A Química das Sapatilhas

Escrita porRay Dias
Editada por Natashia Kitamura

CAPÍTULO • UM

Tempo estimado de leitura: 26 minutos

  %Clair% estava terminando de guardar seus sapatos em sua bolsa, e os colegas de aula conversavam animados. Aquele havia sido outro dia extremamente maravilhoso de treino, entretanto, desgastante como os últimos vinham sendo. Ela amava o que fazia, mas ultimamente, algo a deixava exaustiva e o seu humor não estava dos melhores. Por tal motivo, os colegas mantinham-se afastados das brincadeiras triviais com a mulher.
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  Ela fechou a bolsa suspirando pesadamente, e ao virar-se para sair da sala, o coreógrafo chamou a atenção da turma que ainda não havia sido totalmente liberada:
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  — Antes que todos saiam, peço que aguardem um minuto, por favor. Estou com a lista de parceiros do próximo trabalho. Falarei os nomes das duplas, em seguida deixarei a listagem no mural do corredor. Por favor, façam silêncio e aqueles que tiverem alguma objeção… — Fred olhou diretamente para %Clair%, que emburrada, abaixou a cabeça assim que notou que aquela encarada dele só podia significar uma coisa: ela odiaria seu parceiro — Me procurem para conversar ao final.
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  A garota era conhecida na classe por ser extremamente criteriosa e rigorosa com os parceiros e com o próprio trabalho. E por isso era uma das melhores ali, se não a melhor.
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  %Clair% olhava o relógio apressada. Acabaria se atrasando e teria que ficar no trabalho pós-expediente para compensar a hora extra. Batia o pé de maneira compassada ao chão, demonstrando a sua clara impaciência. Os colegas ouviam os nomes de seus companheiros, cumprimentavam-se e saíam de sala sem maiores problemas. Ela observava a tranquilidade dos outros e começava a ficar apreensiva, os seus melhores amigos — que não estavam falando muito com a garota naquela semana por entender o motivo do mau humor — já haviam sido selecionados. E aqueles com quem conversava de maneira cordial também. Então, estavam restando apenas os novatos; e ela detestaria perder tempo ensinando o básico. %Clair% nem mesmo cogitou uma pessoa tão experiente quanto ela, que também não havia sido chamado, porque ela sabia que seria absurdo fazer parceria com um inimigo. Fred jamais faria aquilo!
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  Frederico olhou-a de esguelha após checar a linha ao qual chegara e, a mulher irritada, já pensava em ser sacanagem. “Droga, eu vou me atrasar Fred. Vai mesmo, me deixar por último?”, pensava ela com os pés numa batida impacientemente ritmada.
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  — %Clair% e…
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  “Droga, não vou gostar disso…” — Ela transmitia tal pensamento em um olhar cortante ao coreógrafo.
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  — Nicholas.
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  Fred mal encarou a garota após falar e deu continuidade. Ela olhou para o outro lado da sala e encontrou o mesmo olhar insatisfeito em sua direção. Os dois bufaram discretos e ajeitando suas coisas, se puseram para fora da sala. Passaram juntos pela porta como se aquilo tivesse sido um passo treinado. E Fred, assim como os demais alunos, ao verem %Clair% e Nicholas saírem sem aguardar para reclamar, surpreendeu-se.
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  A mulher já estava quase na saída do prédio, quando viu Nick a alcançando.
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  — %Clair%. — Ele chamou-na.
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  — Não tenho tempo para você agora. — disse, saindo apressada e deixando o Young extremamente irritado.
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  O rapaz, estreitou seu olhar além do normal, murmurando baixinho:
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  — Odeio você, %Clair%. Cada vez mais estúpida.
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  Ele pegou suas coisas e foi em direção às vagas na frente do prédio, entrando em seu carro e logo dando partida. Enquanto o veículo de Nicholas Young passou por ela acelerado, %Clair% %Stefanini% corria até o ponto de ônibus para não perder o seu transporte. Por sorte o alcançou a tempo de não chegar mais do que cinco minutos atrasada.
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  A porta dos fundos bateu e os funcionários presentes ali, a viram chegar correndo para trocar seu uniforme. Cumprimentaram-se e seguiram para mais um dia de trabalho.
