Oliver and Stella
Capítulo Único
Stella já estava mais para lá do que para cá, quando cheguei em seu apartamento. E eu não aguentava mais aquela loucura toda!
— Stella você precisa parar com essa maconha!
— Olie! — Ela respondeu para mim sorridente com suas covinhas atraentes, mas seus olhos eram de alguém totalmente chapada e fora de si — Oliver! Meu Oliver, Olie!
— Ste… — suspirei seu apelido, deixando minha mala no canto da sala e indo até ela que estava deitada de ponta cabeça no sofá. — Vem, levanta.
Peguei Stella pelos braços e logo ela me abraçou, deixando beijos em meu pescoço e sorrindo travessa. Quando fiz menção de guiá-la para o seu banheiro, ela enlaçou as pernas em minha cintura com uma agilidade que não combinava em nada com aquela figura quase dismórfica de tanto álcool e maconha.
— Eu te amo, Olie! — Ela sussurrou.
— Por que você só vai dizer que me ama quando estiver chapada?
Ela não respondeu, estava fora de si, de novo. Eu já sabia que se não a colocasse debaixo do chuveiro e a pusesse para dormir, em poucos minutos ela começaria a tirar a roupa e se insinuar para mim. E eu não estava nem um pouco pronto para resistir àquilo pela milésima vez. Então, como das outras vezes, apenas despertei ela com um banho frio e depois de alguma relutância, coloquei-a para dormir. Depois, fui eu mesmo me limpar e descansar. Estava há oito horas viajando e meu corpo só ansiava chegar em casa quanto antes.
No dia seguinte…
A casa parecia um bar depois de noite de muito movimento, e eu só queria entender o que levou Stella a fazer aquela zona! Estava irritado, lógico! Ela ainda dormia e eu fiquei com a bagunça toda. Não estava dando mais para dividir aquele apartamento com ela, daquele jeito.
— Oliver? — A voz confusa e surpresa denotavam que ela não lembrava de nada de novo. E eu apenas a olhei por sobre o meu ombro, dando uma checada geral em sua aparência. Stella sorriu e gritou vindo em minha direção animada: — Olie, você voltou!
Pulou em minhas costas me dando um abraço apertado de quem não me via há três meses.
— Quando você voltou seu safado!?
— Ontem de madrugada. — falei ríspido.
Stella se soltou de mim, arregalou os olhos um tanto culpada por saber que provavelmente eu lhe daria uma bronca. Ela começou a observar a zona que eu arrumava e então reclamou, me impedindo de continuar, enquanto tirava as coisas de minha mão.
— Não, não, Olie! Deixe que cuido disso! — Ela me afastou para me sentar ao sofá e começou a arrumar tudo do ponto que eu havia parado e explicava: — Juliette vai embora hoje à tarde para a Suíça, então nos reunimos ontem aqui em casa para uma despedida. Vieram poucas pessoas, só o Zach, namorado dela, o Brandon e a Louise e o Peter… Mas, acabamos bebendo um pouco demais e…
— Peter trouxe maconha. — falei.
— Ah… É, você sabe como ele é… — Stella estava sem graça. — Mas eu não…
— Vai mentir para mim, Stella? Eu vi o estado que você estava ontem.
— Juro que vou mudar, Olie. Mas, eu precisei chapar um pouco ontem porque… Porque…
— Não tem justificativas. Você está exagerando nisso cada vez mais, e eu temo que já esteja chegando perto de uma dependência dessa merda! — briguei e me levantei do sofá indo para a cozinha preparar o café da manhã, já que eu ainda não havia comido nada.
— Deus me livre, Olie! Eu não estou dependente de nada, é só que ontem foi… Foi foda, tá legal? Você não estava aqui e eu fiquei ansiosa porque…
— Por quê? — perguntei surgindo na soleira da porta da cozinha de novo. — O fato de eu não estar aqui é o motivo para você chapar com seu namoradinho de novo?
— Peter não é meu namoradinho! — Stella falou um tanto nervosa. — Quer saber? Você não entenderia!
— Não mesmo.
