Dust in The Wind

Escrito por Nyn L.Dellafield | Revisado por Mariana

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Capítulo 01

  Passos apressados sobre a areia da praia. Respiração ofegante de alguém correndo com todas as suas forças. Tão logo os pés deixavam a areia para tocá-la novamente em outro ponto, os passos anteriores se apagavam, como se a areia nunca antes tivesse sido pisada. Qualquer ponto da paisagem que a rodeava, não passavam de simples borrões. Até que o pé tropeçou em algo, obrigando-a a parar de correr e prestar atenção no que acabara de tropeçar. Um objeto duro, escondido parcialmente por um pouco de areia. Uma ampulheta. Contemplou o objeto, e percebeu algo na disposição dos grãos de areia dentro do vidro transparente. A parte que estava para o lado de baixo possuía maior quantidade de areia que a parte superior, cujos grãos já estavam no fim.
  "I close my eyes/ only for a moment/ and the moments gone/ All my dreams/ Pass before my eyes, in curiosity...” a jovem escutara o som da música ao longe. Minutos depois, os olhos castanho-claros de abriram-se sobressaltados.O celular vibrava sobre o criado-mudo. A morena aproximou-se e viu o nome "Camille" no visor.
  - Alô - disse impaciente - O que queres?
  - Bom dia pra você também - a voz disse, com uma risadinha.
  - Espero que tenha um bom motivo para ter me acordado.
  - Ah , isso são horas de estar dormindo?! São 11h30min da manhã e está um lindo dia lá fora...
  - São horas de dormir pra quem passou a semana inteira trabalhando e ainda tem mais umas planilhas para fazer hoje à tarde - disse .
  - Nossa, quanto mau-humor, eu hein. É TPM? Deve ser. Enfim, ainda bem que você tem uma sorte de ter uma amiga legal como eu, que vai te levar pra relaxar e se divertir. Se arrume que em 10 minutos vou te buscar...
  - Para...?
  - Vamos viajar pra Búzios.
  Búzios. Milhares de imagens povoavam a mente de . E, em especial um par de olhos verdes marotos e um sorriso cativante.
  - Alô, alô, ? Ainda está viva?
  - Camille, eu...
  - Ah, não, por favor, vai me dizer que ainda está assim por causa do... - a interrompeu.
  - Não! Ele já é passado. - disse rapidamente.
  - Não é o que parece quando ele pergunta de você.
   revirou os olhos.
  - Se não tem mais nada importante a dizer então vou desligar e dormir, se não se importa. Tchau.
  Em um clique, desligou o telefone e jogou-se novamente na cama, procurando sono para voltar a dormir. Mas infelizmente, as imagens desconexas de um passado não tão distante assim a atormentavam.
  #FLASHBACK ON#
  - , esta é minha amiga . , este é , amigo do Matthew - disse Camille.
  A garota analisou o rapaz à sua frente. Alto, ombros largos, corpo definido, camisa sem mangas, cabelos castanhos levemente despenteados, olhos verdes que brilhavam como duas esmeraldas. Os cantos de seus lábios se afastaram em um tímido meio-sorriso, e a voz grave enfim disse:
  - Prazer, - estendeu a mão.
  - - disse, segurando a mão que lhe foi estendida.
  #Flashback off#
   e sentiram uma estranha conexão quando seus olhares se cruzavam. Duas almas solitárias, igualmente machucadas por amar pessoas que não correspondiam aos seus sentimentos. Ele amava Kimberly, que não correspondia ao seu sentimento simplesmente por sentir atração única e exclusivamente por garotas. Já , por sua vez, sofria apaixonada por Daniel, o garoto mais popular do colégio onde estudava. O rapaz se envolvia unicamente com garotas ricas e por mais que achasse atraente, tinha vergonha de ter uma "pobre" ao seu lado. A amizade de veio como uma dádiva a . Sempre andavam juntos, sempre saíam juntos, quando Matheus ou Camille chamavam um para sair, só iam se o outro fosse. Em um final de semana, os tios de Matheus deixaram a casa de praia sozinha para o sobrinho, que levou Camille, e para a casa. Um final de semana, quatro jovens sozinhos em uma casa de praia, bebidas à disposição, o desfecho não seria outro. Os cômodos e corredores cheios de garrafas de bebidas vazias, bitucas de cigarros, roupas, camisinhas usadas, espalhados por onde quer que se olhasse, assim como os casais: Matheus e Camille completamente nus abraçados em uma cama de casal, e jogados pelo carpete do sofá, cheio de garrafas de bebidas ao redor. A morena se assustou com a cena, mas logo ela passaria a ser rotineira e as saídas entre os amigos a Búzios sempre com o mesmo final, tanto na casa, quanto nas areias da praia. Anos se passaram e ela ali, com milhares de coisas a fazer, com os milhares de pensamentos despertados pela inesperada ligação de Camille. Uma ligação. Sempre uma ligação acabando com seu dia.