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A • Q U Í M I C A • D A S • S A P A T I L H A S •

  Nicholas na ante-sala aguardava a secretária lhe chamar. Ele folheava as revistas de maneira calma e concentrado. Logo que sentiu a proximidade de alguém, interrompeu a sua leitura e sorriu para a simpática mulher, que lhe indicava o local ao qual o rapaz deveria seguir.
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  A secretária desejou a ele “boa sorte” e sorriu-lhe muito mais animada do que o próprio a devolveu. Era o claro sinal de sua beleza oriental fazendo efeito, como sempre. Nicholas pôde sentir de longe o olhar da mulher sobre si enquanto ele andava, e sorriu divertido. Se não conseguisse o emprego, ao menos sairia dali com o telefone de mais uma bela mulher, mesmo já estando acostumado àquilo.
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  — Com licença? — Ele mencionou ao bater com os dedos na porta abrindo uma fresta, educada.
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  — Oh, senhor Nicholas Young, certo? Muito bem, pode entrar. — O chefe sorrindo simpático à mesa acenou para ele.
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  Nicholas adentrou calmo, elegante como era no seu porte habitual. Observou com cautela a sala do chefe e sentou-se na cadeira em frente a ele, com um sorriso confiante.
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  — Por que o filho de Iruka Young veio pedir emprego na minha empresa? É uma das curiosidades de seu currículo que me fizera aceitar esta entrevista, sabia?
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  Nicholas sorriu um pouco menos confortável.
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  — Sendo prático, então… Não procuro viver à sombra das conquistas do meu pai e ele apoia que eu trilhe meu caminho sozinho. Espero que meu currículo tenha sido realmente relevante, mais do que o meu sobrenome, senhor Brown.
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  Hector Brown além de ser o CEO da construtora ao qual Nicholas estava pleiteando o emprego, era também um grande amigo de seus pais: Iruka Young e Candance Stuart. Hector conhecia a mãe de Nicholas, a norte-americana Candance, desde a época da juventude, e conheceu Iruka, o jovem imigrante japonês quando ele começou a namorar a jovem Stuart.
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  Um casal de faculdade que se tornara marido e mulher e tido dois filhos: Nicholas Stuart Young e Melissa Stuart Young. A irmã de Nicholas era a caçula e tinha quinze anos de idade. Já ele, estava com seus vinte e oito anos.
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  — Sabe Nicholas, sua mãe e eu somos velhos conhecidos. Desde a época do colegial. Eu achava que me casaria com ela um dia, até o Iruka imigrar e estudarmos juntos na faculdade. Eu soube no exato momento que o conheci, que eles haviam sido feitos um para o outro. Somos grandes amigos, infelizmente não acompanhei seu nascimento e o da Melissa, porque passei trinta anos morando na Irlanda. Foi onde comecei a construir essa grande empresa que você conhece. Esta é apenas a filial, mas eu soube que você havia se tornado um grande engenheiro como seu pai, desde que eu ainda comandava da matriz.
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  — Senhor Brown… Eu sempre soube da sua amizade com minha família, por isso fiquei com receio de tentar a vaga. Odiaria que esse emprego viesse como um favor amigo. Eu espero merecê-lo.
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  — Sei muito bem que pensa assim, é igualzinho ao seu pai. Iruka construiu a empresa da sua família com muito empenho e mérito. Não foi fácil para um imigrante japonês entrar na rota das principais construtoras do mercado. Felizmente, atuamos com ramos diferentes porque eu odiaria ser concorrente da Young Projects.
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  — Sim, eu também sei que a Brown Engineer e a Young Projects são colaboradoras. Meu pai me contou. E é por isso que eu fiquei ainda mais interessado em incorporar-me na sua equipe. Veja, senhor Brown, eu sei tudo sobre o estilo oriental das construções tradicionais e contemporâneas, haja visto que minha família atua nesse nicho. E o foco da YP, são as construções domiciliares, mas sinto que estou em um momento de me desenvolver melhor em áreas maiores… Como é o foco da BE, as construções civis empresariais…
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  Hector escutava com orgulho, o discurso de Nicholas. Assentiu, olhou novamente o currículo do rapaz, e iniciou a entrevista como faria com qualquer candidato, e no fim, explicou:
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  — Serei franco, Nicholas. Há um jovem engenheiro com mais experiência em nosso campo do que você, pleiteando a vaga. Seu currículo é muito bom mesmo, mas o dele também. Precisarei pensar entre os dois candidatos qual será a melhor opção para nosso novo projeto. É um projeto bastante arrojado e diferente do tradicional, o engenheiro que o fizer bem, garantirá a permanência na minha empresa. É por isso que, não posso decidir agora. Em até vinte quatro horas a empresa entra em contato com você para lhe dar uma resposta formal, seja ela positiva ou negativa, ok?
