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#015 Temporada

Don't Wanna Cry
Seventeen



Don't Wanna Cry

Escrita por helwa | Revisada por Songfics

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  Junmyeon ouvia frases e as jogava no fundo de sua mente, provavelmente no lugar onde as memórias inúteis ficavam, onde ele gostava de chamar de “lixo do inconsciente”, quando ainda tinha humor o suficiente para inventar termos bestas para coisas das quais ninguém pensaria. A sua voz preferida estaria dizendo em seus ouvidos que ele não fazia bem em ignorar os homens que cuidariam de toda a sua vida profissional dali em diante. Mas ele não conseguia pensar de maneira coerente tinha semanas, ainda mais quando a notícia dolorosa chegou até si na noite que havia se passado. 
  Era uma manhã calorenta, com o sol passando pelo vidro das janelas e chegando até a caneca quase que intocada de Junmyeon. Ele estava em seu estúdio, as paredes de cores bege e marrom claro de preferência do dono e os diversos prêmios pendurados no armário. Um em especial simbolizando a música, uma parte importante de toda a sua vida. E o motivo pelo qual aqueles homens estavam a discutir era mais do que sério, pois as vendas do álbum recém lançado do rapaz estavam em uma montanha que a cada hora crescia mais. Ele estava contente por aquilo, era incapaz de negar, no entanto, algo mais forte o impedia de sorrir e conversar decentemente com as pessoas. 

  A falta não só da sua voz preferida, mas do ser humano que ele mais amava no mundo todo, quebrava seu coração em mil pedaços. Ele não estava acostumado a ficar tanto tempo sem Sehun, o rapaz que dominava todos os seus sonhos e fazia questão de ser papel principal no filme que era a vida de Junmyeon. Ele tinha o deixado há exatas três semanas. Três longas e tortuosas semanas, dias onde o músico acordava e percebia que não mais receberia o “bom dia” agitado do homem, acompanhado dos beijos macios em seu queixo. Junmyeon não possuía o coração de Sehun em seus dedos, nem em seus selares, em nada mais. 
  Distraído de forma constante durante o mergulho nas ideias vazias em sua cabeça, Junmyeon não teve tempo de erguer seu olhar e enxergar Baekhyun, que chegou barulhento na porta do cômodo, cumprimentando todos ali, inclusive o músico, que apenas ergueu a caneca em resposta, a boca presa num Padrón, soltando fumaça em quantidades rasas para fora do ambiente, próximo de uma das janelas. O peito já começava a se sentir pesado, e o rapaz de cabelos castanhos sabia que não deveria manter o charuto nos lábios. Caso Sehun estivesse perto dele, o repreenderia com um bico feio e um tapa em um dos ombros.
  — Bom dia para você também, Sr. Junmyeon. — Baekhyun estava em seu lado agora, cutucando-o com o olhar mandão. — E para a sua chaminé. 
  Junmyeon olhou o amigo com um cansaço nos olhos, uma das mãos coçando a testa com a ponta do indicador. 
  — Bom dia, Baekhyun. — Tossiu de forma leve. — Me deixa em paz, sério. 
  — Não, Junmyeon. — O sorriso dele se fechou, as sobrancelhas vincadas. — Me dá isso, quer fazer feio na frente de todos aqui? Um músico novato que não dá a mínima para seus negócios? 
  E tomou o charuto de sua mão, procurando pela lata de lixo com os olhos pequenos, comemorando internamente quando a achou. Jogou o objeto quente fora passando as mãos na calça para limpar as cinzas que haviam sujado seus dedos. 
  — Eu não ia fazer isso, você sabe. — Baekhyun continuou. — Não ia vir aqui hoje e cancelar a reunião de última hora, mas como sou seu amigo… Eu não tenho outra escolha, certo? 
  Em um movimento leve com a cabeça, o outro assentiu, ansiando por agradecer aos céus por ter enviado um amigo tão bondoso como Baekhyun para si. Isso se materializou de forma mais forte ainda quando viu o menor pedindo de forma educada para que todos saíssem da sala, e apesar das expressões surpresas e descontentes nos rostos dos homens, nenhum deles negou. Nenhum deles era desprovido de noção para negar algo que Byun Baekhyun pedia, ou ordenava. 
  Baekhyun era seu amigo desde que se entendia por músico, ou seja, desde muito tempo atrás. A música veio até si tão calmamente, mas Baekhyun era como um tornado, e assim que o conheceu, por mais que achasse que não combinavam em nada, ele foi surpreendido com uma personalidade amistosa e uma amizade de duração infinita, se continuassem daquela maneira.  
  — Obrigado por isso, Baekhyun. — Junmyeon tossiu outra vez, o olhar baixo. — E desculpe por ter te recebido mal assim.
  — Na verdade, peça desculpas por não ter nem me recebido, não é? — Ele brincou, os olhos observando os últimos homens na sala se esvaindo pela porta de madeira. 
