Boom
Escrito por Ana Ammon | Editado por Lelen
E lá estava eu dentro do avião para voltar para Montréal, o motivo que eu estava voltando apesar de jurar de pés juntos que nunca mais pisaria naquela cidade era simples, um contrato de trabalho no colégio St. Georges de quatro anos, como a proposta para dar aulas de inglês lá era muito boa, melhor do que em Vancouver eu aceitei voltar.
Desembarquei e senti o medo tomando conta de mim, respirei fundo e falei para mim mesma “Vamos , você consegue lidar com isso, sei que vai dar aulas no colégio onde cresceu, mas você consegue.” Peguei minhas malas e fui em direção ao ponto de ônibus, como eu havia crescido naquela cidade eu sabia andar por ela até de olhos fechados, peguei o ônibus que iria em direção ao colégio e desci alguns pontos antes, exatamente na rua onde eu tinha a minha casa.
Quando me mudei para Vancouver deixei a casa alugada, agora quase seis anos depois eu cancelei o contrato e vou voltar para aquela casa, sei que vai precisar de várias reformas mas aos poucos vou deixar ela exatamente como eu quero, parei ao pé da escada de entrada e encarei aquela porta marrom bem familiar, respirei fundo e a abri, assim que entrei na sala memórias tomaram conta de mim, cenas onde eu estava sentada abraçada com o na época em que saímos juntos, nós dois sentados estudando, mesmo não sendo a mesma matéria gostávamos de nos ajudar.
Assim que terminei de olhar toda a casa o caminhão de mudanças chegou trazendo de volta toda a minha mobília, eu havia guardado meus móveis mais importantes em um galpão quando resolvi me mudar para se, por acaso, eu quisesse poderia leva-los para Vancouver, nunca precisei levar mas decidi por manter o galpão, afinal eram móveis antigos e muito bons.
Depois de terminar de arrumar toda a casa e fazer uma boa faxina, tomei um banho e me joguei no sofá para assistir algo que estivesse passando, eu havia me esquecido o quão confortável aquele sofá era, acabei adormecendo ali mesmo.
Na manhã seguinte acordei assustada com meu despertador as seis da manhã, pulei do sofá sentindo as dores nas costas de uma noite dormida na sala e fui me arrumar, eu começava naquele dia na nova escola, depois de pronta peguei minhas coisas e caminhei em direção ao colégio que eram somente algumas quadras da minha casa. Cheguei na sala dos professores já me instalando em um dos armários, separei os livros que iria usar naquele dia e fui pegar um café.
- ?
- ? Meu deus quanto tempo! – Apoiei meu café na mesa e fui dar um abraço nele que logo retribuiu sorrindo. – Você da aula de que aqui?
- Francês mas também sou treinador de basquete, imagino que seja a nova professora de inglês.
- Sim! Inclusive como são os alunos?
- Olha, a maioria é bem tranquilo, só a sala do oitavo ano que dá problema.
- Por que?
- Ah você vai entender. – Ele falou rapidamente quando ouviu o sinal.
- , eu preciso de um favor seu. – A diretora disse entrando na sala antes que ele pudesse sair. – Preciso que você apresente para as salas, ela vai começar pela sala do oitavo ano.
- Ah sério? Por que eu?
- Por que os alunos gostam de você. – Ela o olhou seria. – Você é o mais simpático, por favor?
- Ok ok... – Ele se virou para mim. – Bora , seu primeiro horário é com quem eu chamo de capetas na terra.
Caminhamos lado a lado em um completo silêncio, foi um momento meio constrangedor inclusive mas assim que ele abriu a porta entendi o motivo do silêncio, a sala estava um caos, aviões de papel voavam livremente pela sala, mistura de pelo menos três gêneros musicais completamente diferentes ecoavam nos meus ouvidos. caminhou calmamente em direção a mesa e jogou de uma altura razoável os livros em cima da mesa.
- BOM DIA PESSOAS. – Ele gritou e logo a confusão acabou, todos sentaram em seus lugares em silêncio. – Hoje vou apresentar a vocês a nova professora de inglês, .
- Bom dia!