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  — Claro, senhor Brown! Muito obrigada pela oportunidade, aguardarei com esperança de que a minha experiência seja a mais arrojada tal como o projeto precisa. — Nicholas respondeu sutil e simpático.
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  — Muito bem, Nicholas. E na próxima vez que nos virmos, pode me chamar de Hector, sim?
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  — Como quiser. Eu preciso ir agora, então… Foi um prazer.
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  — Abraços ao Iruka e à Candance. Avise-os que estou de volta permanente aqui na América, e gostaria de vê-los!
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  — Tenho certeza que mamãe irá preparar a ocasião perfeita. Aviso sim.
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  Nicholas saiu da sala de Hector um pouco amedrontado de perder a oportunidade para outro profissional, no entanto, satisfeito em saber que não estava sendo privilegiado por nada. Além disso, havia confiança de que tudo o que seu pai o ensinou era exatamente o que Nicholas precisava oferecer ao projeto misterioso de Hector.
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A • Q U Í M I C A • D A S • S A P A T I L H A S •

  %Clair% terminava de limpar o balcão, estava tão cansada ao ponto de sentir os ossos rangerem. Ela era uma das últimas a ir embora naquele dia. Quando Breno fechou a porta dos fundos, ela lhe deu um sorriso amigável e acenou em despedida.
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  — %Clair%! — Ele chamou e a mulher o olhou preguiçosamente: — Tem certeza de que não quer companhia?
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  O rapaz olhava-na como se ela estivesse com a vida por um fio. E aquilo a incomodou bastante.
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  — Obrigada, mas eu ficarei bem.
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  — Certo… Se precisar, pode me ligar.
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  — Obrigada mais uma vez, Breno.
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  Ela deu-lhe as costas e seguiu com passos lânguidos ao ponto de ônibus. O rapaz caminhava na direção oposta olhando para trás vez ou outra, a fim de certificar-se que ela ficaria bem. %Clair% estava saindo tarde do trabalho nas últimas semanas fazendo horas extras, e era bastante preocupante que naquela localidade, a mulher voltasse para casa sozinha. Ela era bastante reservada, Breno nunca sabia se ela tinha alguém que a esperasse em casa ou não, mas como um cavalheiro e bom colega de trabalho, sempre esperava um pouco para sair junto com ela e espiava-a seguir ao ponto de ônibus, até que entrasse no transporte. Era a maneira como ele podia ir embora mais aliviado.
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  Ao chegar em casa, %Clair% observou a desorganização e mais uma vez decidiu deixar para outro momento a limpeza. A época da Mostra Final era tão corrida, que eram precisas as vitaminas. Foi pegá-las no armário quando lembrou-se que tinha tomado as últimas no dia anterior. Torceu os lábios e pegou um iogurte na geladeira. Aquele seria seu jantar. Não comia bem há alguns dias, por excesso de cansaço em preparar os alimentos. E não negaria o quanto estava sendo difícil arcar com a mudança brusca de rotina. Já estava acostumada aos perrengues, mesmo assim, ora ou outra recordava-se da boa vida que tinha na casa do pai. Contudo, não se arrependia nada de ter escolhido seu próprio sonho.
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  %Clair%, jogou fora o potinho do iogurte em seu cesto de materiais separados, tomou banho e não demorou a recolher-se. Na verdade, a última coisa que se lembrava era do próprio corpo afundando na cama, com a toalha de banho ainda enrolada no cabelo.
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  Na manhã seguinte, Nicholas abriu a porta da sala, e estranhou a solidão ali. O zelador sempre a deixava destrancada pela manhã, pois, %Clair% era a primeira a chegar. O que teria acontecido? Curioso, mas, bastante satisfeito por não encontrá-la ocupando a sala e agradecendo por finalmente não precisar treinar na velha sala com espelhos quebrados, Nicholas ligou o som e calçou seus sapatos.