  #Flashback on#
  Os olhos inquietos de miravam o visor do celular, aguardando alguma mensagem, ligação ou sinal de vida de . Fazia quase um mês que não se encontravam. Uma vibração interrompeu os devaneios de , que clicou na tela para atender a ligação.
  - Oi amor – disse -, ainda bem que você me ligou. Estava pensando em você...
  - T-tava é?
  Um silêncio constrangedor se fez presente.
  - , sabe o que é... eu preciso te falar uma coisa - o tom de voz de estava triste e quase sumia.
  - Diga - o sorriso no rosto da jovem se desfez aos poucos.
  - Não quero mais ver você. Acho que está se apegando muito a mim, e não quero nada mais com você. Tenho uma namorada agora e a amo, acho que esse nosso lance já deu o que tinha que dar. Espero que entenda...
  #FLASHBACK OFF#
  Depois de , jurou a si mesma que não se apaixonaria por mais ninguém em sua vida. Desde então só dedicou sua vida a estudar, a fazer cursos, a se aprimorar profissionalmente, e enfim se tornar uma grande advogada. Teve um casamento com um homem muito mais velho, por interesse, de quem herdou uma empresa após sua morte. possuía muito dinheiro, suficiente para ter uma vida invejável e confortável, cheia de eventos sociais, viagens pela Europa, carros importados, bebidas caras, cruzeiros marítimos. Mas raramente aproveitava seu dinheiro. Apenas pensava em acumular mais e mais, trabalhar, trabalhar e trabalhar, pra acumular e acumular. Uma jovem viúva de 25 anos. , às vezes, era tomada por sensações de vazio e solidão, o que procurava prontamente aplacar com compras e mais compras. Ou trabalhando cada vez mais e mais. Mas, naquela manhã só se permitiu o luxo de dormir até mais tarde pelo simples fato de ter uma dor de cabeça fulminante na noite anterior. Levantou-se da cama, caminhou alguns passos até o banheiro e fez sua higiene matinal. Vestiu em seguida sua saia-lápis preta de cintura alta com uma blusa branca de cetim e nos pés, os fiéis Loubotin pretos de sempre. Dirigiu o carro, a mente bagunçada por pensamentos do passado e presente em completo caos. lembrou-se que além de trabalhar, ainda teria que buscar o resultado dos exames no laboratório a alguns metros próximo de seu caminho. Desceu do carro e caminhou, abrindo devagar a porta de vidro do laboratório.
  - Seus documentos, senhora? - disse a recepcionista.
   entregou-lhe alguns papéis. A recepcionista digitou algo no computador.
  - Aqui está o seu resultado - disse, entregando-lhe um envelope branco.
  Após mais alguns passos para fora do laboratório, a morena abriu delicadamente o envelope. Seus olhos percorriam sem interesse o papel, até que algo lhe chamou a atenção. Sua quantidade de leucócitos estava muito maior do que seria considerado normal. "Não pode ser", pensou, franzindo a testa. Leucemia. Os olhos encheram-se de lágrimas. Dirigiu sem sequer prestar muita atenção ao trânsito. Cenas de sua vida inteira lhe passavam pela mente como se fosse um filme. De nada adiantava possuir tanto dinheiro e tantos bens, se os momentos se esvaíam diante de seus olhos como poeira ao vento. Quando ainda poderia se permitir o luxo de aproveitar a vida, e não viver em função de sua grande ganância. Dinheiro nenhum compraria mais tempo de vida. Não fez quase nada em sua vida do qual pudesse se recordar. A maior parte de seus arrependimentos resultava do que não fez. Morreria ali, apenas como mais um número na multidão, a terra levaria seu corpo e suas ambições. então tomou a decisão de ela mesma abreviar seu período de espera pela própria morte. Acelerou o carro o máximo que podia, na esperança que este colidisse com um poste e assim ela morresse. Porém, avistou a alguns metros um rapaz atravessando à sua frente. "Ele não tem culpa de nada. Ele ainda tem muito a viver", pensou, enquanto freou bruscamente e diminuiu a velocidade. Os olhos do rapaz encaravam como se já a conhecessem, e ele continuara ali parado. Mas a morena apenas desviou o caminho e prosseguiu dirigindo. Os olhos verdes do rapaz fitavam o chão do asfalto enquanto caminhava de volta para a calçada. O que não imaginava, é que não era a única naquele dia esperando que a morte levasse…

Capítulo 02

  - EI, ESPERAAAAAA - gritava, correndo atrás do Mercedes preto que acabara de quase atropelá-lo minutos atrás.
