knockin’ on heaven’s door

   null null suspirava pela milésima vez, nem um pouco animado com a comemoração que aconteceria no “Heaven’s Door”, apesar de ter sido um dos mais animados durante a semana para tal evento. Por mais que seja controverso, ele não estava muito contente em permitir que uma situação lhe afetasse, mas, infelizmente, quando o assunto envolvia o seu coração, não conseguia ser o null racional de sempre.

  Ele amava o seu trabalho e, assim como seus amigos, não se importava em ajudar as pessoas a concluírem seus desejos, contudo, tinha vezes que se perguntava se valia a pena continuar nesse ramo. Não é como se o homem tivesse muita escolha, afinal, seres como null nasciam e cresciam sabendo que na fase adulta se tornariam missionários de desejos, o único problema é quando eles se apaixonam.

   null se via em um beco sem saída após assistir com seus próprios olhos a sua amada estar apaixonada por outro alguém, e o que mais doía era o fato de não poder fazer nada. O rapaz não podia interferir no livre arbítrio de quem ajudava, e por mais que estivesse em um relacionamento fora dos sonhos, não era 100% garantido que o outro se manteria apaixonado por si pelo resto de suas vidas.

  Mesmo que sua namorada tenha aceitado a condição ao iniciar o relacionamento com null – condição a qual dizia que o reino do sonho da pessoa se tornariam tanto dela quanto do missionário de desejo –, não era garantido que ela continuaria se apaixonando por null ao longo de sua vida. É uma porcentagem pequena, no entanto, há aqueles que acabam conhecendo novas pessoas e o sentimento que nutria por um missionário de desejos acaba.

  E para o azar de null, ele fazia parte dessa pequena porcentagem.

  Se passaram três meses desde o término, porém, null tinha esbarrado com sua ex no centro da cidade logo no dia da comemoração. null tentou animá-lo falando sobre a festa, todavia, sabia que seu amigo era um tanto difícil para se abrir a novas experiências. O rapaz decidiu, então, que conversaria com os outros amigos para todos se unirem e fazerem null se divertir um pouco.

  Sasha foi a primeira a surgir na frente dos dois, dando um abraço em ambos e pegou algumas das bolsas que carregavam, ansiosa para finalizar os detalhes das decorações; Fernanda apareceu atrás do balcão, cumprimentando os rapazes brevemente e correu para a área da casa noturna, já que precisava terminar as papeladas dos fornecedores. Todos os membros do local já estavam efetuando suas designadas tarefas, e assim que null e null se separaram, null deu um sorrisinho pequeno, sentindo uma pitadinha de inveja do seu amigo que havia começado a namorar com Fernanda há um pouco mais de dois meses.

  É, null também queria estar apaixonado de novo.

  Faltava meia hora para o início da festa e tudo estava pronto, a não ser por um único detalhe: a barista. De acordo com Sasha, a mulher tinha dado pra trás no último minuto sem dar satisfação, e na correria de achar uma substituta, Fernanda ligou para uma colega de seu prédio, que por sorte estava de folga.

  — Alguma notícia de sua amiga? — null, o dono do local, perguntou.

  — Ela chegará faltando cinco minutos, mas disse que é o suficiente para organizar as suas coisas.

  — Isso é ótimo, contudo, se ela precisar de mais tempo, é só avisar. Sasha, não se esqueça de aumentar o pagamento dela, a mulher está nos fazendo um favor praticamente. — null se aproximou de um cabisbaixo null. — Por que não toma um ar antes da festa?

  — Tenho coisas para finalizar ainda — null respondeu prontamente, querendo ignorar a sugestão de seu amigo.

  — Eu sou seu chefe e digo que não tem mais nada para terminar, então, levante dessa cadeira e vai tomar um ar! — null puxou o rapaz pelas mãos, o empurrando até a área externa. — Dez minutos. Se você entrar antes, receberá uma penalidade. Aproveita essa oportunidade, vai que acontece algo bom para você?