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  %Clair% acordara afoita, com aquela toalha úmida da noite anterior ainda sobre sua cabeça. Tomou um banho extremamente rápido, secou os cabelos e, inclusive, jogou colônia neles a fim de disfarçar aquele cheiro de cabelo que dormiu molhado. Um odor imperceptível à maioria das pessoas, mas, não para %Clair%. Quando chegou à academia o zelador lhe sorriu, e ela apressou-se olhando o relógio. Torcia para não ter ninguém na sala de dança, e embora soubesse que era a única a chegar naquele horário para utilizá-la, também sabia que Nicholas esperava o dia em que ela falharia para que ele treinasse ali.
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  Parou à porta e não ouvindo som algum, ou enxergando pessoa alguma, sorriu e entrou. Colocou sua bolsa sob uma das cadeiras até escutar os movimentos de alguém se levantando do chão.
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  — Achei que não viesse hoje. — Nicholas pronunciou e ela fechou os olhos irritada.
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  — Apenas me atrasei… — respondeu pegando seus sapatos e tirando os jeans que vestia, revelando o colã e as meias por baixo da calça.
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  Ele murmurou afirmativo, e parou ao lado dela colocando a própria mala na cadeira vizinha. Passou um tempo observando-a. %Clair% parecia cansada, mas, embora ele soubesse que a garota saiu apressada, as suas roupas estavam intactas.
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  — Tá olhando o quê? — Ela ajeitava a faixa de sua saia sem encará-lo.
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  — Nada. Agora que estamos juntos na apresentação final, acho que podemos dividir o horário pela sala.
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  — Não todos os dias.
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  — Nesse caso, se não for hoje pode sair, porque eu cheguei primeiro.
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  Ela ergueu os ombros e encarando Nicholas, disse:
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  — Eu odeio você.
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  — É recíproco.
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  Os dois caminharam para o meio da sala, mas ela foi até as barras para alongar. E ele que já havia alongado, foi até o aparelho de som colocar a música:
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  — Escolhi esta música para nossa apresentação… — comentou sem aguardar resposta dela.
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  — Quem deu o direito de você escolher algo sem me consultar?
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  — O Fred. Você não atendeu as ligações dele ontem.
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  Ela encarou Nicholas, e calou-se visivelmente sem graça. Não poderia atender as chamadas naquela ocasião, porque estava trabalhando e mal pôde pegar no celular quando chegou em casa.
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  Nicholas direcionou-se ao meio do salão, e fechou os olhos incorporando a música em um momento reflexivo. %Clair% o olhou com desdém, e igualmente concentrou-se na harmonia. De olhos fechados, ambos soltavam o corpo em passos espontâneos e estavam tão concentrados, que em determinado momento, os dois puderam sentir a presença próxima do outro. %Clair% rodopiava de braços abertos, em uma postura digna do balé e Nicholas pegou em sua mão puxando-a para si, guiando um rodopio com o corpo dela de maneira que ao fim dele, seus corpos estivessem colados. Os dois abriram os olhos surpresos e se encararam um tempo em silêncio.
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  — Isto ficou bom. — Nicholas disse.
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  — Se você não tem algum critério crítico. — %Clair% respondeu afastando-se e indo ao som, retornar a música ao início.
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  — Não foi tão ruim assim, %Clair%.
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  — Não foi bom também.
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  — Acredito que toda expressão espontânea é muito mais enriquecedora do que mera técnica.
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  — Eu também. — Ela olhou para ele, com uma expressão óbvia ao explicar: — Mas não é a proposta deste trabalho que os movimentos não tenham o mínimo de técnica. Não estamos engajados em uma apresentação livre.
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  — %Clair%… Se você for implicar comigo, isto não vai dar certo.
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  — Não estou implicando, apenas quero que compreenda a complexidade disso Nicholas. Fred não uniu um especialista de street dance com uma bailarina para que fizessem qualquer coisa.
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  Nicholas observou a mulher que lhe falava rígida, e baixou sua cabeça em um suspiro contrariado. Se aproximou dela encarando-a incrédulo. Havia uma troca de energias contrárias entre eles, e talvez aquilo os equilibrasse tão bem na dança.
