Coletâneas de Amor – vol 01

Escrito por Ray Dias | Revisado por Mariana

« Anterior
Tamanho da fonte: |


Faixa Um - 12 Horas

  Eram duas horas da manhã quando eu acordei incomodado pelo calor. Olhei para o travesseiro ao lado da minha cama, vazio. O espaço ao meu lado mais frio pela falta de um corpo.
  Levantei e caminhei até a sala do apartamento abrindo as cortinas e janelas. A brisa da madrugada que corria ali era muito mais aconchegante do que em meu quarto. Liguei a televisão e, depois de pegar uma garrafa de água na cozinha, sentei ao sofá. Antes de puxar o controle remoto buscando algum entretenimento, o celular que eu havia deixado na mesa de centro da sala, piscava denunciando as notificações. Desbloqueei a tela e procurei a causa de tantas notificações.
  Meus olhos piscaram alertas e pensativos. Já fazia um mês que não aparecia. Já fazia um mês que não me procurava. E antes disso, já fazia um tempo que ela não tinha motivos para trair.
  Ao notar as mensagens com horário de mais cedo, resolvi não responder.

“Já faz algum tempo, mas... Estou precisando te sentir comigo...”.
“Eu sei que fui fria com você, mas... Você sabe que as coisas por aqui estavam complicadas...”.
“Você realmente está me ignorando?”
“Arrumou outra pessoa?”
“Por favor... Sinto saudades.”
“Me procure quando ler as mensagens”.

  Entretanto, como se soubesse que eu estava lendo-as, uma mensagem nova chegou. Eu não estava esperando nada daquilo.

“Você está acordado, não está? Podemos nos ver no local de sempre?”.

  Fui até a janela novamente, respirei fundo terminando de beber a água. E o som do celular vibrando no sofá, foi o suficiente para eu não resistir.

“Quero você”.

  E aquelas duas palavras, foi o disparo para eu me apressar em buscar uma camisa no quarto, calçar os tênis, vestir uma bermuda e pegar celular e chaves do carro, apressado.
  Quando estacionei o carro no posto de gasolina de sempre, nenhum movimento no local me fazia pensar que eu havia delirado. Então a vi num canto da loja de conveniência, o cabelo cobrindo o rosto junto com o capuz do moletom escondendo minimamente sua identidade. Mas não para mim. A sua identidade para mim era de corpo inteiro e eu a reconheceria mesmo que estivesse longe demais.
  Buzinei parado ao lado de fora e abaixei um pouco o vidro para ver que era eu. E rapidamente ela saiu da loja, sorridente em minha direção. Abriu a porta com agilidade e ao entrar no carro mal pronunciou qualquer coisa. Puxou meu rosto com desespero e me beijou como há tanto tempo eu não sentia. E o gosto de sua língua junto à minha era carnal demais para a sensação de pisar o céu. Era infernal. Nós éramos pecaminosos demais para ter algum perdão.
  Segui com o pé no acelerador como se minha vida dependesse de chegarmos o mais rápido possível. E de certa forma, aquela noite poderia realmente, definir muito.
  A guarita do motel já era conhecida demais por nós, e ela nem mesmo se envergonhava de estar ali. Pelo contrário. Adiantou seus passos pelo corredor, como alguém que conhece cada palmo do lugar. E conhecia. A imagem dela caminhando sedutora à minha frente era um filme gravado em minha memória. Abriu a porta do quarto e a chuva de roupas já havia começado. O ambiente com a luz baixa, o som sensual e ambiente ao fundo como uma serenata particular, e o calor daquela noite misturado ao calor de nossos corpos.
  Ela era uma maldição. Eu já sabia que amá-la era um erro, mas não sabia resistir. De todos os momentos que passamos por aquilo, eu nunca fui capaz de me afastar completamente. Até os últimos meses, que na verdade eram méritos dela. Era ela que não me procurava. Era ela que me trazia de volta quando bem entendia. Deitei naquela cama com o corpo dela sobre o meu, apertando seus quadris que rebolavam sensuais sob o meu. Deitei naquela cama com o corpo preparado e o coração desprevenido. Ela mordeu o lóbulo de minha orelha e espalhou chupões pelo meu corpo, deixando as marcas, as quais eu não me importava. Eu nunca liguei para o fato de ela me marcar como sua propriedade, ou de eu não poder fazer o mesmo.
  Sua mão massageando meu corpo, meus dedos invadindo sua intimidade, sentindo-a gemer meu nome baixinho. E quanto mais eu penetrava o corpo dela, mais eu a queria. Mais eu a desejava. Mais eu a amava. E mais idiota eu era.
  — Eu te amo. – sussurrei no ouvido dela.
  E o seu gemido gutural demonstrava que não fazia diferença. Confessar aquilo ou não, não fazia a menor diferença. Eu sabia que ela estava ali para me usar e ser o seu objeto naquele momento me bastava. A ressaca moral daquela conexão tóxica viria depois.
  Viria no dia seguinte a exaustão de tanta energia sugada. E veio. Quando acordei, a cama vazia ao meu lado novamente. De novo o espaço vazio ao meu lado, frio pela falta de um corpo. O relógio da parede a marcar duas horas da tarde. Era sempre assim: depois de doze horas de amor e frenesi, ela sumia.
  Saí dali após pagar a conta, peguei o carro e retornei para casa. Sentindo-me novamente culpado. Culpado por dar mais valor ao desejo sexual do que ao amor próprio. Ao chegar a casa, abri a porta e arrastado caminhei pelos cômodos, fui ao banheiro. Precisava me sentir minimamente limpo, e mais uma vez jurei que não se repetiria. Eu já sabia o que ia acontecer: eu pegaria o celular, e o número dela teria sumido com a mesma velocidade que suas mensagens surgiram. O bloqueio. Ele estava ali e eu já sabia. Provavelmente, o meu contato estaria lá com o nome de uma amiga, para quando ela quisesse novamente, pudesse me procurar. E a culpa era também minha, que não trocava de número por falta de dignidade.



Comentários da autora