  O homem não conteve a risada com a ação de seu chefe, e por mais que null fosse um ótimo amigo, sabia que ele não brincava com a questão da penalidade. null fez como foi mandado, e assim que completou os exatos dez minutos, retornou ao café, pronto para ir para a boate.

  Até que três batidas na porta da cafeteria o fizeram parar.

  O vidro da porta principal estava tampado com a placa que dizia “fechado”, então null não conseguia identificar quem era. Cogitou em ignorar, visto que todos sabiam que a entrada geral para a casa noturna era pelos fundos, mas podia visualizar null lhe dando um esporro por ignorar um possível cliente e, com um certo pesar, destrancou a porta, se surpreendendo com a silhueta a sua frente.

  — É aqui o Heaven’s Door? Minha colega falou que era atrás do café, mas não consegui achar a entrada e ela não me atende…

  — Você é a barista? — null ainda estava um tanto surpreso.

  — Sim, e você é?

  — Um dos funcionários — se limitou a essa curta apresentação.

  — Ah, obrigada pela ajuda! — ela agradeceu assim que o rapaz pegou uma de suas malas de mão, sorrindo. — É a primeira vez que venho aqui, apesar de morar na cidade há quase um ano.

  Ele a escutou em silêncio, a guiando para os fundos do espaço; null não conseguia dizer exatamente a sensação que sentia, entretanto, saber quem era a barista mudava um pouco o rumo de sua noite.

  — Você vai continuar fingindo que não me conhece?

   null tomou um pequeno susto ao ouvir a voz da mulher bem próxima de sua orelha, causando um arrepio em seu corpo. O homem tentou ignorá-la durante toda a festa, por mais que em vários momentos se pegou a olhando e é claro que foi descoberto.

  — Eu evitei de falar algo quando você me recebeu, mas depois de me olhar a noite toda, eu tive a certeza de que é você que apareceu nos meus sonhos. — Ela se sentou ao seu lado, lhe oferecendo uma bebida.

  — E você me reconheceu. — Ele sorriu marotamente. — Como foi o trabalho?

  — Acho que um certo alguém sabe, né, já que ficou me observando… — A mulher sorriu travessa. — Porém, te darei um ponto por tentar manter a conversa.

  — Muito obrigado, senhorita barista.

  — É null. — Estendeu a mão para null, que a apertou.

  — Prazer, null. Sou o null.

  — O prazer é meu, null. Apesar de já saber o seu nome.

  — Como? — perguntou curioso.

  — Você me falou. No meu sonho. — null quase se engasgou com a bebida. Não é como se eles tentassem ficar no anonimato, todavia, evitavam de falar seus nomes para não serem achados na vida real. — Mesmo que eu não conseguisse ver o seu rosto, você parecia um tanto tristonho. Fico feliz que tenha melhorado. Mas, sendo sincera, não sei se é o tipo de conversa que quero ter essa noite. Eu fiquei pensando se conseguiríamos conversar ainda hoje, e confesso que você é totalmente o meu tipo e eu queria tentar e ver se tenho alguma chance. Ah, não precisa me falar o que você é ou algo assim, pode continuar aparecendo nos meus sonhos sem problemas!

   null não conteve a gargalhada sincera com a honestidade de null. Definitivamente, ele nunca tinha conhecido alguém tão direta como ela e, pela primeira vez em meses, sentiu como se finalmente tivesse dado um passo para fora dos seus antigos sentimentos.

  Os dois continuaram conversando e se conhecendo, até que por um segundo de coragem, null se inclinou na direção da mulher, esperando a permissão para beijá-la. Não foi preciso muito para null o puxar pela gola da camisa e grudar seus lábios, e assim que se separaram, ela sorriu e disse:

  — Que bom que eu bati na porta do céu, né?

  “É, que bom que você bateu”, pensou null antes de beijá-la novamente.