All That Matters

Escrito por Bia J. | Revisado por Bella

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  Eu tinha medo dela. Quer dizer, não medo do tipo “ela vai me matar.” E, sim, medo da obsessão dela por mim. Aquela garota era muito estranha. Se vocês a conhecessem, concordariam comigo.
  - Oi, . – Ela sorriu, passando por mim. – Quer ajuda? Quer que eu carregue a sua mochila? Se você precisar de alguma coisa...
   é a pessoa mais estranha e chata da face da terra. E justo ela tem uma queda por mim. A vida, às vezes, é bem malvada.
   tem a mesma idade que eu. E, para piorar toda situação, ela é minha vizinha. Da para acreditar no meu azar? A menina usa roupas do século passado. Exagerei, mas ela não tem nenhum senso de moda. Sei que pareci gay, mas, cara... Ela usa blusa xadrez de manga cumprida, com todos os botões fechados, calça jeans, botas de cavalgar e duas tranças. E ela nem é do interior. Está vendo a situação? , fora usar roupas estranhas, é obcecada por mim. Desde bem... desde que eu a conheci. E isso foi há muito tempo. Conhecemo-nos a, sei lá, desde os quatro anos de idade. E desde dai, ela vive me perseguindo.
  Maldita garota.
  - Não, . Eu não preciso de você. – Eu respondi, rispidamente.
  Eu não gostava de trata-la mal. Eu sou legal, sabe? Mas o fato era que eu precisava. Eu tinha que a fazer parar de gostar de mim, pois eu nunca iria gostar dela do mesmo jeito. Nunca. Como meu pai sempre diz “Corte o mal pela raiz.”
  Era um lema que eu levaria para vida toda.
  Peguei meus livros apressadamente no armário e saí de lá quase correndo. Eu sabia que ela estava me seguindo, como sempre. Por isso desviei rapidamente e entrei no banheiro masculino. Eu me atrasaria para aula, mas dane-se. Eu estava nem aí, apenas queria manter distância daquela... Garota. Se é que eu poderia chamar ela assim.
  Eu esperava, do fundo do meu coração, que ela não estivesse me esperando lá fora. Porque se estivesse... Eu ia dar um piti.
  Eu sou um cara tranquilo. Ainda mais na minha idade – dezessete anos – Nunca arrumo confusão, não exagero na bebida, sou um bom aluno, dirijo devagar...
  Mas quando se trata de , bem, aí toda minha tranquilidade se esvai.
  Depois de cinco minutos, saí do banheiro. Olhei para os lados e os corredores já estavam vazios. Sem a vista. Suspirei aliviado. Quase desmaiei, de tanto alívio. O sinal já tinha tocado, ou seja, eu chegaria atrasado à aula do professor Franklin, mas eu tinha um excelente motivo...
  Eu andava tranquilamente, feliz da vida, até eu ouvir passos atrás de mim. E, claro, uma vozinha chata que eu conhecia muito bem...
  - Finalmente, ! Achei que tivesse morrido lá dentro. – Ela riu.
  Eu queria me matar. Se não estivéssemos no primeiro andar, com certeza eu sairia correndo e me jogaria da janela. Dei um sorriso totalmente forçado e tentei mostrar isso a ela, mas se ela percebeu não se importou.
  Foi aí que aconteceu a bizarrice sem tamanho. veio ao meu lado e entrelaçou seus dedos com o meu. Apenas uma palavra: ECA!
  Isso conta como uma palavra, certo? Enfim, continuando, aquilo foi totalmente estranho.
  Primeiro motivo: Foi estranho por que... Não foi estranho. E isso foi o mais estranho.
  Segundo motivo: Ela era , a garota mais estranha da escola. Tudo nela era esquisito.
  Terceiro motivo: Eu e estávamos andando de mãos dadas pela escola. TEM COISA MAIS ESTRANHA QUE ISSO?
  Certo, o primeiro motivo foi confuso, mas foi verdade. Nossas mãos se encaixaram perfeitamente, como se elas tivessem sido feitas para isso. E a mão dela era tão macia, não era suada, nem gelada, como de muitas pessoas, era bom. Era normal. Finalmente algo de normal daquela garota!
  É, ela tinha uma mão legal...
  Eu disse mesmo isso? E então a ideia de me jogar na janela chega de novo em minha mente...
  Só que o quarto motivo foi o mais esquisito de todos. Foi o que me deixou assustado. Quando demos as mãos, pareceu que uma corrente elétrica tivesse passado pelo meu corpo. E era assustadoramente bom.
  O que diabos aquilo significava?
  Tirei minha mão da dela, rapidamente. Antes que alguém visse. Ou antes que aquela sensação voltasse. Ela me olhou confusa e eu apenas me virei e caminhei (corri) de volta para sala. Sem dar satisfação nenhuma. Apenas virei e corri, o mais longe possível dela.

