Edge Of Desire

Escrito por Júlia Oliveira | Revisado por Laura Weiller

Tamanho da fonte: |


Capítulo único

  - Não vai abrir? – ela disse, contendo a vontade mortal que tinha de esmurrar a porta.
  - É claro que eu não vou abrir. – ele respondeu, caminhando até a poltrona mais próxima. Largou-se sobre ela, colocando os cotovelos sobre os joelhos enquanto encaixa seu rosto em uma de suas mãos. – Não mesmo.
  - Qual é, ! – ouviu a voz da menina novamente, ela diminuía conforme a conversa (na verdade, não sabia se podia chamar aquilo de conversa) continuava. Ela era firme e raivosa, agora era delicada em tinha uma boa quantidade de angústia. – Você é melhor que isso.
   estirou-se na poltrona, balançando-se para o lado contrário ao da porta: passando a encarar a janela do apartamento, deixou com que seus pensamentos o guiassem: o que diabos estava fazendo ali? Suspirou, quase levantando-se e arrastando a si mesmo até o quarto, jogando-se em sua cama silenciosa. Por que a voz aveludada da garota tinha que bater novamente, de maneira tão selvagem?
  - Vá embora, ! – disse, chamando-a pelo nome. Sua voz soou firme e raivosa, lembrou-se de seu próprio pai depois de alguma arapuca adolescente.
   se remoeu do outro lado da porta. Podia contar quantas vezes ouvira chamá-la daquela forma.
  - Não me chama de ... – sussurrou, tentando engolir as lágrimas que começavam a cair sobre suas bochechas.
  - E qual é o seu nome? – a desafiou, sem forças. Aquele não era ele. Nunca gritaria com , ela era sua bebê, não merecia ouvir sua voz daquela forma.
  - Você sabe bem do que estou falando. – ela respondeu, ainda mais acuada.
  - O que você quer? – ele perguntou, amolecendo mais um pouco, enquanto girava a poltrona de volta para o lado da porta.
  Conseguiu notar um breve movimento da porta, tinha escorado-se a ela, escorregando até o chão, onde sentou-se, abraçando seus próprios joelhos.
  - Eu quero tentar de novo. – ela pediu, quase em um sussurro.
  Um sussurro que ouviria até cercado por uma multidão.
  - Eu já tentei de tudo, a não ser ceder. – a respondeu. Não podia ser molenga dessa vez, tinha que permanecer forte se quisesse continuar a viver. Tinha acabado de tirar de sua cabeça, depois de semanas. Simplesmente, não podia deixá-la entrar novamente.
   ouviu a resposta com o coração na mão. Arrependeu-se. Não conseguia mais. Achara que era forte o suficiente pra sobreviver sem ele, mas não era. era seu tudo, não tinha mais dúvidas disso.
  Apertou-se dentro de seu casaco, respirando fundo enquanto tentava conter suas lágrimas.
  E conseguia ouvi-las caindo.
  - , pelo amor de Deus, não chore... – a pediu, massageando as próprias têmporas.
  - Eu sonho com maneiras de fazer você entender a minha dor. – ela disse, fungando. As lágrimas já a consumiam de forma impressionante. – Oh , não faça isso comigo.
  Pensou em perguntá-la: “Do que diabos está falando?”, mas seus olhos encontraram as malas prontas no corredor. A passagem imóvel sobre a mesa de centro da sala enquanto o vento movia as cortinas da sala.
  - Não vá embora. – pediu fraca.
  Não dormia havia dias, raios caindo sobre seu peito a mantinham acordada a noite. Mas não se importava em não dormir mais essa noite, contando que resolvesse aquilo tudo naquela noite. Precisava do odor agridoce de , de tocar as madeixas irregulares de seu cabelo liso e de receber seu beijo diário na testa para dormir. Acordar com ele entre suas pernas enquanto sentia seus dedos brincando com a franja irregular. Ou de simplesmente sentir sua presença, andando em círculos na sala, à procura daquela tal nota perfeita pra completar aquela música.
  Ele era seu ar. Nunca havia duvidado disso e de repente, mais do que nunca, tinha certeza.
  O nó em sua garganta agravou-se, enquanto a respiração irregular estampou ainda mais sua situação precária. estava pra partir, pra mais longe do que nunca e sem data pra voltar.
  Do outro lado da porta, ouvia a sinfonia do choro único de . Era doloroso, um sacrifício sentar-se naquela poltrona enquanto ouvia aquele som, ela ficava sem ar e soluçava como seu irmão mais novo depois de uma briga boba e infantil, há mais de vinte anos atrás. Onde estava toda sua determinação, ? – perguntava a si mesmo.
  Ela provavelmente, levara junto com todas as outras coisas que possuía. – Respondeu a si mesmo, enquanto levantava-se da poltrona, a dois passos de ceder a moça. Jogou-se no chão, sentando-se ao lado da porta, ainda ouvindo os soluços inabaláveis de .
  Oh, sua pequena. Não era novidade pra ninguém o quanto a amava. Seus olhos, seu tamanho, a maciez de sua pele e seu sorriso desenhado por batons vermelhos sensuais.
  - Eu não quero ir, pequena. – ele suspirou, engolindo mais uma leva de lágrimas.
  - Então não vá. – uma mínima quantidade de esperança estampou a voz de , - O que eu tenho que fazer pra te fazer acreditar na minha dor, ? O que eu posso fazer pra te fazer ficar?
  Ela voltou a chorar, fazendo com que o peito de partisse em dois.
  - ... – chamou-a pelo apelido, virando-se de frente para a porta e colocando a mão sobre a madeira forte e polida do objeto, como se conseguisse tocar a própria . – Não chore.