  Os olhos castanhos da motorista do carro lhe eram familiares. Lembravam uma certa garota de seu passado. Que, aliás, não era tão passado assim, já que ainda passava dias a pensar nela.
  #FLASHBACK ON#
  Os olhos verdes fitavam a escuridão através da janela de seu quarto. As lágrimas escorriam por seu rosto. O barulho da porta do quarto o fez despertar para a realidade.
  - Filho, vem jantar - disse uma voz maternal.
  - Não quero, estou sem fome...
  Um silêncio tomou conta do quarto. Emma ainda observava a reação do filho, os cabelos negros cobrindo parcialmente seus olhos.
  - O que houve, filho? - disse, acariciando seus cabelos.
   abraçou fortemente a mãe.
  - Mãe... o certo é proteger o que amamos, né?!
  - Filho, o certo é protegermos o que sentimos.
  - É, eu sei... - desvencilhou-se devagar da mãe - Eu fiz o que pude, eu juro.
  As lagrimas de tornavam-se mais abundantes.
  - Então por que esta chorando? - Emma segurou o rosto do filho entre suas mãos.
  - Porque estou tentando me convencer que o que fiz é certo...
  - Não é por quê? O que exatamente você tem? - disse, arqueando as sobrancelhas em curiosidade.
  - Pouco tempo de vida... E agora não tenho mais nada, perdi tudo - disse, chorando.
  #FLASHBACK OFF#
  Ninguém fazia noção da tristeza que se escondia por trás dos sorrisos cordiais de . Nunca conseguiu se perdoar por ter feito isso com , por ter sido tão covarde a ponto de não admitir o quanto a amava. Sentia como se conhecer fosse a única coisa boa que tivesse lhe acontecido. Fingia que a relação de ambos resumia-se apenas a sexo, pois conhecia bem o espírito livre da garota, então logo imaginava que esta não quisesse se prender a nada nem a ninguém. Dentro de algumas semanas ou dias, ela esqueceria isso, e estaria amando novamente uma pessoa saudável e que a merecesse. usou esses pensamentos para consolar a si mesmo, mas não adiantavam. Mesmo com os anos se passando, ainda sentia muita falta de e não conseguiu mais amar nenhuma outra garota. "Foda-se", pensou,"Eu vou atrás dela, mesmo que seja a ultima coisa que eu faça na vida". Pegou o celular de dentro do bolso da calça jeans e discou o número de Camille.
  - Oi.
  - Camille, você pode me dar o número da ? - disse .
  - Eu já te disse milhares de vezes que ela não quer mais nada com você e ela sempre fez questão de me dizer isso! Será que você não entende?! - o tom de voz da loura se modificou.
  - Por favor, me ajuda! Eu juro, Camille, juro que essa é a última vez. Lembra das vezes que você e Matheus brigavam e eu sempre o convencia a te perdoar? Então... Temos uma dívida.
  - Búzios hoje, eu, você, Matheus e , que tal?! Como nos velhos tempos. - disse, animada.
  - Ok então, duvido que isso dê certo, mas tudo bem... - disse.
   desligou o telefone, comprimindo os lábios e rezando mentalmente para que os planos de Camille dessem certo. Se desse certo, sem dúvida seria o dia mais feliz de sua vida. Que se fodesse se fosse o último. Pegou sua Indian 1947 e acelerou o máximo que pôde até Búzios. Já estava completamente chorosa e em prantos dentro do Mercedes, rumando do nada a lugar algum. Até que enxugou as lágrimas e mirou pelo espelho retrovisor os próprios olhos castanho-claros. Não sabia nem o dia nem a hora de sua morte, então resolveu ao menos eternizar seus últimos momentos de vida. Suspirou fundo e discou os oito números tão conhecidos.
