Amor & Outras Breguices
Escrito por Maraíza Santos | Revisado por Especial Criativo
Projeto Especial Criativo | 4ª Temporada - Amigo Secreto
História dedicada à autora Mari Guizelini.
— Meu Deus, por que o amor é tão brega?
O resmungo de foi o suficiente para que Raymond lhe empurrasse para o lado. Ellie, esposa do homem, apenas sorriu diante da rabugice da amiga, enquanto cheirava mais uma vez as tulipas que havia ganhado.
— Ah, , vai me dizer que nunca se apaixonou? — disse Ellie, um tanto provocadora quanto curiosa.
— Já sim, claro, mas faz bastante tempo. E não estou criticando o amor, Ellie. Só estou constatando um fato. — declarou , ranzinza.
— Um dia você irá encontrar um homem assim como você: todo chato. E vai ser incrível ver , A Rabugenta se transformar em , A Apaixonada. — Brincou Raymond, abrindo o carro para dar carona a sua amiga.
retrucou qualquer coisa, embora sua mente racional demais estivesse de acordo com o que o amigo havia dito. Um dia, ela viveria um romance e estaria tão encantada que repetiria frases genéricas, mas cheias de significado para alguém que ela amasse, assim como Ellie fez ao receber o buquê de flores após dois meses de casada. E, apesar de negar até a morte, estava ansiosa para esse dia.
Quando esse dia aconteceu, no entanto, embora sempre se convencesse que estava preparada, ela quis fugir. Os sentimentos antigos e já adormecidos estavam de volta: o doce sacolejar das mãos, o gostoso frio da barriga e a grandiosa expectativa de rever quem a constantemente desconcertava. A grande questão era que ela ainda tinha o estigma de sua adolescência, onde foi rechaçada pelos garotos que gostava, sendo o patinho feio da turma, e repleta de experiências desastrosas que envolviam meninos, os quais eram péssimas companhias. Ainda assim, sendo a Senhoria Cérebro e, de acordo com os amigos, o próximo passo da evolução humana, tinha consciência que já havia passado quase quinze anos e se tornara uma poderosa e bem sucedida advogada; sem esquecer das maravilhas que o fim da puberdade a proporcionou. Por que não esquecer-se disso após ter se apaixonado à primeira vista no advogado rival que tentava tirar todo o dinheiro de seu cliente?
E ele não era nada como estava acostumada; era um homem silencioso, afável e sem nenhuma pretensão de ser um cão raivoso. Ele tinha uma aura racional, a qual mesmo com a raiva anormal que suas atitudes poderiam gerar, despertava o medo de perder a razão aos que discutiam com ele, diante de sua divina serenidade. E nunca perdia a razão. Dizer que se apaixonou à primeira vista era exagero: ela o viu entrar no prédio de sua advocacia como se estivesse em casa, cumprimentando desconhecidos sem condescendência. Tinha um bonito sorriso, o tipo que leva as pessoas a sorrirem juntos. O sorriso certo. Depois de ouvi-lo elogiar a gravata de seu cliente sem malícia, percebeu que ele também era o tipo certo de homem.
Divórcios eram complicados. Mas divórcios de casais ricos eram o inferno na Terra.
sempre fora boa em resolver tais casos, mas aquele em particular lhe dava só dor de cabeça. Ela não conseguia pensar bem diante de — não gostava daqueles olhos a encarando com tamanho interesse. O que era para ser resolvido em duas semanas, demorou três meses.
Quando finalmente entraram em um acordo, sentiu sua alma renovada. Nunca mais o veria — nunca mais se sentiria imponente diante dele. E o pensamento, no final, apenas trouxe para ela melancolia. Afinal, aquela montanha-russa de emoções era o máximo de aventura que vivia em anos.
Apenas percebeu que estava sozinha com ele na sala de reuniões após ter o ouvido pedir uma caneta emprestado.
era lindo. Tanto por dentro quanto por fora. havia feito seu dever de casa — embora tivesse clientes de alto escalão, o homem se dedicava a causas pró-bono durante todo ano desde que começara a trabalhar como advogado. Como, diante de um mercado tão inescrupuloso, ele conseguiu manter sua alma íntegra?
— Está aqui. — disse ela, entregando-o.
abriu sua agenda.
— Obrigado. Agora, queria pedir que me desse seu número.
levantou a sobrancelha em zombaria, mas seu coração quase saltou do peito.
— Você tem no meu cartão.
— Não o do trabalho. Quero o seu. — afirmou ele com um sorriso despretensioso.
, A Rabugenta, diria que não, que ainda estavam em um ambiente de trabalho e que sua atitude era antiprofissional, apesar de ter sido bem razoável em sua abordagem. Ela sabia que se dissesse que não queria, anuiria e seguiria seu caminho. No entanto, essa havia sido fisgada por aquele homem havia semanas. Não existia mais salvação.
— Por que não anota no celular? É mais fácil. — argumentou ela.
— Sou old school — disse apenas com um sorriso cheio de esperteza.
O primeiro encontro foi em um restaurante chinês. No segundo encontro, saíram para ver um filme da Marvel, como qualquer cidadão de bem. Deram amassos no carro. Passaram finais de semana em casa, assistindo a trilogia de O Senhor Dos Anéis. Combinaram de ver uma série juntos, embora se segurar para não continuar sozinho foi no mínimo tentador. Brigaram feio por uma besteira que, se alguém perguntasse hoje, eles nem se lembrariam muito bem. Jantaram com os sogros. Ajudaram um ao outro com o trabalho.
a pediu em casamento após dois anos de namoro em um restaurante chique, com direito a discurso ajoelhado em público. Casaram-se na igreja, apesar de não serem tão religiosos assim. Foram para uma região praiana na lua de mel usando o nome “recém-casados” no vidro de trás do carro.
Cinco anos mais tarde, quando começaram a planejar ter filhos, confirmou, então, que o amor era estupidamente brega. Mas se era tão gostoso, tão doce amar, valia a pena estar fora de moda.