Sour Love
O texto a seguir é meramente uma sátira da realidade. Quaisquer semelhanças com a realidade, nomes e eventos são meras coincidências.
As mãos trêmulas de Bosolaro pareciam amortecidas, pressionadas com força contra sua boca, tentando sufocar o acumulo de lágrimas que, agora, transbordavam pesadamente por seu rosto amassado de sono. Estava trancado naquele pequeno banheiro fazia alguns consideráveis minutos. Ele havia deixado de se importar com a sua própria demora dentro do banheiro, ou se por ventura Trampo viria, eventualmente, perceber que ele não estava mais ao seu lado na cama. Mesmo chorar, ele o fazia em silêncio agora, engasgando-se baixinho, apoiando as duas mãos em sua cabeça, sem saber o que diabos deveria fazer agora.
Chegou a questionar-se onde poderia ter errado para que estivesse naquela situação agora: certamente não era sua culpa, afinal, Bosolaro jamais cometeria tais erros, Bosolaro era top, era o maioral. Mas… sentado no topo daquela privada parcialmente limpa, com o cheiro de desinfetante pungente vindo de um balde a sua esquerda, com uma parte de sua mente questionando-se porque diabos ele estava no vaso sanitário se ele ainda tinha a bolsa de colostomia ainda presa a seu próprio corpo. Bosolaro sabia, ele poderia ser muita coisa, mas inteligente, não era. E talvez este tivesse sido seu erro fatal.
Cantar ao pé de ouvido de Trampo, sussurrar palavras de amor em meio ao escuro aconchegante de seu quarto —— popcorn and ice cream sellers senteced for coup attempt in Brazil, que literalmente traduzia para um das palavras mais doces brasileiras já inventadas: minha cenoura —— tocá-lo como nenhuma de suas amantes e nem mesmo sua esposa foram capazes de o fazer, Bosolaro havia se entregado de corpo e alma para Trampo, até mesmo assinado um contrato de submisso havia o feito, e céus, se Bosolaro não sentia um puta tesão ao lamber os sapatos sujos de Trampo.
Bosolaro havia entregado tudo de si. Cada mísero centímetro e esperanças. E, todavia, as provas estavam todas dispostas a sua frente.
As mentiras, as desculpas, as armações, estava tudo ali, escancarado para que qualquer um visse. Céus, Trampo nem sequer havia se preocupado em ocultar alguma coisa, pelo contrário, havia sido tão descuidado que Bosolaro se questionava se a intenção de seu parceiro, desde o começo não havia simplesmente ser pego no flagra. Se a intenção dele não havia sido simplesmente proposital para que Bosolaro descobrisse sobre sua traição.
Não que Bosolaro acreditasse na fidelidade de Trampo.
Antes de se unirem, e viverem aquele conto de fadas, aquele romance havia se iniciado como um romance proibido. O tórrido affair havia tido inicio durante uma confraternização entre grandes lideres mundiais em uma reunião diplomática oferecida pela ONU, e, é claro, sendo quem era, Bosolaro havia dado uma forma de entrar de penetra. Não porque ele tivesse alguma coisa a acrescentar aquela reunião, pelo contrário, não fazia muita questão sequer de dar descarga quando usava o banheiro, quiçá se daria ao trabalho a utilizar seus últimos dois neurônios. Era fato que o médico de Bosolaro havia dito com clareza de palavras que o uso contínuo de seu cérebro acabaria por matá-lo eventualmente, portanto, Bosolaro estava mais do que contente de ser um energúmeno. Pois bem, Bosolaro estava rodando em círculos, tendo acabado de perceber que havia pisado em alguma folha perdida dos outros importantes diplomatas, optando por girar no mesmo lugar até conseguir alcançar a sola de seu sapato ao em vez de seguir pelo caminho mais banal como abaixar e retirá-la, quando ele esbarrou em Bosolaro.