+++

  Intervalo. O segundo momento mais apreciado pelos estudantes, depois da hora da saída, claro. Eu estava ao lado de , meu melhor amigo, comendo meu sanduíche com pasta de amendoim.
  Eu estava bravo, pois tinha levado bronca do professor Franklin, na frente da turma toda. Uma verdadeira humilhação.
  - Why so serious? – Perguntou ele, rindo da minha cara.
  Olhei zangado para , fazendo o mesmo se calar. Eu e o éramos melhores desde que eu me entendo por gente. Sempre juntos. Principalmente em confusões. Eu disse que eu não arrumava briga, mas ...
   era o tipo de cara que não leva desaforo para casa e isso já diz muito sobre ele. Fala o que pensa, sem se importar com as consequências ou se isso pode machucar alguém. Mas ele era um cara legal. Era engraçado e sempre estava ao meu lado quando eu precisava.
  - Ih, não olha agora, mas a estranha está vindo para cá.
  Ignorei a parte do “não olha agora” e me virei para trás. Ela estava vindo mesmo. Gemi de frustração, me virando de frente de novo. Rezando para que ela passasse reto. Qualquer coisa, apenas não falasse comigo.
   tentava segurar a risada, enquanto eu o fuzilava com os olhos. Mas ele parou de rir assim que uma pessoa se juntou a nós.
  Preciso mesmo dizer quem era?
  Eu nunca fui muito popular. Eu não era nada popular, na verdade. Nunca tive minha cabeça enfiada em uma lata de lixo, mas também nunca tive o anuário todo assinado.
  Eu era um meio termo, era normal. Mas eu tinha pretensão de mudar de posição. Queria me tornar um deles. Um dos populares. E eu levaria junto nessa jornada comigo, claro.
  Só de pensar em sentar-se à mesa deles, como um deles, vestido como um deles, eu já me sentia totalmente feliz.
  - Oi, . – Ela sorriu largo. – Vim ver se você estava bem. Soube que levou bronca daquele professor idiota, quem ele pensa que é para falar com você ass... – Eu a interrompi.
  - É, eu estou bem. – Respondi, morto de vergonha por estar sendo visto conversando com a estranha em público.
  - Que bom. – Ela sorriu mais ainda. – Não suportaria te ver chateado. Ainda mais por minha culpa.
  - É. – Evitei olha-la.
  Silêncio. Na mesa, estava sentado eu, , Emma, Nancy, Hunter e Clary. Meus amigos estavam em silêncio, se entreolhando. Fiquei tenso. Olhei para , que estava ali ainda de pé em meu lado. Ela, meio hesitante, perguntou:
  - Posso sentar aqui?
  Oh, não.
  Ela não perguntou isso, certo?
  - Ér... eu... Hm... Não sei, hm...
  Eu queria dizer um belo de um não, mas ao olhar aqueles olhos grandes, brilhantes e suplicantes, como eu poderia?
  Porém, ela entendeu o recado. Assentiu lentamente, chateada, e caminhou para a única mesa vazia: a do lado da lata de lixo.
  Ok, era muita maldade. Olhei para meus amigos, ambos estavam suspirando aliviados, por ela ter ido embora. E eu pensei como eles podiam ser tão sangue frio. Ela podia ser um pé no saco às vezes, ok, sempre, mas...
  Ela era apenas uma garota. Uma garota sozinha.
  Não era culpa de ela ser estranha.
  Droga, eu odeio ser tão legal.
  - – Gritei.
  Só que acho que gritei alto demais, pois um monte de cabeças se virou em minha direção. De várias mesas. Inclusive a dos populares. Oh, merda. Tudo bem, tarde demais.
  Ela se virou, com os olhinhos tristes para mim. Certo, aquilo era golpe baixo.
  - Vem. Você pode sentar aqui. – Tentei sorrir.
  Todos da minha mesa me encaravam boquiabertos, inclusive . Eu não podia culpa-los, afinal, eu sempre reclamava de e logo depois eu a convidava para se sentar com a gente? Era loucura. Ela abriu um sorriso tão grande que me fez sentir um pouco melhor. Um pouco. Ela se sentou ao meu lado, toda feliz. Mas, assim que ela se sentou, todos os meus amigos se levantaram.
  - Aonde vão? – Perguntei chocado.
  - Dar um passeio. – Respondeu Emma, olhando torto para , que estava de cabeça abaixada.
  Todos concordaram e estava entre eles! ! Fiquei decepcionado, afinal, eu nunca o deixava na mão. Olhei para o lado e comia seu sanduíche, mas ela não parecia tão feliz quanto antes. Eu sei lá, não deveria ter perguntado, mas aquilo me afetou. Por que ela estava chateada?
  - O que foi? – Perguntei.
  - Nada. – Respondeu.
  Mas eu sabia que ela estava mentindo. Ela não puxou assunto, por incrível que pareça. Muito menos eu! Comi o resto do meu sanduíche, louco para sair dali e ir ao encontro dos meus amigos. Mas seria muito rude...
  Eu os avistei de longe. conversava com Nathan, o capitão do time de futebol. Os dois riam adoidados. Meus outros amigos também estavam ali, rindo da piada que parecia sensacional. Eu queria saber qual era a graça sem tamanho. Eu queria estar ali com eles. Deixei um suspiro triste escapar pelos meus lábios e voltei a encarar meu prato vazio. Só ai eu vi que me observava.
  Ela desviou seus olhos rapidamente dos meus, voltando a comer. Pude perceber que sua pele estava corada. Ela estava toda vermelha, o que me fez sorrir internamente. Ela ficava bonitinha assim. ficava bem de cabelo preso, isso mostrava seu rosto. Que era bem bonito por sinal, sem nenhum defeito. Mas seus olhos se destacavam. Aquele tipo de olhar que hipnotiza qualquer um. Até mesmo eu.
  - O que foi? – Ela perguntou, ruborizada.
  - Nada. – A imitei.
  Ela olhou para mim e deu um sorrisinho. Quase sorri com ele, mas me lembrei de o que estava acontecendo naquele momento. Meus amigos estavam com os populares e eu estava aqui, sozinho, conversando com ?
  - Eu vou indo. – Ela anunciou, se levantando. – Obrigada por... por hoje. Foi muito legal. – Ela deu mais um sorrisinho, mostrando suas pequenas covinhas. – Tchau, .
  Meio aliviado e desapontado, a respondi.
  - Tchau, .

  Última aula, graça a Deus. Quando eu estava saindo, fui parado bruscamente por . Ele me encarava sério. E eu fiquei irritado com isso. Eu sou quem devia estar bravo com ele, afinal, que me abandonou hoje.
  - Precisamos conversar, cara.
  Eu queria mandar ele para um lugar não tão legal assim. Mas me controlei. Odiava brigar com meus amigos, por mais que eles estivessem errados. Ás vezes, não valia a pena, sabe?
  - Pode falar, cara. – Bufei.
  - Certo, bem... Pode me explicar que porra foi aquela no intervalo?
  - Hãn?
  - Você sabe... O ridículo episódio com .
  Certo, eu tive que reprimir uma careta. E engolir um monte de ofensas. Por incrível que pareça, não gostei dele falando daquele jeito de . Ela era estranha, ninguém podia negar, mas... Ela era uma garota legal. No fundo, bem no fundo.
  - O que é que tem?
  - Você quase colocou tudo a perder! – Gritou, estupefato.
  - Cara, não exagera. – Revirei os olhos.
  - Não exagera? Porra, ! Estamos tentando deixar de sermos perdedores e para ajudar você anda com a menina mais perdedora da escola? Você tinha que ter visto a cara do Nathan... Mas por sorte eu e a galera conseguimos conversar com ele. Ele deixou a gente sentar com ele amanhã. Está acreditando? Vamos sentar com os populares e então vamos nos tornar um deles...
  Fiquei feliz. Era tudo que eu queria. Tornar-me popular. Olhei para , feliz da vida. Até tinha o perdoado por ser um babaca hoje mais cedo. Isso não importava, o que importava era que... EU IA DEIXAR DE SER UM PERDEDOR!
  Finalmente, finalmente...
  - Isso é maravilhoso! – Gritei.
  - É, mas... Bem, Nathan falou que tem uma condição.
  - Uma... espera, condição?
  - É, mas não é nada demais. A condição é você parar de falar com a . Nada demais, não?
  Fiquei quieto. Não deveria ser nada demais... Mas, em pensar nela toda sorridente, usando suas tranças, suas roupas ridículas, que, de alguma maneira estranha, ficava bem nela... Bem, sim, era demais.
  - É. – Sorri forçado. – Não é nada demais.
  E ele sorriu satisfeito com a resposta. Porém eu só conseguia pensar se eu estava fazendo a decisão certa.
  Ser popular é tudo que eu queria, não é? É tudo que importa para mim...
  Não é?