Voltei para a cozinha nervoso. Toda vez que o Peter estava presente era aquilo, ela acabava fumando com ele e bebendo mais do que aguentava. E eu não fazia a menor ideia do que ela via naquele cara, por que razões eles estavam sempre juntos e até sentia certo ciúme, afinal, eu era o melhor amigo dela e mesmo assim, Stella e Peter tinham segredos que eu não conhecia. Enquanto eu espumava meu ciúme e raiva daquilo tudo preparando um sanduíche e um café, ela chegou na cozinha toda sem graça, como se estivesse pronta a contar algo importante:
— Olha só Oliver… — Stella sentou-se na bancada da cozinha sem me encarar — Estavam todos em casal ontem aqui, e Peter e eu não somos mesmo um casal, mas… A galera acha que somos e a gente… A gente meio que deixa vocês pensarem isso porque o Peter não quer que saibam que ele tem outra pessoa. É meio que um fingimento, só que ontem… — Ela hesitava entre as palavras, quase gaguejando para se explicar — Ontem a Juliette quis falar comigo antes de ir embora, sobre um carinha que ela acha que amo e não tenho coragem de falar com ele, e foi aí que fiquei meio na merda. A Ju e o Zach estão indo embora juntos, planejando casar, coisa e tal… E aí, bom… Fiquei na deprê, solitária e pensando que quando você for embora de vez para os braços de alguém, ficarei sem meu melhor amigo. Ficarei sem a pessoa mais importante para mim.
— Você é uma idiota Stella. — declarei após ouvir tudo atentamente — Primeiro por ficar fingindo ser uma namoradinha do Peter quando ele tem outra pessoa. Qual é a desse idiota, afinal? Ficar te usando!?
Certo, saber daquilo não me deixou nada satisfeito. Ele estava usando e prendendo a Stella de ser feliz com alguém.
— É complicado, Olie! Isso é coisa particular do Peter e eu.
— Ah claro, vocês e seus segredinhos. O que, aliás, te faz uma idiota ainda maior! Que babaquice é essa de estar apaixonada em alguém e a Juliette saber, mas eu não? Quem é esse idiota e por que vocês não estão juntos?
Stella arregalou os olhos, abriu e fechou a boca como se não tivesse resposta a dar. E depois de poucos segundos nos encarando, ela respondeu:
— Isso foi uma loucura da Juliette. Não estou apaixonada em ninguém.
— Se não está, por que isso te afetou a beber e fumar daquele jeito? E o quê, o fato de eu não estar aqui ontem tem a ver com isso?
— Se você estivesse aqui, eu não teria me sentido sozinha. — Ela respondeu firme e rápida — Mas não estou te culpando, você tinha seus bons motivos para não estar. Não quero ser egoísta.
— Você precisa caminhar com suas pernas, Ste. Eu não posso ser a razão de você não fazer merda o tempo todo.
— Eu sei… — Stella olhou para baixo e entrelaçava as mãos como uma criança culpada.
— É por isso que acho que está na hora de eu arrumar outro lugar para ficar. Você está se tornando dependente de mim e de outras coisas para se aliviar na minha ausência, e eu não quero ser o mal que te leva para o buraco, Stella.
Eu havia tomado aquela decisão de madrugada, e tive ainda mais certeza que era o certo a se fazer quando ela começou aquela conversa.
— Você vai embora? — A voz dela prendia o choro, mas também havia um enorme orgulho de quem não queria chorar, em sua expressão.
— Meus pais precisam de mim, as coisas não estão nada bem com a saúde do vovô e realmente, esse é o momento mais apropriado para eu ir para a fazenda aprender algumas coisas e tocar os negócios.
— Então… Você decidiu isso quando?
— Quando cheguei ontem e te encontrei naquele estado. Eu pretendia pensar um pouco antes, mas… Ste… — me aproximei dela segurando seu rosto fino entre minhas mãos — Eu não quero ser uma ruína para você morar.
— Olie, se você for embora… Então vou mesmo ficar sozinha. — Ela lamentou sentindo-se vulnerável.
— Não vai não, porque você tem a sua vida para tocar e seu amor-próprio para reconquistar. Você não percebeu que está vivendo uma co-dependência na nossa amizade, Ste? Isso está errado… E eu não vou partir antes de te auxiliar a se tornar mais independente de tudo isso, ok?
Nos abraçamos e nada mais foi dito.
Cerca de quatro meses foi o tempo que levei para finalmente me mudar para o interior e cuidar da fazenda com meus pais. Neste tempo todo eu ajudei a Stella a entender que sempre seremos melhores amigos apesar de nossos caminhos, e também a motivei em ir para algumas reuniões terapêuticas.
No fim do último mês antes da minha mudança, Stella me contou que o segredo sobre Peter era que ele estava apaixonado e envolvido com um homem casado e por isso, ela ajudava-o a esconder aquele segredo. Me senti um completo idiota, afinal, eu estava com ciúmes à toa. Dentro daqueles quatro meses eu também notei o quanto eu amava a Stella e o quanto seria difícil ficar longe dela, mas eu também precisava de uma desintoxicação.
