Ugly On The Inside
- Estava com saudades, Thorne?
O homem andava de um lado para o outro, evitando olhar aquela silhueta que lhe causava tanta irritação sorrindo no espelho, como se quisesse provocá-lo com o seu ar sarcástico. Para quem o observasse, sua aparência física se mantinha impecável – o que sempre zelou –, além de estar trajado com as suas roupas e acessórios mais caros, diferente da outra pessoa que gargalhava enquanto ingeria a sua bebida favorita. Ainda relutante, deu passos lentos até o banco e ficou de frente ao grande pedaço de vidro quebrado, com seu olhar vagando pelas rachaduras do objeto.
- Sinceramente, toda vez será a mesma coisa? Você percorre todo esse espaço pequeno com a mão no queixo como se estivesse muito pensativo, quando na verdade é só puro medo de me encarar. Estou começando a me cansar de sua presença… – A imagem bocejou, visivelmente entediada. – Nossos encontros já foram mais divertidos, sabe?
Thorne resmungou, fazendo com que sua companhia arqueasse uma sobrancelha com um achismo breve de que ele falaria algo. No início, ambos enchiam seus egos e quase brindavam, regados a memórias tão maravilhosas que podiam causar inveja em seus amigos. O rapaz, que colecionava corações durante todo o seu ensino médio e os quebrava mais tarde por puro prazer, gargalhava ao relembrar o tempo que a popularidade era mais importante do que os sentimentos alheios. Para Thorne O’Brian, o status que o dinheiro colocava em suas mãos era suficiente, sendo sua fonte diária que bancava a sua falta de caráter que adorava esbanjar.
Entretanto, nem tudo na vida são rosas.
Há algumas semanas, ele se sentia inquieto e as conversas com o espelho já não o agradava tanto assim. Após seu término e a sua fonte de renda terem o abandonado, tudo o que ostentava o deixava incompleto; a mídia que exercia e os amigos da mesma classe social pareciam não ter o efeito de antes, afinal, O’Brian ia a cada dia perdendo mais o seu tão amado status.
Decidiu, então, mudar. Mudar de ares, de cabeleireiro e de alfaiate, em uma falha tentativa de recuperar os seus acompanhantes e toda a mordomia que conseguia se escorando neles. A primeira vista, sua nova cor de cabelo ainda o dava o charme praticamente perdido, não durando muito tempo a felicidade recém-estabelecida ao escutar mais uma vez que era para ficar longe do seu amado grupo.
- É, você pode mudar tudo, mas não consegue recuperar o seu antigo “eu”. Uma pena ter recebido aquela ligação… Quando você encontra sua alma gêmea e no minuto seguinte é tratado da mesma forma que lidou com os seus incontáveis relacionamentos, dói, não é? – O outro se aproximou e sorriu, oferecendo as suas mais sinceras risadas à Thorne. – Eu diria que uma certa pessoa está colhendo o que plantou… – Assobiou.
- Por qual motivo todas as conversas se resumem a isso?
- Talvez você nunca admitir que a solidão está te consumindo e que tenta voltar a ser o que era, entretanto, continua perdido, seja algumas das razões. Ah, e o mais importante! Como pude esquecer? – Pausou dramaticamente – Se você não tivesse me projetado, não teríamos esses encontros interessantes, já que, eu sou quem você tenta reconquistar: a sua melhor versão de muito antes. Oh, pobre Thorne, posso te contar um último segredinho? Você é feio por dentro. Só me encontro nesse espelho pois a ficha finalmente caiu, na verdade, quando começou a ter que lidar com as consequências dos seus atos algo o fez ver que a vida aí fora não é a metade do que sempre quis que fosse, não é? Não adianta montar um outro personagem se não consegue sustentar o que você criou há anos, Thorne.
O’Brien desejou que não tivesse questionado a silhueta que agora se despedia calorosamente, o deixando com seus pensamentos.
Mais uma vez sozinho e com a companhia da solidão.
Fim
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