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  — Ele nos uniu porque temos a química perfeita. — Ele respondeu-a, de modo grosseiro.
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  A bailarina abaixou a cabeça silenciosa, e puxou seu bloco de anotações. Young não encarava-a, ele mantinha os olhos presos no chão bastante contrariado. %Clair% tinha uma estúpida capacidade de o tirar de si.
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  — Já contou os contratempos? — Ela perguntou diretamente o olhando, abrindo o bloco de anotações como se não ouvisse aquilo.
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  — Não.
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  — Então vamos começar por isso.
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  Os dois sentaram ao chão do salão, e soltando a música fizeram a contagem de tempo, e quais os contratempos harmônicos a música apresentava.
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  Não era a primeira vez que dançavam juntos. Já tinham um histórico considerável de apresentações, mas, toda nova parceria era como se fosse a primeira vez. De certo modo, ambos negavam a sincronia natural entre seus corpos e espíritos, mas, não conseguiam repreender aquilo. Era tão natural quanto respirar. Não havia uma ação do corpo de Nicholas que o corpo de %Clair% não compreendesse na dança, e vice-versa.
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  E embora todos desconfiassem que a “rincha” era proveniente de questões amorosas mal resolvidas, na verdade, os dois nunca tiveram qualquer contato que não fosse profissional. E por isso não deveria ser tão difícil compreender suas intolerâncias com o outro, e acreditar quando um deles dizia que nunca tiveram ao menos se encontrado fora de uma sala de dança.
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  Fred era amigo mais próximo de %Clair%, do que Nicholas. E pertubava-a com tais indagações. Porém, nos últimos tempos ambos haviam se afastado. Não por motivo explícito, mas, porque a rotina foi os distanciando e a amizade entre eles não era baseada em cobranças ou satisfações indevidas. E foi neste momento, que Fred e Nicholas estreitaram seus laços de amizade também. Óbvio que %Clair% não sabia, pois, acreditaria que um complô fora firmado ali, contra ela. Nicholas se dispusera a compreender os motivos pelos quais Fred os escalou antes mesmo de reclamar no dia do sorteio. Entretanto por mais que pensasse, ele não achava a resposta. Logo, quando Fred o telefonou passando a música, ele descobrira:
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  Vocês tem a química perfeita, seus corpos falam entre si embora não vejam isso. Ou finjam não ver. E tem mais, quero a mistura entre balé e street. Quero inovação, e sei que vocês farão algo.”
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  Nicholas passou a pensar sobre aquilo. Era verdade que conhecia o corpo de %Clair% muito mais do que um estranho deveria conhecer, mas, também não era um estranho de fato. No âmbito da dança, eram muito íntimos até. E quando recebeu aquela música, ele não se opôs em momento algum, era da sua área. Já podia observar a coreografia surgindo sob seus olhos. Mas, e %Clair%? Onde ela se enquadraria? Ela daria conta? Não que ela não conhecesse outros estilos de dança, afinal, eles eram submetidos a uma diversidade de ritmos ali na academia. Contudo, o que ela poderia propor?
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  — Acho que podemos trazer elementos muito fortes nos passos. — Ele disse após terminarem a contagem.
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  — Do street dance né… Mas, acredito que o Fred não escolheria essa música para nós se quisesse o trivial. O que ele te disse?
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  — Ele realmente deixou claro que queria uma mistura de nossas potências, e inovação.
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  — Hm… — Ela deitou ao chão e fechou os olhos para pensar.
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  %Clair% sempre fazia aquilo quando estava diante de um momento criativo. Nicholas observava-a com um sorriso de canto, pois, sabia que assim que ela levantasse seria pra valer.
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  — %Clair%, porque não atendeu às ligações do Fred ontem? Não é do seu feitio ignorar trabalho.
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  — Justamente. — Ela respondeu um pouco incomodada — Eu estava trabalhando. E cheguei exausta o suficiente para verificar meu celular.
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  — Trabalhando? — Nicholas perguntou como se fosse absurda aquela informação.
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  De certa forma, era. %Clair% não o respondeu, imediatamente levantou-se e ligou o aparelho de som, expondo o primeiro conjunto de “oito” dos movimentos. E Nicholas conteve sua curiosidade para encarar a proposta dela.