Tudo pareceu parar ao seu redor. As paredes prenderam suas respirações, e os ventiladores fizeram renk, renk, renk em estagnação. Um tremor percorreu o corpo de Bosolaro e, quando seus olhos se encontraram com os do outro homem, algo percorreu por seu corpo. Uma vibração que não vinha de seu Nokia tijolão — uma atitude tomada prioritariamente para ganhar graça publica, ao se mostrar humilde, embora seu Iphone 25 estivesse devidamente guardado em seu bolso. Bosolaro perdeu seu folego ao observar aquele homem, libidinoso e sensual, tão atraente quanto uma laranja em um estande velho de metal em uma quintada qualquer em um bairro de classe média a frente da entrada da loja. Suculenta, redonda, a um passo de ser jogada no lixo por já estar mais enrugada do que deveria.
Bosolaro havia corado com a visão de tamanha masculinidade a sua frente, e ele pode sentir as reações que o estrangeiro havia causado a seu próprio corpo. Como um encantador de serpentes, atraindo-o para sua orbita tal qual um imã de polaridade oposta. Os lábios finos e ressecados de Bosolaro haviam ficado, de repente, secos, e sua garganta desesperada por um pouco de água — ou um cuspe daquele homem sensacional a sua frente.
Trampo, havia dito ele com um sorriso torto que enrugava quase por completo o lado esquerdo de seu rosto, o que quase havia feito Bosolaro chamar a segurança e ligar para a emergência, achando que Trampo havia infartado. É claro que não o fez, até porque o preço da ambulância era maior do que seu Iphone 25, ao contrário, Bosolaro suspirou, sentindo que naquele momento, seu coração murcho e caquético, havia finalmente voltado a vida, de uma maneira que não havia batido por ninguém, nem mesmo por Lúcifer, seu ex-amante.
Bosolaro e Trampo haviam trocado números naquele dia, após Trampo, como um cavaleiro em armadura de papelão ter verificado se ele estava certo. Bosolaro lembrava-se de ter sussurrado um “sim, tá ok?” para Trampo, e ter visto, por uma fração de segundos, os olhos de Trampo se obscurecerem com desejo. Mas todo o encanto daquela cena de amor implacável e predestinado havia acabado de forma curta quando Melanina, a atual esposa de Trampo, se aproximou deles. Bosolaro não pode deixar de sentir uma pequena pontada de inveja ao observar os braços flácidos e pelancudos daquele homem másculo envolverem a cintura de uma jovem mulher que deveria ter idade para ser sua neta. Bosolaro queria aquele lugar para si. Queria os braços de Trampo ao redor de sua cintura redonda e deforme por causa de um acidente em seu passado. Queria o lugar de Melanina, porque certamente, Melanina não parecia sequer estar impressionada com o homem que tinha ao seu lado.
Se Melanina sequer soubesse o que possuía!
Depois daquele dia, Bosolaro havia passado muito tempo encarando seus celulares a espera de uma ligação, de alguma coisa, qualquer coisa vinda de seu futuro parceiro. Sabia que era um risco, e que talvez estivesse confundido as coisas, afinal Trampo era um homem atarefado, com suas inúmeras pausas para respirar e suas reuniões rotineiras para com o estúdio de bronzeamento artificial. É claro que Trampo não teria tempo para Bosolaro. Mas então, um dia, depois de uma jet-ski-ata com seus seguidores, Bosolaro sentiu seu coração acelerar, e suas mãos suarem ao ver a notificação, na barra superior do aparelho com o nome de Trampo.
“Podemos nos ver?”, era tudo o que a mensagem dizia, abaixo do link do tradutor usado para a mensagem. Bosolaro havia hesitado, todavia, afinal ele não queria ser apenas mais um brinquedinho na mão de Trampo. Bosolaro queria mais do que apenas ser usado e descartado como seu eleitorado era. Ligou então para seu caro amigo, Mérgio Soro, e bem ali, Bosolaro passou horas confidenciando suas inseguranças e seus receios ao ouvido do melhor amigo. Mérgio, sendo o sábio que era, apenas sugeriu para que Bosolaro comprasse um triplex e então ligasse de volta para ele, contando se havia dado certo ou não. É claro, Bosolaro havia ficado confuso com aquele conselho, afinal o assunto pouco se dava relacionado a um triplex, mas as palavras de sabedoria de Mérgio Soro, nunca deveriam ser questionadas, apenas ouvidas e respeitadas, já que pouca coerência e clareza possuíam.