Todas as vezes em que ela bebia, Stella me beijava e tentava dormir comigo, dizia declarações de amor e no dia seguinte não se lembrava de nada. E eu sempre resistia por achar errado me aproveitar das situações, porém, era fato que eu ficava mexido. Eu queria que ela fizesse tudo aquilo sóbria, mas isso nunca aconteceu. E eu nunca tive coragem de arriscar nossa amizade colocando contra a parede, uma mulher que apenas delirava sobre nós dois. Decidi que ir embora para o interior também seria uma ótima forma de esquecer meu sentimento absurdo pela minha melhor amiga.
— Então é isso… — Ela falou ao meu lado, olhando para meu carro cheio das mudanças — Vai dirigir longas horas, então não deixe de fazer boas paradas e esticar as pernas, e se sentir sono, não insista, Olie! Ah, e me avisa durante o percurso onde está e quando chegar….
— Eu te avisarei. Não se preocupe. — falei rindo do palavrório preocupado dela. — Vai se cuidar direito?
— Jurei que ia mudar tantas vezes que até entendo você não confiar mais em mim, Olie, mas eu te fiz uma promessa. Eu vou me cuidar e assim que a minha terapeuta me der um laudo positivo, irei até a fazenda visitar você e sua família!
— Eles mal podem esperar para te conhecer, falei tanto sobre você nesses meses que eles ficaram animados em te receber lá. Estaremos todos à sua espera e eu ainda mais, Ste.
Abracei a minha melhor amiga, tentando deixar de lado a preocupação, afinal, era um desafio que ela precisava lidar sozinha, aquela coisa de viver por si mesma.
— Eu te amo, Ste.
— E eu te amo Olie, sempre amei. — Ela respondeu no meu abraço, sussurrando no meu ouvido.
Trocamos um olhar cheio de dúvidas e curiosidade. Ouvir aquela frase com ela sóbria quase me fez acreditar que ela realmente me amava daquela forma, então me lembrei de que era a Stella, minha companheira de casa e melhor amiga. Ela nunca me viu com outros olhos, exceto quando estava fora de si.
— Boa viagem, e não vai arrumar outra garota e me esquecer, ouviu? — Ela comentou quebrando o silêncio e deixando uma lágrima cair de seus olhos.
— Você é a única garota que realmente importa. Se cuida e dê logo entrada nas suas férias do trabalho para ir me ver em alguns meses. — pedi e me soltei de sua mão lentamente entrando no carro.
Depois que Stella bateu a porta do carro e se pendurou em minha janela, ela me chamou com urgência e, chorando, abriu e fechou a boca como se quisesse dizer algo mais.
— O que foi? — Perguntei.
— Não, nada. Eu vou sentir muito a sua falta.
— E eu a sua. Temos uma promessa, sim? — lembrei-a: — Todos os dias nos telefonar à noite. E não importa o que estivermos fazendo, temos que atender as chamadas!
— Sim! Ai de você se me ignorar, Oliver!
Stella sorriu e limpou os olhos se afastando do carro. Eu sorri de volta e olhei para o volante me sentindo errado. Eu estava mesmo fazendo a coisa certa? De todo modo, precisava seguir em frente. Dei partida e gradualmente a imagem de Stella na calçada foi desaparecendo do retrovisor, embaçando no espelho, tal como meus olhos também estavam embaçados.
Três meses depois…
— Oliver! — mamãe me gritava enquanto eu chegava pela varanda do casarão da fazenda — Oliver, você tem visita, meu filho!
Não estava esperando ninguém, na verdade, estava doido para chegar e telefonar para a Stella que não me respondia há dois dias! Além de preocupado com ela, eu estava com medo de Stella achar que eu não era mais alguém importante na sua vida e ter seguido em frente de verdade com medo de se despedir de mim. Havia decidido que se ela não me atendesse eu voltaria para a cidade a fim de a encontrar.
— Visita? — perguntei ao deixar as botas na soleira da porta e vendo o sorriso largo de minha mãe.
— Seu garoto arteiro! — minha mãe puxou minha orelha sorrindo e dizendo alegre — Por que não nos contou que a sua namorada estava para chegar?! Ora, ora, Oliver! A garota quase se perdeu na cidade para pegar um táxi e por sorte seu pai estava lá e a encontrou!
— Minha… Minha, o quê?
