Beleza Mortal

Escrito por Khloe Petit

Tamanho da fonte: |


   sempre gostou de contos de fada.
   Sua infância inteira foi repleta de histórias com finais felizes e amores correspondidos. Príncipes, princesas e até contos modernos, onde as garotas são populares e querida por todos.
  Tudo muito diferente de sua realidade.
  Desde criança foi isolada por todos, julgada por sua aparência terrível, mesmo sendo doce e inocente, vítima de uma maldição que assombra todo primeiro filho de um primeiro filho, seja homem ou mulher.
  A maldição, feita por um bruxo rejeitado por uma das antepassadas de , que não aguentou ser chamado de feio pela mulher cuja beleza raríssima a tornara orgulhosa e prepotente. Para aprender, ela e todos os seus sucessores nascidos de um primeiro filho ou filha, teriam uma aparência abominável que só se transformaria na verdadeira beleza rara original da família após os 21 anos.
   era a filha de um primeiro filho que teve a sorte de encontrar uma amiga de infância que viu mais do que um menino feio; o amou desde sempre e até hoje o casal compartilha de um relacionamento saudável e feliz. A garota, porém, passou toda a infância e adolescência sendo alvo de bullying e vítima de atos violentos por jovens ousados, que não tinham mais o que fazer senão pregar peças que só eles achavam engraçados.
  – Feiosa!
  – Monstro!
  – Abominação!
  – Volte para o lixão, sua porca!
  Mas nada se comparou a .
   o conheceu aos 16 anos, quando todos os jovens se preparavam para a universidade e estavam com os hormônios à flor da pele. Logo no primeiro dia de aula na nova escola, viu na garota amaldiçoada uma oportunidade de se divertir e transformou a vida dela em um inferno.
  – Por favor… - ela murmurava rouca após tanto gritar, presa dentro de um armário onde e seus amigos a haviam prendido. – Eu quero…
  A porta se abriu e não pôde evitar cerrar os olhos devido à luminosidade. Os ouvidos, entretanto, funcionaram muito bem e ela ouviu as risadas dos colegas de sala, que apontavam para ela.
  – Mijona! - um deles gritou, e pode perceber a umidade em suas calças.
  – Alguém traga o balde do lixo, temos que jogar essa porcaria fora! - gritou à frente de todos e agarrou os cabelos de , que gritou com a dor aguda, mas que não pareceu ter sido ouvida, pois logo foi arrastada para fora do minúsculo armário. – Eca! Até seus cabelos são nojentos, Aberração.
  Os professores já não conseguiam controlar os alunos que todos os dias praticavam mais e mais atividades de mau gosto com a garota. No fim do primeiro mês, a diretora abria uma solicitação ao ministério da educação, para que uma permissão especial de tutoria em casa fosse dada a .
  E assim ninguém mais viu ou ouviu falar da garota.
  Até hoje.

