Doll Parts
Eleen despertou atordoada e perdida. Onde é que estava? Abriu os olhos e com custo conseguiu focá-los. Estava confusa. O lugar ao seu redor não se parecia em nada com nenhum lugar que já tivesse visto ou ido. Tudo parecia ser feito de madeira, do chão até o teto. Fez menção de se mover para analisar melhor, mas foi impedida por algo. Olhou ao seu redor e percebeu que estava presa a uma mesa cirúrgica com amarras bastante fortes, tanto que mal conseguia sentir seus membros direito. O desespero tomou conta de seu corpo e então ela começou a se debater tentando se soltar, mas era inútil, e continuar tentando seria perda de tempo e energia. Parou para respirar e analisar melhor o lugar onde se encontrava.
Era uma sala de madeira não tratada, quase se parecendo com um caixote daqueles encontrados em feira, porém muito maior, claro. Ela quase podia ver as farpas de onde estava. Havia uma porta estreita no seu lado esquerdo, uma bancada com instrumentos que ela não enxergava e também prateleiras… Com bonecas de porcelana de todos os tipos e tamanhos.
Eleen engoliu em seco, ela odiava bonecas. Não importava se fossem de pano, porcelana, plástico. Ela simplesmente odiava todas elas. Sempre achou que bonecas tinham uma aura meio sinistra e cada vez mais elas pareciam mais reais e humanas, aquilo lhe causava calafrios.
Calafrios… Ela sentia-os percorrendo toda sua espinha naquele instante, amarrada sobre uma mesa cirúrgica fria. Não conseguia se lembrar do que havia acontecido antes de ficar desacordada. Estivera em alguma festa? Bebera demais com os amigos? Sequer havia saído de casa? Ela não sabia, não fazia a menor ideia e toda vez que se esforçava a trazer mais memórias, sua cabeça parecia querer explodir. Respirou fundo tentando manter a calma. Talvez fosse apenas uma brincadeira idiota de Halloween, embora não se lembrasse de que dia fosse.
Seus olhos percorreram o local por mais alguns instantes, parando algumas vezes sobre algumas das bonecas. Elas pareciam estar lhe encarando e por mais que Eleen ainda estivesse com a visão um pouco embaçada, ela tinha a sensação de que aqueles olhos nos rostos das bonecas eram bastante vívidos e reais. Engoliu em seco e quase se engasgou quando, no mesmo instante, a portinhola se escancarou e um homem completamente coberto de preto adentrou o espaço, logo depois fechando a porta atrás de si.
O estranho ignorou sua presença e foi em direção à bancada ao lado da porta, barulhos metálicos puderam ser ouvidos.
Eleen não sabia se ficava aliviada ou ainda mais desesperada. O que o estranho faria? Decidiu tentar a sorte.
— Ei, você! — exclamou erguendo a cabeça na direção do estranho, mas não recebendo nenhuma resposta. — Ei! — exclamou mais alto, desta vez batendo a palma da mão na mesa na qual estava presa para chamar a atenção, porém, mais uma vez continuou sem resposta.
Estava prestes a gritar novamente e bater na mesa o quanto fosse necessário, quando o ser de preto se virou com uma bandeja de aço em mãos. Aquele simples gesto foi o suficiente para fazer Eleen entrar em pânico novamente.
— O que você quer? — ela perguntou num tom esganiçado devido ao medo.
O homem nada respondeu, apenas caminhou na direção da mesa cirúrgica e colocou a bandeja sobre um carrinho ao lado da mesma, com outros instrumentos – provavelmente cirúrgicos – que a garota não conseguia ver ou identificar.
— Por favor, me solte! — ela choramingou, mas o estranho apenas a encarou através dos óculos escuros que usava.
O homem se afastou novamente da mesa e voltou-se para uma das várias prateleiras cheias de bonecas, pegando uma com extremo cuidado e caminhando de volta para o lado de Eleen.
— Gisela, chegou a sua vez… — Pôde-se ouvir a voz abafada do homem dizer.
— Meu nome é Eleen. — Ela começou a retrucar, mas logo percebeu que na realidade, o estranho conversava com a boneca.
— Ah, Gisela, você esperou por tanto tempo sua vez chegar. — O tom de voz que ele usava era quase encantado, como se falasse com alguém com quem se importasse de verdade. Eleen encarou a cena que se passava a poucos centímetros de sua cabeça com certa confusão e revolta. O que estava acontecendo afinal? — Eu escolhi algo especial para você, vai ficar perfeito! — Ela não podia ver o rosto daquele homem, mas pelo tom de voz, podia ter certeza de que ele sorria ao dizer aquilo.
— Me solte! — Eleen exclamou mais uma vez, chamando a atenção do indivíduo com a boneca.
— Veja, Gisela, não são lindos? — Ele a ignorou mais uma vez e balançou a boneca em frente ao seu rosto, como se faria ao mostrar algo para uma criança.
O que eram lindos?
— Certo, está na hora. — O homem sentou a boneca na bancada de rodinhas ao lado da mesa cirúrgica e vestiu as luvas. — Vamos te dar um belo par de olhos, Gisela!
Eleen começou a gritar de desespero quando finalmente seu cérebro processou a informação. Seus olhos! Era aquilo que o estranho queria!
Ele pegou o bisturi da bandeja que havia trazido no início.
— Vamos dar à Gisela novos olhinhos para ver… — Ele cantarolava tranquilamente aproximando o bisturi.
— NÃO! ME SOLTE, SEU DOENTE! ME SOLTE! — Eleen se debatia e virava a cabeça para os lados, mantendo os olhos fechados.
— Abra seus lindos olhinhos… — ele disse tentando segurar a cabeça da garota a sua frente de uma forma que pudesse conseguir o que queria.
— NÃO! ME DEIXE EM PAZ! — Ela continuava se debatendo com o máximo de força que conseguia e que as amarras permitiam.
— Você já está nos cansando. — A voz soou impaciente. — Gisela não tem muita paciência com as coisas.
— ELA É SÓ A PORRA DE UMA BONECA! — Eleen gritou e abriu os olhos, no mesmo instante, levou uma coronhada.
— Ah, preciso arranjar uma forma mais fácil de fazer isso — O homem murmurou para si mesmo. – Veja só, Gisela, isso vai deixar marcas na sua nova amiguinha… — ele disse balançando a cabeça negativamente. — Mas podemos resolver isso depois, certo? Primeiro seus olhos — disse voltando-se para Eleen novamente, pegou um instrumento na bancada para manter as pálpebras da moça abertas e começou a trabalhar. — Ah, Gisela, veja só… Acabei sujando seu vestidinho com sangue… — ele murmurou em tom decepcionado e balançando a cabeça. — Vamos cuidar disso depois…
Fim
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