  — É, isso. Me desculpa por não ter te recebido adequadamente aqui. — Sarcástico, Junmyeon gargalhou junto do outro e voltou a se sentar. 
  — Só te desculpo se me levar no Subway depois, você sabe. — Respirou fundo. — Você… conseguiu dormir, depois de ontem? 
  Ah, é, Junmyeon pensou. A notícia da noite passada, que assim como o clima naquela cidade grande dos Estados Unidos estava, viera de forma fervente. Queimou o rapaz não só em seu interior, mas em uma camada onde todos veriam. Era uma celebridade vulnerável. 
  Horas antes da reunião ter começado, de Junmyeon colocar os pés fora da cama mesmo tendo passado a noite toda em claro, o celular apitou estridente nos ouvidos do rapaz e de Baekhyun. Mal havia tocado na comida que o amigo preparou para os dois, e rolou a tela do aparelho móvel com os dedos, se assustando com o tanto de notificações que chegavam na barra de luz. Assim que escolheu um dos sites mais confiáveis de notícias, o estômago vazio revirou-se, como se tivesse recebido um forte soco. 
  Junmyeon não podia acreditar quando leu a matéria, “O ex-namorado de uma das novas estrelas da música, Kim Junmyeon, entra em processo contra o galã”, e após os olhos passarem fugazes por todo o texto escrito, ele viu então uma postagem no Instagram de Sehun com um pequeno texto onde ele dizia não ter dado permissão ao rapaz para que colocasse seu nome em uma das músicas de seu álbum de estreia. Aos berros, o que Baekhyun nunca pensou enxergar o amigo fazendo, ele foi questionado, se sabia daquilo, se tinha ouvido algo com um dos assessores, mas o baixinho respondeu que não e pediu para que se acalmasse.
  O músico conseguiu se acalmar, mas não as batidas descompassadas de seu coração. Nem mesmo a comida que entrava na boca e parecia não possuir gosto algum, as palavras de Baekhyun sendo cortantes para cada um dos poros na derme quente dele. O amigo disse que Sehun certamente entrou com os papéis de processo naquele dia, e por isso decidiu expôr o caso nas redes sociais. 
  Sehun não era uma celebridade como Junmyeon, ele trabalhava como modelo, mas todas as vezes em que citava o nome do rapaz em suas redes sociais, o alcance dobrava de tamanho e tomava proporções inimagináveis.  
  — Junmyeon. — Baekhyun estalou os dedos na frente do amigo, tentando recobrar sua atenção a ele. 
  — Oi, oi. — Ergueu o olhar novamente. — Eu me distraí. 
  — Eu percebi. Não se preocupe, é normal ficar com a cabeça meio avoada quando tantas coisas dolorosas acontecem uma atrás da outra. — Sorriu fraco. 
  — Eu consegui dormir um pouco. — Mentiu. Baekhyun sabia que ele estava mentindo, mas não insistiria. Os olhos pesados com olheiras mais feias do que o normal denunciavam o fato. — E você? Conseguiu falar com alguém? 
  — Claro, claro. — Agitado, Baekhyun tirou do bolso o iPhone 8 e procurou pelas conversas gravadas com os assessores do amigo. — Olha, eles me disseram que o Sehun arrumou os processos dos papéis ontem, mas não sabem se é oficial que ele realmente abriu um processo contra você. 
  Massageando as têmporas, Junmyeon leu de forma calma as conversas que ali estavam. 
  — Certo. — Fechou os olhos por alguns segundos, pensando. — O que você acha que eu devo fazer?
  — Acho que deve conversar com ele, Jun.  Baekhyun fitou-o nos olhos, diretamente. A expressão tranquila passava uma calmaria gostosa para o rapaz.  — De profissional para profissional, eu digo. 
  — Sim, é claro. Eu ainda não acredito que ele teve coragem de fazer algo do tipo, Baekhyun. — Suspirou, balançando a cabeça em negação. 
  — Muito menos eu. Eu fiquei tão…
  — Tão puto? Como eu?
  — Isso, eu fiquei puto para um caralho, Junmyeon. Eu não consigo acreditar que ele fez uma merda dessas contigo sem nem ao menos… Dialogar contigo. É tão sem sentido. — O olhar reconfortante que Baekhyun possuía agora deu lugar a um olhar triste. — Sei que terminaram, mas, mais isso? Mais uma dor pra ti? 
  Junmyeon respirou de maneira maciça e nada disse. Não sabia o que dizer, porque as palavras de Baekhyun expressavam com angústia cada uma das dúvidas que rondavam a cabeça do músico. 
  — Eu não sei se consigo falar com ele, Baek. Não sei se consigo nem ao menos olhar para ele. — Comentou, sincero. O peso saindo ao menos um porcento de suas costas. 
  — Vamos ir comer alguma coisa, sim? A gente deixa isso para depois, Jun. — levou uma das mãos até os fios do maior, bagunçando-os. Era mania sua que fizesse aquilo. 
  — Tudo bem, eu te levo no Subway. — Sorriu fraco quando Baekhyun levantou as mãos em vitória. 