2023

   era tudo o que qualquer mulher poderia querer.
  Filho mais novo de uma família de políticos, o jovem prodígio que havia se formado com honras em direito, na Columbia University, iniciava os planos de seus pais em ingressar no mundo político que conviveu a vida inteira como personagem secundário.
  Parte de vários projetos que visam melhorar as condições de vida humana, sabia que mais do que um comportamento exemplar perante a sociedade, seu passado deveria ser limpo.
  Ele não se orgulhava de algumas atitudes que teve quando criança.
  De todas as mal criações que praticou quando era mais novo, conseguiu reverter praticamente todas elas, indo atrás das vítimas. Pediu desculpas, ofereceu suporte psicológico e, o principal, prometeu ajuda financeira. Tudo se resolvia com dinheiro, afinal.
  Contudo, dentre todas as pessoas que se lembrou e que também foram mencionadas por seus amigos mais próximos da época, houve somente uma que não conseguiu encontrar: . A garota monstruosa pareceu ter sumido do mapa após o ministério ter deferido o pedido de tutoria particular e, desde então, não se ouviu mais sobre ela.
  – Sem registros em qualquer instituição superior ou banco – Jennie, sua secretária, dizia –, ela não tem conta, não tirou passaporte e também não tem nenhuma rede social.
  – Não há pedido de mudança de nome?
  – Nada. Nem nenhum atestado de óbito. Sua família também desapareceu. O último registro que se teve foi do pai, quando ele pediu demissão da empresa onde trabalhava como funcionário.
   coçou o queixo, pensativo. Se a monstrinha tivesse sumido, então ela não seria um problema para ele. Caso aparecesse, ele poderia rapidamente dar um jeito na situação, desde que fosse mais rápido do que a mídia.
  – Fique de olhos atentos sobre isso.
  – Sim senhor – a morena falou. – Sobre o funeral de Anton e Leonard…
  Seus amigos de infância. Na noite anterior, recebeu uma ligação de um outro amigo informando sobre a morte dos dois. Haviam sido brutalmente assassinados enquanto se divertiam na zona vermelha. havia dito aos dois que logo mais encontrariam problemas, já que não pareciam ter limites com as prostitutas que levavam para hotéis.
  – Envie coroas de flores. Passarei lá mais tarde para prestar as condolências.
  Viu a secretária anotar os pedidos e então voltar a encará-lo.
  – Danielle entrou em contato pedindo para confirmar o jantar de vocês no Nobu.
  O jovem sorriu, esquecendo totalmente do caso da aberração de sua adolescência e a imagem de sua namorada tomou a frente. Ele namorava Danielle fazia três anos e sua relação com a modelo era seu maior sucesso. A mulher era muito querida pelas pessoas, pois se dedicava, quando não estava trabalhando, a fazer trabalhos sociais. Foi em uma dessas atividades que os dois se conheceram.
  Desde então, foi alvo de inveja de boa parcela de homens no mundo. Com uma carreira prestes a decolar, seu plano de pedir a namorada em casamento se concretiza esta noite, afinal, um bom político sempre possui uma base familiar sólida.
  – Faça conforme planejado.
  – Sim senhor, a orquestra e o chef já foram confirmados, assim como o hotel.
   abriu um pequeno sorriso enquanto observava seu reflexo no espelho de seu escritório. Se houvesse uma forma dele estar mais satisfeito com a vida, então alguém deveria mostrar, pois não poderia existir um homem no mundo que fosse tão bem-sucedido em todas as áreas como ele.

