5:19 in Paris

Escrito por Hanna Lessa | Revisado por Paulinha

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  Paris. Inverno. Aquela época do ano em que tudo é simplesmente frio, um pouco longe de qualquer data festiva... Uma nevasca terrível se aproximando do nosso protagonista, mas para ele, essa é só mais uma curta aventura que se passava a algumas quadras da antiga estação de trem da cidade...
   levava em seus braços a cadelinha Sky, a filhote de husky com apenas dois meses para brincar com a irmã, Smirnoff, cuja dona morava apenas a algumas quadras de distância da casa do jovem adulto. Oito quadras congelantes e cheias de neve. Talvez ir a pé não fosse a melhor ideia que ele tivera desde que se mudara para a cidade das luzes. Pelo menos ele tinha .
   era a salvação de . Eles se conheceram em um evento, o qual ele produzira... O primeiro na França, para falar a verdade. Ele trabalhava naquela empresa já fazia alguns meses, era tão bom, que logo foi transferido para a central, não em um cargo tão bom quanto o de antes, mas o suficiente para fazê-lo sair do conforto da casa dos pais. Era um desfile de moda, e ele não sabia nenhuma palavra em francês, não tinha nem ideia como tinha organizado o evento, para falar a verdade. Ele estava na porta e não conseguia se comunicar com o estilista irritado, ela chegou e resolveu o problema, traduzindo tudo. A garota que veio de Boston para ser jornalista tinha caído do céu naquele momento, e, desde então, continuou ao lado do garoto de olhos para o que quer que fosse. Ele ainda se lembrava dos detalhes daquela noite, até mesmo da presilha azul que ela usava no cabelo...
  O dono do filhote de huski tocou o interfone do prédio da esquina. Desejando baixinho que entrasse logo, com sorte, o porteiro rapidamente ouviu a campainha e o deixou entrar. O prédio baixo e antigo não tinha elevador, mas não era problema nenhum subir apenas dois lances de escada. Parou na porta do apartamento de e bateu na porta várias vezes. Em parte porque estava com frio e em parte porque adorava irritá-la. Logo a porta foi aberta por uma garota com o cabelo enrolado em uma toalha.

  -Você é muito irritante, sabia? - ela falou em um fôlego só.
  - Eu sei. - ele sorriu maroto, enquanto entrava, tirava o gorro, o casaco e largava Sky no chão, a garota fechava a porta atrás dele. Era estranho, mas mesmo com a toalha na cabeça, ele a achava bonita, talvez única.
  - Smirnoff mordeu um sapato meu ontem. - ela constatou enquanto ele se dirigia à sala, observando Sky se juntar a Smirnoff no sofá. - Mas não consegui ficar brava com ela...
  - Pelo menos foi um sapato, Sky destruiu as almofadas do meu sofá de veludo... Mas eu ainda sou apaixonado por ela. - eles riram juntos sentando-se no sofá. Ele sabia que o amor por cachorros dele não era menos que o dela.
  - Você está adiantado, são 5h:19mins, você disse que viria às 6 horas...
  - A nevasca já estava começando a ficar forte. - ele explicou - Resolvi vir antes que ficasse pior.

   apenas se deu conta de suas palavras, depois que viu que era tarde demais, quando o rosto da garota a sua frente entristeceu rapidamente. Ela tinha lhe dito alguns meses antes que o motivo de se mudar para Paris era o acidente de carro em uma nevasca, três anos atrás. Como ele poderia ser tão insensível?

  - Desculpe, eu... - "Não sei o que dizer, sou um idiota.", pensou.
  - Tudo bem, eu tenho que superar isso logo... - e sorriu fraco.
  Tentando mudar de assunto e querendo preencher o ar com algo mais que o noticiário da televisão ele diz:
  - Então, o que faremos de jantar hoje?
  - Eu comprei salmão e vinho, já que essa semana faz um ano que nos conhecemos. - ela respondeu em um tom animado e o seu melhor sorriso.
  - Já estou com fome.
  - Ótimo, eu começo agora, comemos cedo e depois assistiremos O Diário de Uma Paixão. - ela riu e dirigiu-se para a cozinha.

  Ele sabia o quanto ela gostava do filme, mas também sabia quantas vezes tinha visto o filme com a sua mãe... Era deprimente saber que ele tinha chorado todas as vezes que tinha visto aquelas cenas finais, mas ele nunca contara para , sentia-se arrependido por ter assistido tantas vezes, mas não podia negar que a história era bonita.
  O homem de olhos relaxou no sofá, enquanto a garota fazia a refeição. Pegou o controle e trocou de canal algumas vezes. Um documentário sobre conchas, um teleférico que tinha parado e funcionar, uma matéria sci-fi sobre como transformar um abajur em um instrumento de defesa contra o apocalipse zumbi... Tudo em um francês, quase incompreensível... Ele sabia o básico, o suficiente para o trabalho, e nada mais. Diferentemente de .
  Ela sabia tudo, sobre todos assuntos. Mas isso não era nada, ela era uma das principais jornalistas de economia da cidade, mas todos que a conheciam, sabia que a verdadeira paixão era moda. Mas apenas sabia que ela era dona de um blog famoso, porém anônimo… Criticava estilistas e suas coleções “De uma forma única e extremamente incomum”, de acordo com o que ouvia de suas colegas de trabalho. Era este o grande motivo de ter conhecido no evento que ele organizou. Era a “representante” da blogueira.