Por fim, Bosolaro aceitou. Ele comprou o triplex, e igualmente levou Trampo para lá.
A princípio, tudo não parecia nada mais do que apenas uma conversa entre amigos, Bosolaro até desesperançoso se sentiu. Pensou em como poderia ter se enganado em relação a Trampo, em como deveria ter entendido suas intenções de maneira errada. É claro que Trampo nunca largaria uma mulher tão bonita quanto Melanina, era ousadia dele acreditar que Trampo o faria. Mas então, Trampo tocou a mão de Bosolaro com um pouco mais de demora do que o normal. Ele riu por um pouco mais de tempo. Ele colocou uma mecha de seu cabelo atrás de sua orelha, em um gesto de carinho. E antes que Bosolaro pudesse dizer qualquer coisa, Trampo havia o beijado.
Um suspiro permeado por desejo, paixão e satisfação escapou por entre os lábios de Bosolaro quando ele abocanhou a boca de Trampo de volta. Suas línguas travaram batalhas ferozes uma contra a outra, desbravando cada centímetro da boca do outro tal qual como um invasor rico branco de uma Europa do século XVII, invadindo e tomando tudo o que encontrava pelo caminho. Tal qual como Napoleão Bonaparte em meio ao Inverno Russo. Saboreou o gosto de leite condensado com pão, e do frango sem tempero cozido e condimentado de latinha, e Bosolaro nunca se sentiu daquela maneira. Tão cheio, tão envolto por uma paixão avassaladora como aquela que Trampo havia despertado dentro de si.
E então, uma coisa levou a outra. E em pouco tempo, Bosolaro estava cavalgando como um perfeito peão de Ouro Preto no pau enrugado e de procedência duvidosa de Trampo. E céus, como o prazer os envolvia, como a liberação reverberava por seus ossos de forma que ninguém nunca havia conseguido o fazer sentir. Bosolaro pela primeira vez considerou deixar de ser uma pessoa detestável ao perceber o que era ser amado de verdade. Mas então, havia o segredo.
Havia Melanina.
Trampo havia feito promessas para Bosolaro. Trampo havia lhe dito que seria por pouco tempo, que ele não precisava se preocupar que seu coração pertencia unicamente a Bosolaro, mas sua situação era complexa e delicada. Não poderia deixar Melanina daquela forma, não poderia simplesmente ir embora, não antes que tivesse certeza que Melanina não teria nada em seu nome, especialmente para usar contra ele na corte.
E então, os dias se tornaram semanas, e as semanas tornaram-se em meses. E por longos 4 anos e meio, Bosolaro percebeu-se preso naquele maldito relacionamento oculto, sendo escondido de olhares públicos e sofrendo nas sombras por não poder ter o homem que tanto amava. De alguma forma, Trampo havia se tornado tudo para Bosolaro. Trampo havia se tornado a dedicação de sua vida, o sonho que ele nunca havia se permitido sonhar com tanto afinco, mas que agora, em suas mãos, recusava-se a largar. Bosolaro era idiota, sim, e não percebia que estava sendo, como muitos outros antes dele, usado por Trampo. Não percebia a doce mentira que havia são apressadamente contado a si mesmo sobre o homem que amava.
Talvez, este fosse seu maior problema, para alguém que nunca havia conhecido o afeto de fato, o que era ser amado e visto, acreditar que um gesto simplório significava uma verdade absoluta tornava-se a única coisa a mantê-lo no chão e estável. Talvez, seu problema fosse ter aceitado as pequenas migalhas acreditando que jamais iria merecer um baquete inteiro — e de fato, com uma culpa de quase 600 milhões de almas puxando-o para baixo, certamente, Bosolaro não merecia sequer um suspiro de alívio, mas esta é uma outra história, para um outro momento.