- O que aconteceu com a Laurence? – Um garoto ruivo no fundo da sala questionou irritado.
- Ela mudou para Vancouver, vocês já sabem disso. – respondeu ríspido. – Bom, cuidem bem dela, não pela diretora e sim por mim, vejo vocês na terceira aula. – Ele passou do meu lado e sussurrou um boa sorte e logo saiu da sala.
Caminhei em direção a mesa sentido os olhares dos alunos pesando sobre mim, depois de olhar alguns cadernos comecei a aula de onde a antiga professora havia parado, passei uma atividade para eles valendo ponto e notei o quão felizes eles ficaram com a ideia, me sentei em minha mesa e peguei meu livro para ler enquanto ninguém terminava a atividade, vi a diretora passando algumas vezes e olhando dentro da sala mas fingi que nada estava acontecendo.
- Professora, terminei.
- Pode trazer aqui por favor. – O ruivo caminhou em minha direção, deixou a folha e ia voltar para a mesa. – Ei onde acha que vai?
- Voltar para a mesa?
- Não quer acompanhar a correção?
- Sério?
- Yep! Senta aqui do meu lado.
Fui corrigindo e fiquei até surpresa do aluno ter ido tão bem, ele cometeu pequenos erros gramaticais que expliquei para ele detalhadamente o motivo de estar errado, ele voltou para a mesa dele sorridente com um A no trabalho, assim conforme todos iam terminando eu fui fazendo a mesma coisa, um por um explicando os erros ou dando parabéns pelo trabalho perfeito. Notei que todos saíram empolgados da aula quando tocou o sinal e sorri de canto, eu sabia que minha metodologia de ensino não era comum mas não imaginava que agradava tanto as crianças.
Depois da manhã corrida dando aulas para praticamente todas as séries finalmente chegou o tão esperado almoço, quando entrei na sala dos professores todos ficaram em silêncio me olhando.
- Meu deus o que houve? O gato comeu a língua de vocês?
- Novata qual a mágica que você fez com o oitavo ano?
- Eu nada ué, só dei minha aula normalmente. – Dei de ombros e olhei para o que estava sorrindo de canto.
- Normalmente ou metodologia do Gregory? – Ele falou sorrindo lembrando de um professor que tivemos em comum na faculdade.
- Exatamente isso. – Dei risada sentindo meu rosto corar com algumas memórias que invadiram minha mente.
- Então vocês se conhecem?
- Sim, , eles se conhecem. – A diretora entrou na sala falando. – Bem até demais.
Eu e o nos entreolhamos, sabíamos que , a diretora do colégio, tinha estudado na mesma faculdade que nós, inclusive fazia parte do nosso grupo de amigos.
Flashback
Última semana de aulas na faculdade o nosso grupo estava um tanto quanto triste, afinal cada um tinha uma ideia do que fazer após nos formarmos, eu iria trabalhar em Vancouver, o queria ficar aqui em Montréal mesmo, a tinha planos de ir para os EUA e o iria se mudar para Toronto, nós quatro prometemos não perder contato um com o outro.
Quando a semana acabou me despedi da e do , entrei no carro com o e fomos em direção ao aeroporto.
- Seu voo é daqui duas horas, podemos parar para tomar um café se quiser.
- Olha, eu quero. – Respondi triste. – Prometo que ainda vou voltar, não sei quando, mas vou.
- Estarei aqui. – Ele colocou a mão em minha coxa me fazendo corar.
- Vou sentir sua falta.
- Também vou sentir a sua.
Nós paramos para tomar café em uma loja dentro do aeroporto, nos sentamos em uma das mesas redondas e ficamos falando sobre o futuro, ele me contou que iria fazer outra faculdade além da de Francês, inclusive já havia passado no vestibular para ser treinador de basquete.
Depois de uma hora conversando ele me levou até o portão de embarque, me puxou para um abraço e selou nossos lábios, foi quando percebi o quanto gostava dele e o quanto iria sentir falta de vê-lo todo dia, sussurrei um “vou sentir saudades de você todos os dias” em meio ao beijo, terminei o beijo com um abraço forte e fui em direção ao portão de embarque.