  Assim que saíram na rua, os carros passavam na frente de seus olhos, o sol batendo em suas latarias e irritando a visão de Junmyeon. Ele se recordava bem de quando conversava com Sehun, e o ex-namorado comentava sobre um ou dois carros coloridos que tinha visto em alguma estrada qualquer. Ele dizia que era desperdício gastar tantas cores bonitas com aqueles monstros de metal que poluíam o ambiente. Preferiria ter bicicletas bonitas, coloridas da mesma forma, em cima do asfalto quente das grandes cidades. 

  Quando o conheceu, podia ter certeza de que ele era um rapaz que gostava muito de arte. As conclusões não demoraram a vir, mas se mostraram um pouco erradas do que Junmyeon havia predeterminado em seus pensamentos. A noite era morna, e o músico tinha combinado de ir com Baekhyun e mais alguns colegas ao clube de dança que ficava próximo a faculdade onde ele estudava.
  Chegando no lugar barulhento, ele sentou as coxas apertadas pela calça social num dos bancos da frente. Estava quase que de camarote, se podia dizer. Haviam ido até ali apenas para assistir a performance de Kim Jongin, ou melhor dizendo, Kai, um dos dançarinos mais talentosos de toda a faculdade. Ele se apresentou no palco, o rosto coberto pela iluminação roxa que chegava em seus olhos e o deixava ainda mais belo ao público.
  A maneira como ele movimentava seu corpo era incrível, e a música que tocava agradava demais os ouvidos de Junmyeon. Suas palmas, no final da performance, eram fortes e mais sinceras do que poderia imaginar. Ao seu lado estava um rapaz de cabelos loiros e mechas laranjas, chamando-lhe sua atenção de forma curiosa. Ele pulava e gritava coisas entusiasmadas para Kai, que apenas se curvava agradecendo as pessoas que tinham ido a apresentação naquela noite, convidando-os para aparecerem ali em outra noite que fosse fervorosa como aquela.
  Baekhyun que estava ao seu lado acabou notando a forma como seu amigo se virava de dois em dois minutos para encarar o rapaz perto dos dois. E com a sua típica sobrancelha levantada e um sorriso divertido nos lábios, perguntou o porquê de Junmyeon ainda não ter ido falar com o desconhecido. 
  — Eu não posso chegar nele assim, Baekhyun! Do nada? — Junmyeon disse próximo do ouvido do menor, com o rosto meio corado disfarçado pela luz colorida. 
  — É claro que pode, ele já deve ter percebido você olhando descaradamente pra ele, Jun. — disse, como se estivesse claro como a água. Rolou os olhos e empurrou os ombros do outro. — Vai logo, seu besta. 
  — Baekhyun… — mordeu o interior da bochecha, nervoso. — Eu devo ir mesmo? 
  — É claro que sim, você é lindo em todos os sentidos, não tem como alguém te dispensar.
  Junmyeon sorriu, o rosto ainda quente pelo nervosismo, mas agradeceu o amigo pelo incentivo e respirou fundo antes de se aproximar do estranho e então tentar puxar conversa. 
  Assim que ficou próximo daquele que estava observando fazia minutos, não precisou cumprimentá-lo pois ele o fez, da maneira mais acolhedora que já havia visto, mais acolhedor que Baekhyun. Com um copo branco nas mãos, uma bebida cuja ele não sabia qual era, sentiu um dos braços em volta de si. 
  — Ei, boa noite! — Sua voz saiu embolada, perto da audição de Junmyeon. Era uma voz linda, meio rouca, diferente da própria. — Você é o grande pianista da faculdade, né? 
  Ele não sabia como respondê-lo de forma coerente, pois era surpreendente para si que alguém o conhecesse pelas redondezas, ainda mais alguém que o conhecesse fora da faculdade de música. Percebeu como as palavras saíam meio arrastadas da boca do estranho, e então percebeu que ele não falava inglês fluente, o que o deixou pensando da onde tinha vindo, a curiosidade comichando na ponta da língua. 
  — Isso, sou eu mesmo. Mas eu não sou um grande pianista. — Coçou a nuca. — Meu nome é Kim Junmyeon. — Estendeu a mão. 
  Um riso se desprendeu dos lábios do rapaz, mais doce do que o outro estava esperando. 
  — Mas eu ouço dizerem que é grande, sim. Um dia talvez eu possa comprovar isso, não é mesmo? — Apertou a mão dele, macio. — Eu sou Sehun. 
  — Prazer em conhecê-lo, Sehun. — O sorriso genuíno que estava no rosto do músico deixou Sehun com o peito abraçado de chamego. 
  E por horas a fio os rapazes conversaram, para o choque de Junmyeon, que acreditava ser entediante o suficiente para que Sehun caísse fora. Mas ao invés disso, o rapaz de mechas coloridas até mesmo elogiou-o pelo diálogo inspirador que cultivou com ele durante algumas horas, o que fora consequência do músico iniciar um diálogo sem muita pretensão, sobre arte. As risadas que saíam dos lábios do rapaz de cabelos marrons deixavam Sehun tão nele, na dele, dentro daquela aura afável, e poderiam até dizer que era efeito da bebida, mas o próprio sabia que vinha de seu peito que começara a ficar afetado pelo quase-estranho.
  — Se você quiser me acompanhar outro dia, Junmyeon. — O nome dele escapava de sua boca com lentidão. 
  — Outro dia? Em que ocasião? 
  — Eu e os meninos, incluindo o Kai, vamos numa manifestação. Sobre meio ambiente. — Repetiu a última parte em sua mente, tendo certeza de que tinha dito corretamente. 
  — Sério?? Que bacana, Sehun. — Sorriu, afastando os cabelos dos olhos com os dedos. — É claro que te acompanho, mas, posso salvar seu número aqui? — Sacou o celular do bolso. 
  — Uhum, uhum. Vai ser legal, prometo. — Assentiu, pegando de forma cuidadosa o celular das mãos do outro, gravando o próprio número ali, com um emoji de planta. Junmyeon riu, ao vê-lo. — Não ria! Eu gosto dessas coisas no contato. Mas pode mudar, claro… 
  E bocejou, os olhos fechando de maneira adorável. Junmyeon tossiu, tentando fitar outra coisa que não fosse seu rosto. 
  — Sem problemas, eu também gosto, às vezes. — Lambeu os lábios secos. — Tá com sono, não acha melhor ir embora? 
  — Acho sim, com certeza. — Fitou o fundo do copo, bobo. Não havia mais nada lá, soltou um muxoxo com a conclusão.  — Vem comigo? A gente vai conversando no caminho. 
  E foram. Junmyeon aproveitou para conhecer onde o dormitório de Sehun ficava, e ficou surpreso ao descobrir que não era tão longe assim do seu. Caminharam por bons longos minutos, já que o clube era próximo ao prédio da faculdade, mas nem tanto. Nesse meio tempo, Sehun juntou as mãos e quando pararam na frente da rua, os poucos carros passando por ali e o chão molhado pelos chuviscos recentes, teve a mínima audácia de colocar seus dedos na nuca do rapaz.  
  Em sua cabeça ele cantarolava alguma música bonita, alguma que Junmyeon tinha dito amar, nem sabia o porquê. Apenas juntou as bocas em um beijo gostoso e morno. Tinha gosto de álcool, e o músico não gostava tanto assim daquilo, mas Sehun conseguia deixar tudo bom. Até mesmo um selar desajeitado como aquele, que se tornou tão grande em proporções que ele não imaginava, o riso bonito do rapaz meio bêbado ecoando em seus ouvidos. O riso que se tornaria o preferido do moreno. Aquelas mechas estranhas deixando os órgãos dele se revirando, não eram borboletas em seu estômago, mas passarinhos agitados e felizes com o nervosismo de Junmyeon.
  A partir daquele dia, o músico sentiu seu peito, coração e todo o seu ser serem fisgados pela magia de uma alma alaranjada como a de Sehun. Meu amor, ele costumava chamá-lo. Junmyeon era o bem, o doce e o universo inteiro dele. Eles conversavam todo o santo dia, nem que se fosse por uma hora, por mensagens. Mas apenas de receber as palavras preocupadas, carinhosas e divertidas um do outro, se sentiam em paz. Se sentiam em casa, como se plumas encostassem em suas cabeças e os olhos fossem cobertos por asas de anjo. Num paraíso só deles, repleto de particularidades e tempos infinitos. 
  E Junmyeon desejava mesmo que fossem infinitos. Ele gostaria de ter aproveitado cada um dos dias ao lado daquela pessoa que amava tanto, mesmo sabendo que o fez da melhor forma que pôde. Agora ele sentia aquilo voar de seus dedos, sentia as palavras de amor e as pequenas promessas soltarem de si com tanta dor, tanta teimosia. Não sabia porque o coração não queria parar as batidas doídas, mesmo que ele dissesse. Ele não queria chorar, “sem lágrimas, meu amor. Eu não gosto de te ver chorar”, dizia Sehun. Mas o seu corpo não sabia ser obediente ao lado racional do moreno, e ele abafava o choro com gritos no travesseiro, os olhos ameaçando molharem tudo. Não seria frágil, não como o amado o havia deixado. Seria aquele que ele mais amava. No entanto, era complexo que seu corpo aceitasse tudo aquilo.

