A Blusa

Escrito por Stelah | Revisado por Rebecca

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  Eu realmente estava com frio, ou seria difícil confessar. Podia estar tremendo, já rangendo os dentes, sussurrando ao meu calafrio o quanto daria por uma blusa.

  Ele viu a oportunidade, estava sempre ali como uma maldita águia. Os olhos se puseram a abrir, sua postura ficou ereta e a boca se abriu um pouquinho mostrando alguns dentes, talvez nem tão brancos, como quem tem uma boa e até maliciosa ideia - era apenas uma blusa.

  Secou-me com seus pequenos olhos castanhos e demorou alguns segundos para me oferecer a blusa azul marinho que vestia, já colocando os dedos debaixo dela para tirá-la.

  E eu, confirmando a má fama de orgulhosa, já com certo orgulho disso, neguei a oferta baixinho com o frio que cortava as minhas palavras. Mas o ser mais orgulhoso entre nós estava ali, diante dos meus olhos, sentado no banco numa posição de controle na tentativa falha de controlar minha resposta com um puxão em minha cintura, fazendo com que nossos corpos trombassem de forma estranha e desconfortável.

  Neguei, outra vez. Seus olhos mudaram, voltaram a se fechar em desinteresse, meu orgulho ferira o seu. Seu corpo também mudara, da posição de controle passou a encostar um dos ombros no pilar, como se os pensamentos passassem a pesar.

  Fora em vão, deixar a mim assim de forma tão clara seu desejo de me proteger, seu desejo de me possuir. E embora eu saiba que soe tolo – ainda é só uma blusa - a necessidade por trás do ato de se mostrar meu dono para quem quer que visse a nós, como se vestir sua veste fosse uma etiqueta para o que nós tínhamos e buscávamos esconder – um sentimento tolo, vergonhoso, inconsequente cujo não sei denominar - ainda me é tocável, mesmo que só na superfície.

  Senti tua raiva, decepção, pareceu se calar ainda mais. Então me veio uma pena – ou seria o frio trazendo arrependimento? Sentei ao seu lado, esfregando nossas pernas de forma não intencional como quem tenta agradar em vão.

  - Você tem certeza? - Ele perguntou, fazendo um esforço visível de parecer gentil e incansável. Mas eu já tinha certeza, uma certeza que ninguém podia anular, tão menos ele que eu queria tanto não dar o braço a torcer.

  - Tenho. – Respondi com um sorriso fechado, tentando manter um “obrigada” preso dentro da minha boca.

  Trocamos algum tipo de olhar forte, daqueles em que se enxerga até a alma e ele deslizou seus dedos curtos e gordinhos em minha perna que quando apoiados deram-me um singelo apertão. Sede contida de quem espera a muito tempo, toque incerto de quem faz escondido às claras, quando quem se teme é seu próprio sentimento e sua falta de limites.

  Pensei quão bom seria beijá-lo naquele instante e em como isso nos libertaria. Mas não o fiz, nem o faria até depois de muito tempo. Belisquei sua barriga e encostei minha cabeça em seu ombro, era aquilo só. E aquilo só seria.

FIM



Comentários da autora

Me prendo em memórias, ás vezes boas, outrora ruins. Dou valor a pequenos gestos, ainda mais se vindos de ti. Por quê?