Conforme o tempo foi se passando, e aproximava-se o quinto ano daquele affair oculto de olhares públicos e secreto, Bosolaro acabou cansando-se de esperar por uma atitude de Trampo, e fez como toda e boa amante costuma fazer: Bosolaro deu um jeito de fazer Melanina flagrá-los juntos.
Ah, tamanha baixaria e gritaria se deu, mas finalmente, ao final dos vidros quebrados, dos vômitos e acusações, Bosolaro havia saído vitorioso, havia conseguido seu homem finalmente. E agora, finalmente livre das amarras de um contrato social opressivo cujo único propósito era o controle do sistema sobre eles, Bosolaro e Trampo estavam livres para viver seu amor.
Sem impedimentos. Sem arrependimentos. Sem perturbações maiores.
E Bosolaro teve certeza que aquele seria seu final feliz. Céus sabiam, o quanto ele havia desejado que o fosse, mas o tempo, ah, este era um cafetão rancoroso para o cu de sua vida.
Por dois anos, Bosolaro e Trampo viveram um relacionamento perfeito. Trampo era carinhoso na intimidade com Bosolaro, era atento e sempre comprava pequenos presentes para ele; uma coleira com as inicias de Trampo, um anel personalizado, uma nova bolsa de colostomia, esta feita dos mais finos e caros materiais. Bosolaro era paparicado e cuidado como jamais havia sido anteriormente. E em troca Bosolaro amava Trampo como ninguém jamais o amaria de fato. Amava-o com sua alma e sua boca, seu corpo e seu toque. O adorava com atenção e presença, cumprindo com todos os seus desejos e requisitos.
E então, Trampo o traiu.
De novo, e de novo, e de novo, e de novo.
Bosolaro não teria tido problemas se fosse apenas uma prostituta qualquer ou uma noite de sexo, afinal, ninguém era perfeito, todos cometiam erros, mas o que ele havia encontrado aquela manhã no celular de Trampo… céus, aquilo havia o arruinado completamente. Não era apenas uma noite de sexo despreocupada, era um completo affair, um relacionamento que já durava quase seis meses pelas costas de Bosolaro com o maldito Elo Mosque, um bilionário de QI equivalente a Bosolaro. Um homem mais jovem, mais branco e mais rico do que Bosolaro jamais seria. Um garoto de 40 anos que parecia ter encantado Trampo do momento em que haviam se conhecido.
Quando aquilo aconteceu? Quando ele havia deixado isso acontecer? Quando Trampo havia escapado de suas mãos?
Bosolaro limpou o rosto, engolindo em seco, tentando se acalmar, mas falhando miseravelmente. Ele teve vontade de gritar, de se debater e lançar-se contra o que quer que estivesse pelo caminho, ele teve vontade de simplesmente correr sem rumo, sem olhar para trás, e, ao mesmo tempo, havia um buraco gritante bem no centro de seu peito, um buraco tão fundo e doloroso que respirar tornava-se difícil. Ele apertou os lábios em uma fina linha rígida — tão fina que seus lábios já finos desapareceram e viraram apenas uma linha reta — unindo as sobrancelhas, considerando o que diabos ele poderia fazer agora. Para onde iria? O que faria? O que seria de sua vida quando tudo o que ele era, toda sua vida, orbitava ao redor de Trampo? Deveria simplesmente esquecer de tudo? Se fingisse que tudo estava bem, eventualmente, tudo não voltaria ao normal?