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  Ao fim daquela manhã de ensaio privado e coletivo, a garota corria para guardar as suas coisas. Nicholas observou a pressa dela.
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  — Você quer uma carona?
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  — Não.
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  — Não há mal algum em aceitar uma gentileza.
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  — Já ouço fofoquinhas demais em relação a você, obrigada.
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  — Não me parece ser seu estilo dar ouvidos a fofocas.
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  Ela colocou sua bolsa no ombro e despediu-se discreta dele. O rapaz a seguiu pelo corredor, e aproximou-se a fim de fazê-la aceitar a carona.
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  — Eu só quero ajudar. Não vai mudar nossa relação de ódio um com o outro.
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  Ela riu sarcástica pelo comentário dele.
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  — Certo, Nicholas. Eu aceito. Mas já aviso que meu caminho é totalmente fora de mão para você.
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  — Tudo bem, eu não ofereceria se não pudesse levá-la. Onde é?
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  — Perto da minha casa, no Bronx.
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  — Você não morava aqui em Manhattan?
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  — Sim.
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  Eles seguiram até o trabalho de %Clair%. E quando Nicholas compreendeu que ela havia se mudado de endereço e agora começava a trabalhar, certamente porque algo ocorrera em sua vida mudando sua realidade, ele não pode se conter em perguntá-la no percurso:
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  — O que houve em sua vida, %Clair%?
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  — Do que está falando?
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  — Achei que estava chegando mais cedo para ensaiar, apenas por pirraça de não deixar a sala livre para mim… Contudo… Você saiu de Manhattan para o Bronx, que não é tão ruim assim, mas deixa claro que você não poderia mais se manter como antes. E ainda por cima está trabalhando… Você faliu? — Nicholas perguntou sem pudor algum.
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  — Não. Eu nunca tive bens para que eu falisse.
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  — E então?
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  — Você se enganou quando deu esta carona para mim, se achou que teria liberdade para ser invasivo desta maneira.
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  — Desculpe — sorriu irônico. — Só quero compreender o que aconteceu.
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  — Meu pai me mantinha, e não me mantém mais.
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  Nicholas sabia que o pai de %Clair% não aprovava a carreira de dançarina da filha. A mulher estrelava um típico clichê: “o pai rico e a filha que não quer assumir a empresa”. Ele se viu pensando no real motivo para a mulher de 26 anos não estar mais sendo mantida pelo progenitor. E ainda: como %Clair% estaria lidando com a dura vida de uma trabalhadora? Ela nunca fizera o tipo mimada, mas, é fato que usufruiu de todas as mordomias que tinha em sua vida, e não por opção, mas, por necessidade, agora a sua realidade lhe exigia o contrário.
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  — A que horas você sai do trabalho? — Nicholas perguntou após um longo tempo de silêncio na viagem, assim que parou em frente à lanchonete tradicional do Bronx.
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  — Que isso? Eu tenho que bater meu ponto para você agora?
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  — Eu só estou tentando ser gentil.
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  — Sua carona já foi gentil o suficiente. Obrigada.
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  Ela deu às costas ao carro, e atravessou a rua correndo. Nicholas passou alguns minutos observando. Uma lanchonete tradicional, porém, chinfrim, se comparada ao padrão que ela estava acostumada. Se viu curioso para assistir a “posuda” bailarina %Clair%, em um avental e servindo salgados fritos por trás de um balcão. O que Nicholas não pode notar, é o sorriso de admiração que seu rosto formara só em imaginar o esforço que %Clair% estaria fazendo para manter tudo aquilo. Ser esforçada em seus objetivos era uma qualidade muito natural que a mulher sempre demonstrou ter.
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  Infelizmente, Nicholas não teria tempo de apreciar a atuação de %Clair% fora dos palcos, havia conseguido o trabalho na empresa que tanto almejou por tanto tempo. E havia desviado totalmente de seu caminho com aquela ideia de passar um tempo a mais com %Clair%. Não sabia definir os motivos, entretanto, a implicância da mulher, e a ideologia de ódio entre os dois era o que motivava Nicholas a sempre instigar a relação entre eles.
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  Uma relação de trabalho, misto de coleguismo e rivalidade. E lógico, de “desafio a ser superado”. Era isso que %Clair% significava para Nicholas: um desafio.
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