Flashback off.
Notei que eu o encarava há um tempo, então desviei meu olhar para a que estava me olhando com uma sobrancelha levantada, senti meu rosto corar e rapidamente juntei minhas coisas e fui em direção a saída.
- , espera! – gritou apertando o passo para me alcançar. – Notei o seu olhar fixo nele hoje...
- Você e todo mundo, tenho certeza.
- Bom, o que vai fazer as seis horas da tarde?
- Corrigir trabalhos provavelmente.
- Eu marquei com nosso grupo da faculdade de comer pizza lá em casa, se você quiser ir.
- Claro, seu endereço continua o mesmo?
- Sim, só me mudei para duas casas antes.
- Comprou a casa da senhora Reynold?
- Sim, ela faleceu há pouco tempo, aí estava a venda e achei uma boa ideia morar próximo dos meus pais.
- Fechado! Estarei lá!
Sai da escola e caminhei tranquilamente em direção a minha casa, assim que cheguei em casa vi uma pessoa conhecida sentada na entrada me esperando, já sabia que era então sorri enquanto caminhava em direção a ele.
- Não esperava te ver aqui.
- Bom, a me falou que você iria voltar e que estava no mesmo endereço de sempre. – Ele falou meio sem jeito. – Você vai hoje a noite?
- Vou sim, já combinei com ela. – Falei abrindo a porta. – Quer entrar?
- Aceito. – Ele passou pela porta e ficou me olhando. – , não sei se você já sabe mas o está solteiro.
- Estou sabendo, mas o que isso tem de mais?
- Acontece que ele sempre foi apaixonado por você. – caminhou até o sofá. – Até os alunos sabem.
- Como assim até os alunos sabem?
- Bom, ele é treinador de basquete, também é sonâmbulo, já aconteceu de eles estarem no ônibus a caminho de alguma competição, ele dormir e ter ataque de sonambulismo.
- Mas gente
- Bom, vou passar em casa para tomar um banho. – Ele sorriu e caminhou em direção a porta.
- Até mais tarde. - Dei um abraço nele e o vi sair tranquilamente pela rua.
Depois que fechei a porta fui tomar um banho, as palavras de ficaram ecoando insistentemente dentro de minha mente, me vesti com uma calça jeans básica e uma camiseta preta, peguei as chaves do carro e dirigi tranquilamente em direção a casa da , estacionei em frente à casa dela e ainda de dentro do carro pude ver eles já sentados no sofá conversando, sorri com as lembranças invadindo minha mente. Desci do carro e caminhei em direção a porta de entrada da casa da e apertei a campainha.
- ! Você veio! – abriu a porta empolgado já me abraçando.
- Claro que vim ! – Abracei ele de volta sentindo meu coração bater mais forte. – Falei para a que estaria aqui!
- Para ser sincera não achei que viesse. – se aproximou e me ofereceu uma cerveja, rapidamente aceitei. – Vem, estamos jogando uno.
- Adoro esse jogo!
Me sentei no sofá com eles e logo deu as cartas, depois de algumas rodadas de uno pedimos uma pizza na pizza hut que era a única aberta naquela hora, quando a pizza chegou nos sentamos na mesa para comer.
- Então você continua sonâmbulo?
- Olha, sim. – deu risada. – Já tive ataques de sonambulismo na frente das crianças.
- Acho que é importante ir no médico ver, vai que você fala algo que não deveria. – Dei risada.
- Too late. – Ele falou encarando a pizza. – Teve uma vez que dei bronca em um dos garotos do basquete por que supostamente ele estava brigando com o amigo.
- E qual foi a reação dele?
- Quando acordei foram me contar, ele veio me perguntar como eu sabia da briga, sinceramente eu não faço ideia de como sabia.
- Já falou alguma coisa pessoal para eles nesses ataques?
- Sim, mas prefiro não lembrar. – Ele ficou em silêncio.
- Ah isso me lembra, , você quer ir na excursão com a gente?
- Excursão?
- No La Ronde.
- Claro!