- - -

   O hotel Wyn era conhecido mundialmente por ser o primeiro hotel 6 estrelas de Manhattan. Com uma fila de espera de meses para se hospedar, somente as pessoas com mais prestígio visitava os quartos perfeitamente planejados para fazer uma pessoa se sentir dono de um império.
   acompanhava Danielle com a mão apoiada em seu quadril, enquanto subiam o elevador privativo que levava os dois até a cobertura.
   Tudo estava saindo conforme o planejado. Danielle havia dito 'sim' com lágrimas nos olhos e os dois trocaram um beijo cinematográfico diante das câmeras do fotógrafo contratado para divulgar as manchetes do dia seguinte.
   – Eu não consigo acreditar! - a mulher disse, sorridente. – Você me pegou de surpresa! Achei que faria o pedido em nossa viagem para Paris!
   – Você sabe que eu gosto de surpreender.
   A risada deliciosa de Danielle o fez sorrir. Apesar de ser egoísta e orgulhoso, tinha sentimentos reais pela noiva. Ele poderia não chegar a amá-la mais do que a si mesmo, mas depois de si e seu dinheiro, Danielle com certeza vinha em seguida na lista.
   – Que tal um banho? - ele perguntou assim que os dois entraram na enorme cobertura.
   – De banheira? - ela se virou de costas e trouxe os cabelos ondulados para frente, insinuando que ele deveria descer o zíper do vestido dourado que ela usava.
   logo fez as honras e viu o vestido deslizar livre e dar visão a um corpo completamente nu.
   – Caralho, Dani… - ele murmurou, seu pau já latente dentro de sua calça.
   – Eu também gosto de surpreender, amor - a voz da mulher tornou-se aveludada enquanto ela se virava de frente para o homem, que logo reivindicava-a com suas mãos –, o que achou?
   – Perfeita.
   Os dois se perderam em beijos e carícias até estarem dentro da enorme banheira que possuía uma vista espetacular do Central Park. não demorou a entrar em Danielle, que gemia da maneira que sabia que o homem gostava, pouco, mas mostrando muito tesão.
   – Hoje quero ouvir você gritar - ele disse, aumentando a velocidade com que arremetia dentro da modelo. – Não estou ouvindo.
   – SIM! AH… !
   O homem sorriu diabolicamente, posicionando-a de todas as formas que mais lhe fornecia prazer. Mesmo que ela pedisse para parar, ele ouvia como se fosse um incentivo e aumentava a velocidade.
   Durante vários minutos o casal se dedicou ao ato, aproveitando todos os cômodos da cobertura. Quando se viu satisfeito, pausaram para beber uma taça enquanto saboreiam uma tábua de frios preparada pelo hotel a pedido da secretária de .
   – Me conte sobre sua infância - Danielle disse com um morango preso entre os dedos.
   revirou os olhos. Odiava quando a companheira queria falar sobre amenidades. Preferia quando ela lhe trazia fofocas de possíveis concorrentes, para que ele pudesse armazená-las em uma parte de seu cérebro que usaria a informação no futuro para derrotar qualquer um que tentasse atrapalhar seu futuro brilhante.
   – Não foi nada demais.
   – Até parece. Ninguém se torna perfeito assim da noite para o dia.
   O caçula da família soltou uma risada. Danielle sempre soube paparicá-lo como ele queria, o que deixava seus irmãos mais velhos ainda mais bravos pela inveja que sentiam. Não bastasse a beleza que a mulher ostentava, ainda tratava o namorado como um rei.
   – Me conte sobre você então - ele mudou o assunto para ela. Já que queria falar sobre o passado, era melhor que ele soubesse sobre Danielle. Dificilmente ela falava sobre si e ele tampouco se importava. Tudo o que sabia já havia sido entregue por sua secretária antes mesmo dos dois começarem a namorar. Bastava um comando para saber das últimas novidades da noiva.
   – Eu tive uma infância difícil… - ela olhou para cima, provavelmente visualizando a época. – As outras crianças não entendiam que minha aparência era… Rara.
   O noivo riu com a informação. Poderia entender o que era ser uma criança extraordinária. Apesar dele não ter sido aquele que fazia pescoços virarem quando andava no corredor do colégio, seu sobrenome garantia que acontecesse. No entanto, Danielle não. Ela era uma beleza raríssima, com um corpo espetacular e uma voz que poderia derreter até a pessoa mais fria do universo. Quantas vezes a usou para conseguir o que queria? Tudo o que precisava fazer depois, era lhe dar um pouco do que as pessoas chamavam de amor e então voltar a desfilar com ela.
   – Você quer ver uma foto?
   Não, ele não queria. Não tinha interesse nenhum em ver uma pequena Barbie com babados e bochechas inchadas. Não era adorador de crianças, e poderia até odiá-las, se não fossem tão necessárias para seu futuro.
   – Claro - ele sorriu, fazendo sua parte em se mostrar como um homem perfeito para a noiva. Não era tão hipócrita assim; sabia, mais do que qualquer pessoa, que não deveria mostrar as verdadeiras garras para seus melhores peões. Qualquer ser humano poderia se voltar contra outro, não importa o relacionamento que eles tivessem.
   Danielle se revirou e pegou o celular. Enquanto ela procurava uma foto, passou as mãos pelo corpo da modelo, que abriu um pequeno sorriso, sabendo exatamente o que ele queria.
   As mãos, entretanto, não encontraram as curvas que ele estava acostumado, mas uma ardência aguda.
   – Ai! - as mãos fugiram do corpo da noiva. – Que porra é essa?
   – Ah… você é muito sem graça.
   não sabia bem para o que dar atenção, a dor na palma de sua mão, na lâmina da faca que havia surgido como mágica entre os dois, ou no tom de voz de Danielle, na qual nunca havia ouvido antes; parecia uma mistura de tédio e chateação.
   – O que diabos…
   – O plano era que você soubesse o motivo de estar tendo essa morte lenta e dolorosa, afinal, ter consciência dos atos é uma peça importante em qualquer jogo, não é, amor?