  - Então, como está o Blog? - ele resolveu perguntar, já que a televisão não o entretia.
  - Está cada dia melhor. Tenho pensado em sair do anonimato…
  - Se quiser um evento de grande porte, está falando com o cara certo.
  - É só um pensamento distante. – ela lhe explicou, enquanto colocava o peixe no forno e sentava-se no sofá ao lado dele. Mas antes, tinha pegado uma maçã verde na cesta de frutas, queria enganar a fome durante algum tempo. – Quer maçã?
  - Não tem morango? – ele perguntou fazendo careta para a fruta.
  - Não, sou alérgica a morangos, não posso nem passar muito perto de um.
  - Vai maçã então. – ele mordeu um pedaço da maça oferecida por ela.

  Logo, colocou o filme O Diário de Uma Paixão no DVD, e as horas passaram rapidamente, o apartamento foi ficando escuro de acordo com a intensidade da nevasca na rua. Com apenas uma pausa para comer o salmão com arroz e molho branco da blogueira, a parte mais importante do filme começava e ambos sentiam os olhos lacrimejantes. O desejo de era que algo acontecesse, e ele não precisasse ver o final daquela cena, sentia que estava para chorar a qualquer momento e não queria fazer isso na frente da garota que gostava... Mas, de repente, a TV e o abajur ao lado do sofá se apagaram ao mesmo tempo. “Salvo pela falta de luz.”

  - Ah, não! – ela reclamou – Não acredito que essa maldita nevasca fez acabar a luz bem na parte boa do filme.
  - Não acredito simplesmente que faltou luz! Isso nunca acontece nessa região da cidade. – se levantou e foi até a janela, ao que parecia, o apagão era geral. Tirou o celular do bolso da calça jeans e localizou ainda sentada no sofá, agora com Sky e Smirnoff acordadas ao seu lado. – Você tem velas?
  - Na segunda gaveta da pia da cozinha, tem fósforo lá também.

  Em questão de segundos, já tinha uma vela em cada mesa da sala de estar do apartamento de tamanho mediano. Mesmo com a pouca luminosidade, podiam ver muito bem os rostos um do outro e alguns objetos de decoração pendurados nas paredes claras.

  - Então, - ele quebra os minutos de silêncio – o que faremos agora?
  - Não sei... Verdade ou consequência?
  - Meu Deus, nós voltamos agora para a quarta série?
  - Desculpa, eu não tenho ideias para quando falta luz!
  - Ok, pode ser. Mas a parte da consequência não tem graça tem mais gente participando.
  - Tudo bem, então que tal um jogo só de “verdade”? – ela sugeriu.
  - Tipo um questionário?
  - É. Eu pergunto, você responde. Você pergunta, eu respondo.
  - Quem começa?
  - Pode ser você.
  - Huuum... – ele não sabia o que perguntar, sabia muito de ... Mesmo coisas que ela não notava. – Banda favorita?
  - Essa é fácil, Lawson.
  - Eu curto eles também.
  - Pode ser a nossa banda favorita – ela disse rindo. simplesmente amava risada dela. – Minha vez. Como você conseguiu a cicatriz no meu ombro?
  - Essa é de quando eu fui buscar a minha prima de seis anos na escola, tive um acidente de bicicleta na ida. Não consegui buscar ela, obviamente. Ela ficou com raiva de mim durante horas, mas depois que viu a cicatriz, me perdoou. Huum... Você gosta de crianças?
  - Bem... Eu não me sinto bem em volta dos mais novos... – Essa era a versão que contava para todos, mas o garoto dos olhos sabia que ela não chegava nem perto de crianças.
  - Estou sem criatividade agora... Qual é a sua pergunta para mim? – ela falou rindo, mas a verdade é que não queria perguntar mais nada, ele só queria falar uma coisa desde que tinha ficado amigo de . Ele queria dizer o quanto ela era incrível. Que adorava o sorriso dela e quando ela ficava irritada com ele porque ele estava sendo irritante demais...
  - Eu estou apaixonado por você. – ele respondeu, sério. E ela mostrou espanto, ele viu, mesmo na fraca luz vela.
  - Isso não é uma pergunta. – ela disse, com um olhar indecifrável.
  - A pergunta é: Você sente o mesmo por mim?

  Ela ficou em silêncio. O que nenhum dos dois contava, é que a luz iria voltar naquele momento, a nevasca ficaria pior e a Tv voltaria naquela cena emocionante... Mas eles estavam concentrados demais nos olhos um do outro, e dessa vez sabia, o sorriso maroto e o olhar fixo significavam “Sim”.

FIM



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