— Anda, anda! Vá tomar um banho que seu pai levou a garota para colher algumas verduras na horta! Anda, anda!
— Mãe, espera aí… Mas do quê a senhora está falando?
— Ora Oliver, pare de fingir, já descobrimos tudo! Ela chegou nesta tarde e ficou na cidade procurando por alguém que pudesse a trazer para a fazenda, disse ser surpresa e não queria te avisar que havia chegado. Quando o John entendeu que a mocinha falava de você, ele correu até a loja de ferragens porque havia encontrado seu pai por lá e o avisou de que a namorada de Oliver estava na cidade. Seu pai mais do que depressa foi até a rodoviária e Stella explicou tudo para ele!
Meus olhos quase saltaram do rosto ao ouvir aquilo tudo. Stella estava na fazenda? E todos achavam que ela era minha namorada?
— A Stella está aqui?
— Está seu bobo! Ande! Vá se arrumar e passe perfume! Ela e eu iremos fazer o jantar, o seu avô está melhor e até quis se sentar à mesa depois que a conheceu! Um doce de garota!
— O vovô já conheceu a Stella?
Mamãe foi me empurrando ao banheiro sem responder mais nada, porque eu estava mesmo chocado e quase imóvel. Quando minha ficha caiu, eu realmente me senti alegre e me arrumei como se fosse ver a pessoa mais importante do mundo.
Assim que desci as escadas, o pôr-do-Sol abrilhantava a cena pela janela do casarão. Stella estava chegando risonha com meu pai cheia de verduras nas mãos. Ela estava com os cabelos presos em um coque desajeitado e vestia um longo vestido floral soltinho, algo bem campestre. Parecia fazer parte daquele lugar como alguém que nunca viveu na cidade. Mamãe e vovô voltavam da cozinha conversantes, e mamãe colocou uma bandeja de café na mesinha da sala.
— Oliver chegou e está se arrumando querida! — Mamãe falou com ela.
— Finalmente! Mal posso esperar para vê-lo! — Stella comentou com mamãe.
Papai pegou as verduras da mão dela e disse, enquanto ela ajudava ao vovô a se sentar:
— Você deve amar muito o nosso Oliver, não é?
— Sim, ele é mesmo o homem da minha vida! — Ela declarou de repente me pegando de surpresa.
Eu não entendia o que estava acontecendo, mas desci as escadas com os olhos fixos nela, com os ouvidos atentos àquelas palavras e com a voz embargada.
— Ste…
Todos olharam para mim e quando Stella me viu, as lágrimas caíram de seus olhos tão rápidas quanto a corrida que ela deu em minha direção. Nos abraçamos fortemente e assim que levei as mãos ao rosto dela, para encará-la e ter certeza que era ela, Stella me beijou. Juntou nossas bocas com uma paixão que nunca havia se passado em minha mente, um dia acontecer entre ela sóbria e eu.
— Eu te amo, Olie. Meu Oliver, Olie. — Stella sorria chorosa me encarando após o beijo e declarou: — Era de você que a Juliette falava, você é o carinha que eu amo. Eu nunca menti quando te quis Oliver, mesmo fingindo que não me lembrava de nada no dia seguinte.
Fiquei em um misto de choque e alívio.
Então ela sabia que me beijava, se declarava e me provocava quando estava bêbada?
Ela me amava e descobrir aquilo foi como perceber também que eu sempre a amei, e escondia meu sentimento por achar que eu iria estragar tudo.
— Stella, sua maluca… — comentei risonho, mas choroso — Eu… Também te amo e nunca disse porque…
— Shii… — ela tocou meus lábios — Eu sei, eu sei. Mas agora, eu sou a sua namorada, certo?
— Minha namorada… — repeti um tanto abobalhado — Você está falando sério?
— Prometi que iria mudar, Olie. E isso não é só sobre mim, mas sobre nós. Me deixa fazer parte da sua vida de novo?
— Você nunca deixou de fazer, Ste. — sorri e a beijei apaixonadamente.
Abracei e rodopiei com minha melhor amiga e namorada na sala, ouvindo vovô reclamar que demorou muito para eu apresentar a garota da cidade para eles, e minha mãe reclamar que elas precisavam cozinhar e teríamos muito tempo para matar a saudade e namorar.
De repente, como se aquilo sempre tivesse sido a minha rotina, Stella e eu estávamos dividindo uma casa de novo, porém, a casa da minha família e agindo como um casal apaixonado que sempre fomos, mas nunca nos permitimos ser.
Fim
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