+++

  Quando eu estava voltando para casa, avistei . Ela estava em seu quintal, pintando a grade que cercava sua casa. Usava um macacão branco, uma blusa regata preta por dentro e seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo alto. Ela parecia concentrada no que estava fazendo, tanto que nem reparou em mim.
  Dei de ombros e entrei em minha casa, que dava de frente para dela. Dei um oi a minha mãe e subi para meu quarto. Tranquei-me lá como de costume e fiquei mexendo no meu computador por um tempo. Até que eu não resisti e dei uma espiadinha na janela. Sei lá porque, mas queria ver . Oh, céus...
  Ela não estava mais lá. E senti algo estranho dentro de mim, era decepção.
  Não, eu só podia estar ficando maluco. Doido da cabeça. Realmente, eu precisava dormir. Precisava relaxar. A pressão de me tornar alguém popular era de matar. Estava acabando comigo.
  Deitei na minha cama e, mesmo sendo de tarde, dormi. E aconteceu algo estranho. Quando eu fechei os olhos, ela ainda continuava lá, em meus pensamentos e em meus sonhos.

+++

  Eu olhava para os lados, freneticamente. Tentava todo custo evitar . Eu precisava cortar o mal pela raiz. Precisava me distanciar dela. Precisava acabar com seus sentimentos por mim. Para o bem dela. Para o bem de nós dois.
  Eu rezava baixinho para que ela não viesse falar comigo, pois se ela viesse... Bem, eu não teria outra saída se não ignora-la.
  E eu não queria fazer isso.
  Ela é uma garota, acima de tudo. E eu não gostava de magoar garotas, ela, em especial. , no final das contas, não era tão ruim quanto eu pensava.
  Avistei-a de longe, sozinha como sempre. Antes que ela me visse, adentrei em um corredor e subi as escadas correndo, mesmo sendo a direção oposta que eu deveria seguir. Eu tinha aula de física, agora.
  E então de súbito me lembrei de que era da minha turma. Realmente a sorte estava contra mim.
  O sinal tocou. Esperei cinco minutos e segui em direção à sala. Bati na porta, interrompendo a explicação do professor. Ele me olhou zangado, mas me deixou entrar.
  Olhei os lugares vagos na sala e só tinha um. E adivinhem aonde era? No lado de . Realmente, eu não mereço...
  Ela estava lá, toda concentrada na matéria, usando um óculos preto de grau. Sua armadura era grossa e em formato de quadrado. Tinha ficado legal nela.
  Sentei-me ao seu lado. Finalmente sua atenção foi dirigida a mim, ela sorriu bobamente e voltou ao que estava fazendo. Eu tinha ficado um pouco aliviado com a pouca demonstração de afeto, mas um pouquinho decepcionado também. O professor explicava algo totalmente chato. Eu nem prestava atenção, para ser sincero. Queria que a aula terminasse logo, mesmo eu sabendo que isso demoraria, afinal, tinha acabado de começar.
  - ... E é sobre isso que o trabalho vai ser. Como eu já disse, valerá dois pontos na média. É muita coisa. Por isso, se esforcem.
  Quê? Trabalho? Eu estava perdido. Olhei para e ela olhava para o professor, assentindo. Repetindo: Quê? Trabalho?
  - Sortear nomes demora muito, por isso vou usar um método mais simples. Vocês farão o trabalho com a pessoa que estiverem ao seu lado.
  Oh, não.
  Olhei para meu lado, bem devagar. E lá estava ela, sorrindo para mim. Como sempre.
  Repetindo: Oh, não...
  - Vamos ser parceiros, isso não é ótimo?
  Agradecendo baixinho a Deus por nem nenhum dos populares estarem nessa aula, murmurei para , contrariado.
  - Maravilhoso.

