Black Magic
Escrita por B Menezes | Revisada por Songfics
Era a sombra perfeita naquela tarde infernal de verão. O calor, ainda que protegido pela árvore, me impedia de manter o foco na leitura. Sentir a gota de suor descendo pelo couro cabeludo foi meu estopim. Fechei os olhos e concentrei as energias em conexão e a primeira brisa soprou.
Abri os olhos preguiçosos-pós-frescor ao ouvir um leve grito fino de surpresa ao meu lado. Uma moça segurava sua saia rodada, levada pelo vento. Ela sorriu olhando para o rapaz ao seu lado, talvez esperando que o mesmo visse graça na situação tanto quanto ela. Todavia o rapaz parecia mais interessado no conteúdo no celular do amigo. O sorriso desfaleceu no rosto dela, que passou a olhar em volta. Seus olhos caíram nos meus, fixos no dela. Emanou uma energia de surpresa no mesmo instante, energia da qual me alimentei. Seus olhos caíram ao meu colo e então foram levados aos rapazes ao seu lado. Não demorou muito até sentar-se ao meu lado na sombra.
- Fugindo do sol? - perguntei despretensiosamente.
- Também. Cansei de ficar em pé, de qualquer forma.
- São seus amigos ali?
- Meu namorado e o amigo dele. - o entusiasmo mínimo em sua voz entregou a insatisfação.
- Parecem bem entretidos.
- Um joguinho estúpido que descobriram. - revirou os olhos, cruzando os braços abaixo dos seios - Nossa, hoje está realmente abafado. Não passa nem uma brisinha.
E assim o fiz.
Ela olhou pra mim espantada, os cabelos voando.
- Você viu isso? Pareceu até mágica!
- Você acredita em magia?
- O ceticismo me tem um pouco.
- Tudo bem, se você pudesse pedir qualquer coisa, o que pediria?
Ela olhou instantaneamente para ele, que nem notara seu sumiço. Suspirou quase imperceptivelmente e deu de ombros.
- Talvez um pouco de reciprocidade.
- Se eu te der isso, o que ganho em troca?
Ela riu, desacreditada.
- É sério? - Assenti - Tudo bem, vou entrar na brincadeira. O que você iria querer, ó grande mestre?
- Você como minha aprendiz.
- Ó, que grande honra seria, meu senhor.
Por mais que o sarcasmo chegasse a ser palpável nas falas dela, e isso era o ceticismo que a tinha, não custava nada começar a manter o legado.
Tirei de dentro da bolsa uma garrafinha de água, passei os dedos em sua lateral, a água vibrou.
- Um gole deve ser o suficiente. - e movi a garrafa na direção dele. Ela me olhou assustada em confusa. Sorri. - Não é veneno!
Tomei um gole para provar, não teria efeito em mim aquele pedido. Tirei do bolso um pedaço de papel em branco.
- Se der certo, com o prazo de uma noite, um endereço onde poderá me encontrar aparecerá nele. - disse e o coloquei em seu bolso. - Só se prepare para as consequências.
Reuni minhas coisas e fui embora.
Estava sentado à janela no primeiro andar de um prédio federal abandonado quando ouvi passos entre os pedaços de concreto, folhas secas e lixos soltos no piso.
- Olá? - ela chamou - Cadê você?
- Aqui em cima.
A garota se assustou, erguendo a cabeça em minha direção. Saltei da janela e me apoiei no corrimão gasto de madeira, projetando minha sombra sob ela com o holofote natural do sol.
- Deu certo?
Ela assentiu, o medo do desconhecido emanando dela e me alimentando.
- Fico feliz que tenha sido honesta o suficiente para vir me procurar.
- Eu não entendo.
- Em breve entenderá.
- Por que eu?
- Você tem o necessário. Mas terá que se dedicar ou não valerá de nada e as consequências não serão boas.
- Quem te garante que eu não vá te entregar?
Ri. Tão previsível! Nada que já não fosse esperado.
- Se fosse me entregar não estaria aqui.
- Nem eu sei por que estou aqui.
Sem muito esforço saltei para o térreo. O corrimão a qual me apoiará ganhou uma curvatura frágil e a poeira se ergueu em volta dos meus pés.
- Você quer saber o que o fez ter querer mais... Dentro daquela garrafinha.
Peguei sua mão e ergui seu antebraço até a altura de nossos quadris. Encaixe minha mão no braço dela de modo que a ponta dos meus dedos ficassem em volta da veia principal em seu pulso. Com nossos pulsos voltados para cima ela acompanhou quando minha veia saltou grossa contra a pele fina e fez caminho até o pulso. Ela engoliu em seco e assentiu, dizendo: “quero!”. E então ela fechou os olhos sentindo o prazer do poder entrar por sua veia; sussurrei:
- É chamado de magia negra.
E seus olhos abriram, flamejantes.