.

  — Ou nos seus. Aposto que apareço em todos eles — sorriu convencido.

  — Pode ficar tranquilo, em todos eles eu te mato. — Vatore retribuiu o sorriso.

  — E quando eu achei que poderíamos ser felizes juntos, vocês destroem os meus sonhos — %Cain% se afastou, dando as costas para ambos.

  — Ei, não é bem assim... — %Blake% segurou a sua mão.

  — Quem disse que não podemos ser felizes? É só o %Blake%... quer dizer, é só eu e ele tentarmos, né? — A garota segurou outra mão, mordendo o lábio inferior.

  — Às vezes esqueço como o coração de vocês é mole — %Cain% riu, recebendo tapas fortes dos dois lados. — Será que vocês vão deixar de serem inimigos e aceitarem que se gostam?

  — Nunca!

  %Cain% suspirou, assistindo a breve discussão que se iniciou e ele apenas passou os braços pelos ombros deles, tentando impedir que seu amado e amada começassem uma briga. Eles poderiam negar o quanto quisessem, contudo, %Cain% sabia que logo menos, os três estariam dividindo não só a liderança do clã, mas também a eternidade.