  - Alô, Camille?- disse.
  - Que milagre é esse de você me ligar? - riu a amiga.
  - Quem faz as perguntas aqui sou eu - interrompeu -, e a pergunta é, tem como irmos pra Búzios agora mesmo? Mudança de planos...
  - UHUUUL, amiga! - Camille disse, entusiasmada - Assim é que se fala, é pra já!
   desligou o telefone e acelerou o carro em direção ao La Frontiere, o restaurante de comida francesa mais caro da cidade. Entrou em passos altivos e confiantes no estabelecimento, olhando para todos os lados. Queria fazer seus sentidos se inebriarem com o máximo de estímulos que podiam. Pegou o cardápio e se permitiu ao luxo de pedir as opções mais caras disponíveis, em grandes quantidades. Que se fodesse dieta, afinal, cuidar tanto do corpo pra quê, se a terra iria tragá-lo como tantos outros. Naquele dia, decidiu a se dar ao luxo de experimentar tudo do qual se privara. Saboreava lentamente a textura, temperatura e sabor de cada alimento, sem sequer se importar com preço ou com dietas de qualquer espécie. "Próxima parada, minha casa", disse, sorrindo. Abriu todos os vidros do carro e se permitiu sentir enfim o vento bagunçando seus cabelos, sem se importar em manter o penteado ou pose. Ao chegar na frente de sua casa, recebeu olhares assustados de Camille. Entraram no carro e algum tempo depois estavam ambas inebriadas, cantarolando alto a música do rádio. Búzios se aproximava.
  Os céus escureciam, a brisa fria anunciava a chegada da noite e seu majestoso manto negro, sob o qual coisas inesquecíveis poderiam acontecer. Ainda mais quando se reuniriam novamente aqueles quatro amigos. e Camille corriam animadamente para a rua que dava acesso à praia. Seus passos tocavam as areias, mas as marcas não ficavam, por mais que pressionassem os pés, tão logo os tirasse as areias cobriam o espaço. olhava com atenção os grãos de areia serem levados pela fria brisa marítima. Aquela areia lhe era familiar. Recordou-se de seu sonho no qual corria desesperadamente. As paisagens se tornavam borrões exatamente como naquele momento. Sentia-se como em um deja vù.
  - Vai pra água ou vai ficar aqui?
  - Vou ficar um pouco aqui sentada, daqui a pouco vou pra lá - disse.
   sentou-se na areia, tateando com os dedos o chão. Naquele instante parou para pensar em cada detalhe do sonho estranho que tivera no dia anterior. A pessoa que estava correndo era ela mesma. Estar correndo poderia significar que estava com pressa para chegar a algum lugar. Ou fugindo de alguém. "De quem eu estaria fugindo?" pensou. Um perfume amadeirado invadiu suas narinas de repente. virou-se para reconhecer o dono daquele aroma e se deparou com dois olhos verdes a encarando.
  - Posso me sentar aqui? - disse, apontando para um lugar ao lado de onde estava sentada.
  - A praia é pública, logo você pode sentar-se onde quiser - respondeu rispidamente, o olhar mirando a areia da praia.
  - , dá pra falar comigo, por favor?
  - Estou falando, não estou?! Não tenho mais nada a perder, né, então foda-se...- disse, rabiscando alguma coisa com o dedo na areia.
  - Foi com esse pensamento que eu vim aqui, mesmo sabendo que você não quer mais nem olhar na minha cara...
  - Tenho meus motivos - disse friamente.
  - , me desculpa ter vindo aqui. Mas é que eu não poderia deixar que tudo acabasse, sem você ter a chance de saber a verdade...
  Os olhos castanhos o fitaram fixamente.
  - É bom que o que tenha a dizer é importante, porque não tenho muito tempo a perder.
  - , eu... - abaixou a cabeça - Só fiz isso naquele dia pelo seu bem.
  - Como assim?! Isso é mentira sua, você nunca pensou em nada além de você, nem sequer pensou em como eu ia ficar e...
  - - segurou o rosto delicado entre suas mãos - pra mim isso importa muito, mais do que qualquer tempo que possa me restar de vida. Eu te amo, eu sempre te amei. E se eu te deixei, foi pra que você fosse livre, e feliz... com alguém... que pudesse viver o suficiente pra isso.
  Os olhos de a encaravam marejados.