   – Danielle, que porra de brincadeira é essa?
   – Brincadeira? - a modelo se levantou e calçou os stilettos, permanecendo nua. – Para mim não é só uma brincadeira, . Para você certamente não será nada divertido.
   – Você vai explicar isso agora! - ele se levantou e começou a se vestir. Seu sexto sentido lhe dizia para sair dali o mais rápido possível, mas não poderia sair correndo pelado.
   A modelo jogou um tablet que ele não havia visto no local. Suspeitando do ato, pegou o aparelho e arregalou os olhos.
   – Essa sou eu aos 16 anos.
   – Não.
   – Sim.
   – Não é possível.
   – E por que não? - ela se sentou em uma poltrona e cruzou as pernas bronzeadas. – Porque sua secretária e seus capangas não lhe passaram essa informação? - soltou uma curta risada. – Você deve saber que não é difícil mudar informações no sistema.
   – Como você…
   – Ah, … Seu maior erro é achar que é o dono do mundo. Ou que em breve será - Danielle sorriu. – Você se acha esperto demais com todo seu jeito engomado e samaritano. Acha que ninguém sabe que você trepa com sua secretária e lhe promete mares de coisas para que ela permaneça sendo sua maior escudeira; que gasta milhões de dólares todos os anos comprando pessoas para sua estréia na política. Você acha que me beijar, meter seu pau pequeno em mim e me dar algumas jóias é o suficiente para que eu haja como a sua própria boneca. Mas veja bem… no final, quem estava sendo usado esse tempo todo era você.
   – Do que você está falando?
   – Eu só precisava de um acesso a todos os seus amiguinhos infames que falaram e fizeram aquelas coisas horríveis comigo.
   E num piscar de olhos, entendeu tudo. Associou as mortes sinistras que vinha ocorrendo com seus amigos de infância e como Danielle esteve em todos os eventos que envolviam pessoas do seu passado.
   – Sim, agora me parece que resolveu usar a cabeça certa - um sorriso surgiu nos lábios da modelo.
   – Como você…?
   – Fiquei bonita desse jeito? Sabe, , eu estava ansiosa para ouvir de você essa pergunta – ela descruzou as pernas e então as cruzou novamente, não se importando de estar completamente nua na frente de sua vítima. – Porque aí eu teria a oportunidade de mostrar a você que há coisas que o dinheiro não compra.
   olhou ao redor, planejando minuciosamente sua retirada. O celular estava próximo da porta, dentro de seu paletó. Calculou o tempo de sair correndo e acionar a emergência para que seus seguranças lidassem com Danielle; só precisava enrolá-la um pouco.
   – Minha família sofre uma maldição. Todo primeiro filho de um primeiro filho terá uma aparência terrível até completar 21 anos. Após essa idade, voltamos a ter a beleza original da nossa ancestral; uma beleza rara, como pode ver - ela abriu os braços, mostrando o próprio corpo perfeitamente escultural. – Não há cirurgia no mundo que deixe o corpo de uma mulher dessa forma.
  – Tudo isso por vingança?
  – Tudo isso? , acho que você não percebe a gravidade que seus atos cometeram na vida das pessoas que machucou. Você sabe o que é sentir uma dor excruciante e não poder acabar com ela, porque não está ao seu alcance?
  "Durante anos permaneci sendo alvo de brincadeiras e comentários maldosos. É muito fácil rir de outra pessoa quando não se está na pele dela. E então eu pensei: por que não devolver na mesma moeda? Por que não fazê-los sentir querer morrer e não poder, porque não há coragem o suficiente para isso?"
  – Dani…
  – . Meu nome é . A garota que você usou de brinquedo e chutou quando não quis mais. Que fez todo mundo cuspir em cima e inventar palavras horríveis sobre a aparência.
  E então ele decidiu não esperar mais. Se permanecesse ali por mais tempo, poderia acabar como seus amigos de infância. Por isso, correu em direção a porta, mas quando tocou em seu paletó, uma dor horrível tomou conta de sua perna. Ao olhar na direção dela, uma flecha atravessava a região de sua coxa esquerda, fazendo-o gritar.
  Olhou para , que segurava uma balestra ainda sentada em sua poltrona.
  – Você é realmente muito tolo, .
  – O que você quer?
  – O que você acha?
  – Posso te dar qualquer coisa.
  – Hum… será? - ela sorriu e olhou para a ponta da flecha que havia acabado de armar. – Ah! Essa é outra lição que gostaria de te ensinar hoje, meu querido noivo.
  Ela se levantou e sorriu diabolicamente para o homem caído no chão.
  – Sabe outra coisa que dinheiro não compra?
   arregalou os olhos quando viu a arma apontada em sua direção.
  – Sua vida.

- - -

  ÚLTIMAS NOTÍCIAS
   , 32, filho mais novo do governador Philip Liton, comete suicídio.
  O empresário foi encontrado morto na cobertura de um hotel às 7h15 da manhã após sua noiva, Danielle Simmor, encontrá-lo na presença de sua secretária. A mulher de 27 anos informou que era viciado em jogos de vida ou morte, como a roleta russa, e havia convidado várias pessoas para praticar o ato ilegal na cobertura. 
  A polícia apura as informações. De acordo com o chefe da operação, John Mark, o caso será encerrado após a autópsia do corpo. Câmeras de segurança e testemunhos foram coletados, mas a polícia confirmou que as informações somente comprovaram o testemunho inicial.

FIM


  Nota da autora: A ideia original tratava dessa mesma maldição, mas seria desenvolvida de uma outra forma. Como deixei tudo para a última hora, acabei não conseguindo desenvolver a ideia original porque ela só poderia ser tratada em uma longfic.
Mesmo assim, espero que essa versão tenha sido satisfatória. Espero poder, no futuro, escrever a primeira versão da ideia.
Obrigada por ter realizado a leitura! :)



Comentários da autora