  - Você não pode me pedir isso neste momento, . – ela disse, depois de fungar e esconder suas lágrimas por uma fração de segundos. – Me perdoe, mas esse é um dos seus poucos pedidos que eu não posso realizar. – ela suspirou. – Jovem e cansada de fugir, me diga onde isso me levou?
  Ela disse, voltando a voz firme, mas a tristeza e o arrependimento ainda eram óbvios em suas palavras.
  - Aquele pequeno oito desenhado no tapete do seu quarto, tombado em um infinito? – ela o desafiou, conseguiu enxergar sua sobrancelha esquerda levantada de forma irônica. - O amor não é nada além de um sonho que fica me acordando, apesar de tentar, ainda acabamos morrendo. – ela suspirou mais uma vez, fraca. - Porque estou prestes a atear fogo em tudo o que vejo.
  Ela se calou, encaixando a própria testa em uma de suas mãos, enquanto usava a outra pra secar as lágrimas incessantes. Tentando controlar sua respiração, enquanto gritava interna e silenciosamente: “Eu preciso te ter, agora.”
  - Eu te quero tanto que voltaria atrás nas coisas em que acredito – ela disse, firme, quase um grito. Talvez uma das últimas coisas que sua garganta dolorida e a falta de ar em seus pulmões a permitissem dizer. Chorou mais um pouco. - Pronto, eu admito, tenho medo de que você irá se esquecer de mim.
  Ela largou sua cabeça para trás, batendo-a levemente contra a porta do apartamento enquanto tentava adivinhar se ainda a escutava.
  - Eu amo você mais do que as músicas podem dizer. – ele respondeu, rápido, uma desafio a sua própria sanidade. – Mas... - parou por um segundo. não soube se apenas tentava recobrar a sanidade ou o ar, ou se simplesmente media suas palavras. – Por que você quer quebrar meu coração novamente? Por que deveria deixar?
  Por que eu só quero te fazer feliz, . – ela suspirou. – Realizar cada um dos seus pedidos. Ser o suficiente pra você! – ela disse, antes de parar para uma pausa, recuperando todo o ar perdido. – Se você quer mais amor, por que não diz? , eu só quero ser perfeita pra você.
   suspirou, estava cansada e inquieta. Achava que ia acabar dormindo em suas roupas no chão do corredor do prédio.
  - Só estou pedindo que me perdoe, . – ela disse, tomando todas as suas últimas reservas de força. – Eu só quero ser perfeita pra você. E tente entender o que eu passo: - fez uma pausa, engolindo o seco. – Você é o sonho de metade da população mundial, tem noção de quanta pressão eu recebo por estar com você?
  - Não seja ridícula, . – a chamou, deixando com que uma risada saísse de seu nariz. – Você é perfeita. Perfeita em seu melhor vestido, e em seu pijama mais velho que você tem há mais de dez anos. Você é o meu sonho.
  - Você é o meu sonho. – ela o corrigiu, virando-se para porta e ajoelhando-se. – Eu fecho os olhos a noite e rezo pra poder te ver quando abri-los na manhã seguinte. Eu agradeço por poder te chamar de meu, e todas às vezes que me sinto triste: eu penso em você. – uma pausa, encostando a testa na porta. – Eu penso na sua voz, naquelas coisas maravilhosas que só eu posso escutar vindas de você, das mensagens subliminares que só eu entendo nas músicas. Oh , você é a minha alegria, a minha vida. – ela suspirou, já voltando a chorar tão escandalosamente. – Não me prive disso , por favor.
  Ele engoliu o seco. Sentindo seu coração crescer, a ponto de parecer maior que seu corpo.
  - Eu te amo, . – ela disse, como seu último suspiro. – E ainda quero que você lute por mim até o último dia da sua vida. Por que vai ser o último da minha também.
  Ele respirou fundo, esticando-se apenas o suficiente para conseguir encostar a mão na maçaneta.
  - Eu te amo, . – ele disse, antes de abrir a porta e encontrá-la debulhada em lágrimas.
   o encarou, ele tinha o rosto vermelho, consumido em lágrimas, enquanto o dela era um emaranhado da maquiagem rotineira, cabelo e lágrimas. Ela secou o rosto, tentando ficar mais apresentável, fazendo-o soltar uma risada tímida.
  - Você é perfeita. – Segurou-lhe a mão, impedindo-a de continuar a se “arrumar”. – Chorando ou não. Descabelada ou não.
  E então aproximou seu rosto do dela, segurando seu rosto com a mão, enquanto o levantava delicadamente. Depositou um beijo em sua testa, sussurrando algo inteligível, mas que soou como poesia aos ouvidos de .
  Ela segurou a mão dele que acariciava-lhe o rosto, incrédula de estar sendo tocada pelo rapaz novamente. Oh, como sentira falta dele, de seu cheiro, seu toque, sua pele aveludada.
   desceu seus lábios, largando o rosto de para tomar-lhe pela cintura, puxando-a para mais perto: ela era sua novamente, na verdade, um pouco de sua sanidade lhe garantia que ela nunca tinha deixado de ser sua, ainda encaixava-se perfeitamente em seu corpo. Ela era sua, sempre seria. Beijou-a com delicadeza e amor, mas havia também fúria, um traço deixado pela saudade e a satisfação. A língua quente e adocicada ainda era bem-vinda, o gosto de morango ainda lhe era familiar. Puxou-a para dentro, enquanto fechou a porta atrás de si com o pé.
  - Eu nunca amei alguém como amo você. – ela sussurrou, aninhando-se no espaço entre o ombro e o pescoço de .
   riu, abraçando-a com mais amor, disposto a passar noite procurando algo de si nela.
  - Não diga nada, apenas fique comigo. – ele respondeu, espalhando beijos no rosto da garota.
  - Para toda a eternidade. – ela disse como em uma promessa.

FIM



Comentários da autora