  Seu olhar se voltou a Baekhyun, que estava parado em seu lado, logo a frente da lanchonete que o amigo tinha dito que gostaria de ir. Procurou a carteira no bolso, o objeto fazendo peso em seu tecido. O sorriso aproveitador do menor deixava-o irritado, mas apenas soube gargalhar. 
  — Você esqueceu a carteira, tô certo? — Junmyeon questionou, já ciente da resposta. 
  — Não é que eu tenha esquecido… É que eu gostaria de pedir pra você comprar, mesmo. — disse, dando de ombros. 
  — Baekhyun! Eu tenho cara de banco agora, é? — bufou, estalando a língua na boca. — O que eu não faço por ti? 
  — Têm muitas coisas que não faz por mim, eu posso listá-las… — começou a contar nos dedos, sendo interrompido por um peteleco do maior. 
  — Idiota. — continuou a rir, a mão parada na testa. 
  E assim seguiram até a fila, esperando para que fossem atendidos. Não estava tão grande, já que era de manhã ainda, então as poucas pessoas que passavam pelo local eram estudantes que fugiam da escola e procuravam por comida rápida, ou até mesmo conhecidos do músico, que trocavam a hora do almoço para adiantarem o trabalho. O cheiro que chegava nas narinas dos dois era delicioso, mas apenas Baekhyun estava faminto daquela forma, as mãos agitadas na perna, tagarelando perto do amigo, que internamente dizia “obrigado” a ele, por estar sendo tão atencioso, como sempre. Agradecia pela paciência que ele possuía, por aguentar todo o mau humor do músico, todas as partes tristes dele. Apesar de tudo, Junmyeon era sortudo. 
  No momento, quando foram atendidos e ficaram aguardando pelos seus respectivos sanduíches serem preparados, na mesa de fora Junmyeon apoiava o rosto em uma das mãos e observava as pessoas caminhando pela calçada. Baekhyun estava distraído com algumas mensagens no celular, sorrindo abobalhado, sem dar muita atenção para o outro. O maior agradeceu isso, pois ao encostar-se mais um pouco na cadeira e afundar o corpo ali, relaxado, ele sentiu um arrepio no pescoço, bem perto a orelha. Podia ouvir o sussurro de Sehun ali, murmurando palavras engraçadas e bonitas sobre cada um que passava na rua, até mesmo sobre os pombos que roubavam sua comida e o resto todo. Era a cabeça mexendo com seus sentimentos novamente, ou o contrário. Não era capaz de dizer, só sabia que estava tão avoado, tão triste, que seu coração se apertou e ele levou os dentes de maneira forte até o punho. Reprimindo outra vez, os olhos de soltarem seu choro. 

  As músicas tocando no programa de fim de tarde tentavam de maneira fraca, exercerem o papel de entreter Junmyeon, que estava na sala, com as pernas esticadas e os dedos levando algumas pipocas até a boca. Baekhyun se encontrava do outro lado do apartamento, cozinhando uma comida de verdade, segundo ele mesmo, para que o maior comesse. Tinha passado dois dias inteiros se alimentando de comidas gordurosas, cheias de açúcar e tudo o que há de pior para o organismo, isso porque o trabalho no estúdio estava tendo que ser rápido e de alguma forma deixava o moreno ocupado demais para seu gosto. Ele só queria ficar no conforto da cama lendo algum livro romântico e piegas, alimentando seu coração doído. 
  — Ainda tá comendo a pipoca, Junmyeon? — perguntou o menor, da cozinha. O som das panelas alertou o outro do que ele provavelmente estava preparando. 
  — Sim, eu tô. — A fala saiu mastigada, assim como a pipoca entre os dentes. 
  — Eu disse para você parar, Kim. Assim não sobra espaço nesse estômago, eu tô fazendo seu prato preferido. 
  — Pipoca mal enche, Baekhyun. — resmungou, desligando a televisão com o controle. — Só paro de comer se estiver fazendo lámen. 
  — Acertou, idiota. — Baekhyun comemorou.
  — Mentira. — Seus olhos se arregalaram.  —É lámen? 
  — Vem cá ver. 
  O músico bufou, o corpo mole demais para levantar, mas não queria protestar contra um Baekhyun mandão. Assim que o cheiro levantou no ar e os olhos dele procuraram pelo amigo, acabou encontrando a panela cheia com o que o outro disse ser lámen, e então espreguiçou os braços por cima da cabeça. 
  — Já vai me agradecer, Junmyeon? — colocou uma das mãos no ouvido, fazendo graça. 
  — Vou, Baekhyun. — rolou os olhos. — Não achei que fosse mesmo me fazer isso, eu tô com tanta foome. — cantarolou. 
  — E com preguiça também, é visível. — olhou por cima dos ombros, as mãos numa colher funda. 
  Junmyeon até iria responder o outro com algo petulante, mas o celular tocou alto no bolso. Erguendo uma das sobrancelhas, enxergou no visor o número do ex. Estranhando a situação, Baekhyun nada disse, o outro indo até um canto mais afastado para que pudesse atendê-lo. 
  — Alô. — A voz tão conhecida por si chamou no aparelho celular, um pouco mais rouca que o usual, causando um aperto na barriga. 
  — É… Olá, é o Junmyeon.— gaguejou, mordendo o lábio. 
  — Eu sei que é você, Junmyeon. — riu. — Quero marcar uma reunião com você e o seu advogado. 
  O moreno não sabia porque ele tinha de possuir uma risada tão gostosa como aquela, e quis xingá-lo do pior nome possível naquele momento, as veias do pescoço saltadas e o rosto vermelho em raiva. 
  — Para tratar sobre o processo? — perguntou, ríspido. 
  — Isso, uma reunião sobre o processo. Às onze horas, tudo bem? 
  — Certo. 
  — Ok. — O silêncio se instaurou pelo o que parecia serem enormes segundos. Enormes dois segundos. — Tenha uma boa tarde, Junmyeon. 
  — O mesmo. 
  E desligou a chamada, não mais querendo ouvindo daquela respiração que era audível em sua orelha, ou daquela risada e aquele cumprimento tão cuidadoso que sabia ser cuidadoso pela maneira como Sehun falava. Estava irritado, e apenas a lembrança da voz do rapaz o deixava em completo torpor, o pior deles. Era só mandar uma mensagem, ou contatar Baekhyun, qualquer dos casos que fossem menos dolorosos para si. No entanto, ele optou pelo jeito difícil. Ou ao menos, para o jeito complicado na visão de Junmyeon. 
  Quase conseguia enxergar o modo como o ex-namorado havia pego o celular em suas mãos. Os fios totalmente laranja perto de suas orelhas, a mandíbula se mexendo conforme permitia as palavras casuais saírem pela boca e seus dedos se mexerem constantemente. Ele tinha algumas manias agitadas. 