+++

  Eu estava parado em frente à casa dela, sem saber o que fazer. Batia na porta, gritava que eu tinha chegado ou tocava a campainha? Oh, pai do céu...
  O dia tinha passado rápido, mas algo me dizia que aquela tarde não passaria tão rapidamente assim... Depois da aula de física, nós combinamos de nos encontrarmos em sua casa, às quatro horas. Depois da aula eu não a vi mais. No intervalo, desapareceu, o que eu achei totalmente estranho. Ela em geral ficava sempre correndo atrás de mim, enchendo o saco. Mas hoje, não. Eu sentei-me à mesa de Nathan e com toda galera. Foi... Demais. As pessoas nos olhavam como se fossemos superiores e, cara, essa sensação não era certa, mas era boa. Muito boa...
  E, sim, eu disse “nós.” Agora eu também era uma pessoa popular. Também era um deles.
  Eu e não podíamos estar mais felizes. Nosso sonho finalmente estava se realizando. Finalmente estávamos nos tornando alguém importante, alguém de valor...
  Obvio que Nathan não realizou nossos pedidos porque pedimos com jeitinho. Ele fez isso porque devia um favor a nós (história longa, talvez um dia eu conte). Por isso estava fazendo aquilo por nós. Não que isso importasse, mas é sempre bom esclarecer.
  E cá estou eu, em frente à casa de . Meus amigos não sabiam que eu estava aqui, ninguém sabia... Apenas eu e ela.
  Toquei a merda da campainha. Passaram-se minutos e ninguém atendeu. Toquei de novo e não demorou muito para a porta se abriu. Meu queixo caiu até o chão.
   estava... Linda.
  É, linda.
  Juro, não estou brincando.
  Ela estava linda e normal. O que, convenhamos, era um feito e tanto.
  Usava seus cabelos longos e ondulados soltos, sem maquiagem alguma e seus olhos estavam mais brilhantes que o normal. Vestia uma blusa preta regata e um short jeans. Calçava sandálias pretas, combinando com a blusa. Estava simples, porém não deixando de estar linda. Por que ela não ia assim à escola? Por quê? Se ela soubesse como era bonita...
  Parei.
  - Desculpe, . Estava secando meu cabelo. Entre.
  - Sem problemas. – Falei, entrando.
  A casa era simples. Bem aconchegante. A sala era menor que a minha, com menos móveis e as coisas eram simples. O sofá era um pequeno cinza, de três lugares, havia uma televisão também, aquela do tipo dinossauro. Uma mesinha em baixo da grande janela de vidro com uma flor. Do outro lado tinha uma grande mesa de jantar e assim era a sala. Era simples, de verdade, mas era bacana.
   fez um sinal para eu segui-la. E foi isso que eu fiz. Subi as escadas, logo atrás dela. Ela abriu a última porta do corredor, que era seu quarto. O que dava bem de frente ao meu.
  Eu me surpreendi com sua aparência. O quarto era todo branco, com alguns enfeites roxos. Tinha também fotos espalhadas pela parede. A maioria eram dela com a família. Em cima de sua pequena cama, estava espalhados bichos de pelúcia. Sorri com isso. Ela tinha dezessete anos, mas ainda guardava bichos de pelúcia? Depois eu era o infantil.
  O quarto não era muito menininha, nem muito “lixão”. Era simples e delicado, assim como ela. Eu tinha gostado dele. Me sentei no chão, onde tinha um tapete peludo.
  - Pode sentar na cama, é melhor. – Disse ela.
  - Não, tudo bem, aqui está bom.
  Ela franziu o cenho, mas sorriu em seguida. Típico de . Pegou seu notebook e se sentou ao meu lado.
  - A cama não é melhor?
  - É – Ela deu de ombros. – Mas aqui no chão com você não fica tão ruim.
  Fiquei sem jeito. Ela estava me cantando? Não deveria ser eu quem deveria estar fazendo isso? Oh, merda... Ela me deixava totalmente confuso! Ela não estava constrangida, tão pouco estava ligando. Então tentei deixar isso para lá.
  A tarde foi melhor do que eu tinha imaginado. Percebi que não era assim tão estranha. Nem tão insuportavelmente chata. Ela era apenas diferente. E isso não era uma coisa ruim. Eu ainda tinha um pouco de medo dela, mas eu superaria.
  Descobri que o trabalho se tratava sobre o universo. Era um assunto até que legal. Eu pensei que fosse chato, mas quando começou a me explicar, eu fiquei fascinado.
  Ocorreu tudo bem, no final das contas, tínhamos até dado umas boas risadas. Fizemos uma pausa e ficamos contando piadas um para o outro. Ela ria das minhas piadas e eu ria das dela. era engraçada. E eu percebi que gostava de sua companhia. Era agradável e leve.
  Por volta de sete horas fui para casa. Nossa despedida foi meio embaraçosa. Eu não sabia se beijava sua bochecha ou se a abraçava. Acabamos apertando as mãos... Ridículo, eu sei.
  Entrei em casa e fui direto para meu quarto, depois desci para o jantar e subi de novo. Deitei em minha cama e assim que fechei meus olhos, a imagem dela continuava lá.
  Céus, o que estava acontecendo comigo?

+++

  Assim que cheguei à escola, Nathan parou em minha frente, me estendendo um casaco vermelho. O casaco do time.
  Puta merda.
  Olhei para ele de olhos arregalados. Ele estava me oferecendo isso mesmo? Peguei o casaco, ainda meio em choque. Nathan bateu de leve em minhas costas.
  - Bem vindo ao time.
  E então saiu de lá. Fiquei totalmente paralisado. Meu sonho estava se tornando realidade! Caralho!
  Ofeguei, ainda não acreditando. Olhei para frente e vi que vinha correndo em minha direção, o mesmo usava o casaco do time.
  - Finalmente, cara. Finalmente.
  Agora, oficialmente, fazíamos parte da elite. Eu estava super feliz. Não era todo dia que isso acontecia, no final das contas. Mas não pude deixar de lembrar o preço que eu teria que pagar por isso.
  Será que realmente valia a pena?

+++

  Que diabos eu estava pensando? É claro que valia a pena! Assim que entrei no refeitório, todas as pessoas olharam para mim. Não liguei, afinal, agora eu era um deles. Com meu casaco estiloso, fui desfilando até minha nova mesa. A mesa dos populares. Cara, era tão bom dizer isso!
  O dia se passou muito rápido, porém isso não quer dizer que ele não tenha sido ótimo. Várias meninas vieram falar comigo, o que era, sim, uma novidade. Pessoas me convidaram para uma festa e eu fiquei surpreso, quer dizer, tudo isso só em um dia? Em uma semana eu já teria fãs!
  Algumas pessoas dizem que não ligam para popularidade, mas eu acho isso a maior mentira, sabe? No fundo, todos querem ser reconhecidos, idolatrados e amados. “Eu odeio pessoas populares.” Bem, posso afirmar que o dono dessa frase é um perdedor.
  Muitos tendem a odiar os populares, mas eu te digo o real motivo: inveja.
  É, isso aí! I-n-v-e-j-a. Por que enquanto eles estão ficando com várias pessoas, a maioria da qual você tem uma queda, você está aí, em casa trancado no quarto, mexendo no computador. Ou seja, você é um bosta!
  E eu falo isso com todo direito e sinceridade, por que eu já fui um perdedor, já fui um bosta. Mas, agora, meu momento chegou. E ninguém vai tirar isso de mim. E se o preço disso tudo fosse eu parar de falar com ... Bem, então era isso que eu faria.

