Siren

  A noite fria de inverno estava silenciosa.

  As ruas vazias e as luzes apagadas significavam que a madrugada havia chegado, e quanto mais Woozi caminhava sem rumo, mais o seu coração era envolto em um sentimento angustiante que quase o fazia chorar. Mas, seus olhos estavam secos e irritados, e as lágrimas que um dia molhavam as suas bochechas e embaçava a sua visão já não existiam mais, pelo menos, não depois de perder a coisa mais importante para si: a sua voz.

  Desde que as notas altas alcançadas se tornaram murmúrios seguidos de uma tosse incontrolável começaram a fazer parte de sua vida, o homem se viu perdido, preso em uma pequena caixa extremamente sufocante. Apesar de pensar na possibilidade de procurar ajuda, ele não sabia como sair daquele lugar, e todas as suas forças pareciam ter sido usadas para se manter minimamente vivo, e só o pouco que fazia, já lhe custava muito. Todos os dias ele se sentava perto da janela, abraçando seus joelhos contra o peito e olhando a rua através daquele vidro tão fino, percebendo que, mesmo que as estações mudem, Woozi continuaria ali, esperando a volta de quem nunca mais voltaria. O seu reflexo mostrava exatamente como o homem estava tanto por dentro como por fora, a exaustão o consumindo mais e mais, e o rapaz só se entregava ao cansaço, parando até de observar a rua religiosamente.

  “Talvez fosse a hora de parar”, pensou, com aquele vazio tomando conta de si. No entanto, nessa mesma noite, o homem teve um sonho tão vivido que o deixou extremamente confuso, e a sua única reação foi sair pelas ruas frias, em busca daquela criatura que apareceu diante de si.

  Pela primeira vez em muito tempo, Woozi se sentia angustiado. Nervoso. Ansioso.

  Desde que a ficha caiu de que a sua voz não voltaria, os seus sentimentos eram engolidos pelo grande vazio que tomava conta de si, permitindo apenas que a exaustão também o consumisse. As lágrimas tão comuns que caíam nos primeiros dias secaram, e ele não sentia mais vontade de chorar, o que o fazia ficar ainda mais angustiado agora, já que sentia as suas bochechas ficarem úmidas. Ele não entendia nada do que estava acontecendo, e por mais perdido que estivesse, Woozi era guiado por um canto baixo, o mesmo que tinha escutado em seu sonho. Conforme se aproximava da praia, mais limpo o som ficava, e o rapaz se viu hipnotizado naquela melodia que parecia aquecer todo o seu corpo coberto por flocos de neve. Quando se aproximou da beirada, a água batia contra seus pés, e o homem continuava a caminhar em direção ao mar, parando somente no momento em que seu olhar cruzou com o de uma sereia.

  A criatura do seu sonho estava diante dos seus olhos, possuindo uma beleza ímpar e estonteante, e sua cauda brilhava com a luz do luar; aquele canto magnífico acendia a sua alma, e Woozi queria chegar mais perto, o suficiente para poder escutar ainda melhor a melodia que o fazia chorar. Entretanto, ele não deu um passo sequer adiante, tampouco pediu que a sereia continuasse a cantoria após parar. Quando ela finalmente o olhou, o homem sentiu um arrepio percorrer por todo o seu corpo, era como se a mulher estivesse o analisando profundamente, como se ele fosse sua presa. Apesar de ter engolido a seco, Woozi não sentia medo, era mais um misto de adrenalina com curiosidade, e ele sabia que por mais estranho que fosse, aquilo estava acontecendo de verdade.

  — Não tiro a vida daqueles que não são guiados pela luxúria e ganância, tampouco daqueles que não se entregam para mim. Não há graça quando a canção se volta contra o próprio cantor, não é mesmo? — A voz da sereia era como música para os ouvidos de Woozi, e ele continuava vidrado naquela criatura, completamente curioso com a sua existência. — Quando superamos as perdas, podemos encontrar algo valioso.

  Antes de partir, a sereia o olhou pela última vez, voltando a cantar uma melodia que Woozi conhecia muito bem. Quando percebeu, o homem também cantava, e ele foi reparando que sua voz estava voltando, e em meio às lágrimas, Woozi caiu de joelhos na areia, deixando que a água do mar levasse tudo aquilo que o prendia dentro da pequena caixa deixada por sua amada.