  Era inverno quando eles começaram a namorar. Sehun planejou um encontro em todos os mínimos detalhes, desde o horário mais adequado até o sabor de picolé que compraria para ambos. Ele era uma pessoa organizada, mas a sua organização enchia os olhos do músico de brilho. Porque cada um dos seus atos eram de forma mínima, divertidos e cheios de vida. Foi por isso que ele não conseguiu reprimir o sorriso largo que se apossou de sua face, o nariz vermelho do namorado por consequência da temperatura que ficava cada vez mais baixa. 
  Havia escolhido de ir até um chalé que possuía perto da cidade, o picolé de morango em seus lábios deixava-o cada vez mais adorável, a ponta dos dedos mal se importando de tocarem o palito que estava gelado. 
  Durante a caminhada, Junmyeon fluiu suas memórias até que perguntasse algo que sempre desejou, para o rapaz. Desejava saber o motivo dele gostar tanto de cores extravagantes como o laranja, o vermelho e o amarelo. Eram cores de roupas que ele costumava trajar, já faziam parte do visual e da pessoa que era Oh Sehun. Divertido com a pergunta do músico, ele explicou que desde pequeno adorava peixes. De todas as cores, mas em especial o peixe dourado. Por não ter todas os lápis em seu conjunto que levava para a escola, ele acabava por representar peixes dourados com amarelo e vermelho, e seus desenhos eram os mais lindos de toda a turma. Desde então, ele acabou se apaixonando por aquilo e todos os desenhos pintados em seu ensino fundamental tiveram aquelas cores. 
  Por mais boba que a historinha fosse, encantou Junmyeon e seu peito quase explodiu, começando um ciclo interminável de elogios adoráveis á Sehun. O namorado só sabia rir e respondê-lo com beijos frios na bochecha, o primeiro de muitos encontros memoráveis que teriam dali para a frente. Todo os momentos em que grudava os olhos nos alheios, aquela coisa sem nome o puxando para o fundo da alma cheirosa que ele possuía. 
  Com Sehun era daquela forma. Ele não sabia nomear os tipos de amores, de carinhos e nem de suspiros abafados que soltava quando enxergava ou sequer levava a mente até aquele ser tão amado por si. Não eram suficientes os números de dedilhadas no violino ou tecladas suaves no piano para tentar ao menos expressar metade daquilo que nutria pelo namorado. Eram indecifráveis. 

...

  Com um copo de café em mãos, que esquentava sua palma com o líquido quente armazenado no objeto branco, Junmyeon saía do carro recém comprado, um modelo novo de portas enormes e um luxo que era possível de ser exalado apenas no olhar.       Passeou com os olhos pela porta da frente do estúdio, encontrando Sehun sentado sobre o banco que ficava na parte de fora, próximo às plantas e ao pequeno jardim que cultivava ali. Achava que ele iria aparecer um pouco mais tarde, então poderia se esquivar do desconforto todo que a presença dele causava em si. 
  Mal se lembrava de como era estar perto dele. Isso porque tentava a qualquer custo externar as memórias com o rapaz de sua cabeça, jogando fora tudo o que cultivou com ele por anos. Mesmo sendo impossível de se fazer, continuaria tentando incansavelmente. A fragrância daquele ser tão típica dele, as mesmas manias em seus dedos e pés, estava bem ali na frente de Junmyeon. A lembrança favorita do músico se materializou outra vez. 
  Tossiu, como se precisasse atrair a atenção dele. Afinal, os advogados de ambos ainda não haviam chegado. O silêncio quebrado apenas pelo som dos pássaros no fundo do jardim era ouvido.
  — Bom dia, Junmyeon. — virando-se para o músico ele deu um sorriso casto. 
  Junmyeon não sabia como respondê-lo corretamente. Por mais que no dia anterior tivesse ouvido sua voz e falado com ele, era mil vezes mais difícil pessoalmente. E se complicou ainda mais quando fitou os cabelos alaranjados, mais longos do que costumava se lembrar. Já começavam a cair por sua testa, para baixo. Não estava habituado a vê-lo sem os fios bagunçados para os lados. 
  — Bom dia, Oh. — Ele nunca chamava-o pelo sobrenome. Em nenhuma circunstância. Até mesmo nos momentos de raiva. 
  E a surpresa nos olhos de Sehun não deveria ser tão aparente, pois ele sabia, era óbvio, que o músico não o trataria da maneira como tratava antes. Era por sua única e necessária escolha, sabia disso. Porém, mesmo assim, era terrível sentir que estava desconhecendo de quem amava aos pouquinhos. 
  O músico sentou-se no banco, o mais afastado que conseguiu, de Sehun. Puxou o ar com as narinas, cruzando as pernas. Gostaria de pedir aos céus que um jornal caísse em suas mãos para que ele pudesse se distrair com alguma coisa. Não esperava ouvir a voz do outro novamente: 
  — Acha que irão demorar demais? — Sehun questionou, entretido demais nos dedos da mão, brincando com seu chaveiro de peixe Beta. 
  — Talvez. Advogados sempre demoram. — deu de ombros, respirando fundo. 
  — Olha, Junmyeon… 
  — Sim? — olhou-o sem jeito, as sobrancelhas erguidas. 
  — Eu tenho que te dizer que… 
  — Não, Sehun. — engoliu em seco. — Não precisa dizer nada. Na sala com os advogados você me diz. Certo? 
  Com um pesar nos braços, envolvendo a corda metálica do chaveiro, apertou-a até que deixasse seus dedos vermelhos. Por fim, assentiu. Não deixando mais que um mero “ok” esvair da garganta. 
  Parte de si julgou a outra metade, mas ele sabia que estava apenas tentando proteger a si mesmo de mais sofrimento que o rapaz estava proporcionando-o. Fora difícil conter os braços de se encontrarem com o corpo quente do outro, tão próximo de si. Envolveria ele num abraço apertado e gostoso, pedindo desculpas pelo ato impensado. Mas não foi impensado, ele somente gostaria de imaginar como seria a situação. 