+++

  Os dias se passaram voando. Quando eu vi, tinha se passado um mês! estava desaparecida. Não que eu me importasse, claro, mas... Bem, eu não a via desde o dia do trabalho. O que será que tinha acontecido? Mas graças a Deus, estava ocupado demais para pensar nisso.
  Eu estava feliz, sabe? Agora eu era respeitado. Conhecido. Só que eu estava um pouco decepcionado e cansado. Aquela vida, por mais que fosse legal, era meio ativa demais. Você sempre tinha que estar feliz, mesmo se não estivesse. Toda vez que fosse convidado para uma festa, você tinha que ir, mesmo não estando afim. Se algum loser for falar com você, você tinha que ignora-lo ou humilha-lo.
  E eu estava decepcionado por que... Bem, porque eu consegui o que queria, mas percebi que não era tão bom como eu imaginava. Faltava algo, faltava alguém...
  Eu não gostava disso, sabe? Digo, dessa coisa de humilhação. Mas não podia falar nada. Mesmo que eu fosse popular agora, dentro deles eu era um calouro. Estava começando a fazer parte da turma. parecia estar nas nuvens. Não podia estar mais feliz. De verdade.
  Ele estava meio... Mudado, também. Quando eu o convidei para ir à minha casa jogar vídeo game, ele disse que isso era coisa de criança e falou que ia sair com seus amigos de verdade. Ele falou como se não fosse meu amigo. Como se eu fosse o loser e ele o popular. Mas ele esqueceu que eu também era popular.
  Mas, por mais que tentássemos, no fundo sempre seríamos perdedores.
  Eu sei que jogar vídeo-game é coisa de criança. Mas sempre fazíamos isso. Não ligando se isso era ser criança ou não. Nós gostávamos então pronto, porra.
  Eu estava chateado. Odiava admitir isso.
  Várias meninas lindas e gostosas me cercaram no recreio perguntando se eu queria sair com elas amanhã, mas a única coisa que eu fiz foi olhar para a mesa que costumava se sentar. Mas ela estava vazia.
  Onde, diabos, se meteu?
  E por que eu me importava tanto?

+++

  Mais uma semana se passou. Eu estava na aula de matemática. E não basta ser só isso, era uma aula dupla de matemática. Eu queria me matar. O professor explicava algo que para mim era a mesma coisa que nada. Eu não estava a fim de prestar atenção e nem que quisesse, eu conseguiria. Aquela porra era impossível.
  Olhei para a primeira fila e lá estava . A nerd da classe. Mas ela era uma nerd bem feroz, ninguém mexia com ela. Não, ela não batia nas pessoas que enchiam seu saco. Ela fazia pior. Ela simplesmente humilhava com as palavras. sabia usar as palavras como ninguém. Era realmente um dom.
  Fui até ela, assim que as duas aulas tinham terminado.
  - Oi, . – Cumprimentei-a.
  - Certo, o que quer, ? Não estou com paciência hoje.
  - Eu queria lhe fazer uma pergunta...
  - Então está esperando o quê? Faça logo, . O tempo é algo precioso.
  Assenti e hesitei. O que ela acharia quando eu fizesse a pergunta? Riria? Espalharia para a escola? Não, ela era , a perdedora das perdedoras. Mas uma perdedora temida, ninguém podia negar.
  - Bem, eu queria saber por que...
  Eu não precisei terminar. Ela sabia o que eu queria saber. Ela tinha esse outro dom. Parecia mais avançada que as outras pessoas, sei lá.
  - . Você quer saber sobre , não é mesmo?
  Olhei para os lados para ver se ninguém estava prestando atenção. Assenti.
  - Olha, , eu não sei se seria certo te contar, mas...
  - Por favor, eu estou... preocupado.
   suspirou fundo, dramaticamente.
  - Sabe que ela gosta de você, não sabe?
  E tinha como não saber? Eu assenti.
  - Ah, . está passando pela pior fase da sua vida. Você não soube de nada mesmo? Vocês são vizinhos! Em todo caso, eu vou te contar. A mãe de estava mal há um tempo, . Só que ela piorou e então não resistiu. Eu não sei o que ela teve, ninguém sabe. Acho que foi uma virose forte, não sei te dizer. Ela morreu há um mês. está se recuperando agora.
  Eu estava em choque. ...
  - Mas a casa dela está vazia!
  - Eu sei, ela foi passar um tempo na casa da tia, para se recuperar. Eu falei com ela esses dias, ela volta ainda essa semana. é forte, . Já está quase recuperada. É claro ainda vai doer. Vai doer por um bom tempo, mas ela não vai demostrar. Ela vai fingir que está tudo bem, mesmo sendo a última coisa que esteja.
  Por que eu sentia que meu coração estava pesado? Por que só de imaginar triste, instantaneamente, eu fiquei triste? Por que eu estava sentindo tanto sua falta?
   ainda me observava, com uma sobrancelha arqueada.
  - Oh, meu Deus.
  - O que foi?
  - Você está apaixonado.
  - O que? - Dei um grito. – Eu? Euzinho? Você só pode estar louca!
  - Oh meu Deus. – Ela repetiu, sorrindo. – Você está muito apaixonado.
  - Você é louca, . Eu não estou apaixonado. Nem um pouco, se quer saber. Nem perto disso!
  - Garotos, porque são sempre idiotas? - Ela falava consigo mesma. – Isso, , continue repetindo isso tentando convencer a si mesmo, sabendo que é mentira. Uma mulher muito sábia uma vez disse: Se resolver ir embora, a porta está aberta. Não te prendo e nem te imploro. Mas se quiser voltar, meu bem, talvez eu já tenha trocado a fechadura. Bom dia.
  E então se virou e foi embora.
  O que essa merda dessa frase tinha a ver com o assunto?
  Oh, eu sabia tanto quanto ela. Eu não tinha falado que era assim? Vacilou, perdeu. Simples assim.
  Eu tinha falado com ela porque, bem, ela era a única amiga de . Única.
  Fui em direção ao refeitório e estava tão distraído que quando vi, meus pés tinham me levado para a mesa vazia que costumava a se sentar.
  “Você está muito apaixonado.”
  Senti minhas mãos tremerem. Que merda estava acontecendo comigo? Será que eu estava mesmo apaixonado? Fala sério, isso não podia acontecer comigo! A merda do amor estraga tudo. Vi de relance na fila da cantina, fui atrás dela novamente, ignorando os olhares dos meus “amigos” na mesa.
  - . – A chamei.
  Ela se virou para mim nada surpresa, na verdade, parecia que ela sabia que eu voltaria a importuna-la.
  - Eu tenho uma pergunta...
  - Novidade, huh?
  - É sério. – Minha voz falhou.
  - Fala, .
  - Eu... Eu não sei o que está acontecendo comigo. Eu... eu sinto a falta dela, sabe? E pensava que eu a queria longe, mas quando isso aconteceu... eu senti que quando ela se afastou levou parte de mim junto com ela. Eu não sei, não sei mais de nada.
  - Você está se sentindo estranhamente feliz e sorrindo que nem um bobo por aí, ? - Assenti. - Bem, das duas a uma: Ou você está apaixonado, ou você está louco. Mas, no fundo, não faz muita diferença.
  E então pegou sua bandeja e saiu andando, me deixando sozinho novamente. Suspirei mais confuso ainda e fui até minha mesa. Quando sentei, todos me olhavam sérios.
  Nathan me fuzilou com os olhos.
  - Espero que você o quer que você estivesse falando com ela se referisse ao dever de casa, nada mais.
  - E era isso mesmo, estou ferrado em matemática, sabe? - Menti.
  Olhei para , mas ele fazia tudo, menos olhar para mim. Queria deixar claro para todos que não tinha nada a ver com isso. Deixei uma risada sem humor escapar pelos meus lábios, belo amigo eu tinha.
  Nota mental: reavaliar minhas amizades.
  Eles continuaram a conversar, fingindo que nada tinha acontecido. Suspirei, pesadamente.
  Aquilo era ser popular? Olhei para Alex, que tinha falado mal de Nathan para mim ontem mesmo, e agora ele ria e falava que o mesmo era seu melhor amigo. Do outro lado da mesa estava Holly. Ela me contou todos os segredos de sua melhor amiga para mim, todos mesmo. E ainda a chamou de vaca. E agora estava rindo com ela, como se nunca tivesse falado mal da mesma.
  Todos ali falavam mal de todo mundo pelas costas. Até deles mesmos. Era muita falsidade. E do nada meus olhos se desviaram para a mesa de , ela estava com algumas pessoas e todos riam e conversavam juntos. E eu desejei estar com eles. Qual era a merda do meu problema, afinal? Eu tinha conseguido ser popular! Estava andando com a melhor turma de todas! Mas do que tudo isso adiantava se eu não estava feliz?
  Nada.
  Desejei que o dia terminasse rapidamente.