Uma pequena pontada de esperança surgiu por seu peito. Uma esperança traiçoeira e regada a memórias do que aquele relacionamento um dia havia sido. Um desejo desesperado de acreditar que ele ainda conseguia alcançar aquele Trampo do inicio de relacionamento. Aquele Trampo que lhe pertencia, mas… aquele Trampo sequer havia sido real? O teste a sua frente havia dado positivo, mas levando em consideração as alterações hormonais, os desmaios e até mesmo o exame de sangue que Bosolaro havia feito mais cedo, era certeza de que ele estava grávido — ele era burro, pobre coitado, mas o cérebro acreditaria no que desejava acreditar. Bosolaro alçou seu celular do canto da pia do banheiro, os dedos trêmulos dificultando ao dobro para ele tentar desbloquear a tela.
Inspirou uma, duas, três vezes, sussurrando “tá ok” para si mesmo até conseguir controlar o tom de sua vez, antes de discar aquele número… o número que havia jurado nunca mais ligar, o número daquele vermelho maldito que ainda o atormentava em pesadelos distantes, mas sua situação não lhe oferecia outra escolha. Se havia alguém que poderia ajuda-lo naquele momento, era ele…
— Alô, meu caro companheiro… — a voz do outro lado da linha ecoou pelos ouvidos de Bosolaro com uma mistura de revirar seu estômago, o gosto de bile subindo a sua língua, pungente enquanto o músculo de seu abdômen se contraia parcialmente. Ele se questionou se iria vomitar naquele momento, certamente desejava o fazer, só não sabia se era por causa de sua gravidez ou pela descoberta da traição de Trampo; novamente, Bosolaro não era inteligente, e jamais seria.
— Ô Molusco? — Bosolaro questionou, hesitante, olhando ao redor do banheiro antes de apoiar a cabeça em suas mãos, uma perna batendo ritmadamente no chão com a necessidade de seu corpo de expurgar a tensão e ansiedade que permeavam sua mente. — É você mesmo, Molusco, fala daí?
— Olha… — Começou Molusco da Silva com um suspiro pesado, a voz áspera e levemente presa se misturou com o chiado da ligação. Bosolaro tencionou a mandíbula, se questionando onde diabos Molusco da Silva deveria estar naquele momento? Certamente no barzinho do Seu Zé, tomando uma cerveja e comendo um espetinho de quinta categoria. Bosolaro suspirou pesado, sentindo seu primeiro desejo surgir. — É muita audácia da sua parte, ligar para mim numa hora dessas! Depois de tudo que o senhor fez!
— Eu me arrependi, tá ok? — Bosolaro resmungou com um tom de voz baixo, seguido de um soluço. Molusco da Silva soltou um riso abafado, desacreditado, acabando por tossir com sua risada de fumante. — Por favor, Molusco, você precisa me ajudar! Eu… eu não sei…
— Companheiro, eu não tenho nenhum motivo para ajudar você — Molusco resmungou com um tom de voz ríspido, desacreditado pelas palavras de Bosolaro, mas ainda assim, ouvindo-o. Uma ponta de esperança se acendeu no peito de Bosolaro, que sabia que não deveria alimentar, ainda assim, não conseguiu conter-se; estava desesperado, qualquer mínima ação oferecida seria vista como um ato grandioso. Bosolaro nunca havia sido amado, e muito disto se devia a si mesmo. — Me dê um motivo, companheiro… só um… — pediu Molusco, sua voz de fumante tornou-se mais suave, apesar da mágoa que ainda persistia em envolver seu tom e palavras.
Bosolaro sentiu a pressão das lágrimas atingir sua garganta e seus olhos. Sua visão voltou a ficar embaçada enquanto tentava se forçar a manter-se respirando de forma controlada, desesperado para ocultar os soluços de seu coração partido.
— Eu estou grávido — Bosolaro confessou em um sussurro.
O silêncio que se seguiu foi gritante. Bosolaro sentiu um tremor envolver suas mãos, enquanto esperava por uma resposta de Molusco do outro lado da linha. Por uma fração de segundos, ele havia acreditado que nenhuma viria. Que o silêncio do outro lado da linha era apenas a finalização daquela ligação, e seu coração se contraiu em seu peito. Bosolaro fechou os olhos com força, sentindo o desespero começar a nublar seus pensamentos mais uma vez, repousando sua mão sobre sua barriga torta de lombriga, acariciando-a enquanto um gás lhe escapava, imaginando o que diabos seria dele agora, como um pai solteiro com uma pequena criança — era só intestino preso — para criar.