  Num dos dias ensolarados que combinou de se encontrar com o, anteriormente, chamado de namorado, Junmyeon havia preparado um café mais que especial para que comessem a tarde. Ansiava por mostrar seus mínimos, quase nulos, dotes culinários ao amado. Sofria ouvindo lamúrias dele, quando dizia que era o único que cozinhava e que não aguentava mais comer a própria comida. Bom, ali estava o músico, se aventurando em uma área que possuía preguiça o suficiente para não ter interesse. 
  No entanto, uma alma divina desceu do paraíso e deu coragem para que o moreno fosse até o cômodo largo, no balcão, e começasse a preparar waffles com morango, capuccino, frapuccino e até mesmo um pastel doce que descobriu recentemente na internet. Tudo para que pudesse agradar Oh Sehun. 
  Assim que o rapaz chegou no apartamento, com um sorriso no rosto,  beijando o músico, arregalou os olhos ao sentir um aroma se desprender do fundo do ambiente. “Onde você comprou isso, Kim Junmyeon?”, ele perguntou, as mãos na cintura meio divertido e a expressão feliz na face. Não conseguiu e muito menos quis impedir a vontade de encher o pescoço e os ombros do músico com selares após ouvir do mesmo que foi tudo cozinhado pelas próprias mãos. 
  Mas não era o objetivo de Sehun naquela tarde. Ao menos, não era ficar tão feliz e correr para os braços do namorado. Não queria deixá-lo contente para depois conversar de forma séria com ele, mas era necessário. E Junmyeon sentiu algo estranho no momento em que estavam sentados no sofá assistindo algum filme romântico de escolha do acastanhado, e Sehun começou a se afastar gradativamente. 
  — O que aconteceu, amor? — Junmyeon perguntou, mordendo a bochecha por dentro. 
  — Eu… Eu só preciso conversar com você, Junmyeon. — Sem olhar nos olhos do namorado, ele disse. 
  — Conversar…? Sobre o que? Sabe que pode me dizer o que quiser, sem fazer rodeios. 
  — É que… — A voz morreu. 
  O músico não foi capaz de compreender o que estava acontecendo, mas tentou levar os braços até o outro, afagá-lo. Fora impedido. 
  — É que você fez tudo isso pra mim. Fez tudo, Junmyeon. Mas eu ainda sim preciso te dizer algo muito, muito sério. — Com os olhos fechados e um bico choroso nos lábios, ele ameaçou cair em prantos. 
  — Me diz, então. — O medo não estava estampado descaradamente em Junmyeon, mas sentiu a dor da dúvida no peito. 
  — Eu vim aqui hoje pra terminar com você. Eu preciso ir embora, Junmyeon. 
  O choque foi total, tanto que nos passados cinco segundos, o moreno não conseguiu soltar uma palavra sequer. 
  — Ir embora? Para onde, Sehun? 
  — Preciso te deixar. Deixar isso que nós temos. — falhou a garganta, colocando o rosto entre as mãos, abaixado. 
  — Por quê? O que aconteceu, que eu não tô sabendo? — sussurrou. 
  — Eu apenas percebi… Eu te amo muito, você sabe disso. — Mesmo não o vendo naquele momento, sabia que ele havia assentido. — Eu amo tudo isso que nós cultivamos. Amei conhecer você e a pessoa maravilhosa que você é. Mas eu quero coisas novas. 
  — Coisas novas? Nós não saímos, fazemos coisas diferentes? Eu não dou felicidade pra ti, Sehun? — alterou seu tom de voz, a face vermelha em nervosismo. 
  — Você me dá, Junmyeon. Eu sou o cara mais feliz do mundo, se posso dizer. Você não entende… Eu quero poder amar outras coisas também, além de você e da gente. Eu não aguento viver aqui, apenas nesse comodismo. Entende? Quero viajar o mundo todo, vender umas telas em Veneza, sei lá. Quero conhecer outras pessoas maravilhosas também. 
  E aquilo poderia ser chamado de estopim da noite, para Junmyeon. O ápice de sua tristeza profunda, ao perceber que aquele que amava tanto já não gostava do conforto de seus braços, de seu chamego quente e das palavras ouvidas e ditas em nome do que eles tinham juntos. 
  Não soube dizer ao certo as palavras murmuradas que disse no fim daquele desastroso encontro. Não tão desastroso, se pudesse dizer no atual momento, após o término. No momento em que a situação acontece, nunca é fácil de digerir, de agir racionalmente. Mas o olhar duro, frio e triste que direcionou a Sehun naquele fim de tarde, valia muito mais que suas externações em forma de palavras. O que mais guardou em sua memória foi a expressão de sinceridade e desconforto no rosto do alaranjado, os lábios fechados e os olhos tão preciosos, como pérolas molhadas reluzindo na luz artificial da sala. O começo de um fim.

  Os dedos grudados em cada tecla do piano fluíam de um lado para o outro, o corpo dançando no mesmo ritmo que a melodia estonteante que saía dos dedos e da alma de Junmyeon. Todos que estavam ali concentravam seus olhares e seus sorrisos, expressões de perplexidade e palmas no músico jovem que cantava em seu idioma materno para colocar para fora as emoções e ideias românticas e simbólicas sobre a vida. Passar ao mundo um pouco daquilo que se encontrava em seu interior, mais específico no coração que bombeava sangue e música. 
  A letra cantada pela própria voz o deixava com vontade de exclamar, usar todo o ar que tinha nos pulmões para esvaziar uma parte de tudo aquilo que sentia havia tempo. Seus cabelos agora arrumados em um topete, bagunçavam-se conforme a canção ganhava forma, o suor escorrendo pela testa do rapaz, aquela brisa fria que entrava nas janelas enormes e luxuosas do ambiente. Todas as peças de luz que batiam em si deixavam um misto de colorido e trágico. Isto porque o palco no qual ele se apresentava, carregava tons desde os mais leves até os mais pesados, de carmim.