+++

  O dia seguinte estava sendo um pouco melhor, afinal, eu ainda não tinha esbarrado com nenhum dos meus “amigos”.
  Eu estava na aula de física, desligado e longe, como sempre, até que ouvi uma coisa que me despertou rapidamente.
  - Podem me entregar os trabalhos, turma.
  Ih, merda. Abri minha mochila desesperado, mas não estava lá. O trabalho estava com . Oh não... Eu precisava daqueles pontos extras!
  Estava incrivelmente fudido. Adeus, computador. Adeus, iphone. Adeus, vida.
  A porta foi aberta com violência, me fazendo sobressaltar. Eu estava pouco ligando para quem era, foi o que eu pensava, até ouvir uma voz tão doce quanto mel.
  Certo, isso foi meio gay.
  - Desculpe o atraso, professor.
  Ela usava o cabelo solto, dessa vez. Calça jeans e uma blusa branca com uma frase profunda “Do the best you know: be yourself.” E parecia exausta. Quem a visse, pensaria que ela está a mesma. Que estava tudo bem. Só que eu vi em seus olhos que não, não estava tudo bem. Ela ainda estava sofrendo pela morte da mãe, mas parecia controlar melhor seus sentimentos quanto a isso.
  Eu queria abraça-la e dizer que tudo ficaria bem. Queria sussurrar frases clichês em seu ouvido e beija-la...
  Oh, merda! Merda, merda, merda e mais merda.
  Quem eu queria enganar? Todo esse tempo... Todo esse tempo eu achava que era ela quem me admirava, mas eu estava errado. Era eu quem a admirava.
  Eu admirava sua personalidade única. Eu gostava dela, eu sempre gostei dela. Mas não admiti isso por medo. Medo do que pensariam de mim. Medo de manchar minha reputação.
  Minha mãe diria: E você lá tem reputação, menino?
  E então riria de mim. Era sempre assim.
  Foi naquele momento, aquele mesmo momento que nossos olhares se encontraram que eu soube.
  Eu estava apaixonado por .

  Só por ela ser uma boa aluna, ele a deixou entrar. Ela correu para a carteira ao meu lado e tirou da mochila nosso trabalho sobre o espaço. Sobre o universo.
  Sorriu para mim e percebi que seu brilho nos olhos voltou. Sentia-me feliz por isso. Retribui o sorriso, com carinho.
  Só isso pareceu ter feito seu dia ter valido a pena.
  - Pensei que faltaria.
  - Era bem tentador esse pensamento, admito. Mas sabia que você precisava desses pontos extras, não faria isso com você.
  Meu sorriso está do tamanho do mundo.
  - Obrigado, .
  - Por... ? - Ela perguntou, sorrindo.
  - Por tudo. Por você ter aparecido na minha vida.
  Eu não sabia da onde tinha saído aquele romantismo todo. Mas estava feliz por ele ter aparecido. não disse nada, apenas ficou me encarando, boquiaberta. Eu ri e baguncei seus cabelos.
  E ela ficou ainda mais em choque.
  - e . – O professor chamou.
  Vi que não ia falar nada, por isso peguei o trabalho gentilmente de sua mão e entreguei ao professor. Ele sorriu e voltou a pegar os outros trabalhos.
  - Soube da sua mãe, meus pêsames, .
  Ela se recuperou do choque.
  - Obrigada, .
  - Qualquer coisa, eu estou aqui, tá?
  Eu não sabia como agir nessas situações. Por isso estava um pouco constrangido, mas ela achou isso fofo, pois sorriu e me abraçou.
  Foi a minha vez de ficar em choque.
  O abraço de era tão bom. Eu tive vontade de ficar abraçada a ela para sempre. Deixei um sorriso bobo escapar do meu rosto e a apertei mais forte.
  Porém o professor pigarreou, chamando nossa atenção.
  Separamo-nos, ambos corados. Só que eu tinha que admitir... Eu não estava nem aí.
  Pela primeira vez, eu não estava ligando para o que as pessoas estavam pensando sobre mim.

+++

  Depois eu tive aula de literatura. Eu até que gostava dessa aula. , ao meu lado, parecia inquieto. Senti meu celular vibrar. O peguei, vendo a mensagem do mesmo.
  “Pode me explicar que merda é essa?”
  E em baixo tinha uma foto minha e da na aula de física nos abraçando.
  “O que é que tem?”
  “Você é mesmo um otário, . Tem sorte de eu ter feito o dono da foto ter apagado ela. A única coisa que você tinha que fazer é ficar longe dela, merda. Será que é assim tão difícil?”
  “Relaxa.”
  “Vai tomar no cú, . Não vou relaxar merda nenhuma. Minha popularidade está em jogo por sua causa.”
  “A mãe dela morreu, idiota. Eu apenas estava dando meus pêsames.”
– Menti.
  “Espero que seja isso mesmo, . Eu não vou voltar a ser um perdedor de merda por sua culpa.”
  “Sabe, , eu preferia você sendo um perdedor de merda do que esse popular filho da puta que você está sendo.”
  “Cala a boca, não sabe o que está falando.”
  “E você sabe? Anda sendo um belo de um idiota ultimamente.”
  “Apenas cansei de não ser um ninguém ok? E isso não vai voltar acontecer só porque você está apaixonado pela estranha.”
  “Ela não é estranha, ela é única. Tem uma grande diferença.”
  “Cara, que merda está acontecendo com você?”
  “Nunca viu um homem apaixonado, ?”