— As nove da manhã. Amanhã. Esteja pronto, companheiro — É tudo que Molusco disse do outro lado da linha antes de finalizar a ligação.
Bosolaro exalou, sentindo o alívio envolver seu corpo com um tremor intenso. Ele limpou seu rosto, ofegando um pouco enquanto apagava a ligação do histórico de seu celular. Seu coração, ainda partido e quebrado se apertou com a ideia de abandonar Trampo, mas que escolha ele teria ali? As evidências de sua traição com Elo Mosque era mais do que evidentes, eram uma clara declaração de onde a lealdade de Trampo jazia. Aquele homem que lhe oferecia o mundo e o universo havia o enroscado em suas teias de mentiras e o prendido como um pequeno inocente cordeirinho, e agora, Bosolaro teria que abrir seus olhos para enfrentar a dura realidade.
Ele havia sido usado. Ele havia sido descartado. Como todos antes dele.
Bosolaro, que tão rapidamente havia acreditado que era diferente por uma insegurança pessoal consigo mesmo, agora percebia, duramente com a realidade, que ele nunca havia sido especial. Ele havia sido apenas mais um para Trampo. Como todos que viriam depois. E aquilo doeu. Doeu profundamente, ele pode sentir essa dor até mesmo na sua bolsa de colostomia — ele nunca soube muito bem definir o que era ele e o que não era.
E, no fundo de tudo aquilo, havia ainda assim uma parte de si mesmo que hesitava. Que se apegava a memória do que havia tido com Trampo, com a felicidade que havia tido, e com a força do amor que havia sentido. Bosolaro sabia que sua visão de amor estaria sempre tingida pelos atos de Trampo. Que ele não seria mais o mesmo depois daquela descoberta dolorosa. Bosolaro sabia que não conseguiria mais se apaixonar livremente, e lutar com unhas e dentes por alguém, simplesmente por não poder confiar nas palavras dessa pessoa. Mas ainda assim… ainda assim, seu coração traidor não estava pronto para abandoná-lo. Não estava pronto para deixá-lo.
Bosolaro bloqueou o celular de Trampo novamente, voltando para sua cama compartilhada, onde o outro dormia de forma sonora, roncando suaves “China” como sempre fazia depois de um dia duro de trabalho em seu gabinete. Bosolaro percebeu com um aperto no coração de que sentiria falta de ouvir aqueles resmungos inteligíveis e engasgados. Que sentiria falta de acordar todos os dias e se deparar com a pele de abóbora de seu parceiro, ou sentir as rugas de bulldog que seu parceiro possuía. Sentiria falta daquela pele flácida e molenga que adornava seu corpo como uma capa gostosa de calor. Nada seria mais como era antes.
Bosolaro depositou o celular de Trampo de volta na mesa de cabeceira, antes de se deitar ao lado de seu parceiro novamente, suspirando suavemente enquanto ajeitava-se em seu travesseiro, fechando os olhos. Tudo havia acabado.
Mas pelo menos, pelo resto daquele dia, Bosolaro iria fingir que não. Que tudo estava bem entre eles, que Trampo o amava como sempre havia feito, e que nada daquilo era verdade. Que eles ainda eram felizes e que o futuro ainda era brilhante e animador.
Permitiria se enganar uma última vez.
NOTA DA AUTORA: eu peço desculpas para a pessoa que enviou a música do Blackpink, para a beta, e para quem quer que leu esta merda, eu não sabia o que fazer, sobre o que escrever. Vamos fazer um acordo aqui, ok? Você finge que nunca leu isso aqui, e eu finjo que nunca escrevi.
Subscribe
Login
0 Comentários