“Quando metade de mim se foi,
 Como eu posso viver como um? “

  A última frase da música que compôs há meses deixou os lábios como se fossem pequenos pedaços de pétalas de rosas. Pétalas carregadas de espinhos.
  E quando se levantou, os aplausos que pareciam não ter fim entorpeceram Junmyeon, num êxtase que ele não sabia dar nome, muito menos descrevê-lo. Era insana a forma como ele ficava após performar. Quando se curvou durante três segundos, os gritos em francês, inglês e outros idiomas não identificados abriram espaço em seu ouvido e ele saiu do palco com o corpo todo dormente. 
  Meses após os polêmicos acontecimentos, Junmyeon lançou apenas um Single, o qual não tardou a estourar nas paradas internacionais oferecendo a ele, fama o suficiente para que conseguisse aquela tour mundial. Atualmente se encontrava na França, tentando aproveitar do pouco que podia quando encerrava seus shows. Baekhyun nunca deixou de apoiá-lo durante o tempo difícil que passou, a cada dia que se encerrava e enxergava o músico com olheiras e maços de cigarro jogados ao chão, lembrando ambos do estado deplorável que ele ficou. Os abraços e noites que envolveram Junmyeon ao lado do baixinho doce, fizeram com que ele repensasse por tudo aquilo que estava ocorrendo e chegou a conclusão de que seguir a vida era o melhor a se fazer. 
  Com um copo gelado de Pommery Brut Royal em mãos, oferecendo sem sequer saber se o outro queria, Baekhyun entrou nos fundos do palco. Junmyeon não pestanejou e rindo, meio letárgico pela adrenalina de performar, não recusou e tomou um gole rápido da bebida. Com a mão livre procurou por uma toalha molhada, passando-a no rosto a fim de retirar aquele suor que ficou impregnado na derme após o fim da apresentação. 
  — Tem alguém querendo falar com você, Jun. — Baekhyun agora encostado na parede do camarim dedilhava algumas palavras na tela do celular.
  — Quem? — Curioso, Junmyeon ergueu uma das sobrancelhas, bebericando do champagne caro. 
  — Venha você mesmo ver. — desligou o celular e o colocou no fundo do bolso traseiro, chamando Junmyeon com os dedos. 
  Dando de ombros, mas ainda sim curioso para saber quem era a pessoa desconhecida - ou nem tanto -, seguiu o amigo até a parte de fora, próximo a plateia. Seu olhar seguiu a multidão até parar no homem ao lado de Baekhyun. A pele morena brilhando na luz artificial do local não o deixava se esquecer. Era Kim Jongin, da faculdade. O dançarino.
  — Kai? — sorrindo, Junmyeon se aproximou com a mão estendida. 
  — Eu mesmo, Junmyeon. — Ele retribuiu o sorriso, largo, apertando a palma alheia com firmeza. 
  — O que você veio fazer aqui? 
  — Te ver performar, é claro. Gostaria de parabenizar você, foi… incrível. — Seus olhos brilharam. — Acho que compartilhei da mesma sensação que você teve ao me ver dançando. 
  — Muito obrigado, Jongin. — curvou-se brevemente, — E olha, posso ter certeza que sim. É mágico ver alguém performar, seja com dança ou qualquer outro tipo de arte. 
  — Concordo com você.
  Não deixando de sorrir nenhum segundo sequer, o músico estava da maneira mais feliz que podia, surpreso com a presença dele. É claro que não haviam sido grandes amigos, mas o conforto de poder ter mais alguém além de Baekhyun ao seu lado, parabenizando-o pelo trabalho feito, deixava o sangue quente de excitação. Se é que era possível. É claro que as bochechas não poderiam deixar de esquentar com os elogios vindos do dançarino, afinal, Junmyeon o admirava muito desde que tinha assistido suas coreografias muito precisas e fluídas, na época de faculdade. Quando ainda era um rapaz sem saber das fases mais obscuras que a vida tinha.
  — Mas, era apenas a minha presença ilustre que queria ver? 
  — Oh, não… Queria te dar os parabéns, mas, é outra pessoa que quer conversar com você. Quer te ver. — inclinou a cabeça para o lado, apontando para a porta que dava na saída. — Tá te esperando lá. 
  — Sério? É alguém da facul-
  — Junmyeon. Só vai. 
  E sem protestar mais, Junmyeon muito instigado levou seu corpo ainda tomado pela surpresa até o exterior. Aquele ar levemente gelado batendo contra a temperatura quente dele o deixou arrepiado. O que se intensificou com a vinda de um cheiro característico até suas narinas, um cheiro meio doce, meio intenso. Intenso até demais para o gosto do homem. Sem tempo para pensar em alguma coisa, ao virar-se para o lado, fitou madeixas laranjas. Uma cabeça cheia de cabelos laranjas, um rosto bonito com os olhos felizes carregados de carinho. Oh Sehun havia ido até sua performance. 
  — Olá, Sehun…? — A dúvida em sua voz era palpável, ainda não acreditava que em sua frente estaria vendo o rapaz outra vez na vida. Não após tudo o que ocorreu. 
  E ele riu, como de costume. Os olhos se fechando por conta da gargalhada, o que fez Junmyeon crispar os lábios e cruzar os braços. 
  — O que foi, Oh Sehun? O que você tá fazendo aqui? — Irritado, o músico questionou. Os batimentos do coração, perdidos. 
  — Só… Achei graça. Boa noite para você também, Junmyeon. — ergueu a mão, travesso. Aquela travessura da qual o músico não provava fazia tanto tempo. 
  — Boa noite, Oh. — apertou forte, tendo que descruzar os braços. Voltou para a pose de anteriormente, outra vez. 
  — Eu queria te dar os parabéns. — E a gargalhada cessou. Sua postura reta deixou evidente que falava sério. — Fiquei preso na cadeira durante o show inteiro, de verdade. Como sempre, você tava incrível.
   Como sempre. Junmyeon colocou na cabeça que aquele não era mais o Sehun que ele conhecia tinha tempo, então ouvir algo do tipo daquele que ele jurou tentar não pensar mais sobre, era árduo. Fazia seu coração pesar, as mãos ameaçando começarem a tremer pelo nervosismo que batia na porta. 