  E, depois disso, ele não enviou mais nenhuma resposta.

+++

  No intervalo, eu procurava por , mas não a achava de jeito nenhum, chateado, fui até a mesa que costumo sentar.
   olhava para seu prato, com um misto de arrependimento e culpa. Quando eu ia abrir a boca para pedir desculpas, mesmo não tendo culpa alguma, fui interrompido por uma voz grossa e conhecida.
  - Achei que tivesse nos abandonado.
  Nathan sorria, mas sem humor algum
  - Não sei do que está falando, cara. – Respondi.
  - É claro que não.
  Ele continuou a me encarar, agora sério. Mas começou a fazer perguntas para ele, desviando sua atenção.
  Estranhei aquele comportamento e voltei a encarar a entrada do refeitório. Logo ela entrou com ao seu alcance, as duas riam e conversavam.
  Foi ai que ela me notou.
  Ela sorriu e veio em minha direção, mas quando viu onde eu estava, hesitou.
  Eu sorri um pouco mais. Garantindo que eu queria sua visita.
  Ela sorriu um pouco tranquila, trocou palavras com e veio em minha direção, sorridente.
  - Alerta: estranha vindo. –Holly disse gargalhando, me fazendo fechar a cara.
   engoliu em seco e voltou a encarar seu prato. Por que ele estava tão estranho? Nathan abriu um sorriso malicioso, me fazendo engolir em seco.
  - Ora, ora... . – Nathan anunciou, quando ela já estava perto o suficiente para ouvir. – A que devemos a honra da visita?
  Ela hesitou, mas logo se aproximou de mim e o respondeu, firme.
  - Vim falar com .
  - Oh, você então é a menina que ele não para de falar?
  - Hm... Como assim?
  Ele gargalhou. – Agora entendo o que dizia, , ela parece mesmo uma boneca de porcelana. Agora entendo o por que da comparação de brinquedo. No duplo sentido, claro.
  - Não estou entendendo. – Ela disse.
  - Querida – Ashley interrompeu. – O que ia dizer a mesmo?
  - Queria saber se ele... se ele não quer voltar para casa comigo.
  - Mulher forte, gosto disso. Tem iniciativa. – Nathan falou. – Mas, bonitinha, o que você tem nessa sua cabecinha para pensar que um de nós iria sair com gente como você?
  - Gente como eu? O que quer dizer com isso?
  - Você é tão estranha quanto uma pessoa com seis dedos. Até mais. Qual é, . Você nem ao menos é bonita. Achou mesmo que sentia algo por você? Foi tudo fingimento.
  - Ele está mentindo. – Minha voz saiu desesperada. – Eu juro por Deus, .
  - Agora quer pular fora do barco, é, ? O que me diz desse vídeo?
  E então ele apertou o play. Era agora que a merda ia começar a feder.
  O vídeo tinha acontecido ainda na primeira semana que eu comecei a andar com eles. Eu estava bêbado, afinal, era a primeira festa de verdade que eu ia. Eu estava muito bêbado, então Nathan começou a fazer perguntas toscas.
  - Você gosta de andar com a gente, cara?
  - Ser popular é tudo de bom. –Falei, enrolado.
  - Agora você não é mais um perdedor, graças a mim. De nada.
  Eu ri. – Obrigada, eu te amo, Nathan.
  - É, agora você não tem mais aquela garota no seu pé... qual é o nome dela mesmo?
  - . – Eu gargalhei. – Ela é a pessoa mais bizarra da face da terra.
  - Você ficaria com ela, ?
  - Nem em um milhão de anos! Aposto que o único cara que ela beijou foi o pai! E ela parece um verdadeiro carrapato, não saí do meu pé. Um verdadeiro grude. Eu tenho vergonha dela. Eu sinto vergonha por ela.
  Nathan riu e voltou a olhar para câmera.
  - Confissões de um bêbado.
  E então o vídeo acabou.
  Todos na mesa estavam em silêncio. Eu sentia meu coração bater violentamente em meu peito. Eu queria gritar, queria matar Nathan, queria falar à que eu estava bêbado, que aquilo não era realmente como eu me sentia. Mas eu estava petrificado.
  Olhei para e seus olhos se encheram de lágrimas. Não, por favor, não. Meu coração se partiu. Ver chorar era demais para mim.
  - Está chorando, é, bebê? - Nathan continuou a provoca-la. – Vai correr para a mamãe? Ah, é, sua mãe morreu.
  Julie soluçou e saiu correndo. Vi ela sair dali com o coração na boca, ainda não acreditando que aquilo tinha acontecido realmente. Nathan parecia satisfeito consigo mesmo. E eu só sentia nojo. Nojo por um dia querer ser como eles. Olhei para , e entendi o porquê dele estar calado.
  Ele tinha é que contado para Nathan sobre eu e . Sobre sua mãe.
  - Assim é melhor. – Nathan disse.
  - Seu filho da puta! – Gritei. – Cala a boca, cala a merda da boca! Você tem noção da bosta que disse? Da merda que falou? Ela perdeu a mãe e você me diz aquilo? Será que você não tem nenhum sentimento, seu bosta?
  Nathan se levantou totalmente bravo.
  - Repete, .
  - Você – cuspi. – é um filho da puta. É um otário de merda que só liga pra si mesmo e eu espero que você vá para o inferno.
  Não demorou muito para Nathan partir para cima de mim. Só que eu estava tão puto, tão puto, que uma força sobrenatural apareceu em mim. Peguei ele pela gola da camisa e acertei um soco em seu nariz. Ouvi um barulho e não soube se tinha o deslocado ou apenas quebrado.
  Fiquei satisfeito com as duas opções. Ele caiu no chão, choramingando que eu tinha quebrado seu nariz.
  Era um merda mesmo.
   me olhava com uma culpa enorme em seus olhos. Mas eu não queria saber dele. Eu só queria saber de . Saí correndo de lá, saltando o portão que dava para o estacionamento. Vi que sua bicicleta não estava mais lá. Não...
  Justo hoje eu tinha ido a pé, sério, o azar me ama! Até eu chegar em casa a pé, vai demorar um ano. Droga, droga, droga...
  Passei as mãos pelo cabelo desesperado, até que senti alguém me chamar.
  - Ei, cara, toma.
  Era , ele segurava algo semelhante a um chaveiro. Espera, era uma chave... A chave de seu carro. Minha boca caiu até o chão. Porque puta merda, nunca, jamais, emprestou seu carro para ninguém. Nem para seus pais. Olhei para ele com os olhos arregalados.
  - Sou um idiota, né? Eu estraguei tudo, . Fui um babaca e admito isso. Deixei a fama subir minha cabeça. Agora vai atrás da sua garota. E espero que possamos continuar amigos depois disso.
  É, era uma possibilidade. Sorri para ele e corri para seu carro, entrando nele e acelerando para sair o mais rápido dali.
  E enquanto me afastava, vi pelo retrovisor que ainda continuava ali, me observando ir embora. E percebi que já o tinha perdoado.