  - Como assim, do que está falando? - disse .
  - Meu estado de saúde não estava dos melhores, e tive certeza de que iria morrer. Então armei aquela situação toda para te deixar ser livre e feliz, você tem toda a vida pela frente, não seria justo que eu estragasse tudo...
   piscou repetidas vezes, tentando assimilar tanta informação sendo jogada a ela de uma só vez. Mas sentiu seus olhos umedecerem e o coração acelerar. Os braços de a envolveram em um abraço forte. As mãos acariciavam os negros e compridos cabelos. Fechou os olhos e aspirou aquele perfume adocicado. Era incrível como depois de tantos anos, apenas o calor da pele dela era o que o acalmava
  - Então por que resolveu voltar agora, depois de todos estes anos? - perguntou, encarando com lágrimas os olhos verdes de .
  - Porque eu te amo, . Porque eu não conseguia mais parar de pensar em você. Porque cada instante longe de você me fazia desejar mais que a hora da morte se aproximasse e acabasse logo com isso - aproximou seu rosto ao da morena - Porque meu medo de te perder é bem maior do que o de morrer, consegue entender?
  - Tenho uma coisa pra dizer também - disse - Não é só você que tem pouco tempo. Eu peguei meus exames e descobri que tenho leucemia.
  Lágrimas caíam abundantes sob os olhos castanhos.
  - Então... tenho uma proposta. , você aceita passar comigo o que sobrou de nossos dias?
  - Eu aceito - sorriu - Não precisamos mais nos preocupar com o tempo, porque já não nos resta muita coisa. Mas há algo que eu aprendi, não é o tempo que define se fomos felizes ou não. E sim, o que fazemos com ele. E com quem aproveitamos ele. 10 minutos, 10 dias ou 10 mil anos, não me importa. Se estivermos ao lado de quem amamos, aí sim, sentiremos que tudo valeu a pena.
   se levantou, seguindo-as e segurando a mão de . Os passos tocavam a areia e em seguida desapareciam, deixando a areia intacta, como se ninguém estivesse sobre ela anteriormente. Algo interrompeu a velocidade com a qual corria. Seu pé tropeçou em algo. A morena aproximou a mão do objeto, retirando a fina camada de areia que se encontrava sobre ele. Uma ampulheta. A mesma ampulheta que tinha visto no sonho da noite anterior. Estava correndo, sobre a areia. E a areia era idêntica a Búzios. Tropeçara no mesmo objeto que tropeçou no sonho. Mas notou algo diferente na disposição dos grãos dentro do vidro. A parte superior estava com uma grande quantidade de grãos, que caíam lentamente sobre a parte inferior, com pouquíssima quantidade de grãos. se aproximou, tomando das mãos de o objeto.
  - Acho interessante as ampulhetas - disse , observando os grãos caírem lentamente.
  - Por quê? - disse .
  - Porque é intrigante como as coisas podem mudar a qualquer momento. É como a vida quando acontece alguma coisa, vira de ponta-cabeça, mas é necessário pra servir de recomeço. É como se a contagem reiniciasse...
  A jovem segurou a ampulheta nas mãos. Virou-a ao contrário. A parte superior com mais grãos que a inferior. Virou novamente. Aconteceu a mesma coisa. sacudiu, virou para todos os ângulos que conseguia, mas o resultado era sempre o mesmo. A parte superior sempre com mais areia que a inferior. Os minúsculos grãos deslizavam vagarosamente.
  - Temos o nosso próprio tempo agora - disse .
  - Para sempre. O nosso sempre - sorriu .
   deixou a ampulheta onde a encontrou, sorrindo. Parou para pensar em seu sonho. Estava apressada demais na vida. Tropeçou em seu próprio tempo e viu que não lhe restava muito. E agora tudo virou de ponta-cabeça novamente. Reencontrou e redescobriu o prazer de viver e o valor das coisas simples. Agora não precisavam correr, ou ter pressa de chegar a algum lugar. O que interessava era o caminho. Como em um castelo de areia, o importante não é o castelo de areia que foi construído. E sim a imagem do castelo na mente de quem o faria. O castelo construído é facilmente destruído. Mas, quando se destrói algo, se dá espaço para novas coisas serem construídas. Para recomeçar. Não importa se mil vezes destruírem, recomeçar sempre é preciso. Reinventar. A ampulheta da vida teve seu sentido invertido. E a contagem então se reinicia...

FIM



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