  — Obrigado, Sehun. Mesmo, eu nem… Nem sabia que você tava assistindo. — coçou a nuca, com os braços livres dessa vez. 
  — Teria feito diferente se soubesse? — sorriu. 
  — Você sabe que não. — ou sabia, ele queria dizer. — Mas, é só isso que veio fazer aqui? Me assistir?
  Os ombros tencionaram assim que o músico o questionou. O Oh nunca ficava tenso, quando tinha de dizer alguma coisa, mas era o homem que ele havia abandonado ali, em sua frente. O homem que recebeu um processo por conta de sua própria vontade. Era muito egoísmo de sua parte não conseguir dizer tudo o que tinha de dizer, a Junmyeon. 
  — Não. Eu vim assistir porque eu tinha de fazer isso. — tossiu, desviando o olhar. — Eu tenho que esclarecer as coisas com você. Sobre tudo. 
  É claro que o acastanhado sabia do que ele estava falando. Era impossível não saber, pois haviam dias que Junmyeon ainda se pegava pensando naquilo nas decisões sérias demais que Sehun tomou e nas questões em aberto que deixou para o músico resolver. Ele assentiu, como se desse passe livre para começar a ouvir tudo o que ele tinha a falar. A explicar, ou se desculpar. 
  — Certo. — inspirou e expirou. — Eu tomei decisões impensadas… Na verdade, algumas foram pensadas, outras não. Eu quero pedir desculpas, primeiramente, por ter processado você. Fui só eu. 
  — Só você? — interrompeu-o, o peito dolorido. 
  — Ninguém me deu essa ideia. Fui eu que pensei em fazer isso, foi uma péssima escolha. E malditamente egoísta, eu sei. — a cabeça que antes estava abaixada, se levantou. Fixou-se nos olhos do músico. — Eu queria que você entendesse que eu já não queria mais nada de nós, Junmyeon. Aquilo foi o meu ápice de tentar mostrar a você o que eu queria, porque eu tava cansado. Estressado, com a cabeça quente. Eu…
  E o rosto do rapaz de cabelos laranjas estava triste. Como se a culpa batesse em sua face e desse reflexo em todos os membros de seu corpo. 
  — Eu só queria que você pensasse que eu havia me tornado uma pessoa ruim. Pra que não doesse tanto em ti. Entende…? — Seus olhos marejaram. 
  Junmyeon não queria entender. Todos os dias e noites passados em claro por conta da decisão dolorosa de Sehun, os inúmeros papéis de processo, além da imagem manchada que teve na mídia. A sorte é que Baekhyun o ajudou em tudo, inclusive na parte de se reerguer como um músico novato. O que rendeu apenas bons frutos a ele. 
  — Eu sempre o amei muito, você sabe disso. Ou, sabia. Nunca quis te magoar, eu só queria que você entendesse que eu queria viver coisas novas na vida. Foi o que eu fiz durante esse tempo, e foi tão bom pra mim. — sorriu fraco. — Sei que pode ter sido um inferno pra você, mas eu só torci pelo melhor. Quis te ver bem, e quando fiquei sabendo da sua tour… Meu peito se encheu de felicidade. 
  O músico sorriu. Um sorriso de verdade, com os dentes ameaçando aparecer e suas bochechas curvadas e levemente vermelhas. Ele não queria entendê-lo, mas sabia que era necessário. Soube que a decisão doída do alaranjado foi algo impensado e que não precisava acontecer, de fato. Ele não precisava tê-lo processado e causado toda aquela balbúrdia, mas Oh era humano. E aquilo foi um erro perdoável. Sabia que Sehun estava sendo sincero, e por mais que doesse perdoar a pessoa que o fez chorar por meses, milhares de horas, ele não se segurou. Não pôde deixar de levar os braços até aquele corpo quente que precisava daquilo. Necessitava de seu perdão. 
  E um pouco sem palavras, com os olhos arregalados, Sehun apertou Junmyeon nos braços, em um abraço confortável. Um abraço gostoso que o fazia lembrar da pessoa incrível que o rapaz era. Aquele aroma chegando até si, entorpecendo seus sentidos, não de uma forma romântica. Não mais. No entanto, de uma maneira amigável e respeitosa. No sentido mais bonito da palavra, um carinho que era acolhedor. Mesmo com a vontade que queimava por dentro, de soltar algumas lágrimas pelos olhos castanhos, nenhum dos dois o fez. Eles apenas aproveitaram um do outro, após tanto tempo.
  Junmyeon disse em palavras baixas o quão feliz estava por ter a companhia de Sehun ali, ao seu lado. Ele usava uma roupa larga e bagunçada, colorida. Assim como sempre usou. O músico fez questão de ressaltar isso, porque se sentia satisfeito de saber que ele não havia mudado de verdade. Ainda era aquele rapaz doce, gentil e animado que conheceu numa noite artística. E era numa noite repleta de sentimentos que ele também o conhecia outra vez. Que o reconhecia. Agora, como um amigo. Deixando ressentimentos para o passado e apenas sorrisos felizes, eles se preparavam para se despedir outra vez.
  Não era um adeus, mas um até logo. Ambos sabiam que não iriam mais se encontrar com o par romântico que eram antes, com certeza o coração ainda batia forte no peito. Os dois corações, de ambos os corpos. Queimando com amor e dor. A dor de ter um coração partido era insuportável, ardia. Mas a dor de saber que um ciclo tinha se fechado e nunca mais abriria como da primeira vez, era irreparável. Como uma rosa cheia de espinhos que murchava e dava lugar a outra rosa, para que essa outra nascesse nas manhãs mais belas dos dias mais ensolarados e chuvosos. 
  O abraço do adeus era tudo o que eles precisavam. Os braços quentes se encontrando, para que nunca mais se encontrassem. O doce adeus de não querer mais chorar, por não precisar chorar. Por saber que era preciso passar por tudo aquilo e se levantar outra vez. A melodia triste que deixava não um instrumento, mas a alma de alguém. 

Fim.