Ficamos conversando sobre a excursão e me deu detalhes, seria na semana seguinte na sexta feira, iríamos sair do colégio as sete já que o parque é do outro lado da cidade.
Eram cerca de onze da noite quando decidi voltar para casa, como havia bebido preferi voltar andando, o prontamente me acompanhou ate em cada mesmo sendo uma caminhada longa, para ele maior ainda já que ele morava longe de mim. Caminhamos em silêncio por um bom tempo até que ele parou para ajeitar o cadarço.
- Sabe, o me contou o que você falou uma vez no ônibus ônibus o pessoal do basquete.
- Que eu gosto de você? – Concordei com a cabeça. – Não é nenhuma novidade isso...
- A novidade é, continua sendo recíproco. – Ele me olhou chocado. – O que? Não estou mentindo, é a pura realidade.
- Mesmo depois de todo esse tempo?
- Nunca te esqueci, não achei certo casar com meu ex já que não amava ele.
- Por isso nunca se casou.
- Sim. – Dei de ombros.
- Sabe – Ele parou em frente à minha casa. – Minha ex terminou comigo porque enquanto eu dormia eu chamava por você, ela achou isso muito errado e terminou falando para eu ir atrás do amor da minha vida.
- Você quer entrar? – Falei sentindo meu rosto corar depois de ouvir que era o amor da vira dele.
- Aceito, estou congelando aqui.
Nós entramos em casa e assim que fechei a porta pude sentir ele se aproximando de mim, virei de frente para ele e estávamos em uma proximidade onde pude reparar em cada detalhe de seus olhos, nos pelos da barba nascendo em suas bochechas, ele acariciou levemente meu rosto enquanto parecia querer decorar cada detalhe meu.
- Senti tanto sua falta.
- Também senti a sua. – Sussurrei enquanto sorria.
- You still make my crazy little heart go boom. – Ele suspirou e me olhou.
- I love you .
Ele me olhou com brilho nos olhos e selou nossos lábios, foi um beijo intenso onde nós estávamos nitidamente matando a saudade um do outro, interrompi o beijo meio ofegante e o abracei.
- Precisamos ir com calma.
- ...
- É sério, eu preciso ter certeza disso. – Segurei o rosto dele com as duas mãos. – Eu te amo mas fazem tantos anos que não nos vemos que eu preciso ir com calma nisso.
- Ok, no seu tempo. – Ele beijou minha testa. – Te vejo amanhã?
- Com certeza.
Ele foi embora e senti minha mente rodar com o que havia acontecido, meu amor da faculdade estava de volta e querendo ficar comigo! Não era fácil digerir aquela informação, mas eu sabia que era verdade o sentimento dele por mim, tomei uma ducha rápida, escovei meus dentes e me deitei na cama.
Acordei na manhã seguinte um pouco atrasada para as aulas, vesti uma roupa básica e corri para o colégio, no caminho vi o ônibus escolar e achei uma boa ideia pedir carona, ele estava parado com as portas abertas então perguntei ao motorista se iria para o colégio St. Georges, assim que ele confirmou subi no ônibus e me sentei na cadeira vazia atrás do motorista. Quando olhei para trás, vi que o estava sentado junto com um dos alunos que fazia parte da equipe de basquete, sorri de canto lembrando da noite anterior.
Assim que chegamos ao colégio desci do ônibus o começou a caminhar ao meu lado, senti os olhares dos alunos nos acompanhando, ele passou a mão pelo meu ombro e ouvi alguns assobios vindo do grupo de basquete que estava mais para trás.
- ...
- Olha , eu quero estar com você, quero que o mundo saiba o quanto eu te amo.
- Mesmo que isso signifique que um de nós terá que ser transferido?
- Não tem nada nas regras do colégio que nos impeça de ficar juntos.
Eu sorri com aquela informação e passei a mão pela cintura dele, deixando claro que eu queria aquilo tanto quanto ele. Daquele dia em diante nós realmente assumimos um relacionamento, era como se estivéssemos retomado o que nós tínhamos na faculdade, um namoro suave e gostoso, sem brigas, sem ciúmes, sem nada daquela parte ruim que normalmente um relacionamento tem.