Devil by the window

  Os sonhos se misturavam com a realidade de uma maneira tão doce que, quando percebi, estava tão viciado em um sabor extremamente delicioso que eu nem sabia que existia. Toda a sanidade que restava em mim me alertava do quão perigoso poderia ser, as sirenes foram soadas e eu as ignorei por completo, estendendo a minha mão para um aperto de mão com a silhueta mais tentadora que já vi em toda a minha vida.

  Seus longos dedos envolveram os meus de uma forma sutil, mas, naquele exato momento, eu sabia que o modo como me senti era real: o êxtase, a excitação, o medo e a adrenalina me lembravam que eu estava vivo, por mais que a realidade ainda parecesse distante. Mas o que mais me trazia a incerteza era aquela mulher em forma de demônio que me observava com sede, como se toda a minha existência fosse a sua última refeição. Ela se divertia com a certeza de que eu era dela e se deliciava toda vez que minha língua deslizava pelo seu corpo, sempre com o mesmo olhar profundo e um sorriso malicioso enquanto pedia por mais. Eu ia do céu ao inferno só de escutá-la sussurrar no meu ouvido, e, quando era a minha vez de pedir por mais, a mulher fazia questão de invadir todos os meus pensamentos e me deixar refém de si, como se não existisse mais ninguém além dela nos três mundos.

  Todos os dias eu ansiava pelo nosso encontro como se dependesse dele para viver.

  Eu sentava próximo à janela e encarava o anoitecer caloroso surgir, e, assim que os ponteiros se juntavam, a mulher surgia em sua forma demoníaca, me cumprimentando com um beijo demorado enquanto a sua cauda se enrolava em mim, me puxando para si; quando percebia, já estávamos na minha cama, presos em um transe incomum e tão gostoso que eu me via cada vez mais viciado. Eu gostava de cada segundo mesmo que às vezes pensasse em abrir mão desse sonho, no entanto, não conseguiria viver sem essa tentação, sem ter o gosto dela na minha língua todas as noites em que eu lhe garantia de que minha vida a pertencia; talvez, lá no fundo, eu quisesse algo a mais de que ela nunca iria me oferecer, contudo, no fim, eu estava ciente e continuava a querer toda a sua essência.

  Mas, como todo sonho acaba, esse não seria diferente.

   parou de aparecer na minha janela e eu sentia como se um pedaço de mim tivesse sido arrancado, por mais dramático que parecesse. Os meus dias voltaram a ser completamente nublados como eram antes da sua presença e eu tive a confirmação do que tanto ignorava: eu estava apaixonado por um demônio. Perdidamente e estupidamente apaixonado por uma mulher que simplesmente desapareceu da minha vida, e não havia pacto no mundo que me permitisse falar com ela. Tentei procurá-la em vários cantos da cidade, porém, não havia um rastro seu além da minha memória.

  Talvez fossem apenas bons e calorosos sonhos, pensei. Entretanto, a sua marca ainda estava na parte de trás do meu pescoço, como se fosse uma tatuagem tão bonita em formato de coração. Às vezes, quando a insônia era legal o bastante para me deixar dormir, eu podia ver , só que toda vez que eu tentava me aproximar, eu acordava e perdia o sono.

  Um tempo se passou e a sua marca sumiu, e eu entendi que ela havia desfeito o pacto. Isso me doeu mais do que imaginava, contudo, não tinha o que fazer a não ser aceitar que foi embora. Nobre da parte dela em não me dar mais esperanças, apesar de preferir receber um aviso que não teríamos mais nada mais diretamente, principalmente após passarmos tanto tempo juntos.

  Com a sua ida, prossegui com a minha vida e com a saudade que sentia dela, até que, em um belo dia, eu a vi sentada na minha janela em sua forma humana. Pisquei algumas vezes para ter a certeza de que era diante de mim, e assim que a sua mão encostou na minha bochecha, eu tive a confirmação de que era real. As dúvidas sumiram assim que eu a beijei, e quando nossas línguas se entrelaçaram, o doce gosto da tentação invadiu a minha boca, me fazendo sedento por mais. Naquela noite, eu entreguei a minha vida a como se fosse a primeira vez, como se nunca tivéssemos nos separado.

  Naquela noite, eu recebi um convite seu.

  Uma proposta arriscada e tentadora, mas que eu aceitei sem nem pensar duas vezes e que mudaria a minha vida para sempre. A insônia já não fazia mais parte da minha rotina, e toda vez que nos deitávamos na nossa nova casa, eu dormia profundamente após escutá-la dizer:

  — Bons sonhos, .