+++

  Parei em frente às nossas casas, deixando o carro de na calçada da minha casa, e correndo para a dela, que era em frente a minha.
  Bati em sua porta, mas ela não atendia. Olhei para cima e vi que tinha uma árvore que dava para sua sacada. Subi nela, um pouco com dificuldade. Eu nunca fui muito atlético, sabe? Depois de muito esforço, consegui. A janela estava aberta e estava em sua cama, chorando alto. Entrei no quarto e ela nem percebeu.
  Fui até ela e me sentei ao seu lado.
  Quando ela me viu ali, deu um berro muito alto. Fazendo-me cair no chão e bater a cabeça no móvel dela. Murmurei de dor e vi que eu tinha cortado a cabeça. Ah, ótimo. Mamãe vai me matar.
  - O que você está fazendo aqui? - Gritou, furiosa.
  - Tudo foi um grande mal entendido.
  - Saia daqui, . Antes que eu chame a policia!
  - Não vou sair, ok? Não mesmo! Caralho, , você me enlouquece, sabia? Eu estou louco! Louco por você. Sim, eu te achava estranha. Mas logo percebi que isso não é algo ruim, não é, entende? É uma coisa boa. Pelo menos para mim, eu sempre liguei para que os outros pensam sobre mim. Sempre liguei para popularidade e para reputação. Mas, assim que consegui tudo que queria, percebi que... que não era tão legal assim. Percebi que não era aquilo que eu queria. Não era o que importava.
   agora me observava e, mesmo com os olhos vermelhos e a cara inchada, não consegui imaginar uma menina mais linda que ela.
  - Você é única, . E eu estou apaixonado por você. E isso me assusta, ok? Me assusta pra caralho. Eu nunca me senti assim em relação à ninguém. Ai você aparece e bagunça tudo. Isso é novo para mim, então me desculpa, eu faço besteiras. Faço o tempo inteiro! Mas eu sou assim, todo errado. E já quero esclarecer isso aqui. Eu não sou perfeito como você pensa, . Sou o oposto, para falar a verdade. Mas eu posso te garantir: eu nunca quis magoa-la.
  - Então por que não fez nada quando seus amigos idiotas falaram comigo daquele jeito? Então por que disse que nunca ficaria comigo? Por que disse todas aquelas coisas horríveis?
  - Porque eu sou um idiota. E porque eu estava com medo. Porque eu não quero sentir essas coisas, entende? Eu sempre gostei de estar no controle, mas então quando estou com você... tudo simplesmente sai do controle. Você é imprevisível, . Muito imprevisível. Você é louca, estranha, tem gostos bizarros por roupas bizarras, usa sempre o cabelo preso sendo que ele é lindo solto, é uma nerd sem limites, mas é justamente por causa dessas coisas que eu gosto de você. Eu conheço seus defeitos, tanto quanto as qualidades. E eu amo ambas. E eu lembro que você me contava sobre o universo, e descobri que meu universo é você.
  Seus olhos estavam cheios de lágrimas.
  - Sabe, eu sempre sonhei em ouvir isso...
  - Então você me perdoa por ser um idiota?
  Ela deu um sorrisinho.
  - Desde o momento que você se deu o trabalho de escalar até aqui, você já estava perdoado, .
  - Ah... – Disse, um pouco vermelho.
  - Não precisa ficar vermelho, eu amei ouvir essas palavras saindo da sua boca.
  - Mas e você? - Perguntei, nervoso. – Não vai dizer nada?
  - O que posso dizer? Meu coração é seu desde a primeira vez que te vi. E sempre deixei isso claro.
  - É, isso é verdade. – Ri.
  - Eu amo você, . Com todo meu coração.
  Olhei para ela, encantado. era tão... perfeita. Ela era toda errada e era isso para mim que a tornava perfeita e única. E não posso deixar de ressaltar o minha. Eu tinha tentado não me apaixonar por ela, mas, no final, eu não consegui resistir a aqueles olhos grandes castanhos brilhantes hipnotizantes. Acho que ninguém com o juízo perfeito conseguiria.
  - Eu também amo você, . Desculpe por só perceber isso agora.
  Ela me abraçou forte. – Antes tarde do que nunca.
  - É, antes tarde do que nunca. – Repeti, colando nossas testas.
  - E agora? - perguntou. – O que a gente faz?
  - A gente faz o que deveríamos ter feito desde início. – Sorri. – A gente se beija e se ama até o fim.
  Juntei meus lábios com o dela e foi como se o mundo tivesse parado. Foi como se finalmente eu estivesse no lugar certo, fazendo a coisa certa. Tudo tinha se encaixado. Juntei mais meu corpo com o dela, e ela deu passagem para língua. Seu lábio era macio e quente. Seu beijo era mágico. O quebrei com dois selinhos, mas não a soltei.
  Ela agora sorria, mas não de lado como antes. Agora ela sorria de verdade. E eu me senti aliviado por isso. Na verdade, me senti feliz.
  - O mundo fica melhor quando você sorri. – Confessei.
  E ela deu um sorriso que fez meu coração pular. Beijou-me de novo, dessa vez mais rápido, menos delicado, mas, ainda assim, cheio de amor.
  As pessoas sempre me perguntavam “O que é importante para você?” E eu nunca sabia responder essa pergunta. Mas agora eu sei... Agora eu sei.
  Ela é tudo que importa para mim.

FIM



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